Post on 11-Oct-2020
EUTANÁSIA
Eutanásia temaprovação quasecerta e abrepolémica no PSD
As incógnitas na bancada socialista e os indecisos na bancadasocial-democrata não serão suficientes para baralhar as contas
Sofia Rodrigues
Com
o embalo da força daesquerda parlamentar(menos o PCP), a despenali-zação da eutanásia deveráser hoje aprovada, na gene-ralidade, mas o debate, por
causa de um deputado do PSD, des-
viou-se ontem para o referendo. E abancada social-democrata ficou a
braços com uma polémica.A iniciativa do deputado e ex-líder
da JSD Pedro Rodrigues de avançarcom uma proposta de referendo -que, a princípio, foi secundada por
outros seis deputados - foi o bastan-te para criar alguma confusão na ban-cada e no partido. Até porque nãoavisou previamente Rui Rio.
O deputado argumentou que a euta-násia não é apenas uma "questão deconsciência do deputado, mas sim docidadão". Mas a iniciativa do ex-líderda JSD levou a movimentações no gru-po parlamentar logo de manhã. Depu-tados que foram dados como subscri-
tores da proposta foram abordados
pela direcção da bancada que avisounão ser essa a orientação do partido.
Ao final da manhã, Adão Silva, vice-
presidente da bancada, declarava aos
jornalistas que a iniciativa avançou
"totalmente à revelia" da direcção do
partido e seria "inconsequente", jáque não seria agendada para debateem plenário. O gesto é "completa-mente inaceitável", criticou, susten-tando que é preciso "articulação"com a direcção do partido.
À tarde, alguns dos deputados dados
como subscritores, como AlbertoMachado (líder da distrital do Porto),Sandra Pereira, Carlos Silva e Cristóvão
Norte, demarcaram-se da iniciativa dePedro Rodrigues. Mantiveram-sePedro Alves e Paulo Leitão, líderes das
distritais de Viseu e de Coimbra, alémdo promotor da iniciativa.
Pedro Rodrigues, que apoiou Rui
Deputados do PSD favoráveis à despenalização, como Rio, não votam nec iissariamente a favor de todas as propostas em causa
Rio para a liderança do PSD, reiteroua sua posição "de princípio". "Pormuito que me tentem isolar, estouconfortável com a minha convicção.Estou ao lado dos militantes do meupartido e do meu eleitorado. (...) Dis-cutirei este tema no conselho nacio-nal", declarou por escrito, lembrando
que o recente congresso aprovou uma
moção a favor do referendo.À voz dissonante de Pedro Rodri-
gues juntou-se uma outra de um depu-tado que é favorável à eutanásia. Oex-líder da distrital de Lisboa, Pedro
Pinto, saiu em defesa do referendo e
contestou a decisão da direcção detentar travar uma proposta nesse sen-
tido. "Não podemos andar a discutiro sistema político e a moralidade da
política dos deputados e, em contra-
partida, dizer sim a tudo o que venhanão sei de onde", afirmou aos jorna-listas, sustentando que o grupo parla-mentar "é um órgão nacional" do PSD
e tem de ter posição sobre o assunto.À tarde, Rio evitou falar aos jorna-
listas no Parlamento e fez saber quevota a favor da despenalização da
morte assistida. Ao seu lado deverãoestar pelo menos mais quatro deputa-dos da bancada do PSD ao abrigo daliberdade de voto dada: Adão Silva,
que vota a favor do projecto do PS e
abstém-se nos outros; Duarte Mar-
ques; Sofia Matos; e Hugo Carvalho.A aprovação da despenalização da
eutanásia (prevista nos cinco projec-tos de lei de PS, BE, PAN, PEV e Inicia-tiva Liberal) deverá ser garantidapelos votos a favor da totalidade dos
deputados do Bloco (19), PAN (4), PEV
(2), Iniciativa Liberal (1) e de Joacine
Katar Moreira. Assim como estão cer-
tos, do lado do contra, os votos doPCP (10), CDS (5) e do deputado do
Chega (1). Mas a votação não será a
mesma para todos os projectos: o
deputado da IL e o sodal-democrataAdão Silva, por exemplo, só votam afavor da iniciativa do PS. Nas outrasabstêm-se.
Só as bancadas do PS (108) e do PSD
(89), às quais é dada liberdade de
voto, deverão dividir-se: entre os
socialistas, maioritariamente a favor,há quatro deputados que votam con-tra as cinco propostas: AscensoSimões, Pedro Cegonho, José LuísCarneiro e José Leitão. O primeirodeputado votou contra em 2018 e os
três últimos escreveram artigos de
opinião no PÚBLICO e anunciar o seusentido de voto.
As incógnitas na bancada do PS e os
indecisos na do PSD não serão sufi-cientes para baralhar as contas, ape-sar de terem sido as votações cruzadasdo PSD que, em Maio de 2018, contri-buíram para o chumbo de todas as
propostas. Então, foi o projecto do PS
que ficou mais perto de ser aprovado,com 110 votos a favor, 115 contra(incluindo os de Ascenso Simões eMiranda Calha) e quatro abstençõesde sociais-democratas. Os diplomasdo Bloco e do PEV tiveram a mesma
votação global - 104 a favor, 117 contrae oito abstenções - e o do PAN obteve102 votos favoráveis, 116 contra e 11
abstenções. No PSD, só Teresa LealCoelho e Paula Teixeira da Cruz (quejá não estão no Parlamento) se assu-
miram a favor dos quatro projectosem 2018. Bruno Vitorino absteve-seno do PAN e votou contra as restantesiniciativas. Também Cristóvão Nortesó votou a favor da do PAN e absteve-se nas restantes. Duarte Marques,outro social-democrata de quem se
esperava o voto a favor, só apoiou as
iniciativas do BE e d'Os Verdes, nos
projectos do PS e PAN absteve-se. Mar-
garida Balseiro Lopes, líder da JSD,
apenas disse "sim" ao projecto do PS.
Desta vez, encontra-se fora do país e
não votará, com Sônia Sapagesrodrigues@publico.pt
0 que propõem os partidos
Quem pode candidatar-se àassistência médica naantecipação da morte?
, BE, PAN, , INCidadãos nacionais, ou
legalmente residentes noterritório, maiores de idade, comlesão definitiva ou doença
incurável e fatal, causadora deum sofrimento atroz e intolerável,conscientes e capazes deentender o alcance do pedido.Pessoas com doença mental ecrianças podem candidatar-se?
BE, PAN, ILNão.
Quem pode administrar osfármacos letais (eutanásia) oudisponibilizá-los para que odoente os auto-administre(suicídio assistido)?
, BE, PANMédicos ou enfermeiros sob
supervisão médica.
PEVMédicos.ILO médico responsável, cujapresença é obrigatória, e outroprofissional de saúde.Quantos médicos avaliam opedido do doente?
PSNo mínimo, dois: o "médicoorientador" e um especialista na
patologia do doente e que podecancelar o procedimento. Podehaver lugar ao parecer de umpsiquiatra. O processo avançacom o aval da Comissão de
Verificação e Avaliação doProcedimento Clínico deAntecipação da Morte (médico,enfermeiro e especialista embioética) e da Inspecção dasActividades em Saúde.BEDois ou três. Além do "médico
Decidir com serenidade
OpiniãoJosé Luís Carneiro
Luz dos dados conhecidos,sou contra a eutanásia. Sou¦¦ contra por entender que o
B^H Homem é Liberdade, sendoRazão. E é Razão sendo
M BLiberdade. É uma Unidade
que também é um Todo e é um Todo
que também é Unidade. O Homem é
eminentemente um "ser" social.Descobre-se "no" outro e "com" o
outro. Acrescento: realiza-se "pelo"outro. O Homem é, por isso,
"intersubjetividade". Impõe, pois,um olhar "compreensivo". O
individualismo, de per si, conduz oHomem à dissolução dessa sua
condição fundamental. Ora, se é
dever da sociedade, expressão da
razão, respeitar a individualidade
expressa na autonomia e naautodeterminação da vontade, é
também seu dever tudo fazer parapromover e preservar a vida
individual, até aos limites doconhecimento técnico e científico.Contribuindo para remover os
elementos nocivos - a dor e o
sofrimento - que levam à formaçãodessa vontade.
O Humanismo cristão, oHumanismo de Erasmo de Roterdão,os alicerces do liberalismo social e
político partem de um imperativoético e moral que coloca na defesada vida humana todos os meios dasociedade e do Estado. E oiluminismo fundador das sociedades
e Estados modernos reforçou e
alimentou a crença no progresso e
na razão técnica como solução paraos problemas do Homem. Essa é,
aliás, desde os primórdios da
humanidade, a mais imperativarazão da sociedade e do Estado.
Quero, contudo, reconhecer queos projetos que os vários deputados,eleitos pelo PS e por outros partidos,apresentam em sede de discussão e
votação no Parlamento não deixamde integrar a liberdade e a razão. É
nessa sensatez que assenta a
justificação para que o seu projetotenha o apoio da maioria. Cuidam de
garantir o respeito pela formação e
autodeterminação da vontadeindividual e, simultaneamente,procuram garantir um escrutínio,
concomitante e consecutivo, dessavontade individual por parte de
quem assume, em nome do Estado,a responsabilidade de realizar o
acompanhamento da vontadeindividual. Ouvi com atenção as
palavras dos meus colegasdeputados. A maioria vota a favor
pela mesma razão que eu votocontra. Por entenderem que o fim deum sofrimento duradouro,tecnicamente sem cura, está na
procura de uma certa dignidade nomodo de encarar o fim da vida.
Para mim, a formação e
autodeterminação da vontade de
partir será sempre o resultado de
circunstâncias objetivas e subjetivase cumpre-nos a todos, comosociedade assente em determinadosvalores e politicamente organizada,atuar sobre essas circunstânciastendo em vista promover e garantiro desejo e a vontade de viver. Porquea sociedade será sempre muito maisdo que a soma de vontadesindividuais.
Deputado do PS
responsável", escolhido pelodoente, e do especialista napatologia em causa, pode ser
requisitada a avaliação de um
psiquiatra. Numa fase posterior, o
processo é escrutinado por três
profissionais de saúde queintegram a Comissão de
Avaliação dos Processos de
Antecipação da Morte.
Dois (médico titular e psiquiatra^além dos três médicos e doisenfermeiros da Comissão de
Verificação responsável pelaemissão dos pareceres prévios.
PANTrês. Formulado, o pedido éanalisado por uma equipa de trêsmédicos: aquele a quem foi
dirigido o pedido, um especialistae um psiquiatra. Exige-se aindaum parecer prévio da Comissãode Controlo e Avaliação da
Aplicação da Lei (dois juristas,médico, enfermeiro e um
especialista em bioética).ILDois ou três. O pedido deve ser
expresso ao médico de família,por exemplo, e o doente ficaobrigado a cumprir três H
dias de reflexão, acompanhadopor um psicólogo. Depois, odossier é remetido para um
especialista. Caso o parecer sejafavorável, pode ainda ter de sersubmetido a um psiquiatra e,depois, ao crivo de umacomissão (dois juristas, um
médico, um especialista embioética e um enfermeiro.E se o doente ficarinconsciente?
, BE, PAN, , ILO procedimento não se realiza.Prevê-se o direito à objecçãode consciência dos médicos?
, BE, PAN, , ILSim.Quais os locais onde oprocedimento pode ser feito?
, BE, PAN, ILNos estabelecimentos do SNS e
dos sectores privado e socialcom internamento e local
adequado. Pode ser praticado
em casa do doente ou noutrolocal por ele indicado, desdeque o médico conclua que há
condições.
Só em hospitais públicos,atendendo à obrigatoriedade deo doente ser tratado no Serviço
Nacional de Saúde, e não emprivados, "de modo a evitareventuais ânsias de negócio".Como é formalizado o pedido?
, BE, PAN, , IL Por escrito,mas há procedimentos previstospara que, não podendo assinar,o doente se faça substituir por
pessoa designada. A assinaturadeste terá sempre de fazer-se na
presença do médico (sobre o
qual incide a obrigação deinformar o doente dostratamentos disponíveis,nomeadamente ao nível doscuidados paliativos) e,
eventualmente, de outrastestemunhas. O processo é
suspenso, caso decorra ou seinicie um processo judicialvisando a declaração da
incapacidade do doente.Os pedidos são depoissubmetidos ao aval das
comissões de Verificaçãocomuns às diferentes propostas.Quantas vezes tem de serreiterado o pedido?
, BE Até cinco vezes.Quatro vezes.
PAN Formalmente, duas vezes(aquando da formulação do
pedido e antes da morte). Pelomeio, o médico fica obrigado a
verificar que o doente mantém a
sua vontade "um númerorazoável" de vezes,pressupondo-se que o médicoconsultado e o psiquiatra o
façam também.
IL Depois de verbalizado o
pedido, e cumprido o períodode reflexão obrigatório, estedeve ser reiterado por escritoaté sete vezes, consoante o
processo requeira ou não a
intervenção de um psiquiatra.Natália Faria
Um referendo tem muitosperigos, muitas emoções,muitos alçapões, mas osdeputadostambémtêmperigos, emoções e alçapões
Eutanásia sem paliativosé "coagir" a "umaescolha capciosa"
Miguel Oliveira da Silva O professoradmite rever a sua oposição à
despenalização da eutanásia quandotodos tiverem acesso a paliativos
EntrevistaNatália Faria
Promover
a despenalizaçãoda eutanásia quando 80%das pessoas não têm acessoa cuidados paliativos "éaltamente incorrecto do
ponto de vista ético e da
justiça e da equidade", considera
Miguel Oliveira da Silva, professorde Ética Médica e ex-presidente doConselho Nacional de Ética para as
Ciências da Vida.Quando a despenalização daeutanásia foi votada pelaprimeira vez estava contra "porprincípio e regra". Mantém essa
posição?Este debate é urgente mas há umaurgência maior, superlativa, que é anecessidade de cuidados paliativospara toda a população - mesmosabendo que há doentes que podemrecusar os cuidados paliativos e
pedir a eutanásia. Mas, tratando-sede uma questão de consciência, tem
de haver direito à escolha. F
para haver escolha tem dehaver pelo menos umaalternativa. Ora, 80% a85% dos doentes não têmacesso a cuidados
paliativos no ServiçoNacional de Saúde -algumas consultasdemoram seis mesesa ser marcadas e, emdoentes terminais,seis meses bastam
para morrer odoente. Portanto,estamos perante uma
situação em que não háliberdade nem justiça e nemequidade. E estarmos a
promover uma lei quando 80%das pessoas não têmpossibilidade de escolher,
porque não têm outra opçãosenão pedirem a eutanásia, éaltamente incorrecto do pontode vista ético e da justiça e da
equidade. E concordo com [oconstitucionalista] Jorge Miranda
quando diz que a ausência decuidados paliativos é umainconstitucionalidade por omissão.
Portanto, estamos a ferir a
Constituição por omissão. Quando oEstado disponibiliza a eutanásia e
não disponibiliza cuidados
paliativos está a coagir a pessoa a
uma escolha enviesada e capciosa.Admitiria a discussão, adespenalização da eutanásia, seo país estivesse devidamentedotado de cuidados paliativos?A discussão admito-a sempre e a
prova de que a discussão é
importante é que nos últimos dias
quatro subscritores da petição"Direito a morrer com dignidade",de 2016, vieram acrescentar pontos
importantes. O médicoConstantino Sakellarides, por
exemplo, veio defender quea comissão de verificação e
\de avaliação prevista nalei tem a obrigação de
recusar o pedido deeutanásia se o doentenão tiver tido direito
a cuidados
paliativos.Havendo garantiade cuidadospaliativosacessíveis,
admitiriaposicionar-se a
favor da eutanásia?Quando isso
acontecer, terei todo o
gosto em rever senecessário a minha opinião.
É capaz de antecipar odesfecho da votação [dehoje]?É óbvio que, se houver votação,
vai passar à especialidade. Acho
que era bom haver umanegociação para o referendo entre
as votações na generalidade e na
especialidade. Sei que é difícil,
porque parece que a Assembleia e oGoverno não querem, portanto,alguém tem de propor isso aoPresidente da República, já que ainiciativa não pode ser dele. Masacho que é mais saudável haver umreferendo do que corrermos o risco
de, de 20 meses em 20 meses,maiorias sempre conjunturais ediversas votarem uma questão de
importância superlativa como esta
com resultados opostos. Há 20meses, votou-se contra; 20 meses
depois, vamos votar a favor. E quemé que me diz que na próximaAssembleia da República, com outra
composição, não se vai reverter isto
outra vez? Um referendo temmuitos perigos, muitas emoções,muitos alçapões, mas os deputadostambém têm perigos, emoções e
alçapões. Prefiro o referendo a istotudo. Além do mais, a eutanásia nãoconstou dos programas eleitorais doPS e do PSD.A petição para um referendo deiniciativa popular poderá alteraro curso dos acontecimentos?Se tiver 60 mil proponentes, seria
gravíssimo que o Parlamento a
ignorasse. Para mim, a questão estáem saber o que vai fazer oPresidente da República. Há
pessoas que sonham que o católicoMarcelo Rebelo de Sousa se
recusará a promulgar a lei daeutanásia.Poderá sempre remeter a leipara o Tribunal Constitucional.Pode. Para o professor JorgeMiranda a lei tem duasinconstitucionalidades - a vidahumana é inviolável e ainconstitucionalidade por omissão
por causa da ausência de cuidados
paliativos. Mas toda a gente diz quea posição no Constitucional é
imprevisível.
nfaria@publico.pt
Referendo? "Esta nãoé uma decisão de simou de não simples"
José Manuel Pureza 0 deputado do BEe vice-presidente da Assembleia daRepública é das das vozes em São Bentoa favor da despenalização
[Cuidados paliativos eeutanásia] não são coisasalternativas, são abordagenscomplementares naquilo que é
o combate a uma morte má
EntrevistaLiliana Borges
0deputado do Bloco de
Esquerda e vice-presidenteda Assembleia da
República diz que temaprendido muito "com otrabalho de profundidade"
que foi feito no Parlamento e foradele sobre morte assistida. Aos quepedem um referendo responde queé o "argumento dos que procurampretextos para deslegitimar umprocesso que é legítimo".Há hoje mais condições paraaprovar a eutanásia?Acredito que há umamadurecimento sobre esta
questão. É um debate que vem dehá muito tempo, que teve umaprofundamento grande na últimalegislatura. Tudo isso está presente,não se apagou e, portanto, acredito
que os argumentos que entretantoforam adicionados à discussão
permitem a cada deputado ter uma
reflexão mais serena. Os
vaticínios relativamente às
aritméticas só se fazem no fim,mas creio que será sempre umadecisão mais amadurecida do
que a da legislatura anterior.
Que debate é que aindafalta fazer?
Acho que para aquelessectores que reclamam faltade debate nunca haverádebate que chegue. E, naverdade, sejamos sérios,este debate está presentenos países quedespenalizaram a morte Iassistida. Éum debate I
continuado e é assim quedeve ser em sociedades
pluralistas e democráticas.
Ninguém reclama que se
chegue a um momento em
que o debate termina paratodo o sempre. Isso não existe e
nem deve existir.
Receia que seja aprovado umreferendo?Não tenho nenhum receio, nenhum
democrata deve ter receio de uminstrumento democrático como é oreferendo. Não concordo que hajareferendo em relação a esta
questão. Está mais do que provadoque esta não é uma questão a pretoe branco, não é uma decisão de simou de não simples. É uma decisão
que envolve muita ponderação. Nãoé despenalizar sem mais, é
despenalizar em circunstâncias
perfeitamente delimitadas. E isso é
que pode fazer uma lei, não é aquiloque é perguntado num referendo -sim ou não, ponto final.Não há nenhum parecer positivosobre os projectos apresentados.Há margem para melhorá-los?
Há sempre margem. Os projectossão muito próximos, no essencial e
portanto, creio que a haver, como~
espero, uma aprovação na
generalidade serárazoavelmente fácil haver umesforço de aproximação. Os
projectos são muitorigorosos, muito bem feitosdo ponto de vista jurídico edo ponto de vista da
ponderação de todos os
valores em causa.
Qual é o calendário paraa lei entrar em vigor?Não faço nenhum vaticíniosobre datas. Não o querofazer porque há umtrabalho que deve ser feito:
o de aproximação de pontosde vista, de ponderação devários argumentos, váriasmedidas de precaução e de
determinação.O que responde a quem diz que,ao partirmos para a eutanásia,estamos a desistir dos cuidadospaliativos?Primeiro, empenhando-metotalmente, eu e o BE, no reforçoquantitativo e qualitativo doscuidados paliativos que são
prestados em Portugal. O BE
apresentou uma proposta para quehaja uma equipa de suporte acuidados paliativos em cada
agrupamento de centros de saúde e
para que haja uma equipa decuidados paliativos em todos os
centros hospitalares e em todas as
delegações regionais do IPO. Em
segundo lugar, chamo a atençãopara que a realidade dos países quedespenalizaram a morte assistida é
a de uma grande maioria das
pessoas que solicitaram a
antecipação da sua morte poreutanásia serem pessoas que estãonesse mesmo momento numaabordagem de cuidados paliativos.Não são coisas alternativas, são
abordagens complementaresnaquilo que é o combate a umamorte má.
Espera um veto do Presidente daRepública?O que o Presidente da Repúblicafará, só o Presidente da República
sabe. Há uma coisa que eu sei: oPresidente da República tem diantedesta lei, como de todas as outras,três hipóteses: ou veta ou envia parao Tribunal Constitucional (TC) oupromulga. Tenho ouvido muita
gente comentar que o Presidente ouveta ou manda para o TC. Não! Ele
pode promulgaríeis, costumafazê-10. Lembro apenas que naúltima legislatura este Presidentedisse, em consonância com o quetinha proferido no momento em
que se candidatou, que jamaisvetaria uma lei sobre a
despenalização da morte assistida
por razões pessoais. Isto quer dizer
que não será a mundividênciapessoal do cidadão Marcelo Rebelode Sousa que interferirá no seu juízosobre uma lei que venha a ser
aprovada no Parlamento.
liliana.borges@publico.pt