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Desafios regionais da Classificação Indicativa:
Redes, fusos e o respeito à vinculação horária
ITS - Instituto de Tecnologia & Sociedade do Rio de Janeiro
Resumo: O processo de classificação indicativa surge no Brasil caracterizado
por um complexo sistema de emissoras, retransmissoras, a filiadas e redes
televisivas. Não bastasse isso, o território nacional ainda é dividido em um
complexo sistema de fusos horários territoriais e horários de verão. Na prática,
isso implica no desafio contínuo regulatório de atribuir classificação
indicativa para programas que, na prática, são exibidos possivelmente em
diferentes horários, por diferentes empresas. Com base nesse desafio, esse
artigo analisa uma amostra da programação televisiva aberta de cinco redes
nacionais (distribuídas nas regiões do país), com objetivo de analisar os
desafios regionais do processo de classificação indicativa. Em particular, o
artigo discute a eficiência do processo em manter espaços horários restritos à
conteúdos impróprios para crianças e adolescentes, e analisar o grau de
engajamento das afiliadas em submeterem seus produtos regionais ao
processo da classificação indicativa nacional.
Palavras-chave: classificação indicativa, televisão aberta, direitos da criança
e adolescente.
O processo de classificação indicativa é fruto de um acúmulo de duas grandes
ondas de regulamentação decorridas ao longo de mais de quarenta anos de história
nacional: uma caracterizada pela “censura classificatória”, que decorre de 1968 à 1988, e
outra de 1988 para cá, caracterizada pela “classificação, para efeito indicativo”. Esse
processo de regulamentação inclui uma profunda discussão que culmina nos objetivos
normativos atuais do processo de classificação indicativa, que versa sobre duas facetas
importantes dos desafios regionais do processo de classificação: a constante redefinição
da eficiência, eficácia e efetividade como parâmetros normativos de avaliação de
políticas públicas, e a legitimidade da Administração Pública em promover a
constitucionalização do ordenamento jurídico (Romão, 2010).
Desafios reais das duas facetas citadas acima são explicitados na evolução dos
critérios da classificação indicativa no Brasil. Os critérios atuais, descritos de forma
resumida no “Guia Prático da Classificação Indicativa (SNJ, 2012), resultam de um
processo de construção democrático e objetivo de regulamentação pública. Eles chamam
atenção por definir o papel do DEJUS - Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e
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Qualificação – como responsável por classificar indicativamente os conteúdos
transmitidos pelas empresas de mídia, representando o Estado na prerrogativa de garantir
a proteção de direitos de crianças e adolescentes no uso do espectro eletromagnético (que
como se sabe é temporariamente cedido à determinadas empresas por meio de concessões
públicas). Nesse cenário, o papel do DEJUS é de apontar para pais, professores e demais
responsáveis por crianças e adolescentes quais conteúdos na TV Aberta são apropriados
ou inadequados para consumo. Esta indicação é feita pela inserção de símbolos
classificativos que permitam aos responsáveis exercer seu papel de tutela pelos menores
de idade. No caso da TV aberta em particular, o Estado deve ainda criar horários
protegidos nos quais apenas conteúdos indicados sejam exibidos (Vivarta e Canela, 2006).
Cabe ao DEJUS fornecer aos cidadãos e às empresas de mídia informações
eficientes, eficazes e efetivas para orientar o consumo, a produção e a veiculação de
conteúdos audiovisuais na TV Aberta. Mais do que isso, cabe ao DEJUS conduzir um
processo de regulação que garanta dois objetivos complementares: a geração de critérios
classificatórios que permitam a análise objetiva do processo de classificação (não só por
parte dos pais e responsáveis, mas também pelo mercado audiovisual); e a manutenção
dos critérios feita a partir de um processo democrático e multissetorial (Silva e Paulino,
2006) que envolva mecanismos como a participação cidadã (Leal, 2006), audiências e
consultas públicas (Alarcon, 2006), respostas à iniciativas oriundas da sociedade civil
(Barbosa e Moysés, 2006), e diálogos com o setor privado (Romão, 2010). O processo
atual de classificação baseia-se portanto num processo contínuo de (a) identificar
posições interesses, (b) compreender as críticas, (c) descrever problemas e (d) produzir
soluções que caracterizem políticas públicas (Romão, 2006).
No caso do papel da programação regional no processo da classificação indicativa
na TV aberta, dois desafios se sobressaem: o respeito da programação televisiva, ao
longo do país, aos horários protegidos de veiculação, e o engajamento das afiliadas na
submissão de seus programas regionais ao processo de classificação indicativa nacional.
Nesse sentido, são objetivos desse artigo verificar se o horário de exibição de programas
é obedecido pelas afiliadas regionais em todas as regiões do país, e se a programação
regional, exibida em horário nobre, foi enviada para classificação.
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Para desenvolvimento destes objetivos o artigo se desdobra em cinco partes. A
primeira parte realiza uma revisão da literatura sobre vinculação horária e o processo de
classificação indicativa. Temas centrais resgatados nessa etapa referem-se ao debate
regulatório sobre o fuso horário do Acre (e a manutenção do processo de vinculação
horária a partir disso), e a discussão em torno da ADI 2.404 (a qual coloca em cheque
mecanismos centrais para manutenção do processo de classificação indicativa na TV
Aberta).
A segunda parte do artigo realiza o detalhamento da metodologia usada para coleta
e análise de dados, com destaque dado para descrição de características da amostra
produzida. Em seguida, a terceira e a quarta trazem análises quantitativas e qualitativas a
partir do cruzamento dos programas veiculados, suas características de veiculação, e a
classificação indicativa encontrada. Em particular, nessa parte são discutidos os índices
de compliance (obediência) da TV aberta ao processo de classificação indicativa, de
forma a sugerir pontos de atuação para o aprimoramento do processo de classificação
indicativa no país. Por fim, a última sessão do artigo discute criticamente os resultados
encontrados, e busca possíveis impactos e justificativas para o panorama identificado.
Adianta-se desde já que a pesquisa revela um elevado grau de compliance das
emissoras regionais às faixas de classificação indicativa e no envio de programas
classificáveis para o DEJUS. A partir desse cenário, sugere-se ao final do artigo duas
formas de compreender o significado do sucesso neste processo regulatório, como
também imaginam-se possíveis passos para fortalecimento da classificação indicativa no
país.
1. Vinculação horária e classificação indicativa
A discussão sobre a vinculação de horário de exibição associado à uma faixa de
classificação indicativa sempre foi tema de intenso debate entre mercado, sociedade civil,
e Estado. O termo “vinculação”, usado da primeira portaria do processo de classificação
(publicada em 1990) até a publicação da portaria mais recente (datada de 2014), refere-se
à permissão do Estado de fazer recomendação de horários limites para exibição de certos
programas (criando assim horários protegidos adequados para crianças e adolescentes), e
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do uso de sua autoridade para aplicar sanções às emissoras que eventualmente violem
estes horários.
O sistema de vinculação não é uma excentricidade Brasileira, sendo aplicado em
diversos países (Mendel, 2012). Outros mídias, como a TV à cabo, as salas de cinema, o
mercado de jogos, ou a prática do streaming online não são passíveis do horário
vinculado porque tais mídias permitem formas alternativas de controle do acesso de
crianças e adolescentes a conteúdos não recomendados. No caso da TV aberta, porém,
não se permite um controle que não pelo sistema de vinculação de exibição do programa
à faixa horária indicada. Ao mesmo tempo, vale ressaltar o valor do sistema de
vinculação enquanto oposição ao sistema de censura parcial ou total, no qual o Estado
teria o direito de impor cortes ou a proibição completa de exibição de material
audiovisual na TV. O uso de horário vinculado, em oposição à censura, permite que
qualquer conteúdo seja exibido na TV aberta, desde que respeitados horários de
veiculação próprios (SNJ, 2012).
Enquanto ato normativo jurídico, a vinculação de horário atual estipula seis faixas
classificatórias das quais duas são livres de vinculação (i.e. Livres e 10 anos). Já para
produtos classificados como 12 anos, começa o processo de vinculação a partir das 20h.
A Portaria 368/2014, a mais recente, define por exemplo o horário protegido como
aplicável à “Faixa de proteção à criança” (faixa horária entre 6h e 20h, em que apenas
programas de classificação Livre ou 10 anos são permitidos), à “Faixa de proteção ao
adolescente” (das 20h às 22h, em que de forma escalonada programas de 12, 14 e 16 anos
são permitidos), e à “Faixa adulta” (transmitida entre 23h às 6h do dia seguinte, na qual
todos programas são permitidos).
A fixação dessas faixas, e da forma como a vinculação deve ser feita, não foi porém
imposta pelo Estado, mas sim fruto de um intenso e longo debate que começa na
constituinte, quando o marco normativo associa o termo “classificação” aos termos “para
fins indicativos” na Constituição de 1988, e passa até por debates travados na ABERT -
Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão, que incluiu o termo em seu
Código de Ética à época (Ramos, 2006).
É fato porém que o debate mais plural e criterioso das faixas de vinculação começa
a surgir a partir dos preparativos para publicação do Manual da Classificação indicativa
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(SNJ, 2006). Anterior a esta, entre os anos de 2005 e 2006, uma série de audiências
públicas, programas televisivos, e grupos de trabalho realizaram debates com a
Procuradoria Federal e Procuradorias Regionais dos Direitos do Cidadão, Ministério
Público Estadual, Secretarias de Educação, Escolas Públicas, TV Câmara, Delegacia
Regional do Trabalho, Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos
Deputados, Coletivo Brasil de Comunicação Social (Intervozes), Universidade de
Brasília (UnB), Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda),
Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi), dentre outros (Alarcon, 2006).
Atualmente, o debate em torno da vinculação horária está em destaque devido ao
julgamento pelo Supremo Tribunal Federal da ADI 2.404, impetrada em 2001 pelo
Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). A ADI pretende a declaração de
inconstitucionalidade de parte do artigo 254 do Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), que dispõe sobre a transmissão de espetáculo em horário dive rso ao autorizado
ou sem aviso de sua classificação. Sem esse artigo, fica comprometida a autoridade do
Estado em impor penalidades às emissoras que descumprirem o horário de vinculação,
que hoje permite a aplicação de penas que vão desde multa até a suspe nsão da
programação por dois dias (sendo observado que o Ministério da Justiça não é o titular da
ação e não aplica penalidades administrativamente, sendo as penalidades somente
aplicadas mediante decisão judicial em ação movida pelo Ministério Público, por
entidade representativa ou pelo cidadão ofendido.)
O julgamento da ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade foi iniciado em 30 de
novembro de 2011, e permanece na pauta do STF. No amicus curie enviado em conjunto
pela ANDI - Agência de Notícias dos Direitos da Infância, Conectas Direitos Humanos,
INESC – Instituto de Estudos Socioeconômicos e pelo Instituto Alana, encontramos
alguns dos argumentos que favorecem a manutenção do sistema de vinculação horária.
Dentre estes destaca-se a defesa da criação de “horário protegido” durante o período do
dia em que crianças e adolescentes estão mais potencialmente expostos à TV, à inovação
introduzida em 2007 pelo processo de autoclassificação (que garante que as próprias
emissoras indiquem ao Ministério da Justiça em qual faixa etária sua programação
deveria se inserir), e o argumento de que artigo 254 do ECA “materializa em termos
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proporcionais e corretos as disposições da Constituição Federal de 1988, sem afrontar
qualquer outro direito”.
Entre os desafios atuais relacionados à programação regional, dois casos se
destacam: a mudança de fuso horário no Acre, e o debate em torno da classificação de
programas policialescos.
No caso do Acre, o debate girou em torno da necessidade de adequação da
programação televisiva aos diferentes fusos horários do país, fato previsto na Portaria nº
1.220/07 do Ministério da Justiça (Souza, 2014). A manutenção dos horários de
vinculação locais (em oposição à vinculação dos horários de veiculação na Rede
Nacional) exige que emissoras acatem o horário protegido de veiculação em cada
localidade de transmissão, mesmo que para isso sejam necessários ajustes motivados por
diferença de fuso horário e/ou horários de verão.
O tema da vinculação horária no Acre foi extensamente debatido na época de
implementação da Portaria 1.220, que definiu primeiramente a data de 9 de Janeiro de
2008 como prazo para que emissoras de televisão se adequassem ao dispositivo. Na
época as emissoras se mobilizam para adiar ou cancelar a data de implementação da
portaria (ABERT, 2008), o que tornou o Acre um território de disputa nacional entre
mercado, Estado, e sociedade civil. O tema ganhou ainda mais destaque devido à entrada
em vigor da Lei 11.662, de autoria do então senador Tião Viana (PT-AC), que alterou o
fuso horário do Acre, diminuindo a distância do Estado em relação ao fuso do Sudeste, e
a sua posterior rejeição em Referendo (plebiscito), em 2010, realizado na região, que
voltou a aumentar o fuso do Estado.
O que aconteceu em relação ao Acre, debate este que ficou conhecido como “A
batalha do relógio” (Romão, 2010), é apenas um dos pontos de discórdia entre setor
privado e Estado na regulamentação do horário protegido. Afora este, outro debate que
despertou atenção dos desafios regionais diz respeito à classificação feita, em 2004, de
cinco telejornais policialescos — entre os quais um de grande audiência nacional, o
“Cidade Alerta” - como inadequados para exibição antes das 21hs. Embora na
regulamentação atual tais programas sejam dispensados de classificação indicativa (por
se tratarem de conteúdo jornalístico) o debate travado lá atrás levanta a discussão sobre
que produtos são dispensados de classificação prévia (Bucci e Kehl, 2006).
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No caso acontecido em 2004 em torno dos jornais policialescos, Romão (2010)
relata a violenta reação do setor privado, e também da comunidade de jornalistas, com a
decisão do DEJUS. Esse debate travado evidenciou porém a necessidade de
fortalecimento do marco legal classificatório, visto que a ação do Ministério da Justiça de
classificar os programas jornalísticos, à época, não estava amparada em procedimento
administrativo que garantisse o contraditório e a ampla defesa. “Isto é, embora houvesse
evidências indiscutíveis de que os programas fossem inadequados para veiculação em
horário livre, não existiam registros administrativos que formalmente justificassem a
decisão” (Romão, 2010 : 173).
Uma resolução diferente teve o desfecho da disputa do DEJUS com programas
transmitidos ao vivo mas baseados em entretenimento, como o quadro “Teste de
fidelidade”, de João Kleber exibido pela Record (que foi reclassificado de 14 para 16
anos), reality shows como Big Brother (classificado como 14, e depois reclassificado para
12 anos) e reprises vespertinas de novelas (como no caso da Globo e seu Vale a Pena Ver
de Novo, que passou a reeditar as obras para reclassificá- las como ‘10 anos’ ou ‘Livre’).
O que a comparação desses processos de sucesso na classificação de programas de
entretenimento teve, em comparação ao desfecho conflituoso gerado pela classificação de
programas policialescos, é que a atuação do DEJUS é mais eficiente, eficaz e efetiva
quando baseada em critérios objetivos construídos por processos democráticos
multissetoriais. Ao mesmo tempo, o que se evidencia é que em seu cerne o debate que
motiva programas de entretenimento e jornalismo a serem ou não classificados é tênue.
Nessa linha, vale mencionar o debate gerado pela resolução 163/14 do CONANDA, que
classificou como abusivo o direcionamento de publicidade e de comunicação
mercadológica à criança e ao adolescente, debate este que discutiu a aplicabilidade do
modelo adotado pelo DEJUS como solução para promover simultaneamente a
constitucionalização do ordenamento jurídico e garantir o apoio do mercado as restrições
impostas à publicidade.
2. Metodologia
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Este artigo está baseado na análise de 55.278 programas exibidos coletados entre os
anos de 2010 a 2014, veiculados nas capitais de cinco regiões do país, a saber São Paulo
(Sudeste), Porto Alegre (Sul), Fortaleza (Nordeste), Belém (Norte) e Campo Grande
(Centro-Oeste). Na análise foram catalogados os programas das cinco maiores redes
nacionais do país (Globo, SBT, Record, Band e RedeTV), no horário nobre vespertino
(11-13h) e noturno (18-23h). Pela terminologia programas, importante notar, nos
referimos a exibição dos programas na rede, e não ao conjunto de programas exibidos na
grade. Isso significa, por exemplo, que programas como Jornal Nacional não são
computados de forma unificada, sendo contados de acordo com a quantidade de vezes
mencionados na grade (se o JN for exibido de segunda a sábado, por exemplo, isso
equivaleria a seis programas).
Para obtenção dos programas, a estratégia usada foi transformar em base de dados a
programação televisiva encontrada em cada praça a partir de: (a) busca de arquivo online
disponível, como aqueles encontrados nos jornais impressos e/ou em seus portais virtuais;
(b) busca de arquivo em biblioteca na cidade, ou na Biblioteca Nacional; e (c) busca em
arquivos de mídia localizados na internet ou em empresas privadas. Para fins de
levantamento de dados foram analisadas todas as capitais de cada região, e a partir destes
foram selecionadas as cidades com maior acervo disponível e maior diferença de fuso
horário possível.
Ao final, os dados levantados incluem uma amostra de uma semana de
programação por mês, em todos os meses do ano, exibidos entre Janeiro/2010 e
Junho/2014 nas cidades pesquisadas (exceto no caso do Norte, onde só foram
encontrados dados entre Julho/2012 e Julho/2014). As particularidades de consulta de
fontes em cada cidade são descritas abaixo:
• Sudeste – Para essa análise foi utilizado o Caderno “Ilustrada” do jornal
“Folha de São Paulo”, impresso em São Paulo/SP. Essa programação foi classificada primeiramente como “nacional”. As emissoras afiliadas
analisadas foram TV Globo SP, SBT São Paulo, Record SP, Rede TV! São Paulo, e Band São Paulo.
• Sul – Para levantamento de dados foi utilizado a “Revista da TV” do jornal
“O Sul”, localizado em Porto Alegre/RS. As emissoras filiadas analisadas foram RBS TV (Globo), SBT RS, Record RS, Rede Pampa de
Comunicação (RedeTV) e Band RS.
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• Centro Oeste – Nessa região foi utilizado o “Programa da TV” do jornal “Correio do Estado”, localizado em Campo Grande/MS. As emissoras
analisadas foram TV Morena (Globo), TV Campo Grande (SBT), TV Guanandi (Band) e TV MS (Record). Não foram encontrados registros da
rede afiliada da RedeTV. • Nordeste – A análise dessa região foi realizada a partir do caderno “Zoeira”
do jornal “Diário do Nordeste”, localizado em Fortaleza/CE. As emissoras
analisadas foram TV Verdes Mares (Globo), TV Jangadeiro e NordesTV e TV Verdes Mares (SBT), TV Cidade (Record), RedeTV Ceará, e TV
Jangadeiro e Band. Nota-se na amostra que a TV Jangadeiro foi filiada à rede SBT durante um período da análise, e a partir de Abril de 2012, a emissora passou a ser uma afiliada da Band.
• Norte – Para a análise dessa região foi utilizado o caderno “Tudo de bom” do jornal “Diário do Pará”, localizado em Belém/PA. As emissoras
analisadas foram Televisão Liberal (Globo), SBT Pará, Record Norte e RBA (Band). Não foi encontrado registro da afiliada da RedeTV.
Com base na lista de programas encontrados foi então feita a busca da classificação
indicativa nas duas bases disponíveis no Portal da Classificação Indicativa no Ministério
da Justiça: a base de programas de autoclassificação (conteúdos inéditos ou modificados
exibidos na televisão) e a base de programas de análise prévia (demais conteúdos).
Programas que fossem claramente dispensados de classificação, como jornais locais,
programas eleitorais e competições esportivas não foram buscados por serem casos
evidentes de dispensa do processo de classificação. Mas nos casos em que houvesse
dúvida, estes foram buscados na base do DEJUS e quando necessário, na própria grade
das emissoras (para determinar se seriam ou não classificáveis). Os programas com
classificação não encontrados na base do DEJUS, e que não se caracterizam
objetivamente como não classificáveis, foram anotados na base como “não encontrados”.
3. Descrição geral da programação analisada
Nesta seção analisamos o perfil da amostra coletada, comparando as
características dos programas catalogados com base na região, ano de exibição, emissora
responsável, tipo de rede (se nacional ou regional) e turno (se manhã ou noite).
Analisamos ainda dados gerais da classificação indicativa encontrados. No total a base é
formada por 55 mil programas (N=55.278), distribuídos em cinco anos de monitoramento
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(Tabela 1), com exceção da Região Norte, que tem dados a partir de Julho de 2012
apenas. Em relação às emissoras monitoradas, a Band foi o canal com maior
concentração na amostra (24%), sendo a Record emissora de menor concentração na
amostra (15%). Isso indica que a Band é o canal com maior variedade de programas, o
que sugere ser esta a emissora com maior demanda de produtos para classificar, e a
Record a de menor variedade (o que em partes é justificado pela concentração de
programas de grande duração, como os programas religiosos, transmitidos pela emissora).
Tabela 1 – Análise do perfil da programação geral por Região
CO N NE S SE Total
# Total %
# % # % # % # % # %
Ano 2010 3.321 ,29 ,00 3.049 ,22 2.890 ,25 2.841 ,23 12.101 ,22 2011 1.828 ,16 ,00 2.850 ,21 1.317 ,11 2.595 ,21 8.590 ,16 2012 1.669 ,15 1.318 ,22 2.917 ,21 2.774 ,24 2.642 ,21 11.320 ,20 2013 2.561 ,23 2.702 ,45 2.937 ,21 2.792 ,24 2.588 ,21 13.580 ,25 2014 1.940 ,17 1.943 ,33 2.076 ,15 1.912 ,16 1.816 ,15 9.687 ,18 Emissora BAND 3.014 ,27 1.469 ,25 3.274 ,24 2.771 ,24 2.995 ,24 13.523 ,24 GLOBO 2.282 ,20 1.276 ,21 2.910 ,21 2.546 ,22 2.802 ,22 11.816 ,21 RECORD 1.827 ,16 831 ,14 2.082 ,15 1.820 ,16 1.609 ,13 8.169 ,15 REDETV 1.878 ,17 1.248 ,21 2.644 ,19 2.252 ,19 2.806 ,22 10.828 ,20 SBT 2.318 ,20 1.139 ,19 2.919 ,21 2.296 ,20 2.270 ,18 10.942 ,20 Rede Nacional 8.571 ,76 5.073 ,85 11.877 ,86 8.960 ,77 11.918 ,95 46.399 ,84 Regional 2.748 ,24 890 ,15 1.952 ,14 2.725 ,23 564 ,05 8.879 ,16 Turno Manhã 3.809 ,34 1.627 ,27 4.112 ,30 4.013 ,34 3.532 ,28 17.093 ,31 Noite 7.510 ,66 4.336 ,73 9.717 ,70 7.672 ,66 8.950 ,72 38.185 ,69 Classificação Não encont. 441 ,04 64 ,01 481 ,03 114 ,01 148 ,01 1.248 ,02 Não aplicável 5.508 ,49 3.010 ,50 7.125 ,52 6.072 ,52 5.829 ,47 27.544 ,50 Aplicável 5.370 ,47 2.889 ,48 6.223 ,45 5.499 ,47 6.505 ,52 26.486 ,48 Total Geral 11.319 1,0 5.963 1,0 13.829 1,0 11.685 1,0 12.482 1,0 55.278 1,0
Em relação à distribuição da rede em programação regional ou nacional, a Tabela 1
também revela que mais de 4 em cada 5 programas transmitidos no país referem-se a
programas da rede nacional (84%), considerando que rede nacional, na pesquisa, é aquela
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formada por programas exibidos em pelo menos 3 regiões diferentes, em horários
equivalentes. A concentração de maior programação nacional se dá no Sudeste (95%) e a
de menor concentração no Centro-Oeste e Sul (76 e 77%, respectivamente), o que indica
que o SE é a região que mais exporta programas para as outras regiões, enquanto o CO e
S são as regiões com maior produção regional (e que, por isso, são as que mais
potencialmente tem demanda regional de classificação de seus programas).
Em relação à distribuição de programas por período nobre de programação
(manhã/noite), identificamos que em torno de um terço dos programas monitorados são
matutinos (31%), enquanto restante é vespertino (69%). Isso é esperado visto que
monitoramos duas horas da programação pela manhã (11-13h) e quatro horas pela noite
(18-23h).
Tabela 2 – Análise do perfil da classificação por Região
CO N NE S SE Total
# Total %
# % # % # % # % # %
Classificação L 2.938 ,26 1.543 ,26 3.285 ,24 3.083 ,26 3.702 ,30 14.551 ,26 10 anos 1.230 ,11 755 ,13 1.531 ,11 1.476 ,13 1.513 ,12 6.505 ,12 12 anos 727 ,06 448 ,08 899 ,07 627 ,05 825 ,07 3.526 ,06 14 anos 458 ,04 136 ,02 491 ,04 307 ,03 452 ,04 1.844 ,03 16 anos 11 ,00 2 ,00 12 ,00 5 ,00 10 ,00 40 ,00 18 anos 6 ,00 5 ,00 5 ,00 1 ,00 3 ,00 20 ,00 Dispensados 5.508 ,49 3.010 ,50 7.125 ,52 6.072 ,52 5.829 ,47 27.544 ,50 Não encontr. 441 ,04 64 ,01 481 ,03 114 ,01 148 ,01 1.248 ,02
Sub-totais L + 10 anos 4168 ,37 2298 ,39 4816 ,35 4559 ,39 5215 ,42 21.056 ,38 L+ 10 + D 9676 ,86 5308 ,89 11941 ,87 10631 ,91 11044 ,89 48.600 ,88 12 a 16 anos 1202 ,11 591 ,10 1407 ,10 940 ,08 1290 ,10 5.430 ,10 12 a 16 + D 6710 ,60 3601 ,60 8532 ,62 7012 ,60 7119 ,57 32.974 ,60 Total Geral 11.319 1,0 5.963 1,0 13.829 1,0 11.685 1,0 12.482 1,0 55.278 1,0
Analisando especificamente a distribuição de programas por tipo de classificação
(Tabela 2) notamos que 50% dos programas identificados são dispensados de
classificação indicativa, enquanto 48% dos programas deveriam ter e têm classificação
definida, e 2% deveriam ter classificação definida mas não foram encontrados nas bases
do DEJUS (detalhamos esse casos na Sessão 4 do artigo). Dos programas em que a
classificação indicativa se aplica, a maior concentração encontrada foi a de programas
classificados como Livre (26%), seguido por 10 anos (12%). Programas classificados
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como 18 anos, que teoricamente não poderia ser exibidos dentro da amostra analisada
(pois só podem aparecer depois das 23h) ocorrem em casos esporádicos (apenas 20 dos
55mil programas analisados caem nessa categoria). Se lermos os programas como
materiais exibíveis de acordo com as faixas estabelecidas na Portaria 368/14, notamos
que a Faixa de proteção à criança tem 87% da grade elegível (37% entre Livre e 10 anos,
mais 50% de programas Dispensados), enquanto produtos elegíveis apenas na Faixa de
proteção ao adolescente somam 11% da amostra.
A Tabela 1 indicou que apenas 16% dos programas encontrados refere-se à
programas feitos regionalmente. Quando observamos as características de classificação
destes programas apenas (Tabela 3), encontramos um fato importante: em 87% dos casos
as obras são dispensadas de classificação indicativa, percentual em muito justificado por
se tratar majoritariamente de conteúdo jornalístico. Dentre os 13% de progra mas
regionais classificáveis, nota-se ainda que todos são isentos de vinculação de horário por
se tratarem de obras classificadas como Livre (7%) ou 10 anos (1%). Na prática, isso
revela que a programação regional não é impactada, diretamente, pela vinculação horária.
Tabela 3 – Análise do tipo de classificação, programação regional APENAS
CO N NE S SE Total
# Total %
# % # % # % # % # %
Classificação Não encontr. 181 ,07 24 ,03 226 ,12 77 ,03 1 ,00 509 ,06 Não aplicável 2.345 ,85 856 ,96 1.701 ,87 2.221 ,82 560 ,99 7.683 ,87 Aplicável 222 ,08 10 ,01 25 ,01 427 ,16 3 ,01 687 ,08
Por faixas L 210 ,08 2 ,00 21 ,01 377 ,14 3 ,01 613 ,07
10 anos 12 ,00 8 ,01 4 ,00 50 ,02 ,00 74 ,01 12 a 18 anos Não encontrado N/E 181 ,07 24 ,03 226 ,12 77 ,03 1 ,00 509 ,06 D 2.345 ,85 856 ,96 1.701 ,87 2.221 ,82 560 ,99 7.683 ,87 Total Geral 2.748 1,0 890 1,0 1.952 1,0 2.725 1,0 564 1,0 8.879 1,0
4. Análise quantitativa dos índices de compliance
13
Nesta seção analisamos o grau de compliance (obediência) da TV aberta com dois
critérios do processo de classificação indicativa: a submissão de programas classificáveis
para processamento do DEJUS, e o respeito ao horário de exibição local por faixa
classificativa. Em termos gerais o quadro é positivo. Como mostra a Tabela 4, apenas 1%
dos programas exibidos desrespeitam o horário de exibição (765 programas identificados),
enquanto a grande maioria (96%) é exibida dentro do horário permitido. O restante dos
programas, 2%, são aqueles em que não foi encontrada classificação, e refere-se ao
índice de não compliance de exibição da classificação nas bases do DEJUS (seja pelo fato
de serem programas não enviados para classificação, ou porque a base dos DEJUS não os
exibe corretamente). Importante observar que estes níveis de compliance, nas duas
análises feitas, tem pouca variação de uma região para outra (variando entre 1 e 2% no
caso de compliance com a faixa de horário, e de 1 a 4% no caso de programas
encontrados).
Tabela 4 - índice de compliance por região
CO N NE S SE Total
# Total %
# % # % # % # % # %
Vinculação Obedecida 10.701 ,95 5.802 ,97 13.118 ,95 11.465 ,98 12.159 ,97 53.245 ,96 Desobedecida 177 ,02 97 ,02 230 ,02 106 ,01 175 ,01 785 ,01 Não encontr. 441 ,04 64 ,01 481 ,03 114 ,01 148 ,01 1.248 ,02
Classificação Não encontr. 441 ,04 64 ,01 481 ,03 114 ,01 148 ,01 1.248 ,02 Identificada 10.878 ,96 5.899 ,99 13.348 ,97 11.571 ,99 12.334 ,99 54.030 ,98 Total 11.319 1,0 5.963 1,0 13.829 1,0 11.685 1,0 12.482 1,0 55.278 1,0
Tabela 5 - Índice de compliance por rede
Band Globo Record RedeTV SBT Total
# Total %
# % # % # % # % # %
Vinculação Obedecida 13.103 ,97 11.681 ,99 8.089 ,99 10.032 ,93 10.340 ,94 53.245 ,96 Desobedecida 105 ,01 49 ,00 55 ,01 413 ,04 163 ,01 785 ,01 Não encontr. 315 ,02 86 ,01 25 ,00 383 ,04 439 ,04 1.248 ,02
Classificação Identificável 13.208 ,98 11.730 ,99 8.144 1,0 10.445 ,96 10.503 ,96 54.030 ,98 Não encontr. 315 ,02 86 ,01 25 ,00 383 ,04 439 ,04 1.248 ,02
Total 13.523 1,0 11.816 1,0 8.169 1,0 10.828 1,0 10.942 1,0 55.278 1,0
14
Quando observamos o grau de compliance por rede (Tabela 5), observamos que a
Globo e a Record são as emissoras com maior compliance (99% em cada caso), seguido
por Band (97%), SBT (94%), e RedeTV (93%). Na questão de compliance em envio dos
programas para classificação no DEJUS, a RedeTV é a rede de menor índice (4% dos
programas não foram encontrados), sendo a Record a de maior índice (apenas 25
programas não foram encontrados).
Quando observamos o grau de compliance das redes por faixa horária de exibição
(Tabela 5), analisamos que o grau de não obediência às faixas horárias é em geral 1%
(N=785), o que indica alto grau de respeito à vinculação horária, com exceção da
RedeTV (Tabela 6) que teve 10% de desobediência no horário das 18-22h (N=355) ) e do
SBT (3% de desobediência no mesmo horário, N=144). Como será apresentado abaixo,
esses números elevados em muito se referem a repetidas exibições dos programas
Rationho (SBT) e Te Peguei na TV (RedeTV) em faixa imprópria.
Tabela 6 - índice de NÃO compliance de horário vinculado, por rede e faixa horária
Band Globo Record RedeTV SBT Total
# Total %
# % # % # % # % # %
Horário de
Vinculação
11-13h 23 ,01 38 ,01 4 ,00 27 ,01 ,00 92 ,01
18-20h 18 ,00 10 ,00 5 ,00 355 ,10 144 ,03 532 ,03
20-21h 52 ,02 ,00 46 ,03 21 ,01 9 ,01 128 ,01
21-22h 12 ,01 ,00 ,00 4 ,00 9 ,01 25 ,00
22-23h ,00 1 ,01 ,00 6 ,03 1 ,00 8 ,01
Média ,01 ,00 ,01 ,05 ,01 ,01
Por fim, quando observamos o grau de compliance por região (Tabela 7),
encontramos que na média aritmética das faixas, o Centro-Oeste e o Nordeste são as
regiões com maior índice de desobediência do horário (2%), índices maiores que na
Norte (1%), que poderia ter índices maiores visto que é a de constante maior diferença
horária da região Sudeste. Verifica-se ainda que as faixas com maior problema de
compliance são aquelas referentes à Faixa de proteção à criança (11-13h e 18h20h),
enquanto as faixas mais avançadas (21-23h, por exemplo) apresentam apenas problemas
pontuais.
15
Das faixas com maiores índices, identificamos que o desrespeito ao horário de
vinculação na faixa de 11-13h é pontual (apenas 92 programas da mostra caem nessa
categoria), a maioria fazendo referência a exibição de filmes com classificação 12 anos
(que são detalhados na próxima sessão do artigo, e que são exibidos sempre na rede
nacional)1. Já na faixa de 18-20h (532 casos), índice elevado pelas exibições repetidas do
“Te Peguei” (RedeTV), exibido de 2013 para cá, e do “Programa do Ratinho”
(SBT),exibido em desacordo apenas em 2010.
Tabela 7 - índice de NÃO compliance de horário vinculado, por região e faixa horária
CO N NE S SE Total
# Total %
# % # % # % # % # %
Horário de
Vinculação 11-13h 19 ,00 1 ,00 26 ,01 21 ,01 25 ,01 92 ,01 18-20h 102 ,02 83 ,04 134 ,03 75 ,02 138 ,03 532 ,03 20-21h 42 ,03 13 ,01 59 ,02 9 ,00 5 ,00 128 ,01
21-22h 10 ,01 ,00 9 ,00 1 ,00 5 ,00 25 ,00
22-23h 4 ,02 ,00 2 ,01 ,00 2 ,01 8 ,01
Média ,02 ,01 ,02 ,01 ,01 ,01
5. Análise qualitativa dos índices de compliance
Nesta seção analisamos os principais programas identificados com problemas de
compliance, de forma a mapear áreas de conflito e sugerir ações para o aprimoramento do
processo de classificação indicativa no país. A sessão se divide entre análises dos
programas com problemas no respeito à faixa horária vinculada, e depois, à análise dos
problemas da classificação indicativa encontrada na base do DEJUS.
Na faixa horária matutina (11-13h) os programas com maior problema encontrados
foram as séries Glee (Globo, classificação 12 anos, exibido em 2011) e Momentum
(RedeTV, classificação 14 anos, exibido entre 2010 e 2011). Nesse caso, é evidente o
descumprimento do horário de classificação indicativa pois tratam-se de classificações
com horário vinculado que são exibidas em horário protegido. Resta em casos como esses
1 É recorrente a transmissão de filmes no período da tarde reclassificados, ou seja, enviados para o DEJUS com cortes de forma que a classificação seja rebaixada. Como padrão consideramos sempre a classificação mais alta encontrada no site do DEJUS, pois não temos, a partir da descrição na programação publicada no jornal, saber qual versão do filme foi passada. Anota-se porém que é possível que em alguns casos uma versão editada tenha sido exibida.
16
a atuação do DEJUS no monitoramento da grade e notificação das emissoras (o que pode
inclusive já ter ocorrido, visto que os problemas desaparecem da amostra embora saiba-se
que os mesmos continuaram a ser exibidos)2. Outra fonte de problema identificado na
faixa foi a exibição de filmes de classificação 12 anos, como Entrando numa fria maior
ainda, Quarteto Fantástico e Vicky Cristina Barcelona. Esse tipo de problema é mais
encontrado na programação da Globo, e aparece por três anos consecutivos. Mas apesar
de representar um problema ele é pontual e indica uma pequena tendência das emissoras
de exibir filmes indicados para 12 anos em horário diverso a esta faixa.
Na primeira faixa horária noturna, que se refere ainda à Faixa de proteção à criança
(18-20h), os programas com maior reincidência de problemas identificados foram os
programas Te Peguei (Record, 12 anos, 2013 e 2014) e Programa do Ratinho (SBT, 12
anos, 2010). Nota-se ainda que enquanto o caso do SBT sugere estar resolvido, o
programa da Record parece continuar a desrespeitar o horário protegido da faixa, e em
ambos os casos sugerem uma demanda do DEJUS de monitorar e notificar os infratores
(o que, especula-se, já tenha ocorrido). Outro ponto importante de problema nessa faixa
são programas que violam o horário limite por poucos minutos, como no caso do CQC
(Band, 12 anos, 2010) que iniciava-se às 19h50. Esse é um problema esporádico, mas
sugere que emissoras podem buscar violar o horário protegido para ganhar maior
audiência logo no começo da próxima faixa horária vinculada.
Na primeira faixa noturna orientada à proteção do adolescente (20-21h) a maior
concentração de problemas refere-se à exibição de séries, como no caso de CSI, House, A
Ex, e Lei e Ordem (todos da Record, classificação 14 anos), Exterminador do Futuro,
Sobrenatural e o Mistério da Ilha (todos do SBT, classificação 14 anos), e NCIS e
Mulheres Ricas (todos da Band, classificação 14 anos). Apesar de serem casos pontuais, a
prática sugere uma tendência de inserir séries exibidas fora do horário protegido em
2 Esses casos se referem a processos de autoclassificação, que quando identificada como incorreta pelo DEJUS podem acarretar notificação da emissora e possível reclassificação. A partir de espaço de diálogo e defesa entre as partes, a emissora pode editar a obra, ou mudar ela de horário, e em casos como esse até que a decisão final saia, é incorreto indicar as obras como descumprido o horário de veiculação. Como a metodologia do artigo não permite avaliar esses casos individualmente, anotam-se estes programas como exibidos em horário impróprio, sendo que é possível que eles estejam na prática em período de ajustes de classificação a partir de demanda iniciada pelo DEJUS (o que, para fins de processo, não os classifica como descumprindo o horário).
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grade indevida3. Nota-se ainda que esse fenômeno em geral independe de diferenças de
fuso horário nas regiões.
Na segunda faixa noturna (21-22h), a concentração de problemas é pequena
(apenas 25 casos em toda a amostra), e em sua maioria se referem a exibição de filmes de
classificação 16 anos em horário impróprio (ex: A hora do pesadelo, Robocop II, e
Operação França). Há ainda duas ocorrências de filmes indicados para maiores de 18
anos exibidos na faixa (o filme A Órfã, e uma ocorrência da série Dexter).
Na terceira faixa noturna (22-23h) os poucos casos encontrados (N=8) referem-se
quase sempre à exibição de filmes com classificação 18 anos (i.e. Fúria Mortal e Cidade
de Deus). Nota-se que, especificamente sobre a exibição de obras classificadas como 18
anos, existem apenas duas outras ocorrências encontradas (os filmes Paranóia e Reno
911).
Tabela 8 – Exemplos de programa não encontrados nas afiliadas regionais
Região Rede Ano Classificação possível
Programas de culinária Um gordo na cozinha Sul Band 2012 a 2014 Livre Almoço de estrelas Norte SBT 2012 a 2013 Livre Na cozinha com o chef N SBT 2014 Livre Programas humorísticos É de graça N Band 2012 a 2014 10 anos Rapidinhas do suricate N Band 2014 Livre Autarquias do humor NE SBT 2013 a 2014 Livre Programa de música Estúdio Livre CO Band 2010 a 2011 Livre Forró da Jangadeiro N Band/SBT 2010 a 2012 Livre Paradão da semana S RedeTV 2012 a 2013 Livre Programa de variedades Exército em revista CO Band 2010 Livre Surdez na terceira idade S Band 2010 a 2011 Livre Estilo de vida CO Record 2010 Livre Programa do Bezerrão N SBT 2010 Livre
Outra análise realizada nessa seção do artigo diz respeito aos programas
classificáveis mas não encontrados na base do DEJUS. Um dos objetivos da classificação
indicativa é que todos os programas da televisão aberta passem pelo processo de
3 Aqui se aplica a notação da Nota de Rodapé anterior. Também deve-se considerar que as séries recebem classificação por episódio, e como a programação encontrada nos jornais não permite identificar qual episódio foi exibido, considerou-se a classificação mais alta encontrada.
18
classificação. Alguns programas estão dispensados de classificação (como os programas
jornalísticos) enquanto outros podem ter classificação prévia ou passarem pela
autoclassificação (que depois é monitorada pelo DEJUS). O fato de encontrarmos na base
programas que deveriam ter classificação publicada, mas que não são encontrados,
levanta um alerta sobre a necessidade de atuação do DEJUS em notificar as emissoras
regionais para classificarem seus produtos próprios.
A Tabela 8 lista os principais programas não encontrados na grade regional. Com
base em uma análise especulativa da possível classificação recebida se os programas
fossem classificados, identificamos um cenário positivo. Para essa análise, utilizamos as
descrições dos programas descritos na página das emissoras, exemplos de conteúdo
encontrados no Youtube, e o uso como referência da classificação recebida por
programas similares. Como fica claro na tabela, a maioria dos programas não encontrados
na base do DEJUS referem-se a programas Livres ou de 10 anos, e que portanto não
seriam impactados por vinculação de faixa horária.
5. Discussão
Existem duas formas de resumir os resultados desse artigo. Na primeira versão, o
impacto da classificação indicativa e da atuação do DEJUS na programação regional é
mínimo. Isso seria verdade pois o índice de compliance dos programas transmitidos é alto,
o que indica que a o mercado consegue, mesmo num país com enormes complexidades
de fuso horário, e de composição complexa de emissoras, retransmissoras, afiliadas e
redes (ver Pinto, 2013), se autorregulamentar (ou corregulamentar, visto que há
regulamentação dada pelo DEJUS) e obedecer voluntariamente aos critérios
estabelecidos pelos DEJUS. De fato, apenas 1% da programação veiculada analisada
invadiu em algum momento o horário de proteção de crianças e adolescentes. E em
apenas 2% dos casos o programa exibido que deveria ter classificação indicativa mas o
material não foi enviado a DEJUS. Indo ainda mais além, podemos realçar a quantidade
de programação Livre ou 10 anos incluídos na programação em geral, mesmo em faixas
de horário protegido, a ponto de encontramos um terço (38%) de todos os programas
exibidos nessas faixas.
No que diz respeito à invasão da faixa de horário, encontramos em geral casos
pontuais de filmes que foram exibidos em faixa errada aparecem (no caso da faixa de 11-
19
13h), ou de séries que incorrem no mesmo erro, principalmente na faixa de 21-22h. Mas
estes são casos pontuais de conflito. Afora isso, os únicos problemas repetidos referem-se
a um caso resolvido em 2010 (o Programa do Ratinho) e a outro que pode ser resolvido
facilmente (Te Peguei na TV). Dos grandes violões que geralmente ocupam o debate
como promotores de sexo, drogas e violência, em particular as telenovelas e reality shows,
foi encontrada pouca ou nenhuma desobediência ao horário protegido na grade analisada.
Sinal último de sucesso de um modelo de um possível sistema de
autorregulamentação no país: o tipo de programação em que as emissoras regionais
investem. Nenhuma obra identificada veiculada regionalmente indicava classificações
acima de 10 anos, e daquelas que não encontramos classificação, a maioria seria
provavelmente classificada como Livre.
O argumento do sucesso de uma possível ampliação do sistema de
autorregulamentação do mercado (em detrimento de uma manutenção do sistema de
corregulamentação), porém, é apenas um dos lados da moeda. Outra forma de ler os
números acima é entendê- los como resultado de um processo longo, construtivo, e
objetivo da classificação indicativa. Com critérios claros de conteúdo atrelados às faixas
de horário protegido, as redes podem ter tido condições objetivas de se programar para
criar e exibir programas dentro da faixa indicada de veiculação. Puderam ainda ter acesso
ao processo de editar filmes ou seriados quando necessário para baixar uma classificação
mais alta recebida, e o fazer voluntariamente, sem interferência do Estado.
Outro ponto a favor de ler os índices encontrados como resultado do processo de
classificação adotado no país (e não simplesmente como resultado de um processo de
regulação centrado no mercado) é a atuação pontual, ao longo dos anos, do DEJUS na
reclassificação de obras mediante monitoramento. Big Brother, séries de TV, novelas
reexibidas em horário vespertino, esses são apenas alguns dos casos de ações diretas do
DEJUS de 2010 para cá que podem ter aumentado o grau de compliance encontrado na
amostra analisada. Principalmente por lembrar que no caso do fuso horário, a ação do
DEJUS foi sempre clara quanto a obrigatoriedade do respeito ao horário local de exibição.
Não é possível estimar, com a metodologia adotada pelo artigo, qual dos dois
cenários é mais indicado para explicar os resultados encontrados. Seria o sucesso de
compliance um ato de demonstração do poder de ampliar os processos de
20
autorregulamentação do mercado, reduzindo as áreas de corregulamentação? Ou seria
este o resultado de uma ação afirmativa do Estado em implementar o processo de
classificação no país, e portanto de ampliação do processo de corregulamentação? É
impossível pender para um lado ou para outro apenas analisando a grade veiculada e a
classificação dos produtos encontrados. Mas o que é evidente com base nos dados
analisados é que a complexidade de fusos horários e de sistemas de emissoras regionais
não é, no Brasil, um obstáculo para a eficácia do sistema de vinculação horária e da
manutenção de horários protegidos.
Mesmo assim, um ponto a se refletir retoma o embate entre classificação de
programas de entretenimento, e classificação de programas policialescos. Os números
lidos acima indicam que boa parte do conteúdo da TV Aberta (50%) é isento de
classificação indicativa, o que não significa que estes sejam necessariamente livres de
conteúdos classificáveis (i.e. exibição de cenas de drogas, sexo e violência). Isso indica
que os avisos da classificação, ausentes em metade da programação do país em horário
nobre, poderiam também servir para pais e responsáveis orientar, na outra metade da
programação, crianças e adolescentes sobre o conteúdo a ser consumido.
O debate vivido pelo DEJUS em 2004 com relação aos programas policialescos
como Cidade Alerta, e o debate recente sobre a proibição de publicidade levantado pelo
CONANDA, deixam no ar desafios futuros do processo de classificação indicativa. Seria
o DEJUS o órgão indicado para classificar, para fins indicativos, programas jornalísticos
que beiram o entretenimento e o sensacionalismo (ver o debate levantado por Bucci e
Kehl, 2006)? Seria o modelo do DEJUS indicado para criar órgãos que classifiquem, para
fins indicativos, a publicidade no país (ver o debate levantado por Olmos, 2006)? A
resposta a essa questão é complexa, mas pelo que indicam os resultados do artigo, o
processo de classificação indicativa tem sido um caso de sucesso.
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