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UNIVERSIDADE SUL DE SANTA CATARINA
GUILHERME SAUERBIER
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO CIRURGIÃO PLÁSTICO
Florianópolis (SC) 2009
GUILHERME SAUERBIER
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO CIRURGIÃO PLÁSTICO Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL, Campus Grande Florianópolis, Norte da Ilha, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.
Orientador: Prof. Luiz Gustavo Lovato
Florianópolis (SC)
2009
GUILHERME SAUERBIER
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO CIRURGIÃO PLÁSTICO
Esta monografia foi julgada adequada à obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovada em sua forma final pelo Curso de Direito da Universidade Sul de Santa Catarina.
Florianópolis (SC), 11 de novembro de 2009.
_______________________________________ Prof. e Orientador: Luiz Gustavo Lovato
Universidade Sul de Santa Catarina
_______________________________________ Prof.
Universidade Sul de Santa Catarina
_______________________________________ Profª.
Universidade Sul de Santa Catarina
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO CIRURGIÃO PLÁSTICO
Declaro, para todos os fins de direito e que se fizerem necessários, que
assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico e referencial conferido ao
presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a
Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de todo e
qualquer reflexo acerca desta monografia.
Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente
em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico.
Florianópolis (SC), 11 de novembro de 2009.
__________________________ Guilherme Sauerbier
A Jesus, pois graças a ele cheguei até
aqui.
A meus pais, que contribuíram para a
minha formação.
A minha esposa Michelle que sempre me
motivou para cumprir esta meta.
AGRADECIMENTOS Aos meus amigos e irmãos na fé em
Cristo que oraram por mim. A todos os professores da Unisul, que
levaram o ensino de diferentes formas ao
ambiente acadêmico, em especial ao
Professor Luiz Gustavo Lovato, que se
mostrou disposto a me ajudar na
orientação deste trabalho.
RESUMO
O presente estudo trata da responsabilidade civil do médico cirurgião plástico no
contexto atual do ordenamento jurídico brasileiro, focando a obrigação subjetiva do
profissional liberal na relação contratual médico-paciente em relação ao Código de
Defesa do consumidor. Há uma clara distinção entre obrigação subjetiva de meio e
de resultado na área médica quando se trará de uma cirurgia plástica reparadora e
uma cirurgia plástica estética. O médico é um profissional liberal abrangido pela
exceção que o Código de Defesa do Consumidor faz no que se refere a
responsabilidade do fornecedor de serviços, no qual prevalece a responsabilidade
civil subjetiva com obrigação de meio quando este não estiver comprometido,
contratualmente, a alcançar determinado resultado.
Palavras-chave: Responsabilidade Civil. Médico. Cirurgia Plástica.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 08 2 OBRIGAÇÕES DE MEIO E DE RESULTADO ...................................................... 10 2.1 OBRIGAÇÃO DE MEIO ....................................................................................... 12
2.2 OBRIGAÇÃO DE RESULTADO .......................................................................... 13
2.3 INADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES ........................................................... 14 2.4 MORA.................................................................................................................. 16
2.5 CLAUSULA PENAL ............................................................................................. 17 2.6 PERDAS E DANOS ............................................................................................ 17 2.7 JUROS ................................................................................................................ 18 2.8 ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA ............................................................................. 19 2.9 HONORÁRIOS DO ADVOGADO ........................................................................ 19 3 O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E A RESPONSABILIDADE CIVIL 20 3.1 O CONSUMIDOR ................................................................................................ 22
3.2 O FORNECEDOR ............................................................................................... 23
3.3 O PRODUTO ....................................................................................................... 24
3.4 O SERVIÇO ........................................................................................................ 25
3.5 DISTINÇÃO ENTRE VÍCIO E DEFEITO DE UM PRODUTO OU SERVIÇO ...... 26
3.6 RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR DE SERVIÇO PELO FATO ........... 27 3.7 RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR DE SERVIÇO PELO VÍCIO ........... 28 3.8 DOS PROFISSSIONAIS LIBERAIS .................................................................... 29 4 NATUREZA JURÍDICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO .............. 33 4.1 A PREVISÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ........................... 33
4.2 A OBRIGAÇÃO MÉDICA .................................................................................... 36
4.2.1 O Dano Moral .................................................................................................. 40 4.2.2 O Dano Estético .............................................................................................. 42 4.3.3 Obrigação de Meio na Atividade Médica ...................................................... 44 4.3.4 Obrigação de Resultado na Atividade Médica ............................................. 47 4.3.5 Responsabilidade do Cirurgião Plástico na Cirurgia Estética e na Reparadora .............................................................................................................. 49 4.3.6 Causas Excludentes da Responsabilidade Médica ..................................... 52 5 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 54
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 55
8
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho aborda a responsabilidade civil do médico, em
especial a do médico cirurgião plástico, focando as conseqüências em caso de culpa
e ônus da prova.
A cirurgia plástica, historicamente é um moderno ramo da medicina, que
se tornou comum nos dias atuais a ponto de os tribunais debruçarem-se sobre a
matéria.
A atividade médica é um meio lícito de atuar na área da saúde, fazendo
parte do dia-a-dia da população. Porém, a atividade médica da cirurgia plástica
possui uma característica particular, pois o que se visa não é a cura do paciente ou a
recuperação física de alguma patologia ou lesão oriunda de acidentes. Criou-se uma
condenação, em decisões jurídicas, a esse tipo de prática do ponto de vista moral,
haja vista, os motivos fúteis com que as pessoas procuram esse tipo de atuação
médica.
Diante desse contexto, o trabalho visa estudar a responsabilidade civil do
médico cirurgião plástico, no âmbito do Código de Defesa do Consumidor, por ser
positivada como relação de consumo, devido a uma necessidade de proteção da
parte mais fraca dessa relação. Nesse aspecto, buscam-se identificar os elementos
caracterizadores da responsabilidade civil frente ao ordenamento jurídico brasileiro,
analisando-se, inclusive, alguns julgados do Superior Tribunal de Justiça.
Esse trabalho foi motivado pelas controvérsias em torno do assunto a ser
tratado, ou seja, se a responsabilidade civil do médico cirurgião plástico caracteriza
obrigação de meio ou de resultado. A resposta dos tribunais tem evidenciado uma
aversão a tal prática consumista, causando divergência doutrinária.
A grande relevância do tema mostra-se na tendência crescente em
transformar a cirurgia plástica estética em um meio de comércio e o
conservadorismo do judiciário brasileiro, que repudia tal prática, gerando polêmica
doutrinária e uma tendência futura de se entender de modo diverso o assunto em
questão.
O método de abordagem utilizado na investigação é o indutivo, eis que o
estudo partiu de um fenômeno particular para buscar respostas nas teorias e leis
9
gerais. Esse procedimento, vale dizer, foi realizado por meio de pesquisa
bibliográfica.
O estudo, que resulta neste relatório de pesquisa, foi estruturado em cinco
capítulos distintos.
No capítulo 1 estabeleceu-se a parte introdutória, a qual insere o leitor no
contexto do trabalho. Nessa primeira parte se incluem o tema e sua
contextualização, os objetivos e a justificativa da pesquisa, além da metodologia
utilizada e a organização do estudo.
No capítulo 2 faz-se a distinção entre obrigação subjetiva de meio e de
resultado. A seguir refere-se ao inadimplemento contratual e suas conseqüências
jurídicas. Importante o destaque sobre o inadimplemento para que o leitor
contextualize a relação médico-paciente que é uma relação contratual e se insere,
também, na relação de consumo.
No capítulo 3 conceituam-se os elementos que fazem parte do contrato
referidos pelo Código de Defesa do Consumidor e a responsabilidade do fornecedor
de serviços.
No capítulo 4 são apresentados várias decisões do Superior Tribunal de
Justiça e são abordados os deveres e responsabilidade do médico cirurgião plástico,
além de ser feita uma importante distinção entre a responsabilidade civil do médico
cirurgião plástico na cirurgia estética e na reparadora. Também são feitas
considerações a respeito das excludentes da responsabilidade médica.
Na conclusão apresenta-se uma síntese de cada capítulo, fazendo uma
referência ao contexto social e a possibilidade de mudanças devido ao avanço da
medicina e as divergências entre doutrina e jurisprudência.
10
2 OBRIGAÇÕES DE MEIO E DE RESULTADO
A obrigação de meio e a obrigação de resultado são duas modalidades
da responsabilidade civil subjetiva a serem estudadas para melhor entender o
assunto, e que são abrangidas pela responsabilidade civil dos profissionais liberais. 1
Essas modalidades de obrigação precisam ser analisadas para o seu
uso em cada caso, pois trazem significativas conseqüências na aplicação da
responsabilidade. 2
No Código Civil de 1916, ora revogado, era estabelecida a
responsabilidade civil de alguns profissionais ligados à área da saúde, quais sejam
os médicos, cirurgiões, farmacêuticos, parteira e dentistas, que porventura agissem
com culpa e causassem a morte, inabilitação de servir ou ferimento ao paciente.
Porém, com o Código Civil de 2002, atualmente em vigor, esse rol foi ampliado para
todos os profissionais que em sua atividade causem dano ao paciente. 3
Assim dispõe o art. 951 do Código Civil in verbis:
Art. 951. O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.
Esse dano pressupõe uma obrigação de reparação, conforme o art. 927
do Código Civil: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem,
fica obrigado a repará-lo”.
Essa obrigação gera dois tipos de responsabilidade civil, quais sejam, a
objetiva e subjetiva. Desta forma comentou Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de
Andrade Nery (2003):
3. Sistema de indenização do CC. São dois os regimes jurídicos da responsabilidade civil no sistema do CC: a) responsabilidade subjetiva; b)
1 CAVALIERI FILHO, Sérgio, 2004, Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros, p. 518. 2 GODOY, Cláudio Luiz Bueno de, et al, 2007, Responsabilidade Civil na Área da Saúde, Saraiva, p. 200. 3 SILVA, Regina Beatriz Tavares da, Código Civil Comentado, Saraiva, 2008, p. 927.
11
responsabilidade objetiva. Ambas têm a mesma importância no sistema do CC, não havendo predominância de uma sobre a outra. Conforme o caso, aplica-se um ou outro regime da responsabilidade civil, sendo impertinente falar-se em regra e exceção. 4
Para a caracterização da responsabilidade subjetiva, além do dano e do
nexo causal, é imprescindível que haja culpa do autor do dano, pois esta é
pressuposto para aquela. 5 Dessa forma, na responsabilidade civil contratual a culpa
pode ser provada ou presumida, ou seja, com obrigação de meio e de resultado.
Sérgio Cavalieri Filho (2004) explica essa relação:
Na responsabilidade contratual, a culpa, de regra, é presumida; inverte-se, então o ônus da prova, cabendo ao credor demonstrar, apenas, que a obrigação não foi cumprida; o devedor terá que provar que não agiu com culpa, ou, então, que ocorreu alguma causa excludente do próprio nexo causal. Na realidade, entretanto, essa presunção de culpa não resulta do simples fato de estarmos em sede de responsabilidade contratual. O que é decisivo é o tipo de obrigação assumida no contrato. Se o contratante assumiu a obrigação de alcançar um determinado resultado (obrigação de resultado – v. item 103) e não conseguiu, haverá culpa presumida, ou, em alguns casos, até responsabilidade objetiva; se a obrigação assumida no contrato foi de meio, a responsabilidade, embora contratual, será fundada na culpa provada.6
A divisão da culpa em contratual e extracontratual, não tem vínculo com
a presunção de culpa e a inversão do ônus da prova, o que se tem em questão é
que a jurisprudência e a doutrina interpretam as obrigações contratuais como
obrigações de meio e de resultado, e é a partir daí que se verifica a inversão do ônus
da prova. 7
Por isso, existem regras aplicáveis para a responsabilidade contratual e
a extracontratual. O C.D.C. dispensou essa distinção, colocando uma
responsabilidade sobre o fornecedor independentemente da realização de qualquer
contrato com o consumidor. 8 A exceção ocorre em relação aos profissionais liberais,
para quem a culpa depende do que foi firmado no contrato médico-paciente,
ensejando obrigação de meio ou de resultado, conforme o caso. Em regra, é
subjetiva com culpa provada, ou seja, obrigação de meio. 9
4 NERY JÚNIOR, Nelson, et al, Código Civil Anotado, Revista dos Tribunais, 2003, p. 488. 5 CAVALIERI FILHO, Sérgio, 2004, Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros, p. 39. 6 CAVALIERI FILHO, Sérgio, 2004, Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros, p. 297. 7 STOCO. Tratado de Responsabilidade Civil. Editora Revista dos Tribunais. 7. ed. São Paulo:, 2007. p. 556. 8 CAVALIERI FILHO, Sérgio, 2004, Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros, p. 39. 9 CAVALIERI FILHO, Sérgio, 2004, Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros, p. 392.
12
2.1 OBRIGAÇÃO DE MEIO
A obrigação de meio configura-se quando a parte contratada para a
prestação de um serviço se compromete a agir de acordo com seu conhecimento
técnico profissional para a conquista de determinado resultado, sem, contudo, ser
responsabilizado por ele, entretanto, se garantir esse resultado, este é conseqüência
possível do uso da melhor técnica. Exemplos de obrigação de meio existe no caso
dos os advogados, na medida em que não estão obrigados a vencer uma
determinada causa, mas apenas proteger o interesse do seu cliente; também os
médicos podem ser citados nos exemplo dessa obrigação, como será analisado na
secção 4.2.3 do capítulo 4. 10
Fernanda Schaefer discorre sobre a obrigação de meio no caso dos
médicos:
São obrigações de meio aquelas em que o médico, ao assistir o paciente, obriga-se apenas a empregar de forma diligente todos os meios e recursos disponíveis para a melhor condução do quadro clínico apresentado, sendo irrelevante a verificação do resultado. Nestes casos o ônus da prova é do credor, ou seja, deve o paciente demonstrar que o médico (devedor) agiu com dolo, negligência, imprudência ou imperícia. 11
Por esse motivo a responsabilidade médica é em regra geral contratual
não pelo fato de se presumir a sua culpa, mas sim porque, dependendo do acordo
promovido entre as partes contratantes, incumbe ao paciente o ônus probatório no
caso de sua inexecução
Nesse sentido o § 4º do art. 14 do C.D.C. considera a responsabilidade
subjetiva para o descumprimento da obrigação no caso dos profissionais liberais,
porém, depende do acordo firmado entre este e o consumidor, ou seja, se de meio
ou de resultado.
10 GONÇALVES, Carlos Roberto Gonçalves, 2004, Direito Civil Brasileiro, Saraiva, p. 174. 11 SCHAEFER, Fernanda, Responsabilidade Civil do Médico & Erro de Diagnóstico, Juruá, 2006, p. 38.
13
2.2 OBRIGAÇÃO DE RESULTADO
Há obrigações para os profissionais liberais que por sua definição são
submetidas à responsabilidade civil subjetiva com culpa presumida. Essas
obrigações são consideradas obrigações de resultado para a doutrina
Assim, Fernanda Schaefer expõe que:
As obrigações de resultado são aquelas em que o devedor se compromete a atingir um determinado objetivo, como, por exemplo, cirurgias estéticas rejuvenescedoras, e anestesias. O que importa é o resultado final e não os meios utilizados. Não sendo atingido o resultado, será o médico considerado inadimplente. Aplicam-se a estes casos os princípios da responsabilidade civil objetiva, restando ao devedor demonstrar que não atingiu os objetivos estipulados por total impossibilidade objetiva. Esta modalidade de obrigação está sendo abandonada pela jurisprudência brasileira sobre o fundamento de que não se pode exigir que o médico seja absolutamente infalível, posição com a qual a autora concorda. Conforme este novo entendimento, toda obrigação médica passa a ser exclusivamente de meio.12
A autora refere-se ao seguinte julgamento da apelação cível do Tribunal
de Justiça do Paraná:
Erro médico - Anestesia - Desatenção quando da aplicação dos anestésicos - Edema cerebral Generalizado e lesão isquêmica devido à anoxia – Síndrome cerebelar com seqüelas irreversíveis - Culpa comprovada – Responsabilidade solidária do nosocômio – Paciente em estado de coma - Alta precocemente permitida - Médico sócio da pessoa jurídica e membro do corpo clínico do hospital – Inversão do ônus da prova – Encargo do qual o profissional não se desincumbiu – Dano estético e moral – Verba única – Pedido genérico – Valores a serem apurados em liquidação de sentença, por artigos – Parcial provimento do recurso adesivo – Desprovimento da apelação dos réus e dos agravos retidos pelos mesmos interpostos.13
Os profissionais liberais possuem obrigação de meio ou de resultado, por
ser sua responsabilidade civil subjetiva, só se aplicando, mediante a verificação de
culpa, conforme determinado pelo C.D.C., como já visto. Desse modo, existem
12 SCHAEFER, Fernanda, Responsabilidade Civil do Médico & Erro de Diagnóstico, Juruá, 2006, p. 38. 13 PARANÁ. Primeira Câmara Civil do Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº. 0132617-4. Relator: Desembargador Antônio Renato Strapasson. Apelante: C. H. e C. D. LTDA. Apelada: M. Z. Julgado em: 07/12/1999. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/4320153/apelacao-civel-ac-1326174-pr-apelacao-civel-0132617-4-tjpr> Acesso em: 27 jul. 2009.
14
algumas situações do profissional que exigem que sua atuação produza um
resultado, como por exemplo, o cirurgião-dentista quando coloca jaqueta ou pivot,
quando existe uma preocupação estética por parte do paciente; ou ainda, o resultado
estético que se espera de um médico-cirurgião.
Segundo Ingrid Patrícia Félix da Cruz:
Na obrigação de resultado há o compromisso do contratado com um resultado específico, que é o cerne da própria obrigação, sem qual não haverá o cumprimento desta. O contratado compromete-se a atingir objetivo determinado, de forma que quando o fim almejado não é alcançado ou é alcançado de forma parcial, tem-se a inexecução da obrigação. Nas obrigações de resultado há a presunção de culpa, com inversão do ônus da prova, cabendo ao acusado provar a inverdade do que lhe é imputado. 14
A obrigação de resultado existe quando o profissional realiza um acordo
com a outra parte, o qual determina que o único objetivo do contrato seja o resultado
esperado. Dessa forma, não sendo atingido o resultado prometido, está configurado
o inadimplemento, que para o profissional liberal, significa que ele é quem deve
provar que cumpriu as diligências profissionais necessárias. 15
2.3 INADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES
Nas obrigações a parte credora possui o direito de cobrar do devedor o
cumprimento de uma prestação, e este, por sua vez, o dever de prestar a obrigação,
extinguindo-se, normalmente, com o pagamento. 16
Segundo os doutrinadores Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona
Filho (2009):
[...] a obrigação - entendida como a relação jurídica patrimonial que vincula o credor do devedor – é um liame economicamente funcional, por meio do qual se efetiva a circulação de bens e direitos no comércio jurídico.
14Cruz, Ingrid Patrícia Félix da. Cirurgia plástica estética: obrigação de meios ou de resultado? Elaborado em 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5655> Acesso em: 28 jul. 2009. 15 CAVALIERI FILHO, Sérgio, 2004, Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros, p. 402. 16 GONÇALVES, Carlos Roberto Gonçalves, 2004, Direito Civil Brasileiro, Saraiva, ps. 233-235.
15
De tal forma, dada a sua dinâmica essencial, a relação obrigacional obedece a um ciclo que se encerra com a sua extinção, que se dá, geralmente, por meio do pagamento. 17
Dessa forma, ocorre normalmente o adimplemento das obrigações, ora
por iniciativa da parte devedora, ora por apelo do credor para que aquele cumpra a
obrigação. Porém, nem sempre a prestação é efetuada de forma integral, seja por
culpa de uma das partes ou quando ocorre caso fortuito ou de força maior, por
exemplo; pode ocorrer, ainda, a decadência do direito do credor ou o perdão da
dívida. 18
Em nenhuma dessas causas ocorre a prestação da obrigação, mas o não
cumprimento da obrigação só ocorre quando a prestação não for efetuada pelo
devedor ou por terceiro, e quando não for extinta por outra causa.19
Nessas hipóteses, o inadimplemento pode ser absoluto ou relativo20, cuja
diferença será mais bem demonstrada na secção a seguir.
Ocorre o inadimplemento absoluto quando inexiste a possibilidade de o
credor receber a prestação de forma útil, seja total ou parcialmente. Por isso, o art.
389 do Código Civil dispõe sobre a obrigação do devedor: “Não cumprida a
obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização
monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de
advogado”.21
Quando ocorrer o inadimplemento absoluto por culpa do devedor há o
inadimplemento voluntário ou culposo da obrigação, base para a responsabilidade
civil contratual. Nesse caso, o juiz, a requerimento do autor, procederá a conversão
da obrigação de fazer ou não fazer, em perdas e danos, ou seja, ocorrerá a
transformação da obrigação em pagamento por quantia certa, independentemente
da aquiescência do réu. Também ocorrerá conversão se for impossível a tutela
específica ou a obrigação do resultado prático equivalente, caso em que o juiz
poderá proceder a conversão de ofício. 22
17 GAGLIANO, Pablo Stolze; et al, 2009, Novo Curso de Direito Civil, Saraiva, p. 265 e 347. 18 GONÇALVES, Carlos Roberto Gonçalves, 2004, Direito Civil Brasileiro, Saraiva, p. 347. 19 GONÇALVES, Carlos Roberto Gonçalves, 2004, Direito Civil Brasileiro, Saraiva, p. 348. 20 COELHO, Fábio Ulhôa, 2004, Curso de Direito Civil, Saraiva, p. 168. 21 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo, 2009, Novo Curso de Direito Civil, Saraiva, p. 267. 22 WAMBIER, Luiz Rodrigues; 2006, Curso Avançado de Processo Civil V. 2, Revista dos Tribunais, p. 274.
16
O art. 461 c/c § 1º do CPC assim estabelece:
Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. § 1.º A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.
Em suma, o inadimplemento, seja absoluto ou relativo, se for culpa do
devedor, será seguido de alguma forma de indenização, que pode estar prevista no
contrato como por exemplo, a cláusula penal.
2.3.1 Mora
Diferentemente do absoluto o inadimplemento relativo ocorre quando
determinada prestação não foi realizada no tempo, lugar e forma devidos. Porém,
mesmo com atraso culposo, por parte do devedor, ou a recusa injustificada do credor
em receber a prestação, esta ainda poderá ser cumprida com proveito, o que se
diferencia do inadimplemento absoluto e caracteriza a mora, conforme está
positivado no art. 394 do Código Civil: “Considera-se em mora o devedor que não
efetuar o pagamento e o credor que não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma
que a lei ou a convenção estabelecer.” 23
Conforme Fábio Ulhoa Coelho (2009):
“A mora é o atraso no cumprimento da obrigação provocado por ato culposo de uma das partes. Está em mora o devedor que não entrega a prestação ao credor no vencimento, e o credor injustificadamente se recusa a recebê-la.” 24
Convém ressaltar que segundo o Código Civil, o devedor não incorre em
mora quando acontecer casos inimputáveis ao devedor. Desta forma está positivado
o art. 396 do Código, in verbis: “não havendo fato ou omissão imputável ao devedor, 23 COELHO, Fábio Ulhoa Coelho, 2009, Curso de Direito Civil, Saraiva, p. 170. 24 COELHO, Fábio Ulhoa Coelho, 2009, Curso de Direito Civil, Saraiva, p. 171.
17
não incorre este em mora”. Exemplos de casos não imputáveis ao devedor seriam o
caso fortuito e a força maior. 25
2.3.2 Cláusula Penal
A cláusula penal é uma obrigação acessória estipulada pelas partes, que
assim concordaram, que, caso fosse descumprida a obrigação, houvesse uma pena
para o responsável. Considera-se que é uma multa a ser paga conforme
estabelecido no pacto contratual. 26
Fábio Ulhoa Coelho faz uma definição sobre a cláusula contratual
As partes de um contrato podem estabelecer uma pena para a hipótese de inadimplemento. A pena, em geral, é uma multa, e a cláusula que a contempla é chamada “penal”. A lei limita o valor da multa convencional e determina que ela seja reduzida por equidade em caso de cumprimento parcial da obrigação ou se for manifestamente excessiva. 27
Dessa forma, a cláusula penal garante dupla vantagem ao credor, uma
vez que a probabilidade de que o contrato se cumpra seja maior, alem de tornar fácil
o pagamento da indenização, pois não há necessidade de provar o prejuízo para
exigir a pena estabelecida. 28
2.3.3 Perdas e Danos
Sempre que o inadimplemento do contrato acarretar dano ao contraente,
este pode exigir indenização pelos danos materiais decorrentes do descumprimento
da obrigação. 29
25 GAGLIANO, Pablo Stolze, et al, 2009, Novo Curso de Direito Civil, Saraiva, p. 274. 26 GONÇALVES, Carlos Roberto Gonçalves, 2004, Direito Civil Brasileiro, Saraiva, p. 388. 27 COELHO, Fábio Ulhoa, 2009, Curso de Direito Civil, Saraiva, p. 189. 28 GONÇALVES, Carlos Roberto Gonçalves, 2004, Direito Civil Brasileiro, Saraiva, p. 388. 29 DINIZ, Maria Helena, 2009, Curso de Direito Civil Brasileiro, Saraiva, p. 440.
18
Sílvio Rodrigues divide as perdas e danos em dano emergente e lucro
cessante:
Cumpre ao credor provar o dano que experimentou e o fará demonstrando que o inadimplemento resultou para ele determinada perda. Cujo montante passa a evidenciar. [...] Além do que efetivamente perdeu, cabe ao credor o direito de ser pago daquilo que razoavelmente deixou de lucrar. 30
Os danos emergentes são aqueles que diminuem o patrimônio do credor,
em razão do inadimplemento por parte do devedor, e está definida em lei, no art. 402
do Código Civil, sendo: tudo o que o credor efetivamente perdeu e o que
razoavelmente deixou de ganhar. 31
Lucros Cessantes, por sua vez, é o que a vítima razoavelmente deixou
de lucrar, ou seja, é todo o valor que o credor lucraria se a prestação fosse cumprida
efetivamente e que, supõe-se, ocorreria dentro da normalidade, considerando-se o
que antecedeu. 32
2.3.4 Juros
Carlos Roberto Gonçalves (2008) define os juros da seguinte maneira:
Juros são os rendimentos do capital. São considerados frutos civis da coisa, assim como os aluguéis. Representam o pagamento pela utilização de capital alheio. Integram a classe das coisas acessórias (CC, art. 95). [...] Os juros dividem-se em compensatórios e moratórios, convencionais e legais, simples e compostos. 33
Os juros compensatórios são frutos do capital que foi empregado,
remunerando o credor pelo tempo em que ficou privado do capital. Os moratórios
são uma indenização pelo prejuízo causado pelo inadimplemento culposo do
devedor. 34
30 RODRIGUES, Sílvio, 2009, Direito Civil, v. 2, Saraiva, p. 254-255. 31 COELHO, Fábio Ulhoa, 2009, Curso de Direito Civil, Saraiva, p. 181. 32 GONÇALVES, Carlos Roberto Gonçalves, 2004, Direito Civil Brasileiro, Saraiva, p. 378. 33 GONÇALVES, Carlos Roberto, Responsabilidade Civil, Saraiva, 2008, p. 382. 34 GONÇALVES, Carlos Roberto Gonçalves, 2004, Direito Civil Brasileiro, Saraiva, p. 378.
19
2.3.5 Atualização Monetária
A correção monetária visa atualizar o valor devido ao credor, que com o
tempo, perde o seu poder aquisitivo decorrente da inflação, sendo calculado por um
índice medidor da mesma, como o IGP e o FGV. 35
2.3.6 Honorários do Advogado
Fábio Ulhoa Coelho (2009) explica porque deve ser pago honorários de
advogado:
O devedor inadimplente deve pagar os honorários de advogado do credor, mesmo que a tardia execução da obrigação não tenha dependido de medida judicial. Como a indenização devida pelo inadimplente deve ser completa, sempre que o credor tiver contratado advogado para ver satisfeito o seu direito, ao devedor é imposta a obrigação de ressarcir os honorários daquele profissional. 36
Seria ilógico o fato de o credor ter que pagar honorários do advogado
para satisfazer o seu direito contratual e não ser ressarcido do valor pago ao
profissional, por isso é que o devedor deve arcar com o dever de pagar os
honorários de advogado do credor.
Esses casos tratam de responsabilidade civil contratual e também fazem
parte das relações de consumo, às quais se incluem a cirurgia plástica, estando
prevista a responsabilidade civil no Código de Defesa do Consumidor.
35 COELHO, Fábio Ulhoa, 2009, Curso de Direito Civil, Saraiva, p. 185-86. 36 COELHO, Fábio Ulhoa, 2009, Curso de Direito Civil, Saraiva, p. 190.
20
3 O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E A RESPONSABILIDADE CIVIL
A defesa ao consumidor foi estabelecida no ordenamento jurídico como
garantia fundamental a partir de uma previsão da Constituição de 1988 conforme
está positivado no art. 5º, XXXII, in verbis: “o Estado promoverá, na forma da lei, a
defesa do consumidor”, visando, este dispositivo a proteção ao consumidor, prevista
também, como um dos princípios da ordem econômica no art. 170, caput c/c art. 170,
V, da CF/88, in verbis37:
“A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) V – defesa do consumidor”
Essas previsões constitucionais surgiram da necessidade de proteção ao
consumidor, haja vista, a sua vulnerabilidade nas relações de consumo, admitindo-
se, desta forma, que a parte mais fraca na relação de consumo é o consumidor. 38
A necessidade de proteção já vinha sendo acolhida por outros países,
sendo inclusive, reconhecida pela ONU - Organização das Nações Unidas, em
resolução do ano de 1985 – mais antiga, portanto, que a Constituição brasileira de
1988 – a qual afirma que os consumidores estão em desequilíbrio em termos
econômicos, nível educacional e poder aquisitivo. 39
Logo nos primeiros anos que se seguiram, após a promulgação da
Constituição e com a garantia desta, a defesa do consumidor foi codificada, surgindo
no nosso ordenamento jurídico, como princípio constitucional (art. 170, V, CF), e
cláusula pétrea (art. 5º, XXXII), não podendo ser modificada, pois foi protegida entre
os direitos individuais. 40
37 BULOS, Uadi Lammêgo, 2008, Constituição Federal Anotada, Saraiva, p. 1263. 38 ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, 2009, Curso de Direito Constitucional, Saraiva, p. 471. 39 ALMEIDA, João Batista, 2009, A proteção Jurídica do Consumidor, Saraiva, p. 25. 40 NUNES, Rizzatto, Curso de Direito do Consumidor, Saraiva, 2009, p. 66.
21
Desta forma, este princípio constitucional foi concretizado no Código de
Defesa do Consumidor. Por isso, prescreve o seu art. 1º da seguinte forma:
“O presente Código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, nos termos dos arts. 5º, XXXII, 170, V, da Constituição Federal e art. 48 de suas Disposições Transitórias.”
O art. 48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias concedia o
prazo de 120 dias para que fosse criado, pelo Congresso Nacional, o Código de
Defesa do Consumidor. 41
Porém o Código só foi aprovado em 11 de setembro de 1990, muito
embora fosse aprovado pela lei ordinária para evitar que seu prolongamento fosse
maior, já que o setor empresarial insistia em adiar sua aprovação sob a alegação de
que a Constituição menciona em Código, contrariando o processo legislativo
ordinário. 42
Desta forma, foi criada essa lei, prevendo a relação jurídica de consumo,
com sujeitos ativos e passivos, dos quais será feita uma breve análise conceitual
sobre essas partes da relação de consumo.
O Código de Defesa do Consumidor adota como regra geral a
responsabilidade civil objetiva, muito embora atentasse em dar tratamento diverso
para situações diferentes, por esse motivo o artigo referido prevê expressamente a
exceção destacando em parágrafo próprio sobre os profissionais liberais, que só
respondem mediante verificação de culpa do profissional. 43
Por isso, no caso dos médicos, por exemplo, mesmo que haja a
convicção da natureza contratual da prestação de serviço do profissional, há uma
obrigação de meio e não de resultado, sendo que a ausência de culpa torna
improcedente a ação indenizatória. Porém, em outros casos, a obrigação assumida
pelo médico é de resultado, por exemplo, na responsabilidade civil do cirurgião
plástico. 44
41 SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho, Código de Defesa do Consumidor Anotado, Saraiva, 2009, p. 2. 42 NUNES, Rizzatto, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Saraiva, 2009, p. 93. 43 STOCO. Tratado de Responsabilidade Civil. Editora Revista dos Tribunais. 7. ed. São Paulo:, 2007. p. 467. 44 GONÇALVES, Carlos Roberto, Responsabilidade Civil, Saraiva, 2008, p. 397
22
3.1 O CONSUMIDOR
O C.D.C. traz em seu conteúdo os conceitos de fornecedor e
consumidor, que são os dois sujeitos da relação de consumo.
O art. 2º expressa que “consumidor é toda pessoa física ou jurídica que
adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”
O conceito fornecido pelo código não generaliza consumidor como toda e
qualquer pessoa que adquire um produto ou serviço, mas apenas o destinatário final,
ou seja, aquela pessoa física ou jurídica que não recoloca no mercado, na forma de
revenda, os bens consumíveis que foram adquiridos, ou seja, a relação de consumo
deve ser interrompida no consumidor. 45 Assim, o advogado que adquire um
automóvel, é considerado consumidor se o utilizar para uso próprio. 46
Porém, é importante destacar o comentário de Rizzatto Nunes:
A lei emprega o verbo “adquirir”, que tem de ser interpretado em seu sentido mais lato, de obter, seja a título oneroso ou gratuito. Porém, como, se percebe, não se trata apenas de adquirir, mas também de utilizar o produto ou o serviço, ainda quando quem o utiliza não o tenha adquirido. Isto é, a norma define como consumidor tanto quem efetivamente adquire (obtém) o produto ou o serviço como aquele que, não o tendo adquirido, utiliza-o ou o consome. Assim, por exemplo, se uma pessoa compra cerveja para fornecer aos amigos numa festa, todos aqueles que a tomarem serão considerados consumidores. 47
São considerados consumíveis alguns bens que o Código Civil define em
seu art. 86, in verbis: “São consumíveis os bens móveis cujo uso importa destruição
imediata da própria substância, sendo também considerados tais os destinados a
alienação.”. Por isso, Silvio Rodrigues conclui que:
“Além das coisas consumíveis por sua natureza, que desaparecem com o primeiro uso, a lei classifica igualmente como consumíveis as que se destinam a alienação. Assim, o livro, para o estudante, é bem inconsumível, porque ele sobrevive à utilização; mas para o livreiro é consumível, porque sua utilização (alienação) conduz ao seu perecimento para o alienante. A
45 ALMEIDA, João Batista de, A Proteção jurídica do Consumidor, Saraiva, 2009, p. 41. 46 SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho, Código de Defesa do Consumidor Anotado, Saraiva, 2009, p. 8. 47 NUNES, Rizzatto, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Saraiva, 2009, p. 96.
23
máquina não é consumível para quem a explora, mas o é para o fabricante que a produz e a destina à venda. 48
Por fim, a pessoa jurídica também pode ser considerada consumidora
com a condição de que seja reconhecida a sua vulnerabilidade, conforme dispõe o
art. 4º, I, do C.D.C. Essa vulnerabilidade pode ser do ponto de vista técnico, uma vez
que uma grande empresa também pode ser considerada consumidora. Dessa forma
quando esta se encontrar impotente de fato, a ponto de estar impossibilitada de
discutir o direito com o fornecedor, tem-se a possibilidade, inclusive, de se ter
invertido o ônus da prova a favor da pessoa jurídica consumidora. 49
3.2 O FORNECEDOR
O conceito de fornecedor está definido no C.D.C. art. 3º, in verbis:
Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
O C.D.C. conceitua fornecedor tanto a pessoa física como a jurídica,
pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados.
Assim, a lei ordinária previu um grande leque de possibilidades na definição de
fornecedor para não excluir condutas positivas que influenciasse de forma material
as partes da relação. 50
O conceito de fornecedor também abrange o prestador de serviço, pois o
C.D.C. menciona, o termo “fornecedor de serviços” nos arts. 14, 20, 21 e 40. 51
Jorge Alberto Quadros de Carvalho Silva (2009) afirma que, porquanto
não haja qualquer menção na lei os requisitos para ser considerado fornecedor são:
autonomia (poder de decisão), profissionalismo (conhecimento técnico) e
48 RODRUGUES, Sílvio, Direito Civil, Saraiva, 2007, p. 129-130. 49 SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho, Código de Defesa do Consumidor Anotado, Saraiva, 2009, p. 8. 50 NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano, et al, Código de Defesa do Consumidor Interpretado, Saraiva, 2008, p.23. 51 NUNES, Rizzatto, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Saraiva, 2009, p. 205.
24
habitualidade (freqüência no fornecimento), porque embora não esteja definido na lei
há casos em que será considerado fornecedor todo aquele que preencher esses
requisitos. 52
3.3 O PRODUTO
O conceito de produto está definido pelo Código de Defesa do
Consumidor no § 1º do art. 3º: “Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material
ou imaterial.
Essa definição de produto é utilizada de modo universal e liga-se
intimamente à concepção do que vem a ser um bem, que é a finalidade das
sociedades capitalistas dos dias atuais, quando se trata de relação de consumo.
Esse conceito era utilizado pelos agentes dos setores econômicos, financeiros e de
comunicações, e com o advento do C.D.C. passa a ser usado, também no ambiente
jurídico. 53
Interessante notar que a lei abrange também a proteção das relações de
consumo relativas a bens imóveis, passando longe do Direito Comercial, o qual não
cuida desse tipo de relação. 54
Os produtos podem, ainda, ser classificados em duráveis e não duráveis.
Esse conceito está positivado no art. 26, I e II do C.D.C., que fala sobre a prescrição
e decadência:
art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em: I – 30 (trinta) dias, tratando-se de fornecimento de serviços e de produtos não duráveis; II – 90 (noventa) dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produto duráveis.
52 SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho, Código de Defesa do Consumidor Anotado, Saraiva, 2009, p. 18-19. 53 NUNES, Rizzatto, Curso de Direito do Consumidor, Saraiva, 2009, p. 90. 54 NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano, et al, Código de Defesa do Consumidor Interpretado, Saraiva, 2008, p.28.
25
Durável é o produto que não se exaure com o simples uso, durando
bastante tempo, com o objetivo de ser usado várias vezes. Produto não durável, por
sua vez, perece com o uso pelo consumidor e se extingue com facilidade. 55
Esse critério de classificação foi necessário para que fossem fixados os
prazos para que o consumidor pudesse reclamar por vícios do produto ou serviços. 56
3.4 O SERVIÇO
O C.D.C. definiu serviço no § 2º do art. 3º mostrando de maneira
bastante específica o seu conceito:
“Art. 3º (...)
§ 2º - Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.”
Serviço vem a ser uma atuação do homem com um objetivo específico,
que se termina logo que praticado, sendo uma contradição a definição em serviço
não durável. Porém, por uma conveniência do mercado, há serviços que são
considerados duráveis. Podem exemplificar esse entendimento os serviços de
convênio de saúde e os serviços educacionais regulares em geral. Por isso, o C.D.C.
adotou esse conceito, definindo os serviços em duráveis e não duráveis. 57
Hildegard Taggesell Giostri expõe um conceito sobre serviços:
Os serviços podem ser materiais, imateriais, intelectuais, braçais, técnicos, domésticos ou exteriores e, para que se integrem às relações de consumo, devem ser lícitos, conceituando-se relações de consumo como aquelas que se estabelecem entre fornecedores e consumidores.
55 NUNES, Rizzatto, Curso de Direito do Consumidor, Saraiva, 2009, p. 90. 56NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano; et al, Código de Defesa do Consumidor Interpretado, Saraiva, 2008, p.28. 57 NUNES, Rizzatto, Curso de Direito do Consumidor, Saraiva, 2009, p. 100.
26
Um requisito importante para a caracterização de serviço segundo o
Código está relacionado a remuneração, posto que, sem remuneração não existe
serviço. 58
Em suma, o conceito de produtos e serviços estão previstos no C.D.C., o
qual responsabiliza os fornecedores por qualquer vício e defeito em seus produtos e
prestação de serviços.
3.5 DISTINÇÃO ENTRE VÍCIO E DEFEITO DE UM PRODUTO OU SERVIÇO
Uma importante distinção a ser feita está relacionada aos vícios e
defeitos dos produtos ou serviços.
Segundo Rizzatto Nunes os vícios são classificados da seguinte forma:
São considerados vícios as características de qualidade ou quantidade que os tornem os serviços (ou os produtos) impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam e também que lhes diminuam o valor. Da mesma forma são considerados vícios os decorrentes da disparidade havida em relação às indicações constantes do recipiente, embalagem, rotulagem, oferta ou mensagem publicitária. 59
Os defeitos, por sua vez ensejam a responsabilidade pelo fato do
produto ou serviço, pois ocasionam danos, que necessitam da respectiva reparação.
São fatos anormais que causam uma insegurança indesejada aos consumidores,
que se resultarem somente no funcionamento do produto ou serviço, será
considerado vício, porém, se vier a causar um dano ao consumidor passa a ser
defeito. Portanto, defeito tem elo com o dano. 60
Por essa razão Rizzatto Nunes Expõe:
O defeito é o vício acrescido de um problema extra, alguma coisa extrínseca ao produto, que causa um dano maior que simplesmente o mal funcionamento, o não-funcionamento, a quantidade errada, a perda do valor pago, já que o produto ou serviço não cumprem o fim ao qual se
58NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano, et al, Código de Defesa do Consumidor Interpretado, Saraiva, 2008, p.28. 59 NUNES, Rizzatto, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Saraiva, 2009, p.205. 60ALMEIDA, João Batista de, A Proteção Jurídica do Consumidor, Saraiva, 2009, p.95.
27
destinam. O defeito causa, além desse dano do vício, outro ou outros danos ao patrimônio jurídico material ou moral do consumidor. 61
Dessa forma, conclui-se que, o defeito é sempre condicionado a um vício
anterior, sendo que este pode deixar de ser simplesmente um vício e passar a ser
um defeito, que ensejará a responsabilidade pelo fato do produto ou serviço.
Essa distinção é importante também para a aplicação da
responsabilidade dos profissionais liberais. Por isso, Rui Stoco afirma:
Como não se desconhece, tudo que se ligue ao consumo é redigido pelo Código de Defesa do Consumidor. Portanto, a colocação de produtos no mercado ou a prestação de serviços regem-se por esse importante Estatuto. 62
O STJ teve essa posição na seguinte decisão:
Conforme precedentes firmados pelas Turmas que compõem a 2ª Sessão, é de se aplicar o Código de Defesa do Consumidor aos serviços prestados pelos profissionais liberais, com as ressalvas do §4 º do art. 14. O fato de se exigir comprovação da culpa para poder responsabilizar o profissional liberal pelos serviços prestados de forma inadequada, não é motivo suficiente para afastar a regra de prescrição estabelecida no art. 27 da legislação consumerista, que é especial em relação às normas contidas no Código Civil. 63
Por isso, o C.D.C., com a exceção do seu § 4º do art. 14, aplica-se por
completo aos profissionais liberais, pois, trata-se de relação de consumo quando
prestam serviços a seus clientes. 64
3.6 RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR DE SERVIÇO PELO FATO
Rizzatto Nunes (2009) destaca que o fornecedor de serviço é sempre
responsável pelos vícios ou defeitos:
61 NUNES, Rizzatto, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Saraiva, 2009, p.206. 62 STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil, Revista dos Tribunais, p. 486. 63 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Terceira Turma. REsp 931155 / RS Recurso Especial. Relatora: Ministra Nancy Andrighi. Julgado em: 07/08/2007. Publicado em: DJ 20.08.2007. p. 281. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/SCON/>. Acesso em: 28 set. 2009. 64 STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil, Revista dos Tribunais, p. 486.
28
De qualquer maneira, pelo menos quanto à prestação de serviço, não haverá a distinção feita para responsabilização dos agentes em caso de defeito ou vício no produto. Como visto, a reparação dos danos por defeitos do produto cabe aos agentes especificados nos arts. 12 e 13, espécies do gênero fornecedor. E a responsabilidade pelo vício é do fornecedor do produto (arts. 18 e 19). No caso de serviço, é sempre o prestador o responsável, quer em caso de defeito (art. 14), quer em caso de vício (art. 20). 65
Para os casos de defeitos dispõe o caput do art. 14 c/c com § 4º do
C.D.C.:
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre fruição e riscos. § 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.
Dessa forma, também será considerada parte do serviço, por exemplo, a
prótese que o cirurgião utiliza na prestação do serviço, uma vez que se houver
responsabilidade do médico o paciente não terá que arcar com a despesa desse
produto, uma vez que se configura responsabilidade pelo fato do serviço.
3.7 RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR DE SERVIÇO PELO VÍCIO
O art. 20 do C.D.C. dispõe sobre a responsabilidade do fornecedor pelos
vícios de qualidade do serviço:
Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I – a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível; II – a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III – o abatimento proporcional do preço. § 1º A reexecução dos serviços poderá ser confiada a terceiros devidamente capacitados, por conta e risco do fornecedor.
65 NUNES, Rizzatto, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Saraiva, 2009, p.209.
29
§ 2º São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade.
Serviço impróprio é aquele que impede o consumo a que se destina, por
exemplo, o freio mal colocado em um veículo, que o impossibilita de reduzir a
velocidade. Nesse caso, está configurada a responsabilidade do fornecedor pelo
serviço, sendo-lhe vedada a alegação de que o produto, por exemplo a pastilha de
freio, era de péssima qualidade ou de que havia vício no próprio produto, pois a
qualidade deste também é de sua responsabilidade.
Serviço inadequado, segundo Rizzatto Nunes (2009) é aquele serviço
que não impede o seu uso, porém com eficiência reduzida. 66
3.8 DOS PROFISSIONAIS LIBERAIS
Para entender o conceito de profissional liberal é necessário discorrer,
em primeiro lugar, sobre o significado de trabalhador autônomo, pois este é um dos
requisitos básicos para a sua formação, como será analisado nesta secção.
A origem da palavra “autonomia”, segundo explica Sérgio Pinto Martins,
vem do grego auto, que pode ser traduzido por próprio e nome ou nomia, que
significa regra ou norma.67
Para Carlos Sérgio Pinto Martins trabalhador autônomo pode ser definido
da seguinte forma:
[...] temos o trabalhador autônomo que presta serviços por conta própria, não sendo, portanto, subordinado, com ou sem fins lucrativos, mas tem necessidade de exercer atividade econômica remunerada. Se há ou não lucro na sua atividade, tanto faz para a previdência social, bastando apenas que essa pessoa exerça uma atividade econômica remunerada. Logo, a prestação dos serviços não pode ser gratuita, mas onerosa, independendo, porém, se há ou não fim lucrativo, quando normalmente esse fim existe.68
Embora não use mais a expressão “autônomo”, O art. 12 da lei 8212/91
prescreve trabalhadores autônomos da seguinte forma: 66 NUNES, Rizzatto, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Saraiva, 2009, p.298. 67 MARTINS, Sergio Pinto, Direito do Trabalho, Atlas, 2009, p. 149. 68 MARTINS, Sergio Pinto, Direito da Seguridade Social, Atlas, 2004, p. 117-118.
30
Art. 12. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas: V - como contribuinte individual: h) a pessoa física que exerce, por conta própria, atividade econômica de natureza urbana, com fins lucrativos ou não
De acordo com a referida lei ordinária, trabalhador autônomo é o
profissional que tem autonomia econômica, pois presta serviços por sua conta e
risco, independentemente dos fins lucrativos. Difere do empregado, pois este é
sempre subordinado a alguém na prestação de seus serviços, pois é requisito
obrigatório para a sua caracterização.
Conforme o art. 3º da CLT: “Considera-se empregado toda pessoa física
que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência
deste e mediante salário”. Assim, enquanto a característica do trabalhador autônomo
é a não vinculação contratual em uma relação de subordinação o empregado
depende hierarquicamente de um empregador.69
Autônomo, portanto, é o trabalhador que não está subordinado a um
empregador, além de ter autonomia na prestação dos seus serviços e de exercê-los
de forma habitual, assumindo os riscos inerentes às escolhas que executar. Deve
necessariamente exercer atividade econômica de natureza urbana, podendo prestar
serviço em zonas rurais, porém suas atividades continuam de natureza urbana por
definição, como por exemplo, o médico veterinário e o engenheiro agrônomo, são
esses profissionais liberais. 70 Estes profissionais serão mais bem definidos na
próxima secção.
Os profissionais que prestam serviços especializados são chamados
profissionais liberais, que para tanto, devem possuir diploma de curso superior e
habilitação obtida por órgão de fiscalização específico. Além disso, a autonomia
econômica também é uma característica do profissional prestador de serviço, como
visto nesta secção. Exemplos mais comuns são os médicos, dentistas, psicólogos,
arquitetos, engenheiros civis, advogados, veterinários e contadores.71
Nesse sentido, Fábio Ulhoa Coelho disciplina:
69 MANUS, Pedro Paulo Teixeira, Direito do Trabalho, Atlas, 2005, ps. 63, 64 e 69. 70 MARTINS, Sergio Pinto, Direito da Seguridade Social, Atlas, 2004, p. 117-118 71 COELHO, Fábio Ulhoa, Curso de Direito Civil, Saraiva, 2009, p. 316.
31
Profissionais liberais são os prestadores autônomos de serviços especializados que, pela relevância e complexidade destes, devem possuir formação superior e habilitação dada pelo órgão específico de fiscalização. Dois, portanto, são os elementos que identificam o profissional liberal: de um lado, a necessidade de formação superior e sujeição a controle específico, nos termos da lei reguladora da atividade em foco (elemento institucional), e, de outro, a autonomia econômica como prestador de serviços (elemento econômico).72
Assim, profissional liberal não é empregado quando no exercício de suas
funções, pois ao trabalhar por conta própria em atividade artística ou científica,
exerce o ofício por livre opção, podendo até mesmo escolher o cliente
facultativamente, por isso, para que seja considerado liberal, o profissional não deve
estar submetido a nenhum vínculo empregatício, e conseqüentemente, a nenhum
vínculo hierárquico. Dessa forma não são considerados profissionais liberais as
pessoas jurídicas e as empresas, mesmo que exerçam atividades de medicina e
engenharia, como por exemplo os hospitais, casas de saúde, construtoras e
empreiteiras.73
A lei Orgânica da Seguridade Social conceitua empresa no seu art. 15:
Considera-se empresa: I – empresa: a firma individual ou sociedade que assume o risco de atividade econômica urbana ou rural, com fins lucrativos ou não, bem como os órgãos e entidades da administração pública direta, indireta e fundacional.
É importante destacar que, embora exerça profissionalmente atividade
econômica para a produção ou a circulação de bens e serviços o profissional liberal
não pode ser confundido com o empresário, pois assim prescreve o art. 966, caput e
parágrafo único do Código Civil in verbis:
Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.
Empresário é, portanto, que exerce sua atividade com habitualidade,
visando lucro ou outro fim econômico, desempenhando atividade organizada com o
72 COELHO, Fábio Ulhoa, Curso de Direito Civil, Saraiva, 2009, p. 316. 73 NERY JUNIOR, Nelson; et al, Leis Civis Comentadas, Revista dos Tribunais, 2003, p. 196.
32
objetivo de criar riqueza, produzindo ou promovendo a circulação de bens e
realizando serviços. 74
Em conseqüência daquela disposição legal, a conclusão adotada é a de
que o profissional que exerce atividade intelectual, considerando as de natureza
científica, literária ou artística, como por exemplo, os médicos, advogados e
engenheiros, não são considerados empresários, mas profissionais liberais, salvo
apenas se o exercício da profissão constituir elemento de empresa. 75
Há diferença, também, entre empresário e os profissionais liberais quando
se trata de responsabilidade civil, pois estes assumem responsabilidade civil
diferenciada em relação a que assumiria uma empresa. Esta tem responsabilidade
civil objetiva, independente de ser firma individual ou pessoa jurídica, além de não
constar na exceção positivada no Código de Defesa do Consumidor, art. 14, § 4º: “A
responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a
verificação de culpa”.
Dessa forma está excluída a responsabilidade civil objetiva nas relações
entre profissional liberal e consumidor.76
As atividades dos profissionais liberais são serviços negociados previstos
no Código de Defesa do Consumidor, excetuando-se a sua responsabilidade, que é
subjetiva, da qual se aplicam as regras de obrigação de meio, com culpa provada, e
obrigação de resultado, com culpa presumida.77
74 NERY JÚNIOR, Nelson; et al, Código Civil Anotado, Revista dos Tribunais, 2003, p. 512. 75 SILVA, Regina Beatriz Tavares da, Código Civil Comentado, Saraiva, 2008, p. 949. 76 GODOY, Cláudio Luiz Bueno de, et al, 2007, Responsabilidade Civil na Área da Saúde, Saraiva, p. 199. 77 CAVALIERI FILHO, Sérgio, 2004, Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros, p. 518.
33
4 NATUREZA JURÍDICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO
A questão de grande relevância sobre a responsabilidade civil do
médico diz respeito à natureza jurídica do instituto. A dúvida está em averiguar se a
relação entre médico-paciente é contratual ou extracontratual.
A doutrina dominante opina no sentido de que a responsabilidade civil
do médico é contratual em relação à sua natureza jurídica.78
A doutrina entende, ainda, que a exceção feita no art. 14, § 4º do
C.D.C., existe em razão da natureza intuitu personae da obrigação, o que a
descaracteriza como um contrato próprio das relações de consumo. 79 Por isso, Vidal
Serrano Nunes Júnior e Yolanda Alves Pinto Serrano (2008) fazem a seguinte
afirmação:
“Não se pode dizer que um contrato negociado minuciosamente – como tipicamente ocorre entre médicos e pacientes, advogados e clientes etc. – seja exatamente um contrato nos moldes do ideário embasador da lei de proteção ao consumidor. Não se vê, comumente, contratos de adesão neste âmbito.” 80
Em suma, a responsabilidade civil do médico é, em regra, contratual
devido a sua natureza intuitu personae, a qual a diferencia da responsabilidade civil
da regra geral do Código de Defesa do Consumidor, que é objetiva e faz exceção no
art. 14, § 4º do C.D.C., em relação aos profissionais liberais.
4.1 A PREVISÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Para que os profissionais liberais possam atuar em suas áreas devem
possuir os conhecimentos práticos e teóricos necessários, com o objetivo de exercer
de forma cautelosa, perita e eficiente. Agindo assim, esses não prejudicarão seus
78 GIOSTRI, Hildegard Taggesell, 2007, Erro Médico, Juruá, p. 58. 79 NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano; et al, Código de Defesa do Consumidor Interpretado, Saraiva, 2008, p.88. 80 NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano; et al, Código de Defesa do Consumidor Interpretado, Saraiva, 2008, p.88.
34
clientes, além de não mancharem o próprio nome, carreira e inclusive a classe
profissional em que atuam. 81
Para Miguel Kfouri Neto (2007), os médicos são contratados pelos
clientes porque passam uma confiança necessária para que possam atuar em seus
serviços. Por isso, a responsabilidade desses profissionais só ocorre quando houver
culpa subjetiva, quais sejam, a negligência, imprudência ou imperícia. 82
A conclusão de que a responsabilidade civil do médico só ocorre
quando houver culpa está baseada na exceção do art. 14, § 4º do C.D.C., a qual
exclui as pessoas jurídicas.
Entende-se que mesmo que um médico trabalhe para um hospital, este
terá responsabilidade civil objetiva, desde que exista vínculo empregatício entre o
médico e a casa hospitalar. Nesse caso, o hospital é quem deveria provar as
excludentes do dano, especificadas no art. 14, § 3º, in verbis: “Art. 14. O fornecedor
de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o
serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.”. 83
Porém, entendimento diferente foi defendido por Rui Stoco, o qual
afirmou inexistir responsabilidade objetiva de hospital:
“Primeiro, porque o Código de Defesa do Consumidor não se afastou do conceito clássico de responsabilidade por ato ou fato de terceiro, consagrado em nosso Código Civil”,. Segundo, “porque existe diferença fundamental e ontológica entre a responsabilidade objetiva e a responsabilidade presumida”. Terceiro, “porque sendo a responsabilidade do hospital contratual, responderá por ato de seu preposto nos termos do inciso III do art. 932 do Código Civil, que prevê a culpa presumida do empregador ou comitente pelos atos de seus prepostos. Em quarto lugar, “porque o serviço prestado pelo hospital, quando contratado para ministrar tratamento, cirurgia ou acompanhamento médico ou ambulatorial, tais praticas são subministradas por médicos, de modo que o que se opõe em exame é o próprio trabalho médico, como atividade especializada e restrita aqueles previamente credenciados pelo Conselho Regional de Medicina. (...) Por fim, cabe obtemperar que a total ausência de sentido lógico-jurídico se, em uma atividade de natureza contratual em que se assegura apenas meios adequados, ficar comprovado que o médico não atuou com culpa e, ainda assim, responsabilizar o hospital por dano sofrido pelo paciente, tão-somente em razão de sua responsabilidade objetiva e apenas em razão do vinculo empregatício entre um e outro. Percebe-se, porque importante, que o caput do art. 14 do CDC condicionou a responsabilização do fornecedor de serviços à existência de ‘defeitos relativos à prestação dos serviços’ (faute du service). Tal expressão, embora mal posta no preceito, induz culpa, máxime quando se trate de atividade médica, cuja contratação assegura meios e não resultados, de modo que o resultado não querido não
81 GIOSTRI, Hildegard Taggesell, 2007, Erro Médico, Juruá, p. 33. 82 KFOURI NETO, Miguel, 2007, Responsabilidade Civil do Médico, Revista dos Tribunais, p. 199. 83 KFOURI NETO, Miguel, 2007, Responsabilidade Civil do Médico, Revista dos Tribunais, p. 199.
35
pode ser rotulado de ‘defeito’. Este só se configura quando a lesão ao paciente resultar de procedimento totalmente desviado dos padrões e, portanto, com culpa evidente de seu causador”. 84
O STJ também entende que há a responsabilidade subjetiva dos
hospitais, porém somente quando se referir à atuação técnico-profissional dos
médicos ou quando estes forem ligados por convênio ao hospital. Desta forma, a
responsabilidade objetiva só se aplicaria aos hospitais para os serviços do
estabelecimento empresarial, enquanto o paciente não for medicado, ou seja, o
hospital só se responsabiliza objetivamente, quando da estada do paciente, pelos
danos causados pelas instalações ou serviços de enfermagem e exames. Segue a
ementa:
CIVIL. INDENIZACAO. MORTE. CULPA. MEDICOS. AFASTAMENTO. CONDENACAO. HOSPITAL. RESPONSABILIDADE. OBJETIVA. IMPOSSIBILIDADE. 1 – A responsabilidade dos hospitais, no que tange à atuação técnico-profissional dos médicos que neles atuam ou a eles sejam ligados por convênio, é subjetiva, ou seja, dependente da comprovação de culpa dos prepostos, presumindo-se a dos preponentes. Nesse sentido são as normas dos arts, 159, 1.521, III, e 1.545 do Código Civil de 1916 e, atualmente, as dos arts. 186 e 951 do novo Código Civil, bem como a Sumula 341 – STF (É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto). 2 – Em razão disso, não se pode dar guarida à tese do acórdão de, arrimado nas provas colhidas, excluir, de modo expresso, a culpa dos médicos e, ao mesmo tempo, admitir a responsabilidade objetiva do hospital, para condená-lo a pagar indenização por morte do paciente. 3 – O art. 14 do CDC, conforme melhor doutrina, não conflita com essa conclusão, dado que a responsabilidade objetiva, nele prevista para o prestador de serviços, no presente caso, o hospital, circunscreve-se apenas aos serviços única e exclusivamente relacionados com o estabelecimento empresarial propriamente dito, ou seja, aqueles que digam respeito à estadia do paciente (internação), instalações, equipamentos, serviços auxiliares (enfermagem, exames, radiologia), etc. e não aos serviços técnico-profissionais dos médicos que ali atuam, permanecendo estes na relação subjetiva de preposição (culpa). 4 – Recurso especial conhecido e provido para julgar improcedente o pedido. 85
84 STOCO, Rui. Responsabilidade Civil dos profissionais liberais e dos prestadores de serviços. Tribuna da Magistratura, Cadernos de Doutrina, p. 65, set. 1996 apud, Miguel Kfouri Neto. Responsabilidade Civil do Médico. Revista dos Tribunais, p. 200. 85 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Quarta Turma. REsp 258389 / RS Recurso Especial. Relator: Ministro Fernando Gonçalves. Julgado em: 16/06/2005. Publicado em: DJ 22.08.2005. p. 275. Disponível em: < http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=@docn='000241304' >. Acesso em: 11 nov. 2009.
36
A jurisprudência entende que a responsabilidade civil do hospital deve
ser subjetiva. Em decisão recente o Tribunal de Justiça de São Paulo defende a
responsabilidade civil subjetiva, com fundamento de que é o próprio trabalho do
médico que se coloca em questão:
Responsabilidade Civil. Hospital. Ajuizamento com base no Código de Defesa do Consumidor. Responsabilidade Objetiva. Inadmissibilidade. Hipótese de exercício de profissão liberal, na medida em que o réu agiu com culpa ou dolo. Art. 14, § 3.º, do referido Código. Recurso não provido. Em ação de indenização contra hospital, ajuizada com base no Código de Defesa do Consumidor, embora se trate de pessoa jurídica, a ela não se aplica a responsabilização objetiva, na medida em que o que se opõe em exame e o próprio trabalho médico. Aplicável, pois, o § 4.º do art. 14 do referido Código. 86
O hospital só se responsabilizaria subjetivamente por serviço de
enfermagem se a obrigação for de meio, ou seja, se necessária for a aplicação de
injeção na veia do paciente, porque, nesse caso, a chance de sobrevida deste
depende das suas próprias condições venosas e não só do bom desempenho do
profissional de enfermagem. Diferentemente, a responsabilidade será objetiva se a
obrigação for de resultado, ou seja, quando, por exemplo, o paciente necessitar de
medicamento via oral, uma vez que, nessa hipótese, o serviço dependeria apenas do
bom êxito do enfermeiro ou auxiliar de enfermagem.87
4.2 OBRIGAÇÃO MÉDICA
A conduta exigida dos médicos para desempenho de seu ofício é
rígida, pois esses exercem profissões que atuam em bens valiosos como a vida, a
saúde e a integridade psicofísica. Entretanto, mesmo que seja exigida uma conduta
rigorosa, ele não está imune a qualquer aferição de culpa, nem de outro modo, será
considerado inimputável. 88
86 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Terceira Turma. 179.184-1 / Agravo de Instrumento. Agravante: Ignaz Thallinger. Agravado: Policlínica santa Amália. Disponível em: < http://br.monografias.com/trabalhos910/acusacoes-de-dano/acusacoes-de-dano2.shtml >. Acesso em: 11 nov. 2009. 87 SILVA, Regina Beatriz Tavares da, et al, 2007, Responsabilidade Civil na Área da Saúde, Saraiva, p. 21. 88 GIOSTRI, Hildegard Taggesell, 2007, Erro Médico, Juruá, p. 33.
37
O art. 6º do Código de Ética Médica dispõe do seguinte modo:
Art. 6° - O médico deve guardar absoluto respeito pela vida humana, atuando sempre em benefício do paciente. Jamais utilizará seus conhecimentos para gerar sofrimento físico ou moral, para o extermínio do ser humano, ou para permitir e acobertar tentativa contra sua dignidade e integridade.
Nesse aspecto o STJ se firmou no seguinte posicionamento:
PROFISSIONAL LIBERAL – Médico – Responsabilidade Civil – Consentimento informado – A despreocupação do facultativo (médico) em obter do paciente seu consentimento informado pode significar – nos casos mais graves – negligência no exercício profissional. As exigências do princípio do consentimento informado devem ser atendidas com maior zelo na medida em que aumenta o risco, ou o dano, Recurso conhecido. 89
José da Aguiar Dias (2006) afirma que há cinco deveres que os
médicos devem cumprir:
Decompondo as obrigações implícitas no contrato médico, verificamos que ele impõe aos médicos estes deveres: 1) conselhos; 2) cuidados; 3) obtenção do consentimento; 4) abstenção de abuso ou desvio de poder; 5) dever de sigilo. 90
Portanto, essas exigências do exercício profissional existem porque
não ocorra dano ao paciente no desempenho de suas funções, pois, todo dano
enseja uma responsabilidade civil, seja ela objetiva ou subjetiva.
Ao se analisar a responsabilidade civil do médico é importante tomar
uma determinada precaução, qual seja, a de se verificar se a causa efetiva do dano
foi em razão do ato profissional, ou se decorreu de uma evolução patológica. Com
essa verificação pode-se prevenir qualquer equívoco entre o erro médico e ou
alguma evolução natural do estado mórbido do paciente. 91
89 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Quarta Turma. REsp 436827 / RS Recurso Especial. Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar. Julgado em: 01/10/2002. Publicado em: DJ 10.03.2003. p. 207. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=&livre=cirurgia&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=131>. Acesso em: 11 nov. 2009. 90 DIAS, José de Aguiar, 2006, Da Responsabilidade Civil, Renovar, p. 337. 91 GIOSTRI, Hildegard Taggesell, 2007, Erro Médico, Juruá, p. 34.
38
Para a ocorrência da responsabilidade civil médica são necessários
cinco requisitos a seguir mencionados por Hildergard Taggesell Giostri (2007):
“o agente (que é o médico); o ato profissional (ocorrido no exercício da profissão); a culpa (imperícia, imprudência ou negligência); o dano (que pode abranger desde o agravamento da doença, uma lesão, até a morte) e, por último, a relação de causa e efeito entre o ato e o dano (ação ou omissão do médico que gerou o dano). 92
Os riscos continuam a existir mesmo com todos esses cuidados
tomados pelo médico ao realizar uma cirurgia, não podendo responder pelos riscos
próprios da operação por seria um ônus absurdo para o profissional e tornaria a
atividade inviável. Por isso existe o dever médico de informar o paciente. 93
Miguel Kfouri Neto (2001) afirma o quão rigoroso é esse dever do
médico de informar, devendo, inclusive, verificar se o paciente diz a verdade:
Repita-se, uma vez mais, que as obrigações do cirurgião, nessa especialidade, são agravadas. Deve ele, em primeiro lugar, apreciar a veracidade das informações prestadas pelo paciente; depois, sopesar os riscos a enfrentar e resultados; a seguir, verificar a oportunidade da cirurgia. Convencido da necessidade da intervenção, incumbe-lhe expor ao paciente as vantagens e desvantagens, a fim de obter seu consentimento. Na cirurgia plástica estética a obrigação de informar é extremamente rigorosa. Mesmo os acidentes mais raros, as seqüelas mais infreqüentes, devem ser relatados, pois não há urgência, nem necessidade de se intervir. 94
Há, também, a responsabilidade pessoal do médico, quando este
chefiar equipe médica, conforme explica Rui Stoco (2007):
É certo que em determinadas circunstâncias a responsabilidade recairá sobre o chefe da equipe, não tanto por essa razão (ser “chefe”), mas nos casos em que os demais médicos sejam, ad exemplum, contratados dele. Mas aí responde por presunção que se faz da responsabilidade do “patrão” por ato de seu preposto, que independe da apuração de culpa, posto que objetiva nos termos do art. 932, III, c.c. o art. 933 do CC. 95
92 GIOSTRI, Hildegard Taggesell, 2007, Erro Médico, Juruá, p. 43. 93 CAVALIERI FILHO, Sérgio, 2004, Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros, p. 399-400. 94 KFOURI NETO, Miguel, 2004, Responsabilidade Civil do Médico, Revista dos Tribunais, p. 173. 95 STOCO, Rui, 2007, Tratado de Responsabilidade Civil, Revista dos Tribunais, p. 577.
39
O código Civil coloca essas hipóteses citadas desta forma:
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: [...] III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele. [...] Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.
Portanto, os médicos devem escolher profissionais que se
comprometam em desempenhar um bom serviço, caso contrário, responderá pelos
danos por esses causados, ou seja, haverá uma responsabilidade pelo fato de
outrem, sendo possível, posteriormente, direito de ação de regresso o causador do
dano. 96
Sobre esse assunto, o STJ decidiu da seguinte maneira:
Dependendo das circunstâncias de cada caso concreto, o médico-chefe pode vir a responder por fato danoso causado ao paciente pelo terceiro que esteja diretamente sob suas ordens. Hipótese em que o cirurgião-chefe não somente escolheu o auxiliar, a quem se imputa o ato de acionar o pedal do bisturi, como ainda deixou de vigiar o procedimento cabível em relação àquele equipamento. Para o reconhecimento do vínculo de preposição, não é preciso que exista um contrato típico de trabalho; é suficiente a relação de dependência ou que alguém preste serviços sob o comando de outrem. 97
A súmula 341 do STF, dispõe em complementação que “é presumida a
culpa do patrão, amo ou comitente pelo ato culposo de empregado ou preposto”.
Diferentemente ocorre no caso do anestesiologista, pois se entende
que, se o paciente vier a sofrer danos por causa da anestesia, àquele é quem deve
responder, porém se o dano advier da cirurgia mal sucedida quem responde é o
cirurgião. 98
A explicação para essa diferença de tratamento é explicada por
Hildegard Taggesell Giostri (2007): 96 GIOSTRI, Hildegard Taggesell, 2007, Erro Médico, Juruá, p. 119. 97 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Quarta Turma. REsp 200.831 / RS Recurso Especial. Relator: Ministro Barros Monteiro. Julgado em: 08/05/2001. Publicado em: DJ 26.08.2002. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/IMG?seq=1487&nreg=199900029801&dt=20020826>. Acesso em: 11. nov. 2009. 98 STOCO, Rui, 2007, Tratado de Responsabilidade Civil, Revista dos Tribunais, p. 578.
40
Modernamente, com a evolução da especialidade desse último (não mais anestesista, mas anestesiologista), tem-se, como consequencia, uma necessária dissociação de responsabilidades entre a sua e a do médico-cirurgião. No passado, era ele considerado como auxiliar do operador, trabalhando sob as suas ordens e sendo tal tarefa muitas vezes desempenhada, até mesmo por enfermeiras. Todavia, com o avanço científico-tecnológico, o ato anestésico tornou-se extremamente complexo. As drogas utilizadas, bem como toda a aparelhagem necessária para sua realização, passaram a demandar do profissional um alto conhecimento, tanto técnico quanto científico, o que veio mudar drasticamente a situação anterior. E, uma das conclusões que se pode tirar, a priori, de tais mudanças é que, atualmente, o anestesiologista ocupa posição de destaque no ato cirúrgico, em pé de igualdade com o cirurgião. 99
Em suma, o anestesiologista é tão responsável quanto o cirurgião
dentro de suas respectivas competências, ou seja, àquele em relação à
anestesiologia e esse em relação à cirurgia.
4.2.1 O Dano Moral
A palavra dano tem origem na palavra demere, que traduzindo significa
tirar ou diminuir. Por isso, dano traz a idéia de perda ou diminuição do patrimônio,
que pode ser total ou parcial. Entretanto, para a doutrina dominante, o dano pode ser
considerado a diminuição ou perda não só relativo ao patrimônio (dano material),
mas também a lesão aos direitos extrapatrimoniais (dano moral), por ser este
considerado um bem jurídico. 100
O dano material está definido no Código Civil: “Art. 402 Salvo as
exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor
abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de
lucrar.”. Abrangendo os danos emergentes (o que ele efetivamente perdeu) e os
lucros cessantes (o que razoavelmente deixou de lucrar).
99 GIOSTRI, Hildegard Taggesell, 2007, Erro Médico, Juruá, p. 47. 100 LOPEZ, Teresa Ancona, 2004, O Dano Estético, Revista dos Tribunais, p. 23.
41
Por outro lado, em relação aos danos morais, os requisitos para a sua
caracterização, segundo obra de coordenação da Regina Beatriz Tavares da Silva
(2007), são os seguintes:
“- dor moral; - dor física; - constrangimento; - vergonha; - humilhação Realmente, quem tem tais sentimentos ou sensações sabe que está sofrendo um dano moral. Esses sentimentos ou sensações, via de regra, são utilizados pelos operadores do direito na definição de dano moral.” 101
Os danos morais, portanto, são todos aqueles que lesam a vítima no
sentido humano do seu ser, pode ser a integridade física, a honra, a liberdade
individual, a saúde, a paz, a boa fama. 102
Antes da Constituição da República de 1988 houve muita dificuldade,
no âmbito jurídico, em determinar o valor a ser indenizado pelo dano moral, o que
gerou muita divergência doutrinaria. Uma parcela da doutrina argumentava que por
ser o dano puramente moral não poderiam se estabelecer um valor patrimonial; outra
parcela via como imoral a determinação um valor para essa espécie de dano. 103
O dano moral vem definido no art. 5º, V e X da Constituição Federal de
1988:
Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantido-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
E no art. 186 do Código Civil: “Aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda
que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” 101 SILVA, Regina Beatriz Tavares da, et al, 2007, Responsabilidade Civil na Área da Saúde, Saraiva, p. 60. 102 SCHAEFER, Fernanda, Responsabilidade Civil do Médico & Erro de Diagnóstico, Juruá, 2006, p. 33. 103 SCHAEFER, Fernanda, Responsabilidade Civil do Médico & Erro de Diagnóstico, Juruá, 2006, p. 33.
42
Determina-se o dano moral por intermédio de critérios objetivos para
que haja segurança nas relações jurídicas em relação a esse tipo de dano,
verificando-se se os direitos atingidos são os da personalidade, ou seja, a honra e
integridade física; e se teve como efeito uma lesão no que tange os aspectos
extrínsecos e intrínsecos da vítima. 104
Nas relações de consumo, no caso de erro médico, o que pode agravar
o dano moral é o descaso médico. Entretanto, o ofendido deve demonstrar, no
processo, a culpa do médico, que poderá ser maior ou menor de acordo com as
conseqüências resultantes do descaso, se for o caso.
4.2.2 O Dano Estético
A palavra estética origina-se da palavra grega “aisthesis”, que significa
sensação. 105 A estética estuda, portanto, a beleza e suas manifestações na
natureza e na arte. Entretanto, no dano estético não está inserido somente o que
atinge a beleza, sendo que não depende da beleza pessoal. 106
Por isso, o dano estético pressupõe uma lesão à aparência física
externa da pessoa em relação ao seu estado antes da modificação sofrida. 107
Em 1914, com a eclosão da 1º guerra mundial, a cirurgia plástica
passou a fazer parte do ramo da cirurgia geral como especialidade. Anos mais tarde,
em 1930, surgiu na França a Sociedade de Cirurgia Reparadora, Plástica e Estética.
108
A aplicação desse ramo da ciência não tem sido enfrentada com
complacência nos julgamentos, e com naturalidade, uma vez que a cirurgia estética
é exercida com a finalidade de atender vaidades fúteis, ou utilizada como seqüência
de atos que visam o rejuvenescimento. 109
104 SILVA, Regina Beatriz Tavares da, et al, 2007, Responsabilidade Civil na Área da Saúde, Saraiva, p. 61. 105 LOPEZ, Teresa Ancona, 2004, O Dano Estético, Revista dos Tribunais, p. 45. 106 SILVA, Regina Beatriz Tavares da, et al, 2007, Responsabilidade Civil na Área da Saúde, Saraiva, p. 62. 107 LOPEZ, Teresa Ancona, 2004, O Dano Estético, Revista dos Tribunais, p. 45. 108 STOCO, Rui, 2007, Tratado de Responsabilidade Civil, Revista dos Tribunais, p. 570. 109 DIAS, José de Aguiar, 2006, Da Responsabilidade Civil, Renovar, p. 373.
43
Muitas clínicas, por exemplo, mostram apenas os benefícios do
resultado obtido em outras cirurgias, como explica Rui Stoco (2007):
A publicidade em torno dessa atividade médica e até mesmo a propaganda ostensiva de algumas clínicas – contrariando a orientação dos Conselhos Regionais de Medicina e os arts. 132, 133 e 136 do Código de Ética Médica (Res. CFM 1.246/88)- é massiva, oferendo as mais diversas intercenções e mostrando exemplos de resultados obtidos, o que demonstra que, atualmente, o que se oferece é mesmo um resultado, como também ocorre com tratamentos odontológicos de natureza meramente embelezadora. 110
Na ocorrência do dano moral, este entendido como dano irreversível,
considera-se a parte final do art. 949 do Código Civil:
Art. 949. No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido.
Sobre a cumulação de danos a Coordenadoria de editora e Imprensa
do STJ argumenta sobre a súmula 387 do STJ:
“É possível a acumulação das indenizações de dano estético e moral.” Esse é o teor da Súmula 387, aprovada pela Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo o entendimento firmado, cabe a acumulação de ambos os danos quando, ainda que decorrentes do mesmo fato, é possível a identificação separada de cada um deles. Em um dos recursos que serviu de base para a edição da Súmula 387, o STJ avaliou um pedido de indenização decorrente de acidente de carro em transporte coletivo. Um passageiro perdeu uma das orelhas na colisão e, em consequência das lesões sofridas, ficou afastado das atividades profissionais. Segundo o STJ, presente no caso o dano moral e estético, deve o passageiro ser indenizado de forma ampla. Em outro recurso, um empregado sofreu acidente de trabalho e perdeu o antebraço numa máquina de dobra de tecidos. A defesa da empresa condenada a pagar a indenização alegou que o dano estético era uma subcategoria de dano moral, por isso, eram inacumuláveis. “O dano estético subsume-se no dano moral, pelo que não cabe dupla indenização”, alegava. O STJ, no entanto, já seguia o entendimento de que é permitido cumular valores autônomos, um fixado a título de dano moral e outro a título de dano estético, derivados do mesmo fato, quando forem passíveis de apuração separada, com causas inconfundíveis. O relator da nova súmula é o ministro Fernando Gonçalves. 111
110 STOCO, Rui, 2007, Tratado de Responsabilidade Civil, Revista dos Tribunais, p. 573. 111 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Coordenadoria de Editoria e Imprensa. Acesso em 22 de outubro de 2009: http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=93425
44
De fato o STJ tem decidido nesse sentido. Segue uma decisão sobre o
assunto:
Responsabilidade civil. Médico. Cirurgia Estética. Lipoaspiração. Dano extrapatrimonial. Dano moral. Dano estético. Dote – “Para a indenização do dano extrapatrimonial que resulta do insucesso de lipoaspiração, é possível cumular as parcelas indenizatórias correspondentes ao dano moral em sentido estrito e ao dano estético. 112
O dano proveniente da cirurgia estética pode ter origem contratual ou
delitual. Quando de origem contratual, pode-se destacar exemplos de lesões
oriundas de cirurgia médica e seus tratamentos. Entretanto, para boa parte da
doutrina, não há diferença entre culpa contratual e extracontratual, pois seguem a
teoria de culpa una, ou seja, apenas atribuem diferenças secundárias ou acessórias
para ambas as responsabilidades. 113
4.2.3 Obrigação de Meio na Atividade Médica
A Ministra do STJ Fátima Nancy Andrighi afirma a importância da
distinção em obrigação de meio e de resultado na responsabilidade civil do médico
cirurgião plástico:
No campo da responsabilidade contratual, por outro lado, deve-se distinguir os contratos que regulam uma obrigação de meio, e os que regulam uma obrigação de resultado. Essa distinção é fundamental e, por esse motivo, não pode permanecer sendo conhecida apenas pelo profissional do direito. Tendo em vista que, em última análise, o cidadão comum é a razão de ser e o destinatário de todas as normas jurídicas. É muito importante que os institutos sejam expostos de modo que sejam também compreendidos por toda a comunidade. 114
112 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Quarta Turma. REsp 457.312 / RS Recurso Especial. Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar. Julgado em: 19/11/2009. Publicado em: DJ 16.12.2002. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=384388&sReg=200200961325&sData=20021216&formato=PDF>. Acesso em: 11 nov. 2009. 113 LOPEZ, Teresa Ancona, 2004, O Dano Estético, Revista dos Tribunais, p. 66. 114 ANDRIGHI, Fátima Nancy, Responsabilidade Civil na Cirurgia Plástica. Disponível em: http://bdjur.stj.gov.br/xmlui/bitstream/handle/2011/2278/Responsabilidade_Civil_Cirurgia.pdf?sequence=4
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Atualmente, na responsabilidade civil no caso dos médicos não se pode
presumir a culpa. Isso quer dizer que o cliente é quem deve provar o
descumprimento do contrato por parte do profissional.115
Regina Beatriz Tavares da Silva relaciona a obrigação dos profissionais
da saúde da seguinte forma:
As pessoas que atuam profissionalmente na área da saúde assumem obrigações, via de regra, de meio, já que o resultado depende não só do profissional contratado mas também das condições orgânicas do paciente. Desse modo, a responsabilidade é subjetiva, porque, se a obrigação é de meio e não de resultado, deve a vítima ou lesado provar que o profissional não se utilizou de todos os meios a seu alcance para obter o direito à indenização. É preciso provar a culpa, ou seja, a atitude negligente, imprudente ou imperita do lesante, na utilização dos meios adequados para a cura ou tratamento do paciente. 116
Em razão disso, o médico, na obrigação profissional que ocupa, não
tem o dever de curar o doente ou salvá-lo, por isso, segundo Sérgio Cavalieri Filho:
“[...] A obrigação assumida pelo médico é de meio, e não de resultado, de sorte que,
se o tratamento realizado não produziu o efeito esperado, não se pode falar, só por
isso, em inadimplemento contratual”.117 Assim sendo, a responsabilidade civil por
erro médico é subjetiva.
A jurisprudência também vem se firmando no sentido de ser necessária a
demonstração de culpa do profissional da medicina:
Médico – Reparação de danos na eventualidade da atuação do profissional da medicina não levar ao resultado objetivado, gerando, ao revés, prejuízo – Verba devida somente se demonstrada convincentemente sua culpa, seja na modalidade de imprudência, negligência ou imperícia. 118
A jurisprudência do STJ é a seguinte:
PROFISSIONAL LIBERAL – Médico – Cirurgia – Seqüelas – Reparação de danos – Indenizações – Culpa – Presunção – Impossibilidade. 1. Segundo doutrina dominante, a relação entre médico e paciente é contratual e encerra, de modo geral (salvo cirurgias plásticas embelezadoras), obrigação de meio e não de resultado. 2. Em razão disso, no caso de danos e seqüelas porventura decorrentes da ação do médico, imprescindível se
115 DIAS, José de Aguiar, Da Responsabilidade Civil, Renovar, 2006, p. 329. 116 SILVA, Regina Beatriz Tavares da, Código Civil Comentado, Saraiva, 2008, p. 928. 117 CAVALIERI FILHO, Sérgio, 2004, Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros, p. 371. 118 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. RT 782:253. Relator: Dês. Elliot Akel. Julgado em: 25/07/2000. Disponível em: <http://siaiweb06.univali.br/seer/index.php/nej/article/viewFile/349/293>. Acesso em: 11 nov. 2000.
46
apresenta a demonstração de culpa do profissional, sendo descabido presumi-la à guisa de responsabilidade objetiva. 3. Inteligência dos arts. 159 e 1.545 do Código Civil de 1916 e do art. 14, § 4º, do Código de Defesa do Consumidor. 4. Recurso especial conhecido e provido para restabelecer a sentença. 119
Em outro julgamento o STJ decidiu:
MÉDICO – Responsabilidade civil – Indenização – Contrato entre profissional e paciente não cumprido – Inexecução da obrigação pelo abandono do paciente sem assistência, não esgotando os cuidados terapêuticos exigíveis, culminando com a extração definitiva do rim do doente – Ocorrência da danos materiais, consubstanciado pela incapacidade temporária deste. Responsabilidade civil do médico. Culpa a justificar a reparação do dano. O contrato entre o profissional e o paciente, de locação de serviços, não foi cumprido. Se os recursos empregados não foram satisfatórios, o contrato foi descumprido. Havendo erro ou negligência, incide a responsabilidade aquiliana. Embora o Código Civil coloque a responsabilidade do médico como se apenas estivesse em foco a responsabilidade extracontratual, a contratual subsiste. A obrigação médica não é de resultado: não assume o médico o dever de curar o paciente, de aplacar todos os seus males e de transformar-se em guardião absoluto da sua vida. É intuitivo que a obrigação é de meio, mas nem por isso está o médico desobrigado de esgotar os cuidados terapêuticos disponíveis ao seu alcance. Da extração de um cálculo renal, nos dias subseqüentes, o médico omitiu-se e ignorou os sintomas de anemia, hematoma, fortes dores e dificuldade de locomoção, até chegar a radiografia computadorizada, por outro médico, e nova cirurgia com outra equipe médica, trazendo, como conseqüência, a extirpação do rmi do paciente. A conduta ética do médico resultou em punição imposta pelo Conselho Regional de Medicina, e a vítima da negligência deve ser indenizada. 120
Contudo, para os médicos profissionais liberais, não há, em regra,
obrigação de se obter o resultado desejado pelo paciente, qual seja a cura. Portanto,
nessa modalidade de obrigação o paciente é quem deve provar que o médico não
agiu com a devida diligência, contudo, existe culpa presumida do médico, quando a
obrigação for de resultado121 como será mais bem explicado na próxima secção.
119 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Quarta Turma. REsp 196306 / RS Recurso Especial. Relator: Ministro Fernando Gonçalves. Julgado em: 03/08/2004. Publicado em: DJ 16.08.2004. p. 261. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=RJADCOAS.font.+ou+RJADCOAS.suce.&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=31>. Acesso em: 11 nov. 2009. 120 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Primeira Câmara Cível. Ap 2.563. Relator: Ministro Pedro Américo Rios Gonçalves. Julgado em: 27/09/1994. Disponível em: <http://brs.aasp.org.br/netacgi/nph-brs.exe?d=AASP&f=G&l=20&p=33&r=660&s1=c%EDvel&s2=&u=/netahtml/aasp/aasp1.asp>. Acesso em: 11 nov. 2009. 121 KFOURI NETO, Miguel, Responsabilidade Civil do Médico, Revista dos tribunais, 2007, p. 178.
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4.2.4 Obrigação de Resultado na Atividade Médica
Em obra da Regina Beatriz Tavares da Silva (2007) afirmou-se: “Na
área da saúde estamos sempre às voltas com o estudo das obrigações de meio e de
resultado. 122
As cirurgias plásticas ou estéticas passaram, desde 1999, após uma
decisão do STJ, a serem tratadas pela comunidade jurídica, como obrigações de
resultado. 123
Na época, a decisão proferida foi a seguinte:
CIVIL E PROCESSUAL. CIRURGIA ESTÉTICA OU PLÁSTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO (RESPONSABILIDADE CONTRATUAL OU OBJETIVA). INDENIZAÇÃO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. I – Contratada a realização da cirurgia estética embelezadora, o cirurgião assume obrigação de resultado (responsabilidade contratual ou objetiva), devendo indenizar pelo não cumprimento da mesma, em decorrência de eventual deformidade ou irregularidade. II – Cabível a inversão do ônus da prova. III – Recurso conhecido e provido.124
Segundo Rui Stoco (2007) a obrigação do médico pode ser de meio ou
de resultado, dependendo do caso:
A obrigação do médico pode ser de meios, como geralmente é, mas também pode ser de resultado, como quando faz um raio X, um check-up, aplica ondas de calor, dá uma injeção, faz transfusão de sangue, procede a determinada esterilização necessária ou, como já nos referimos, no caso da cirurgia plástica estética. Também há possibilidade da obrigação do médico ser de resultado quando assume expressamente a garantia da cura. 125
122 SILVA, Regina Beatriz Tavares da, et al, 2007, Responsabilidade Civil na Área da Saúde, Saraiva, p. 147. 123 Revista jurídica consulex, ano XIII, nº 299 de 30 de junho de 2009, p. 35 124 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Terceira Turma. REsp 81101 / RS Recurso Especial. Relator: Ministro Waldemar Zveiter. Julgado em: 13/04/1999. Publicado em: DJ 31.05.1999. p. 140. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=+10536&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=18>. Acesso em: 11 nov. 2009. 125 STOCO, Rui, 2007, Tratado de Responsabilidade Civil, Revista dos Tribunais, p. 556.
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O STJ na mais recente decisão não afastou a obrigação de resultado nas
cirurgias estéticas:
“CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. NULIDADE DOS ACÓRDÃOS PROFERIDOS EM SEDE DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NÃO CONFIGURADA. CIRURGIA PLÁSTICA ESTÉTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. DANO COMPROVADO. PRESUNÇÃO DE CULPA DO MÉDICO NÃO AFASTADA. PRECEDENTES. 1. Não há falar em nulidade de acórdão exarado em sede de embargos de declaração que, nos estreitos limites em que proposta a controvérsia, assevera inexistente omissão do aresto embargado, acerca da especificação da modalidade culposa imputada ao demandado, porquanto assentado na tese de que presumida a culpa do cirurgião plástico em decorrência do insucesso de cirurgia plástica meramente estética. 2. A obrigação assumida pelo médico, normalmente, é obrigação de meios, posto que objeto do contrato estabelecido com o paciente não é a cura assegurada, mas sim o compromisso do profissional no sentido de um prestação de cuidados precisos e em consonância com a ciência médica na busca pela cura. 3. Apesar de abalizada doutrina em sentido contrário, este Superior Tribunal de Justiça tem entendido que a situação é distinta, todavia, quando o médico se compromete com o paciente a alcançar um determinado resultado, o que ocorre no caso da cirurgia plástica meramente estética. Nesta hipótese, segundo o entendimento nesta Corte Superior, o que se tem é uma obrigação de resultados e não de meios. 4. No caso das obrigações de meio, à vítima incumbe, mais do que demonstrar o dano, provar que este decorreu de culpa por parte do médico. Já nas obrigações de resultado, como a que serviu de origem à controvérsia, basta que a vítima demonstre, como fez, o dano (que o médico não alcançou o resultado prometido e contratado) para que a culpa se presuma, havendo, destarte, a inversão do ônus da prova. 5. Não se priva, assim, o médico da possibilidade de demonstrar, pelos meios de prova admissíveis, que o evento danoso tenha decorrido, por exemplo, de motivo de força maior, caso fortuito ou mesmo de culpa exclusiva da "vítima" (paciente). 6. Recurso especial a que se nega provimento.” 126
É importante considerar que o médico cirurgião plástico precisa obter o
resultado desejado pelo paciente, e deve saber qual é o resultado estético que se
espera antes de começar a cirurgia. Há, inclusive, tecnologia computadorizada que
simula a nova imagem, por meio de montagem mostrada no monitor, podendo o
cliente decidir a que mais lhe agrada. 127
126 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 236.708 / SP Recurso Especial. Relator: Ministro Carlos Fernando Mathias . Julgado em: 10/02/2009. Publicado em: DJ 18.05.2009. p. 281. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/SCON/>. Acesso em: 27 out. 2009. 127 STOCO, Rui, 2007, Tratado de Responsabilidade Civil, Revista dos Tribunais, p. 556.
49
4.2.5 Responsabilidade do Cirurgião Plástico na Cirurgia Estética e na Reparadora
Antes de entrar no mérito sobre a responsabilidade do médico cirurgião
plástico, importante se faz a distinção em relação à cirurgia corretiva e a estética.
Diferentemente da cirurgia meramente estética o objetivo da cirurgia
corretiva, como o próprio nome diz, está em corrigir/reparar alguma anomalia
morfológica estrutural traumática ou congênita, sendo aconselhável, em certos
casos, a cirurgia plástica corretiva em vista de o paciente ter nascido com algum
defeito físico, ou após acidentes de automóveis, por exemplo. Sendo que, a
obrigação médica nesse caso é de meio, porque não se pode exigir que o
profissioonal da saúde elimine totalmente a deformidade. 128
Em trabalho da Regina Beatriz Tavares da Silva (2007) afirmou-se:
Entende-se por cirurgia plástica reparadora o procedimento necessário à preservação da integridade física ou da vida do paciente. Sua finalidade é terapêutica. Dá-se como exemplo a correção de queimaduras deformantes. A cirurgia plástica estética não é procedimento necessário. Sua finalidade é embelezadora. Como exemplo, a correção de rugas advindas da idade. Na cirurgia reparadora, por ser terapêutica e necessária, suas obrigações são de meio. 129
No caso de cirurgias estéticas para que esteja caracterizada a
responsabilidade médica é necessária apenas a culpa certa, ou seja, não é preciso o
erro ser grave ou grosseiro. 130
Teresa Ancona Lopez (2004) afirma que há certas circunstâncias que
ensejam a responsabilidade médica no dano estético:
“1.º) Se houve infração contratual, isto é, descumprimento dos deveres contratuais. Aqui se leva em conta se a obrigação é de meio ou de resultado. Nesse sentido, foi considerada obrigação de resultado anestesia peridural-raquiana que resultou em lesão cerebral, levando o anestesista à condenação por imperícia e negligência e obrigando-o a indenizar o paciente e a família dele por danos materiais físicos e dano moral permanente.
128 CAVALIERI FILHO, Sérgio, 2004, Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros, p. 402. 129 SILVA, Regina Beatriz Tavares da et al, 2007, Responsabilidade Civil na Área da Saúde, Saraiva, p. 147. 130 LOPEZ, Teresa Ancona, 2004, O Dano Estético, Revista dos Tribunais, p. 113.
50
2.º) Se houve infração a dever extracontratual, ou seja, lesão a direitos subjetivos absolutos, como saúde, integridade física, vida. Caso também tenha havido esse tipo de ilícito, teremos o concurso das duas responsabilidades, a contratual e a extracontratual ou aquiliana. Dessa forma, mesmo sendo a responsabilidade médica contratual, não está o médico autorizado a cometer danos à pessoa e nessa parte responderá por ato ilícito. 3.º) As circunstâncias objetivas do dano; local, espécie e extensão dessa lesão. A medida do dano vai dar o tamanho para a indenização. 4.º) As circunstâncias subjetivas da vítima e do defensor. Não só a saúde anterior, as idiossincrasias, mas também poderá ter motivos pessoais sérios para não ter procedido como deveria. 131
Por isso, o médico-cirurgião plástico antes de submeter o paciente a
uma cirurgia estética deve ter o consentimento do paciente e passar-lhe informações
sobre os riscos, de forma escrita, individual e testemunhada para que se possa
provar precisamente ao juiz, em caso de processo oriundo de resultados
inesperados. 132
Dessa forma o STJ decidiu que cabe ao médico a avaliação dos riscos:
O profissional que se propõe a realizar cirurgia, visando a melhorar a aparência física do paciente, assume o compromisso de que, no mínimo, não lhe resultarão danos estéticos, cabendo ao cirurgião a avaliação dos riscos. Responderá por tais danos, salvo culpa do paciente ou a intervenção de fator imprevisível, o que lhe cabe provar. 133
O STJ entendeu que nesses casos compete ao médico provar que os
danos causados não decorreram de sua conduta:
No procedimento cirúrgico estético, em que o médico lida com paciente saudável que apenas deseja melhorar sua aparência física e, conseqüentemente, sentir-se psiquicamente melhor, estabelece-se uma obrigação de resultado que impões ao profissional da medicina, em casos de insucesso da cirurgia plástica, presunção de culpa, competindo-lhe ilidi-la com a inversão do ônus da prova, de molde a livrá-lo da responsabilidade contratual pelos danos causados ao paciente em razão do ato cirúrgico. 134
131 LOPEZ, Teresa Ancona, 2004, O Dano Estético, Revista dos Tribunais, p. 113-114. 132 KFOURI NETO, Miguel, Responsabilidade Civil do Médico, Revista dos tribunais, 2001, p. 173. 133 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Terceira Turma. AgReg 37060 / Agravo Regimental. Relator: Ministro Eduardo Ribeiroi. Julgado em: 28/11/1994. Publicado em: DJ 06.02.1995. p. 1348. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=(('AGRG%20NO%20AG'.clap.+ou+'AGRG%20NO%20AG'.clas.)+e+@num='37060')+ou+('AGRG%20NO%20AG'+adj+'37060'.suce.)>. Acesso em: 11 nov. 2009. 134 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Terceira Turma. REsp 81101 / RS Recurso Especial. Relator: Ministro Waldemar Zveiter. Julgado em: 13/04/1999. Publicado em: DJ 31.05.1999. p. 140. Disponível em:
51
Para a inversão do ônus da prova pode ser aplicado, ainda, o art. 6º,
VIII, do C.D.C. quando for verossímil a alegação ou nos casos de hipossuficiência do
consumidor em relação ao prestador de serviço, quando considerado o desequilíbrio
no aspecto técnico.
Dessa forma o art. 6º, VIII, do C.D.C. menciona a inversão do ônus da
prova quando for o consumidor hipossuficiente:
“Art. 6º São direitos básicos do consumidor: VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências.”
Em decisão do TRF da 1ª Região:
Segundo exegese do artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, tem-se que a inversão do ônus probatório constitui exceção à rega geral estabelecida no artigo 333, incido I, do CPC, quanto à produção de provas e não quanto à responsabilidade pelo pagamento de despesas relativas a estas. Não se pode obrigar o réu a custear perícia requerida pelo autor. 135
A hipossuficiência consiste na dificuldade em provar em defesa própria
por falta de informações e conhecimentos específicos que possam produzir efeitos
em favor do lesado. Exemplo existe no caso de um consumidor de telefone celular
com vício no produto ter que se onerar com despesas de perícia, que pode ser até
mesmo maior que o próprio valor reclamado, contraditando o instituto de defesa ao
consumidor. 136
<http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=+10536&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=18>. Acesso em: 11 nov. 2009. 135 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Quinta Turma. AG 5730 MT 2002.01.00.005730-0. Agravo de Instrumento. Relatora: Desembargadora Selena Maria de Almeida. Julgado em: 02/06/2003. Publicado em: DJ 30.06.2003. p. 127. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/2286745/agravo-de-instrumento-ag-5730-mt-20020100005730-0-trf1>. Acesso em: 11 nov. 2009. 136 NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano; SERRANO, Yolanda Alves Pinto, Código de Defesa do Consumidor Interpretado, Saraiva, 2008, p.52.
52
4.2.6 Causas excludentes da responsabilidade médica
Fernanda Schaefer (2006) aponta os fatos excludentes da
responsabilidade médica, entre eles estão:
“a) Legítima defesa (art. 25, CP e art. 160 I, CC o art. 188, I do Novo Código Civil) (...); b) Estado de necessidade (CP, art. 24) (...); c) Exercício regular de direito e cumprimento de dever legal (CP, art. 23, III) (...); d) Fato da vítima exclusivo ou concorrente (...); e) fato exclusivo de terceiro (...); f) caso fortuito ou força maior (...); g) renúncia à indenização (...); h) ausência do nexo de causalidade (...); i) erro e ignorância (...); j)cláusula de não indenizar (...).” 137
No caso da cirurgia plástica estética o médico deve recusar-se a fazer a
cirurgia quando os riscos forem maiores que o benefício que traria ao paciente,
sendo irrelevante o consentimento provado do médico. 138
Mesmo assim, se o resultado da operação não atingir o fim esperado o
cirurgião não pode ser responsabilizado nos seguintes casos, segundo Hildegard
Taggesell Giostri (2007):
“a) tenha sido razoavelmente necessária; b) o risco corrido pelo paciente seja de menor proporção que a vantagem
buscada; c) tenha sido a intervenção praticada de acordo com as normas da
profissão.”
O dever de informação também deve ser cumprido pelo médico para que
não responda por culpa nesse caso.
É dever do médico informar o paciente dos riscos que deve correr se de
fato aceitar a cirurgia, por isso a Ministra do STJ Fátima Nancy Andrighi afirma:
Em conclusão, o fato é que o dever de informação desempenha um papel central. Tal dever tem de ser cumprido de maneira estrita pelo cirurgião. Trata-se do aspecto mais importante para a preparação de uma cirurgia plástica estética (aliado, naturalmente, a todas as cautelas que a técnica médica demanda, antes - solicitação e análise de exames laboratoriais – durante, e após o ato cirúrgico). O paciente deve estar informado, não apenas sobre quais os riscos envolvidos na cirurgia a que pretende se submeter, como também qual o melhor resultado que pode esperar, dentro das variações a que naturalmente se submete a cirurgia estética. A preocupação de informar não pode ser, jamais, posta de lado pelo cirurgião
137 SCHAEFER, Fernanda, Responsabilidade Civil do Médico & Erro de Diagnóstico, Juruá, 2006, p. 48-50. 138 GIOSTRI, Hildegard Taggesell, 2007, Erro Médico, Juruá, p. 119.
53
plástico. E, naturalmente, dada a importância desse dever, é imprescindível que a plena informação do paciente esteja documentalmente comprovada, da forma mais completa possível. Esse é o caminho que deve seguir o cirurgião cauto para que tenha argumentos fortes para defender a correção de seu procedimento em eventuais controvérsias judiciais.
Por isso, o resultado esperado depende, não só do bom desempenho do
médico, mas também, das condições físicas do paciente, de forma tal que a
dificuldade na cicatrização ou a elasticidade da pele podem comprometer a sua
saúde. 139
139 SILVA, Regina Beatriz Tavares da et al, 2007, Responsabilidade Civil na Área da Saúde, Saraiva, p. 149.
54
5 CONCLUSÃO
O trabalho apresentado fez uma análise geral da responsabilidade civil
do médico cirurgião plástico com base referencial na doutrina e jurisprudência
adequadas.
O Superior Tribunal de Justiça costuma ser rigoroso quando se trata da
cirurgia plástica estética, que é um moderno ramo da medicina, porque considera a
responsabilidade subjetiva de resultado, uma vez que este é o único objetivo da
cirurgia estética.
Houve um avanço para o consumidor com a introdução do Código de
Defesa do Consumidor que, em regra coloca a responsabilidade do fornecedor de
serviço com sendo objetiva, fazendo exceção quanto aos profissionais liberais, os
quais se incluem os médicos.
Para os médicos a responsabilidade civil é a subjetiva de meio, haja vista,
não se colocar o encargo de salvar a vida de alguém. Na cirurgia estética reparadora
dá-se o mesmo tratamento.
Porém, devido ao fato de que, na cirurgia plástica estética só a procura
quem está com boa saúde, o tratamento faz-se necessário que seja diferente. De
fato, assim determinou a jurisprudência brasileira, invertendo o ônus da prova no
caso de cirurgia plástica embelezadora.
Como o avanço da medicina não cessou e os tribunais tendem a se
adaptar com as transformações, pode haver uma mudança nessa questão, que
ainda gera dúvidas e discussões no meio jurídico.
Verificou-se que a responsabilidade do médico depende também das
condições físicas do paciente, por isso, a necessidade de que o médico avalie os
riscos do paciente a partir das informações trazidas pelo próprio cliente, antes que
comece o trabalho, para evitar assim, que sofra a culpa do dano oriundo da cirurgia.
Dessa maneira, o magistrado deve avaliar todas as provas trazidas, para
que não haja uma sentença equivocada, quando o paciente mentir sobre o seu
estado de saúde e o resultado não for o desejado.
55
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