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ENCONTROS – ANO 12 – Número 22 – 1º semestre de 2014
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O SENSÍVEL E A RAZÃO:
relato de uma prática pedagógica transdisciplinar
Jacqueline Vasconcellos1 Lourdes Ferreira2 Marcelo Pangaio3
Resumo: Este trabalho descreve uma proposta pedagógica na qual as disciplinas de Artes Visuais e de Desenho Geométrico procuraram aliar a sensibilidade estética aos recursos técnicos e tecnológicos na criação de
trabalhos plásticos. A prática educativa envolveu o estudo das estéticas barroca e modernista brasileiras, bem como a análise da influência da
cultura portuguesa e do grafismo do arquiteto Athos Bulcão na azulejaria brasileira.
Palavras-chave: Transdisciplinaridade, Arte, Técnica e Tecnologia, Azulejaria.
Abstract: This paper describes a pedagogical proposal in which the
disciplines of Visual Arts and Geometric Drafting sought to combine the aesthetic sensibility to technical and technological resources in creating
plastic works. The educational practice involved the study of Baroque and Modernist aesthetics in Brazil, as well as the analysis of the influence of portuguese culture and the design of the architect Athos Bulcão in
brazilian tiling.
Keywords: Transdisciplinarity, Art, Technique and Technology, Tiling.
1 Professora de Artes Visuais do Colégio Pedro II – Campus Humaitá II. Mestre em Ensino
de Ciências da Saúde e do Meio Ambiente. Especialista em Socioterapia (FAHUPE).
Licenciada em Educação Artística (BENNETT) e Psicologia (UFRJ). 2 Professora de Desenho do Colégio Pedro II - Campus Humaitá II. Mestre em Ensino de
Ciências da Saúde e do Ambiente, com ênfase em Meio Ambiente (UNIPLI). Especialista
em Docência Superior (FABES). Licenciada em Educação Artística (BENNETT). 3 Professor de Desenho do Colégio Pedro II – Campus Humaitá II. Licenciado em
Educação Artística com habilitação em Desenho (UFRJ).
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I. O conhecimento como construção transdisciplinar
O paradigma tradicional de um conhecimento multifacetado, onde
não há trocas e nem a procura de soluções para problemas comuns, onde
as fronteiras são rígidas e hierárquicas, precisa ser transformado em um
novo modelo, no qual haja a integração entre os saberes, resultando em
uma prática educativa transdisciplinar. Desse modo, o conhecimento a
ser produzido no espaço pedagógico deve ser fruto da busca do sentido
da vida através das relações entre os diversos olhares, em uma
democracia cognitiva onde os limites entre as disciplinas se tornem
fluidos e permeáveis.
O caráter transdisciplinar do processo pedagógico evidencia um
novo modo de ver o mundo, de repensar o ato de ensinar e de aprender.
De acordo com Morin (2000, p. 15):
na escola primária nos ensinam a isolar os objetos (de seu meio ambiente), a separar as disciplinas (em vez de reconhecer suas correlações), a dissociar os problemas, em vez de reunir e integrar. Obrigam-nos a reduzir o complexo ao simples, isto é, ao separar o que está ligado; a decompor, e não a recompor; a eliminar tudo o que causa desordens ou contradições em nosso entendimento.
Como a abrangência do que se entende por leitura ultrapassa as
fronteiras das disciplinas, mediar o desenvolvimento de uma
alfabetização que vá para além das palavras é a base de uma metodologia
transdisciplinar na qual professores e alunos vão descobrindo e inferindo
múltiplos caminhos para a decodificação de mensagens e de seus
processos (FREIRE, 2002).
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A implantação gradual de projetos dessa natureza no contexto
educacional conduz a ações transformadoras, favorecendo a flexibilidade
e o pensamento crítico. Nesse sentido, os esforços para a democratização
do trabalho com imagens na escola não podem ser negligenciados, pois
os benefícios desse saber superam os aspectos unicamente estéticos,
levando os alunos à compreensão da realidade social em que vivem e a
participar ativamente de sua transformação (FREIRE, 1980).
Assim, com o propósito de estabelecer as necessárias pontes entre
as diferentes competências e saberes, já que a realidade não existe
seccionada em disciplinas estanques, foi elaborada uma proposta
pedagógica que visa atender tanto à estrutura do calendário escolar
quanto aos objetivos das disciplinas envolvidas.
II. Azulejaria: arquitetura ou decoração?
Alguns estudiosos afirmam que o termo azulejo deriva do árabe al
zullavcha ou al zulléija (pequena pedra polida ou ladrilho), já outros
afirmam que vem da palavra lazurd, assimilado do persa lachuard (pedra
semipreciosa, de intensa cor azul, também conhecida como lápis-lázuli).
O que se sabe é que o azulejo é uma placa de cerâmica, geralmente pouco
espessa e quadrada, tendo uma das faces revestida por uma substância
vítrea e pintada com motivos decorativos.
Na Península Ibérica, a arte da azulejaria foi trazida pelos mouros
quando da expansão muçulmana. A influência de outras culturas
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promoveu o surgimento do estilo hispano-mourisc4 ou mudéjar, com sua
elaborada técnica e requintados desenhos geométricos (MUSEU DO
AZULEJO, s/data).
Na visita à cidade espanhola de Sevilha, um dos maiores centros
produtores de azulejos, D. Manuel I, rei de Portugal, ficou impressionado
com a exuberância da azulejaria local e, ao retornar ao seu reino, mandou
decorar o Palácio Real ou Palácio Nacional de Sintra com os azulejos
andaluzes, iniciando uma ampla utilização da azulejaria em todo o reino
português.
Em seguida surge uma nova fase, denominada ítalo-flamenga,
originária da união entre o estilo gráfico flamengo e as tendências
renascentistas, cuja minuciosa técnica pictórica resultou em uma
harmoniosa estética sem precedentes na arte da azulejaria portuguesa.
Com o fim da União Ibérica, a nobreza portuguesa desejosa de
reafirmar a identidade nacional, recentemente conquistada, mandou
construir novos palácios revestidos de azulejos importados da região de
Flandres.
4 Disponível em http: www.comunidade.sol.pt Acesso em 14.04.2014.
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A influência flamenga promoveu relevante
renovação temática, com o predomínio dos
conhecidos azul e branco e a figura avulsa5, em
que cada azulejo representava uma cena
autônoma.
Em meados do século XVIII, a rica fase joanina da monarquia
portuguesa, financiada pelo ciclo do ouro no Brasil Colonial, propiciou
um incremento da produção de azulejos em Portugal, por meio da criação
de peças com motivos mitológicos, bucólicos, religiosos ou que
retratavam o cotidiano da corte (REDE AZULEJOS, s/data).
A beleza ornamental do barroco finalmente chega à arte da
azulejaria através da proliferação dos contrates claro-escuro, dos putti
(desnudos meninos angelicais), dos painéis com motivos naturalistas,
das representações com pássaros e golfinhos e das “figuras de convite”
(pessoas da corte posicionadas nas entradas das edificações em um gesto
de boas vindas aos visitantes).
Representação dos putti6 Figura de convite7
5 Disponível em www.cml.pt. Acesso em 14.04.2014 6 Disponível em www.redeazulejo.fl.ul.pt Acesso em 15.04.2014. 7 Disponível em www.olhares.sapo.pt Acesso em 15.04.2014.
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No início do século XX, surgem as representações de cunho
histórico, o uso de formas sinuosas de enorme plasticidade e a exploração
da cor. As novas propostas estéticas buscam integrar o uso dos azulejos
em projetos modernos de arquitetura e urbanismo (MUSEU DO
AZULEJO, s/data).
III. A azulejaria no Brasil Colonial
A variedade formal da azulejaria portuguesa resulta da influência
de diferentes culturas, estimulada, ainda mais, por sua expansão
marítima. Sendo parte dessa expansão territorial, o emprego de azulejos
no Brasil seguiu o esquema da azulejaria tradicional. Os primeiros
registros datam doinício do século XVII quando foram utilizadas peças,
fabricadas na Metrópole, nas ornamentações do Convento de Santo
Amaro de Água-Fria, do Convento dos Franciscanos8 e do Colégio dos
Jesuítas, todos em Olinda, Pernambuco.
8 Detalhe da sacristia. Disponível em www.pt.wikipedia.org/Ficheiro:Convento-de-s-
francisco3-ol.jpg Acesso em 19.04.2014
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Na segunda metade do século XVII, intensifica-se pelo Brasil afora
a construção de inúmeras edificações religiosas e civis – templos,
sobrados, engenhos – sendo raro encontrar uma que fosse desprovida de
azulejos, na maioria com padrões policromáticos e os conhecidos tons de
azul (SIMÕES, 1959). São exemplos desse período os revestimentos da
Capela de Nossa Senhora do Pilar (Recife) e da Igreja do Antigo Convento
de Nossa Senhora dos Anjos (Cabo Frio, RJ); o frontão do altar da Igreja
de Nossa Senhora da Piedade (Recife) e o interior da Igreja de Nossa
Senhora dos Prazeres9 (Recife).
Quando a Corte Portuguesa fugiu para o Brasil, face à invasão
francesa, a produção de azulejos na Metrópole experimentava uma fase
de estagnação.
Por outro lado, a azulejaria no Brasil havia adquirido uma nova aplicação,
não mais se limitando ao interior das edificações, mas sendo utilizada no
revestimento externo das mesmas. Essa vertente utilitária acaba por
influenciar a produção da Metrópole, onde, até então, os azulejos eram
9 Detalhe do interior. Disponível em http: www.wikimapia.org Acesso em 19.04.2014.
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aplicados somente em “vergas de portas e janelas exteriores” (op. cit., p.
15).
É ainda no século XVIII que as casas e os palácios, principalmente
no Rio de Janeiro e no Maranhão, adotam um estilo arquitetônico de
influência francesa mantendo, contudo, o estilo formal da tradicional
azulejaria portuguesa.
Foi do Brasil – continuação de Portugal – que veio para a
velha metrópole a nova “moda” do azulejo de fachada (...)
que encheu o norte do país de chalés e vivendas, com seu
ar exótico e equatorial (...), de imóveis imponentes a dar ao
Porto, principalmente, essa continuação de “ar de família”
que notamos tão exuberantemente desde o Pará ao Rio de
Janeiro (SIMÕES, 1959, p. 18).
Casario de Palacete Pinho
10 11 12
IV. Athos Bulcão e a tradição da azulejaria barroca portuguesa
Athos Bulcão nasceu no Rio de Janeiro em 1918 e passou sua
infância na residência de Teresópolis. Como a família mantinha interesse
10 Foto da autora Professora Lourdes Ferreira. 11 Disponível em www.skyscrapercity.com Acesso em 19.04.2014. 12 Disponível em www.azulejosantigos.blogspot.com Acesso em 20.04.2014.
Casario do São Luis, Maranhão
Palacete Pinho Belém, Pará
Igreja N.S. do Desterro Rio de Janeiro, RJ
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pela Arte em geral, Bulcão frequentou, desde pequeno, teatros,
exposições e espetáculos. Aos quatro anos já ouvia música clássica e
esboçava desenhos.
A utilização de azulejos no revestimento de construções brasileiras
deriva do renascimento do uso de azulejos na modernização das cidades
portuguesas no período pós-guerra. Essa renovação conceitual
influenciou o arquiteto Lucio Costa no projeto do edifício Gustavo
Capanema (RJ), optando o autor pelo revestimento do prédio com
azulejos planejados por Portinari.
Aos 21 anos, Bulcão foi apresentado a Portinari com quem
trabalhou na decoração do mural de azulejos da Igreja de São Francisco
de Assis. A Igreja13 faz parte do Complexo da Pampulha (Belo Horizonte),
obra idealizada por Oscar Niemeyer:
Primeiro edifício moderno tombado pelo
Patrimônio Histórico do Brasil.
A arquitetura de Niemeyer voltou a integrar o azulejo, agora de
Athos Bulcão, naquela que era a sua visão de uma cidade do futuro e que
veio a materializar-se na nova capital, Brasília.
13 Disponível em www.fundathos.org.br Acesso em 18.04.2014.
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Bulcão potencializa a arquitetura dentro desse projeto trabalhando
as peculiaridades oferecidas pelo espaço projetado e as relações deste
com a paisagem e com a natureza, como a incidência da luminosidade
solar.
Detalhes de revestimentos idealizados por Athos Bulcão.14
Em seus azulejos, com forte influência das linhas curvas e
sinuosas do Barroco português, destacam-se a modulação e o grafismo,
habilmente criados com base em formas geométricas. Sua obra, inscrita
em alguns dos principais edifícios modernos brasileiros, notabiliza-se
pelo equilíbrio encontrado nas relações entre arte e arquitetura, entre
estaticidade e dinamismo, entre a unidade e o conjunto.
A trajetória artística de Athos Bulcão é essencialmente
consagrada ao público em geral. Não ao que frequenta
museus e galerias, mas ao que entra acidentalmente em
contato com sua obra, quando passa para ir ao trabalho,
à escola ou simplesmente passeia pela cidade, impregnada
de sua obra, que “realça” o concreto da arquitetura de
Brasília (MUSEU DO AZULEJO, s/data).
Bulcão trabalhou, ainda, como desenhista gráfico ilustrando vários
livros e revistas literárias, além de fazer cenários para peças de teatro
14 Disponível em www.fundathos.org.br Acesso em 18.04.2014
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como Tio Vânia de Tchekov e O Dilema de um médico de Bernard Shaw
(MESQUITA, 2008). O artista faleceu em Brasília, em 21 de julho de 2008,
aos 90 anos.
V. Prática: união entre o sensível e a técnica
Tanto o Desenho quanto a Arte são linguagens que envolvem
estruturas mentais que potencializam o pensamento visual. Segundo
Rodrigues (1999, p.6), “quaisquer que sejam as estratégias e
instrumentos utilizados, o que se deve entender por ‘pensamento visual’
é um potencial de dimensão ampla, ou seja, um leque de capacidades
que atuam conjuntamente.” Dentre as capacidades mencionadas pela
autora, citamos: percepção, análise, síntese, criatividade, visualização de
soluções, avaliação.
Por outro lado, também não podemos esquecer as especificidades
de cada área que, antes de serem obstáculos, são oportunidades de
captar a diversidades de ‘olhares’ e de ampliar as possibilidades de
criação, observando-se, neste caso, os limites impostos pela
estrutura/composição da matéria.
Nas múltiplas formas em que o homem age e onde penetra seu pensamento, nas artes, nas ciências, na tecnologia, ou no cotidiano, em todos os comportamentos produtivos e atuantes do homem, (...) São análogos os princípios ordenadores que regem o fazer e o pensar (...) Embora os conceitos dinâmicos possam ser análogos, o fazer concreto (...) diferencia-se pelas propostas materiais a serem elaboradas em cada campo de trabalho, de acordo com o caráter da matéria (OSTROWER, 2001, p. 31).
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VI. Relato da Prática Educativa
As atividades foram desenvolvidas com seis turmas do 8o Ano do
Ensino Fundamental do Colégio Pedro II – Campus Humaitá II, tendo
cada turma aproximadamente trinta alunos. No primeiro momento os
alunos foram informados do projeto, de suas características
transdisciplinares, das regras e possibilidades de trabalhos.
Nos encontros iniciais das aulas de Artes Visuais, os alunos
analisaram através de imagens o estilo barroco em diferentes momentos
da História da Arte, inclusive comparando a estética europeia com a
brasileira. Em relação a esta última, foram observados os aspectos
formais na arquitetura e na pintura, buscando registrar a presença do
barroco nos períodos colonial e moderno brasileiros.
Paralelamente, nas aulas de Desenho, as turmas assistiram a uma
apresentação sobre o desenvolvimento da azulejaria portuguesa, na qual
foram mostradas imagens que exemplificavam a influência de diferentes
culturas na estética e na fabricação portuguesa.
A criação dos módulos/azulejos teve como inspiração o trabalho do
artista Athos Bulcão, cuja produção mantém estreita relação com os
conteúdos programáticos de Desenho e Artes, tendo em vista o caráter
geométrico de seus azulejos, a presença da influência portuguesa e a
importância de sua produção no campo das artes e da arquitetura
modernista brasileira.
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A trajetória artística de Bulcão foi apresentada às turmas tanto nas
aulas de Arte quanto nas de Desenho, sendo abordados os aspectos
relevantes relacionados às duas áreas. Consideramos ainda que seria
interessante mesclar dois estilos estéticos presentes na azulejaria
brasileira: o Barroco português e o modernismo de Athos Bulcão. Isso se
traduziu pelo uso das cores, limitado ao branco e aos tons de azul (uma
das características dos azulejos portugueses), e pela livre escolha das
formas na criação do módulo/azulejo que serviria de base para as etapas
seguintes do projeto.
A elaboração desse módulo utilizou, inicialmente, o papel (prancha
A4) e o lápis de cor, sendo desenvolvida em dupla, estimulando-se, assim,
a troca e a negociação entre os sujeitos. Nesse momento os alunos
aplicaram os conhecimentos sobre as formas geométricas, conteúdo que
faz parte do curso de Desenho ao longo de todo o 2o ciclo do Ensino
Fundamental. Além disso, os módulos foram feitos em escala reduzida -
igualmente um conteúdo de Desenho - para posterior reprodução nas
aulas de Artes Visuais.
Módulos produzidos pelos alunos Luiz Henrique S. M., Felipe Martinez,
Carolina Tornaghi, Ana Carolina Meireles, Ana Carolina Marques, Igor Totti e
Henrique Costa
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A partir dessa produção, os trabalhos foram levados para as
turmas nas aulas de Artes que, em grupos de quatro alunos, escolhiam
um único módulo para ser reproduzido individualmente, tendo agora
como suporte a tela e utilizando tinta acrílica.
O trabalho nessas aulas teve início com a ampliação em tela das
imagens criadas, processo ao mesmo tempo inverso e complementar ao
desenvolvido em Desenho no que tange as relações de escalas e
proporções. Os grupos passaram a transpor o módulo escolhido para
telas de 20cm x 20cm, construindo e avaliando a cada momento as
relações de tamanho, proporção e encaixe entre as telas já que as
mesmas estariam dispostas de modo a formar um único trabalho
(polípticos).
Após os esboços prontos, os alunos iniciaram a pintura com tinta
acrílica e a criação de escalas tonais para que pudessem trabalhar os
azuis característicos da azulejaria colonial portuguesa.
A experiência em se construir diferentes arranjos com as telas e a
consequente transformação das imagens a partir de suas variadas
combinações permitiu não só a visualização da maleabilidade das formas
e das múltiplas possibilidades de interpretação das imagens, mas ainda
a concretude necessária para a compreensão de análises combinatórias
matemáticas.
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Polípticos produzidos por Ana Luiza Ribeiro, Rebecca Reimol,
Carolina Tornaghi, Camila Costa e Camila Montovani.
A atividade desenvolvida no Laboratório de Informática teve como
objetivos estimular o senso estético, a percepção espacial e a criatividade
dos alunos. Além disso, no processo de criação das composições
estávamos aplicando as transformações pontuais – rotação, translação e
reflexão - conteúdos que fazem parte do programa de Desenho e que são
amplamente utilizados em projetos gráficos. A atividade consistiu na
produção de dois ‘arranjos’ distintos utilizando o mesmo módulo/azulejo
projetado pelas duplas no encontro inicial de Desenho.
Como o uso dos recursos computacionais permite a visualização
imediata do resultado final de qualquer produção artística, os alunos
puderam comparar/modificar seus desenhos em busca da melhor
solução gráfica, exercitando, desse modo, a percepção, flexibilização e a
análise crítica.
Ana Carolina Meirelles e Ana Carolina Marques
Felipe Holst e Gabriel Ruas
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VI. Considerações Finais
Neste projeto procuramos superar os obstáculos/limites impostos
pela estrutura educacional brasileira através de um trabalho
compartilhado, no qual o diálogo e a busca de pontos comuns às duas
disciplinas serviram de bases para o desenvolvimento das atividades.
A presença cada vez maior das representações visuais em nossa
sociedade determina a importância que deve ser dada ao desenvolvimento
de atividades educacionais capazes de dinamizar a capacidade dos
alunos de se expressarem graficamente. Neste aspecto, o Desenho -
enquanto recurso técnico - e a Arte - como expressão do sensível - se
tornam valiosos aliados, já que seus objetivos se relacionam com as
capacidades que atuam no processo criativo.
Há, ainda, outro aspecto a ser mencionado: a crescente presença
dos recursos tecnológicos na atual sociedade. Os jovens de hoje são
estimulados a todo o momento pelas redes de comunicação e informação,
pelos programas multimídias, pelos jogos eletrônicos e pela propaganda,
exigindo deles uma nova maneira de raciocinar, aguçando-lhes a
imaginação e a percepção. A incorporação do som e do movimento às
linguagens visuais transformou a maneira pela qual nos relacionamos
com o mundo real e o mundo das ideias (MENDONÇA, 2001).
Assim, devemos considerar que esses recursos, que tanto
encantam os jovens fora da escola, podem contribuir para que as
atividades pedagógicas se tornem mais atraentes e estimulantes.
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Ademais, as tecnologias digitais dinamizam os ambientes de
aprendizagem, uma vez que possibilitam obter, armazenar e interagir
com diversas formas de expressão.
Acreditamos que esta proposta não se encerra aqui, uma vez que o
papel do professor, como mediador do processo educativo, se explicita
através de leituras inovadoras de conteúdos pré-estabelecidos e
cristalizados nas diversas áreas do saber, objetivando ampliar a formação
dos jovens do século XXI.
Referências
Obras e Artigos
FREIRE, P. Educação como prática de liberdade. São Paulo: Paz e Terra, 1980.
FREIRE, P., MACEDO, D. Alfabetização: leitura do mundo, leitura da palavra. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002.
MENDONÇA, A. C. As redes de significados como um novo paradigma na educação. Revista Brasileira de Tecnologia, vol. 30, p. 152-153, Jan/Jun. Rio de Janeiro, 2001.
MORIN, E. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000.
OSTROWER, F. Criatividade e Processos de Criação. 15a edição. Petrópolis: Vozes, 2001.
RODRIGUES, M. H. W. L. Da realidade à virtualidade. O “pensamento
visual” como interface: contribuição das linguagens técnicas de representação da forma à Educação. Tese de Doutorado. Faculdade de Comunicação. UFRJ, 1999.
Em meio eletrônico
FUNDAÇÃO ATHOS BULCÃO. Artigos. Disponível em
<www.fundathos.org.br> Acesso em 15.04.2014.
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INSTITUTO CAMÕES. Disponível em: <http://cvc.instituto-
camoes.pt/conhecer/exposicoes-virtuais/a-arte-do-azulejo-em-portugal.html> Acesso em 13.04.2014.
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MUSEU DO AZULEJO. Cronologia do Azulejo em Portugal. Disponível em<www.museudoalzulejo.pt> Acesso em 14.04.2014.
REDE AZULEJO. Cronologia do azulejo português. Disponível em
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SIMÕES, J. M. S. Azulejaria no Brasil. Comunicação destinada ao colóquio de estudos luso-brasileiros na Bahia, 1959. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, no 14. Rio de Janeiro: MEC,
1959. Disponível em <www.iphan.gov.br/baixaFcdAnexo.do?id=3190> Acesso em 18.04.2014.
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Recebido em 30/05/2014 Aprovado em 30/06/2014