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ISSN: 1983 - 1072 Janeiro a Dezembro de 2013
Edio EspecialN 32/33
ndice
Apresentao............................................................... 03
Artigos
A Ascenso do Pagamento por Servios Ambientais no
Brasil: Negociando uma Governana Policntrica.........06
Caminho do Meio: Propostas para a Operacionalizao
da Poltica Nacional de Pagamentos por Servios
Ambientais......................................................................16
Cotas de Reserva Ambiental (CRA) na Nova Legislao
Florestal Brasileira: Uma Avaliao Ex Ante.................. 24
Potencial Mercado de Cotas de Reserva Ambiental em
So Paulo e Mato Grosso: Perspectivas em Diferentes
Contextos....................................................................... 30
O Potencial de CRA em um Municpio no Arco do Desmatamento: Cotriguau-MT ................................... 36
A Crise Hdrica Paulista e seus Atenuantes: Panorama
Atual do Uso do Solo nas reas de Contribuio do
Sistema Cantareira - Implicaes para PSA................. 42
X Encontro da ECOECO - Vitria 2013....................... 46
O Imbrglio do Clima: Debate.................................... 49
Curso de Ps-Graduao em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro(CPDA/UFRRJ) Av. Presidente Vargas 417 - 8 Andar - Rio de Janeiro - RJ
Tel: (21) 2224 8577 - Ramal 233 E-mail: ecoeco.secretaria@gmail.com
Informes............................. 02
XI Encontro Nacional da Sociedade Bras i l e i ra de Economia Eco lg ica (ECOECO) e VII Congreso Iberoamericano de Desarrollo y Ambiente (CISDA) 2015."Aplicaes da Economia Ecolgica nas Polticas Pblicas Latino - Americanas"
Instrumentos Econmicos para Conservao
da Biodiversidade e Servios Ecossistmicos
Nmero Publicado em Dezembro de 2014
8 a 11 de Setembro de 2015 - Araraquara-SP, Brasil.
Universidade Estadual Paulista (UNESP) Campus de Araraquara Faculdade de Cincias e Letras
Datas importantes: Data-limite para envio do resumo expandido
15 de abril de 2015.
Divulgao dos resultados da seleo
de trabalhos:
15 de maio de 2015.
Data-limite para pagamento de inscrio
para trabalhos selecionados:
30 de junho de 2015.
Mais detalhes no site da ECOECO (www.ecoeco.org.br)
O objetivo do encontro promover uma
aproximao dos estudos e pesquisas no campo da
economia ecolgica com estratgias e polticas para a
gesto da sustentabilidade no mbito do setor pblico,
do se tor pr ivado (empresas e assoc iaes
empresariais) e de organizaes no-governamentais.
Estamos observando o agravamento de problemas
ambientais no Brasil, na Amrica Latina, no mundo todo.
O enfrentamento destes impe a urgncia de aes
XI Encontro Nacional da Sociedade Brasileira de
Economia Ecolgica (ECOECO) e VII Congreso
Iberoamericano de Desarrollo y Ambiente (CISDA) 2015 "Aplicaes da Economia Ecolgica nas Polticas
Pblicas Latino-Americanas"
integradas, construdas a partir da juno de
competncias acadmico-c ient f icas com a
experincia de gesto ambiental de atores pblicos e
privados. Assim, neste evento conjunto XI ECOECO e VII
CISDA 2015, pretendemos aproximar mais a Economia
Ecolgica das experincias e recomendaes de
polticas pblicas de sustentabilidade.
EC ECBoletim N 32/33 Janeiro a Dezembro de 2013
EC ECExpedienteDiretoria:Clvis Cavalcanti ( Presidente de Honra)
Diretoria Executiva:Peter Herman May (Presidente)Luciana Togeiro de Almeida (Vice-Presidente)Joseph Weiss (Tesoureiro)Cltia Helena Backx Martins (Secretria)Valria Gonalves da Vinha (Suplente)
Ncleo Norte:Oriana AlmeidaPhilip Martin FernasideSrgio Luiz de Medeiros Rivero
Ncleo Nordeste:Franciso Correia de OliveiraIhering Gugoes Alcoforado de CarvalhoMaria Ceclia Junqueira LustosaSuely Salgueiro Chacon
Ncleo Centro-Oeste:Alexandre Magno de Melo FariaAndr Luiz Campos de AndradeJoo Paulo Soares de AndradeLuciana Ferreira da SilvaMauricio AmazonasThomas Ludewigs
Ncleo Sudeste:Carlos Eduardo Frickmann YoungDaniel Caixeta AndradeEnrique OrtegaJos Eli da VeigaJos Gustavo FeresPaulo Gonzaga Mibielli de CarvalhoShigeo ShikiSonia Maria Dalcomuni
Ncleo Sul:Lucio Andr de Oliveira FernandesMaria Carolina Rosa GulloValdir Frigo DenardinUwe SpangerAdemar RomeiroFrederico Cavadas BarcellosMaria Amlia Rodrigues da Silva Enriquez
Projeto grfico e diagramao:
Cludio Ferraz
O pagamento da anuidade
conjunta realizado por
intermdio da Sociedade
Internacional de Economia Ecolgica (ISEE) ou
atravs do seu site (www.isecoeco.org), ou
atravs da prpria ECOECO.
Formas de pagamento e maiores informaes na
pgina de filiao da ISEE
(http://theisee.wildapricot.org/) ou no site da
ECOECO (www.ecoeco.org.br).
ISEEThe International Societyfor Ecological Economics
Apresentao
Aproveito o fim do ano para refletir como esta virada traz,
conjuntamente, complicaes de fundo e oportunidades para a
sustentabilidade da economia brasileira. Em parte, tais complicaes so
fortemente relacionadas s polticas pblicas equivocadas no que diz
respeito gesto dos recursos naturais. Sobrepujando todos os demais em
intensidade de dano provvel acoplado minimizao de prioridade por
parte do poder pblico, estamos vivendo uma das piores crises de
disponibilidade de gua j enfrentadas pelo Sudeste do pas (sem falar na
seca no Nordeste, que atingiu seu terceiro ano consecutivo, em 2014).
Procuradas as solues, a tica persiste em focar no capital construdo e no
no capital natural, ou seja: transposio, canais, encanamento so as
prioridades... Timidamente, tenta-se promover a economia de uso, atravs de
"incentivos e no multas", como defende o governador de So Paulo, Geraldo
Alckmin, embora, efetivamente, o sobreuso pelos grandes consumidores
deva ser sobretaxado.
No que tange s solues de longo prazo, que possam surgir a partir
de uma tica alternativa, voltadas ao capital natural, h a perspectiva de
compensao pela proviso de servios ecossistmicos. Retornamos neste
nmero do Boletim da ECOECO a este assunto, que continua atraindo
considervel ateno da poltica pblica ambiental. A exponencial produo
cientfica sobre os pagamentos por servios ambientais (PSA), associada
ateno do Congresso a este instrumento que mereceu debate por mais de
sete anos consecutivos em sucessivos projetos de lei sobre a matria sem
ignorar a crtica precificao de natureza implcita nesta estratgia de
mercado , continuam a absorver considervel ateno, talvez desmedida,
considerando os parcos resultados efetivamente alcanados em projetos
PSA at o momento.
Neste nmero, acompanhamos o debate sobre PSA no pas,
apresentando resumidamente duas contribuies recentes importantes. A
primeira, coordenada por Emilie Coudel (economista do CIRAD, lotada na
Embrapa Amaznia Oriental, em Belm) contou com a participao de vrios
EC EC Boletim da Sociedade Brasileira de Economia Ecolgica
4
integrantes da ECOECO, e ser publicada em verso
completa num livro organizado por Roldan Muradian
(um dos co-autores). O trabalho versa sobre a evoluo
do pensamento sobre PSA no Brasil, desde os
primrdios das tentativas de segmentos do governo e
de assentados rurais em implementar o programa
Proambiente, passando por experincias locais com o
apoio de ONGs e prefeituras, at o presente em que se
debate a implantao de um programa nacional de PSA.
O segundo trabalho deste bloco, apresenta os
resultados de uma consulta tcnica patrocinada pelo
WWF-Brasil em 2014, com o apoio de outras entidades
da sociedade civil junto com segmentos da academia,
relativa formulao do PL 792-2007, que trata do
programa e do Fundo Nacional do PSA. Os participantes
nesta consulta chegaram concluso que o PL deve ser
reformulado para superar vrios defeitos contidos na
sua concepo, entre os quais o conceito de
adicionalidade adotado, e a hegemonia federal prevista
no PL sobre a gesto de recursos financeiros.
Registramos um dilogo com a diretoria da ECOECO
quanto pertinncia em propor a volta estaca zero nas
negociaes do projeto, considerando as mudanas
que ocorreram na composio do Congresso a partir de
janeiro de 2015.
Finalmente, Bruno Puga e Oscar Sarcinelli,
doutorandos da UNICAMP, descrevem uma anlise do
potencial de um sistema PSA para apoiar a proviso de
servios hidrolgicos, com enfoque no Sistema
Cantareira, em So Paulo, crucial fonte de gua para a
regio metropolitana, que enfrenta a pior crise da sua
histria.
O segundo bloco de trabalhos contidos neste
nmero do Boletim diz respeito a outro instrumento
econmico: a Cota de Reserva Ambiental (CRA),
incorporada como componente da nova legislao
florestal do pas, aps revises do Cdigo Florestal
contidas na Lei 12.651/2012. A CRA j tinha sido
incorporada em outras edies do Cdigo Florestal,
sucessivamente reeditadas via Medida Provisria pelo
governo FHC nos anos 90, com o ttulo de Cota de
Reserva Florestal, se referindo s Reservas Legais em
propriedades privadas em todo o pas.
A nossa discusso comea com uma reviso
das origens do mecanismo chamado, em ingls, de
Tradable Development Rights, amplamente aplicado
nos EUA e em outros pases para conservar recursos
naturais prioritrios, estimulando a troca de permisses
de uso com outras reas, de modo a propiciar um
resultado ambientalmente mais adequado. O trabalho
de May et al. relaciona tentativas de avaliar a eficcia do
instrumento em gestao no Brasil de forma ex ante. Tal
avaliao esbarra numa srie de incertezas na
regulamentao, que afetaro o seu potencial de
assegurar uma maior rea conservada com menor
custo.
Outros dois trabalhos relacionados com a CRA
foram includos na nossa coletnea. O primeiro, de
Paula Bernasconi resume os resultados de simulaes
da CRA efetivadas pelo Projeto POLICYMIX no estado
de So Paulo e, posteriormente, em Mato Grosso
(baseado em Micol, et al.), evidenciando um menor
custo para atingir as metas da nova legislao florestal
ao permitir trocas no mesmo bioma. Ao definir
prioridades para conservao da biodiversidade de
acordo com os critrios dos inventrios do BIOTASP em
So Paulo, elevam-se os custos. No entanto, a
priorizao permite que o instrumento proteja uma
proporo maior da biota ameaada.
A aplicao dos critrios da CRA para o Estado
EC ECBoletim N 32/33 Janeiro a Dezembro de 2013
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de Mato Grosso indica uma maior oferta de reservas
legais do que a demanda potencial do Estado, fazendo
com que houvesse a perspectiva de preencher parte
desta demanda oriunda de outros estados do Cerrado
e/ou da Amaznia. O caso de Mato Grosso
aprofundado no trabalho de Andrade et al. em
Cotriguau, mostrando o potencial de trocas dentro do
mesmo municpio, permitindo atingir os objetivos da
nova legislao sem necessitar de um massivo
investimento em restaurao ou procura de imveis em
outros locais. O principal problema identificado em
todos os casos o potencial efeito do grande excedente
de oferta devido s isenes e anistias concedidas pela
legislao sobre o preo alcanado nas trocas, o que
pode fazer com que o mercado no se materialize,
inviabilizando o instrumento, apesar dos esforos da
BVRio de criar um mercado voluntrio em CRA.
Finalmente, nosso nmero inclui reflexes do
nosso ex-Presidente Paulo Mibielli e da Professora
Sandra Dalcomuni sobre os resultados do X Congresso
da Sociedade ECOECO, realizado com grande xito,
em Vitria-ES, em agosto de 2014. Outra comunicao
do Paulo reflete sobre um debate de especialistas
ocorrido no Rio de Janeiro no dia 15 de dezembro de
2014 sobre os resultados da COP20 da UNFCCC para
os esforos de atingir as metas de controle de emisses
de gases de efeito estufa no Brasil. Esperamos que os
trabalhos reunidos sejam valiosos para os seus
trabalhos e a continuidade do nosso dilogo, que
continuar com maior fora ainda em 2015, com a
realizao do XI congresso da ECOECO em conjunto
com a VII CISDA, reunindo todas as sociedades
regionais da Economia Ecolgica da Amrica Latina e
da Pennsula Ibrica. O Congresso ser realizado entre
os d ias 08 e 11 de se tembro de 2015, na
UNESP/Araraquara, sob a coordenao da Professora
Luciana Togeiro de Almeida. O anncio e chamada de
trabalhos acompanha este nmero do Boletim.
Um feliz e produtivo (mas decrescido!) 2015
para todos.
Rio de Janeiro, 27 de dezembro de 2014
Peter H. May
EC EC Boletim da Sociedade Brasileira de Economia Ecolgica
A Ascenso do Pagamento por Servios Ambientais no
Brasil: Negociando uma Governana Policntrica.
Autores: E. Coudel J. Ferreira , M. Amazonas , L. Eloy , M. Hercowitz , L. Mattos , P. May , R. Muradian , M.G. Piketty , F. Toni1,2,3, 2 3 4 5 6 7 8 1 3
1. CIRAD, UR Green, 34398 Montpellier, Frana
2. Embrapa Amaznia Oriental, Belm, Brasil
3. Universidade de Braslia, Centro de Desenvolvimento Sustentvel, Braslia, Brasil
4. CNRS UMR Art-Dev 5281 Universit Montpellier 3, Frana
5. Pau Brasil, Economia Ecolgica e Gesto Socioambiental, So Paulo, Brasil
6.Embrapa Cerrados, Planaltina-DF, Brasil
7. Curso de Ps-Graduao em Cincias Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro-CPDA/UFRRJ, Rio de Janeiro, Brasil
8. Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro, Brasil
Introduo
No final da dcada de 1990, os Pagamentos
por Servios Ambientais (PSA) tornaram-se o novo paradigma da poltica ambiental, propondo conectar os
atores que se beneficiam dos servios ambientais com
os que contribuem com o fornecimento de tais servios
(Engel et al., 2008; Pagiola et al., 2004). Uma grande
variedade de modelos foi agrupada sob esta
terminologia comum, variando desde arranjos
estritamente de mercado at as polticas pblicas
nacionais. O PSA tem sido largamente definido como
"uma transferncia de recursos entre atores sociais, que
pretende criar incentivos para alinhar as decises sobre
o uso da terra (individuais e/ou coletivas) com o
interesse social na gesto dos recursos naturais"
(Muradian et al., 2010: 1205).
No Brasil, o caso do PSA particularmente
interessante para ilustrar como diferentes modelos
surgiram, seguindo agendas distintas, e como se
consolidaram. Enquanto o PSA em outros pases, como
a Costa Rica e o Mxico, tem sido administrado pelos
governos nacionais (Le Coq et al., 2012; Corbera et al.,
2009), no Brasil, o PSA foi implantado no comeo da
dcada de 2000 pelas ONGs e pelos governos locais,
dando espao a uma experimentao considervel e
direcionado para uma diversidade de prticas em todo o
pas (Pagiola et al., 2012; Guedes e Seehusen, 2011).
Arcabouos legais e recursos especficos foram
progressivamente sendo criados para apoiar a
implantao dos esquemas de PSA em diferentes nveis
de governana (Santos et al., 2012). Existem vrios
trade-offs entre os diferentes nveis de governana
(Larson and Ribot, 2009; Toni, 2011). No que se refere ao
nvel local, as aes de governana podem ser
pe rceb idas por es ta rem ma is p rx imas s
1. FAO (2007) define "servios ambientais" como os servios ecossistmicos,
associados s atividades humanas. Portanto, mais comum se referir a
"Pagamentos por servios ambientais", uma vez que se trata de uma
6
recompensa pela prestao recebida por meio das atividades humanas (ou
atravs de restrio do uso humano). Esta terminologia ser mantida para todo
o artigo.
EC ECBoletim N 32/33 Janeiro a Dezembro de 2013
preocupaes e necessidades dos atores e os custos
de transao e monitoramento podem ser mais baixos.
Entretanto, falta frequentemente aos governos locais a
capacidade para executar tais governanas, havendo o
risco de uma "captura" pela elite. Com relao aos nveis
mais altos, apesar de os governos poderem praticar
economias de escala e limitar vazamento (leakage), o
monitoramento pode tornar-se mais complexo, com a
provvel resistncia por parte dos atores locais. As
complementariedades entre os nveis de governana
pode tornar esta governana mais eficiente (Nagendra e
Ostrom, 2012), mas na prtica as relaes de poder
estabelecem, com frequncia, o equilbrio entre os
nveis e os modelos de poltica dominante.
Revises diferentes do PSA no Brasil tm sido
realizadas ao longo dos anos, proporcionando
descries detalhadas das experincias e dos sistemas
legais (e.g., Pagiola et al., 2012; Guedes e Seehusen,
2011; Santos et al., 2012). Nosso objetivo aqui no de
acrescentar mais um estudo a este conjunto j
exaustivo, mas de analisar mais amplamente os
processos associados s experincias do PSA no Brasil,
em particular as tenses e complementariedades que
surgiram entre os atores ao longo do caminho e como
isso progressivamente configurou-se numa governana
policntrica. Grande parte dos autores deste captulo
esteve envolvida em pesquisas de experincias de PSA
e vem acompanhando processos legislativos e
observando de perto as dinmicas de aes entre os
atores envolvidos. Dessa forma, busca-se no presente
trabalho revelar os cenrios institucionais dos
processos de deciso, junto com as relaes de poder e
as controvrsias sociais, tendo como objetivo mostrar,
como ressaltado por Shi (2004), que no h respostas
nicas s perguntas polticas e normativas.
1. O surgimento progressivo do PSA no Brasil: principais agendas e processos.
1.1 Primeiro passo: idealizao dos incentivos
socioecolgicos.
Os movimentos sociais da Amaznia brasileira
foram os primeiros a idealizarem o PSA, uma vez que
estes instituram o Proambiente entre os anos de 2000 e
2002, em parceria com as ONGs regionais. O
Proambiente consistiu em uma proposta de poltica
pblica para implantar um modelo novo de uso da terra,
com base na gesto dos recursos naturais, nos quais o
PSA teria um papel importante no incentivo da transio
(Hall, 2008). A proposta tinha por objetivo combinar
nveis diferentes de gesto e planejamento, envolvendo
planos de produo individual, acordos comunitrios,
atravs de certificao participativa, bem como planos
de desenvolvimento territorial (Mattos e Hercowitz,
2011). Este projeto piloto foi concebido para envolver
mais de 20.000 famlias de produo rural, em nove
estados da Amaznia brasileira.
Durante o primeiro ano do governo do
Presidente Lula, em 2003, a proposta do Proambiente foi
includa no Plano Plurianual de 2004-2007 com a
participao de diversos rgos governamentais, em
particular o Ministrio do Meio Ambiente (MMA) e o
Ministrio do Desenvolvimento Agrrio (MDA). Os
movimentos sociais esperavam que o Proambiente se
transformasse num programa de governo, porm estes
no tinham considerado a necessidade de estabelecer
7
EC EC Boletim da Sociedade Brasileira de Economia Ecolgica
1 .2 . Expec ta t i vas l i gadas a REDD+: 1 .2 . Expec ta t i vas l i gadas a REDD+: envolvimento dos governos estaduais e federal.envolvimento dos governos estaduais e federal.
condies de pagamento verificveis pelo Programa .
Isto causou um rompimento com o MMA em 2005. O
pagamento foi implantado, em 2006, para 2.555 famlias
de produo rural registradas no Proambiente, porm
s durou seis meses (Mattos, 2010). A assistncia
tcnica e extenso rural foram implementadas somente
na fase inicial do Programa (nos primeiros dois anos),
antes das prticas sustentveis preconizadas pela
in ic iat iva serem adotadas pelas fam l ias. O
planejamento territorial e os acordos comunitrios no
foram implantados.
A despeito das falhas do Proambiente, sua
conseqncia maior foi a mobilizao social para
demandas de po l t i cas pb l i cas , as qua is
reconheceriam a proviso dos servios ambientais,
motivando um debate nacional nos ministrios e no
congresso a partir de 2006.
1 .2 . Expec ta t i vas l i gadas a REDD+: envolvimento dos governos estaduais e federal.
A crescente agenda internacional referente s
mudanas climticas reforou a discusso nacional
sobre a promoo dos servios ambientais. Entretanto,
a partir de 2003, grande parte da ateno passou a ser
focada na reduo de emisses de gases de efeito
estufa nas florestas naturais, atravs do mecanismo de
compensao REDD .O governo federal brasileiro vem
2. REDD+ : Reduo das Emisses do Desmatamento e Degradao, com "+",
significando a conservao dos estoques de carbono e a gesto sustentvel
das florestas.
3. A principal doao do governo da Noruega, que prometeu US$ 1 bilho
entre 2009 e 2015.
4. GCF uma iniciativa de colaborao subnacional de alguns estados de sete pases da Amrica do Norte e Sul. Seis estados brasileiros participam: Acre,
Amap, Amazonas, Par, Mato Grosso e Tocantins.
5. Trs estados j promulgaram leis direcionadas a REDD+: Amazonas em
8
2007, Acre em 2013 e Mato Grosso em 2014; mais trs outros estados esto na
frase preparatria.
6. O Brasil recebeu mais de US$ 266 milhes, com compromisso adicional para
m a i s d e U S $ 8 1 9 m i l h e s , p a r a 1 2 p r o j e t o s o f i c i a i s
(http://www.forestcarbonportal.com, acesso em 23/05/2014). Os projetos existentes
incluem: reas protegidas, tais como a Juma Sustainable Use Reserve, o
primeiro projeto brasileiro certificado envolvendo a REDD+; terras indgenas
tais como o Suru Indgenous Territory, por exemplo; e projetos desenvolvidos
em terras particulares, tais como o Purus Forest Conservation Project.
argumentando que o mecanismo REDD+ no deve ser
usado para compensar as emisses dos pases
industrializados, devendo, em vez disso, ser financiado
pelas doaes bilaterais e multilaterais (Santilli et al.,
2003 ; MMA, 2012). Para consolidar esta estratgia, o
governo federal lanou o Fundo Amaznia em 2008,
com o objetivo de financiar projetos de reduo de
emisses relacionados s mudanas de uso da terra na
regio amaznica (Moutinho et al., 2011). A legislao
nacional relativa REDD+ foi inicialmente proposta em
2009, apesar de ainda estar em estudo pelas comisses
do Congresso Nacional Brasileiro.
medida que a legislao nacional de REDD+
avana a passos lentos, os estados da Amaznia
definiram suas estratgias de REDD+ como, por
exemplo, a participao na Fora Tarefa dos
Governadores para o Clima e a Floresta (GCF) (May et
al., 2011; Toni, 2011). Neste frum, defendida uma
abordagem aninhada (nested approach) com
participao no mercado de carbono, portanto contrrio
posio do governo federal (MMA, 2011). Para
legitimar sua posio, oito estados da Amaznia j
criaram um sistema regulatrio para a mudana de
clima e os servios ambientais (Pavan e Cenamo, 2012).
as iniciativas de REDD+ de escala local avanaram
rapidamente, sendo o Brasil o maior captador de
doaes para os projetos de REDD+ at o momento. A
maior iniciativa de REDD+ atualmente o Programa
+2
3
4
5
6
EC ECBoletim N 32/33 Janeiro a Dezembro de 2013
Bolsa Floresta, lanado em 2007 pelo Governo do
Estado do Amazonas, numa parceria de mltiplos
atores, envolvendo 15 Unidades de Conservao
Amaznicas e beneficiando mais de 30.000 pessoas.
Com base na experincia da Reserva de Uso
Sustentvel do Juma, o programa oferece pagamentos
diretos s populaes locais junto com outros incentivos
para estimular a prestao de servios ambientais (Hall,
2008). Apesar do reconhecimento dos impactos sociais
de benefcios desses programas (e.g., Brner et al.,
2013; Mohammed et al., 2013), um ponto crtico
importante a necessidade de uma melhoria no
monitoramento do desmatamento e da degradao
florestal, a fim de assegurar a condicionalidade e,
portanto, a efetividade do programa (Tejeiro and
Stanton, 2014).
Junto com os pagamentos privados e
voluntrios, muitos projetos se beneficiaram do Fundo
Amaznia, embora muitas crticas apontem a
burocracia e as dificuldades de acesso aos recursos,
mesmo para os projetos aprovados. O setor da
sociedade civil tem sido fundamental para fomentar
as condies de iniciativas dos estados e municpios ,
tendo as ONGs frequentemente um papel central nos
arranjos hbridos de governana.
Entretanto, o REDD+ aparenta estar numa
situao paradoxal: o programa surge no cenrio de
poltica domstica com a expectativa de receber
recursos internacionais; ainda que a crise econmica
global tenha lanado dvidas crescentes na
credibilidade dessas expectativas de recursos. Os
projetos de REDD+ at o momento no venderam seus
crditos nos mercados internacionais de carbono e os
PSA prometidos s populaes locais no se
materializaram em sua maioria. Assim, o REDD+ pode
muito bem se tornar uma poltica financiada em nvel
nacional. Neste contexto, os avanos na preparao do
REDD+, estabelecendo as linhas de base e metas para
as redues de emisses nacionais e para a preparao
de um sistema confivel de Monitoramento, Relatrio e
Validao (MRV), podero possivelmente reforar os
sistemas futuros de PSA.
1.3 Consolidao da experincia do PSA em torno da agenda da gua.
No inicio de 2001, o governo federal, atravs da
Agncia Nacional de guas (ANA), lanou o Programa
Produtor de gua para apoiar a gesto de bacias
integradas, com a inteno de facilitar os sistemas de
PSA guas descentralizados (Pagiola et al., 2012). No
sudeste do Brasil, devido ao fornecimento de gua ter se
tornado um problema srio para as grandes cidades,
como o Rio de Janeiro e So Paulo, o Banco Mundial e
ONGs ajudaram os estados e municpios na tentativa de
criar esquemas de PSA. Atravs de uma parceria de
7. At a presente data, este fundo financiou uma variedade de projetos REDD:
ao todo 54 projetos receberam recursos no reembolsveis para investimentos
mistos de aproximadamente US$ 390 milhes (Boletim Fundo Amaznia,
Maro 2014).
8. A maioria dos projetos financiados so coordenados por ONGs (35%),
sendo o restante liderado pelos estados (33%) e municpios (15%).
9
7
8
EC EC Boletim da Sociedade Brasileira de Economia Ecolgica
mltiplos nveis (ANA, governos do Estado de So Paulo
e Minas Gerais , The Nature Conservancy e
organizaes locais), dois experimentos pilotos de PSA
foram lanados em 2006: Conservador das guas em
Extrema (MG) e na bacia dos rios Piracicaba, Capivari e
Jundia PCJ.
Durante os anos posteriores, os projetos PSA
proliferaram rapidamente no bioma da Mata Atlntica
nas regies Sul e Sudeste, com 80 projetos identificados
em 2010 (Guedes e Seehusen, 2011), principalmente
para a conservao dos recursos hdricos atravs da
proteo e restaurao das matas ciliares. medida
que REDD+ ganhou visibilidade, as empresas e ONGs
vislumbraram a oportunidade de suplementar os fundos
de gesto hdrica com recursos dos fundos de mercado
de carbono. Com base nessas experincias, os
municpios e os estados comearam a construir um
sistema regulatrio para dar suporte ao PSA. Santos et
al. (2012), por exemplo, identificou 20 projetos de
legislao estaduais e 7 municipais de PSA.
O governo do Estado de So Paulo, apoiado
pelo Banco Mundial e a ONG The Nature Conservancy
(TNC), desempenhou um papel particularmente ativo na
definio da poltica estadual para disseminar
esquemas de PSA ligados gua no sudeste do pas.
Aprendendo com a experincia de vrios programas
PSA, com os quais instituies brasileiras tiveram
experincias ao longo dos anos anteriores, foi lanado o
programa Mina D'gua em 2009. No incio de 2013, a
Secretaria de Meio Ambiente (SMA) realizou acordos
9. Entrevista com Helena Carrascosa, 18/04/2013.
10. ANA recebe um oramento anual de cerca de US$ 7 milhes para
desenvolver o programa. Estes 20 projetos representam um investimento de
US$ 12 milhes, o que significa que fontes adicionais de recursos so
necessrios. (entrevista com Devanir Garcia dos Santos, 29/04/2013).
10
com 21 municpios. Como o estado no tinha recursos
para implantar um projeto com seu corpo de tcnicos ,
esta abordagem ajudou na construo da capacidade
operacional necessria.
A governana do PSA de mltiplos nveis foi
tambm reforada pela ANA, ao encorajar novas
iniciativas a serem includas no Programa Produtor de
gua. Em 2013, este programa tinha 20 projetos em
implantao, envolvendo uma rea de 310.000 ha e
1.016 produtores. A ANA no coordena os projetos em
si, mas faz a mediao entre as vrias entidades,
promovendo os arranjos institucionais e financeiros, a
expertise tcnica e captao de recursos, quando
necessrio (cerca de 10-15% do valor total de cada
projeto) .
A multiplicao dos sistemas locais de PSA, no
Sul e Sudeste e, agora, na regio central do Brasil
atende a uma demanda local importante em termos de
gesto dos recursos hdricos nas bacias hidrogrficas
estratgicas. Embora a var iedade de aes
institucionais permita a adaptao dos projetos aos
contextos locais, os mecanismos adequados para dar
escala a tais sistemas ainda so incipientes (Pagiola et
al. 2012).
1.4. Rumo ao Sistema federal de PSA: projetos de lei e o novo Cdigo Florestal Em 2006, aps as demandas dos movimentos
sociais ligados ao Proambiente e com as promessas de
negcios nos mercados de carbono e gua, o PSA
9
10
EC ECBoletim N 32/33 Janeiro a Dezembro de 2013
11. Oito Projetos de Lei foram submetidos em 2007 e mais seis at 2009.
12. O novo Cdigo Florestal (Artigo 41, 4, Lei 12.651) estipula que as APPs e
RLs podem representar uma "adicionalidade" elegvel para serem
comercializadas nos mercados domsticos e internacionais para reduo dos
GEE. Em termos, isto uma contradio, uma vez que a "adicionalidade"
definida como um aumento nos servios do ecossistema o qual no ocorreria
na ausncia de um programa. Entretanto, h numerosos atores, incluindo
oficiais do governo, que sustenta este argumento da "adicionalidade". 11
ganhou relevncia entre vrios grupos de interesse.
Este tema emergente se materializou, em 2007, numa
avalanche de projetos de lei (PL) no legislativo, cada um
abordando diferentes estruturas e interesses . O Poder
Executivo (representado pelo MMA) props um projeto
de lei em 2009, apresentando uma poltica nacional para
PSA (PL 5487/2009). Os projetos de lei anteriores,
incluindo aqueles do governo, foram transformados num
s pacote, substituindo o PL 792/2007, que tem evoludo
medida que as negociaes continuam entre os
comits das Cmaras federais. No entanto, o
entusiasmo inicial no legislativo referente ao tema
esfriou rapidamente. Na verdade, na arena domstica
brasileira, a batalha poltica aconteceu em torno da
reviso do Cdigo Florestal, em que o PSA tornou-se o
elemento estratgico.
As di ferentes agendas anter iormente
envolvidas com discusses de PSA cristalizaram-se ao
redor do debate do Cdigo Florestal. Os movimentos de
agricultura familiar destacaram o potencial da prestao
dos servios ambientais. Os grandes proprietrios de
terra defendiam o seu lado, mas no processo, as
prticas agrcolas ficaram totalmente excludas; o foco
permaneceu somente na cobertura florestal. Uma
aliana inesperada entre os ambientalistas e o grupo
rural levantou a questo sobre a adicionalidade . Os
ambientalistas queriam legitimar os pagamentos
destinados a ajudar reas j sob proteo legal. Os
grandes proprietrios tinham como objetivo receber os
11
12
pagamentos para conservao ou restaurao das
reas de Proteo Permanente (APPs) e Reserva Legal
(RL) localizadas nas propriedades privadas.
O novo Cdigo Florestal (Lei n 12.651, aprovada em 25
de maio de 2012), reconheceu o PSA pela primeira vez
dentro do arcabouo legal nacional, ainda que de
maneira ambgua. O ponto mais polmico que permite
os pagamentos ou incentivos aos grandes proprietrios
para manuteno ou restaurao das APPs e RLs
(Artigo 41), o que em princpio viola a Constituio que
probe o pagamento de um benefcio pblico para
cumprimento da Lei. Entretanto, uma tentativa de
incentivar os grandes proprietrios a respeitarem a Lei,
dado o histrico descumprimento, podendo assim
oferecer servios ambientais importantes.
Neste interim, o governo federal avanou na
agenda socioambiental de PSA criando em 2011 o Bolsa
Verde. O programa concede pagamentos s famlias
que vivem em extrema pobreza e tm direitos ao uso da
terra em reas de relevncia ecolgica (principalmente
as Unidades de Conservao). A mesma estrutura
operacional do Programa Bolsa Famlia (um programa
social federal de transferncia de renda) foi usada pelo
Bolsa Verde, que registrou 59.000 famlias at meados
de 2014 . Apesar disso, a condicionalidade ambiental
do programa levanta algumas interrogaes. As famlias
assinam um contrato para limitar os impactos do meio
ambiente, mas como isto ser monitorado ainda no
est claro.
13
14
13. Cada famlia recebe aproximadamente US$ 150 a cada trs meses.
14. http://www.mma.gov.br/desenvolvimento-rural/bolsa-verde/item/9141
(consultado em 29/05/2014)
EC EC Boletim da Sociedade Brasileira de Economia Ecolgica
2. Que tipo de governana emerge deste
processo?
O Congresso brasileiro pode estar prximo de
aprovar a poltica nacional de Pagamentos por Servios
Ambientais . No entanto, as ONGs e os governos
estaduais se opem a essa poltica, que no representa
a diversidade de experimentos regionais e locais em
andamento e advertem que sua aprovao pode
colocar obstculos numa ferramenta em princpio
flexvel. difcil prever qual ser o direcionamento das
discusses e a flexibilidade dos acordos entre os nveis
diferentes de governana. Os processos analisados
mostram que as relaes entre os nveis de governana
e setores podem ter muitas facetas. Atribuio do poder,
descentralizao e re-centralizao so processos
constantes, que so negociados entre o governo
federal, nveis de governana mais baixo e outros
setores, conforme os interesses dos atores (Andersson
et al., 2006; Toni, 2011).
No caso da agenda florestal, a governana de
nveis mltiplos torna-se uma questo complexa.
Embora, os estados e municpios sejam incentivados a
se engajar na gesto ambiental, frequentemente faltam
capacitao e incentivos para a execuo dos projetos
(Toni e Kaimowitz, 2003). Como REDD+ trouxe
promessas de recursos, os municpios e estados
ficaram motivados para se engajar nas discusses
nacionais e internacionais direcionadas para o
desenvolvimento do mecanismo. No entanto, como a
questo florestal estratgica para o governo brasileiro
nas negociaes internacionais, desejvel manter o
controle sobre REDD+. Este o paradoxo clssico de
REDD+ (Phelps et al., 2010; Sandbrook et al., 2010), que
resultou em certa re-centralizao da agenda florestal
em alguns pases. No Brasil, no entanto, os estados tm
um grau mdio de autonomia e poder, possibilitando-os
a construir uma agenda forte de REDD+/PSA (Toni,
2011). Apesar das ONGs desempenharem um papel de
defesa referente abordagem aninhada com REDD+
para implantar seus projetos, essas se tornaram
tambm consultoras importantes para os governos
estaduais e federal. Essas instituies tm apoiado as
aes em curso para regularizao fundiria e
formao da capacitao local, dois pontos cruciais no
reforo da legislao florestal, mas tambm para
qualquer adaptao futura do PSA em apoiar os
esquemas REDD+. Por isso, a coordenao
emergente entre as entidades, mas sob regras e
monitoramento rgidos estabelecidos pelo governo
federal.
No caso da agenda socioambiental, um dos
principais desafios est relacionado ao custo e
complexidade dos programas PSA ligados s prticas
agroambientais, em adio preservao de reas
naturais. Ainda que algumas organizaes sociais
tenham tentado melhorar a certificao participativa de
tais prticas, esta estratgia mostrou-se impossvel sem
um programa apoiado pelo governo federal. Como a
agenda social foi integrada no programa Bolsa Verde,
isto comprometeu seu potencial para a adicionalidade
ambiental. Um projeto aprovado dentro do Fundo
Amaznia iniciou recentemente esquemas de PSA em
algumas reas plo do Proambiente e pode se tornar um
15. Conforme mencionado anteriormente, aps quatro anos de suspenso,
um Projeto de Lei Substituto foi submetido ao Congresso (Maio de 2014).
16.O Projeto "Assentamentos Sustentveis na Amaznia," dirigido pelo 12
15
16
IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amaznia)
(http://www.fundoamazonia.gov.br).
EC ECBoletim N 32/33 Janeiro a Dezembro de 2013
exemplo no estabelecimento da estruturao da
governana para apoiar o PSA agroambiental. No
entanto, as avaliaes realizadas aps o Proambiente
mostram que os agricultores querem, principalmente,
assistncia tcnica para desenvolver as atividades de
modo correto ambientalmente, em vez de pagamentos
diretos (Costa, 2008). O governo federal tem trabalhado
para criar uma nova organizao com o objetivo de
coordenar a assistncia tcnica, podendo assumir um
papel facilitador de maneira semelhante ANA. Um
novo instrumento poder se reforar neste contexto, o
Crdito Ambientalmente Condicionado, o qual
fornecer incentivos para os agricultores a mudar suas
prticas de manejo da terra.
Concluso
Ao traar a emergncia do PSA no Brasil, trs
processos diferentes so revelados: um para valorizar
as prticas agroecolgicas; um devotado s florestas e
dirigido ao REDD+; e um para consolidar a gesto da
gua. Estas trs agendas diferentes se influenciaram
parcia lmente entre s i , mas se confrontaram
verdadeiramente quando o PSA foi discutido dentro do
novo Cdigo Florestal. Isto um preldio para o debate
sobre a Poltica Nacional de PSA, o qual est
comeando novamente.
O PSA iniciou um debate no Brasil sobre o
possvel papel dos incentivos positivos da poltica de
13
EC EC Boletim da Sociedade Brasileira de Economia Ecolgica
meio ambiente. A sua dimenso simblica foi criando
muitas expectativas para valorar os esforos daqueles
que fornecem os servios ambientais. As vrias
experincias ratificam a disposio de muitos tipos de
atores, desde os fundos privados s organizaes da
sociedade civil at os governos locais para se engajar
no debate nacional e avanar suas ideias para renovar
as pol i t icas ambientais. Di ferentes t ipos de
coordenao foram se consolidando em torno dos
esquemas de PSA, nem sempre de maneira pacfica,
mas as tenses tambm permitiram os atores a negociar
seus papis e encontrar complementariedades nas
aes de governana policntrica. O desafio para a
pol t ica do governo federal oferecer mais
possibilidades para a coordenao entre os nveis
distintos de governana. O perigo, porm, que a
poltica nacional possa permanecer incua e pouco
eficiente se limitar-se a definir regras bsicas que j
ex is tem em nve is loca is ou se meramente
burocratizarem as experincias existentes.
Construir polticas sempre um processo de
argumentao coletiva (Bogelund, 2007), que se baseia
em pontos de vista, prioridades e posicionamentos
diferentes. Bogelund (2007) considera que a chave para
o processo argumentativo nesta construo garantir
que os diversos grupos de atores estejam engajados no
processo de avaliao. Esse processo de avaliao
coletiva das experincias de PSA em curso poder
permitir os atores avanarem alm de uma descrio
tcnica das experincias de PSA para realmente avaliar
as aes de governana e suas limitaes, de acordo
com os pontos de vista daqueles engajados no
processo.
14
EC ECBoletim N 32/33 Janeiro a Dezembro de 2013
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EC EC Boletim da Sociedade Brasileira de Economia Ecolgica
Em resumo
O texto apresenta o processo e principais
resultados obtidos na primeira fase da Iniciativa
"Diretrizes para Poltica Nacional de Pagamentos por
Servios Ambientais" que contou com a participao
das organizaes WWF-Brasil, CIFOR, The Nature
Conservancy, Fundao Grupo Boticrio de Proteo
Natureza, IDPV, Imazon, IPAM, Movimento Empresarial
pela Biodiversidade, Instituto Internacional de
Educao do Brasil, Forest Trends e SOS Mata Atlntica.
A Poltica Nacional de Pagamentos por Servios
Ambientais objeto do Projeto de Lei 792/2007 que
atualmente encontra-se na Comisso de Finanas e
Tributao da Cmara dos Deputados, aguardando
parecer final para ser encaminhado a Comisso de
Constituio e Justia e, logo ao Senado. As
recomendaes para a operacionalizao da PNPSA
representam um posicionamento entre diversos
especialistas e organizaes da sociedade civil
interessadas no tema, buscando, entre outras
finalidades: (I) contribuir para a melhoria do PL 792 e
demais instrumentos legais para operacionalizao do
Caminho do Meio: Propostas para a Operacionalizao da
Poltica Nacional de Pagamentos por Servios
Ambientais. Mariana Ferreira ; Marcos Rugnitz ; Claudio Klemz
PSA no Brasil; (II) servir como material de referncia para
a elaborao do respectivo decreto de regulamentao
da Lei, bem como para o futuro decreto referente ao
artigo 41 do novo Cdigo Florestal, que prope vrias
modalidades de compensao para proprietrios que
mantm ou reconstituem a Reserva Legal e/ou APPs,
entre os quais o PSA; (III) contribuir para a formulao e
execuo de iniciativas regionais (estaduais,
municipais) e privadas. Para isso, foi necessrio
elaborar um documento de referncia a partir da reviso
do histrico da tramitao do PL-792/2007 na Cmara
dos Deputados e consulta a especial istas e
representantes da sociedade civil.
A partir dessa informao foi elaborada uma
verso preliminar das recomendaes, tendo
inicialmente em considerao os comentrios e
posicionamentos j apresentados pela sociedade civil
aos relatores do PL, a partir de cinco encontros.
O documento passou por trs rodadas de
anlises dos especialistas, incluindo ainda uma
reunio tcnica com parceiros realizada na cidade de
1. Superintendncia de Polticas Pblicas - WWF-Brasil
2. Especialista em Servios ecossistmicos, consultor WWF-Brasil
3. Coordenao de Articulao Equipe de Servios Ambientais - The Nature
Conservancy.
16
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EC ECBoletim N 32/33 Janeiro a Dezembro de 2013
Braslia no dia 4 de junho de 2014, na qual
participaram 26 representantes de 16 instituies,
incluindo entre estes a Sociedade Brasileira de
Economia Ecolgica-ECOECO. O texto completo com
as recomendaes para a operacionalizao da
Poltica Nacional de PSA poder ser visualizado em
http://www.wwf.org.br/informacoes/bliblioteca/.
A Importncia e o Histrico do Tema.
O tema de Pagamentos por Servios
Ambientais/Ecossistmicos (PSA/E) tem se tornado uma
agenda prioritria no Brasil com o fortalecimento de uma
economia baseada na conservao florestal, produo
agropecuria sustentvel e na manuteno dos servios
essenciais do meio ambiente para a sociedade. Entre
outros benefcios, o PSA/E busca reconhecer atravs de
incentivos as aes de recuperao e/ou conservao
ambiental, realizadas por indivduos ou grupos que
visem garantir a proviso de servios ecossistmicos
para a sociedade. O uso de tal instrumento econmico
permite que beneficirios de servios ambientais
remunerem financeiramente ou de outras formas os
provedores de tais servios de modo a garantir a
conservao dos ecossistemas.
No Brasil, o tema ganhou fora em 1997, a partir
da lei da Poltica Nacional de Recursos Hdricos que, de
maneira preliminar, instituiu a necessidade de
pagamento por uso da gua e reinvestimento na prpria
bacia hidrogrfica. Posteriormente, em 2003, com a
iniciativa do governo federal, comeou um programa de
desenvolvimento socioambiental denominado
Proambiente, visando compatibilizar a conservao do
meio ambiente a processos de desenvolvimento rural
regional na Amaznia.
A partir da experincia do Proambiente e de
iniciativas privadas desenvolvidas em paralelo, diversos
projetos de lei sobre PSA foram propostos no mbito da
Cmara dos Deputados, Senado e na esfera estadual,
alm de serem abordados em diferentes polticas, leis e
programas governamentais. Ao mesmo tempo, foi
atravs de iniciativas locais, lideradas por estados,
municpios, comits de bacias e iniciativa privada que
as primeiras experincia prticas ganharam corpo.
Atualmente, levantamentos destacam que existem mais
de 28 iniciativas, incluindo leis e decretos identificados
em nveis estadual e federal, assim como projetos de lei
federais ainda em discusso relacionados a PSA e
REDD+, sendo a maioria no Sudeste, Sul e Norte do
Brasil.
Nos ltimos anos um amplo coletivo vem
trabalhado para instituir uma regulao federal sobre o
PSA. Apesar de seu longo tempo de tramitao, o
Projeto de Lei 792 de 2007 tem ganhado fora dentro do
legislativo e executivo para ser votado e aprovado,
inclusive, apoiando a implementao das alteraes no
Cdigo Florestal, como uma alternativa manuteno
de tais servios.
Apesar de todas as informaes geradas pela
sociedade civil brasileira e pelo governo, o PL 792 ainda
carece de uma anlise de elementos estruturais
relacionados governana necessria para a
implementao assim como de que forma os recursos
4. Marco regulatrio sobre pagamento por servios ambientais no Brasil / Organizao de Priscilla Santos; Brenda Brito; Fernanda Maschietto; Guarany Osrio; Mrio Monzoni. Belm, PA: IMAZON; FGV/ GVCes, 2012.
17
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EC EC Boletim da Sociedade Brasileira de Economia Ecolgica
advindos de uma Poltica Nacional poderiam apoiar o
desenvolvimento de projetos e assegurar o ganho em
escala dos resultados.
Principais questes identificadas
Inicialmente a iniciativa buscou no dar foco
em novas alteraes no PL atual (substitutivo de abril
2014, Parecer n. 1 CFT) e concentrar esforos no apoio
regulamentao da futura lei; afinal j se passaram sete
anos de tramitao. Entretanto, o debate levou ao
consenso de que a verso corrente do PL 792 ainda
demanda anlises mais aprofundadas. Entre outros
motivos, destaca-se:
Conceitos bsicos: os conceitos estabelecidos
diferem do consolidado na literatura e nas
polticas de PSA j existentes. A carncia de
clareza que persiste no PL pode dificultar a correta
compreenso pelos parlamentares, bem como ter
implicaes indesejveis ou resultar em
sobreposies com outras legislaes existentes.
o PL-792 prope a Abrangncia do Programa:
instituio de um Programa Federal estruturado
com recursos captados em um Fundo Federal,
gerenciado por uma instituio financeira tambm
Federal. A proposta de um Programa Federal
poderia representar um obstcilo a iniciativas
regionais (estaduais, municipais) e privadas j
existentes. J a proposio de um Programa
"Nacional" que estabelea as bases para o
florescimento e disseminao de iniciativas
regionais e locais tende a ser mais estratgico;
Sobreposio com iniciativas estaduais: a verso
atual do PL no estabelece as bases que
permitiro a convergncia da PNPSA proposta e
do Programa Federal com as polticas e
legislaes j existentes;
Iniciativas independentes pblicas ou privadas: o
PL no considera iniciativas regionais e privadas
em andamento e no apresenta garantias
necessria liberdade para novas iniciativas e
arranjos locais. Tambm no considera de forma
clara a participao do setor privado como
pagador e gerador de servios ambientais nem
promove benefcios claros ao engajamento do
setor;
Sobreposio com outras polticas nacionais: A
atual verso do PL demonstra sobreposio de
elementos da Poltica Nacional e do Programa
Federal (ex. critrios de elegibilidade) com outras
polticas e legislaes relacionadas ao tema.
Todavia, no fica claro como ser a convergncia
da PNPSA com esses instrumentos;
Acumulao de servios prestados: no permite
que um provedor de servio ecossistmico esteja
a s s o c i a d o a m a i s d e u m a i n i c i a t i v a
(projeto/programa de PSE hdrico, carbono,
biodiversidade, etc.), quando a grande inovao
do conceito de PSA/E justamente a de
reconhecer e recompensar a conservao dos
ecossistemas e seus mltiplos servios;
Sustentabilidade do financiamento: as fontes de
recursos determinadas para constituir o Fundo
Federal de PSA no identificam fontes ou
mecanismos inovadores que garantam a
sustentabilidade do Programa;
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EC ECBoletim N 32/33 Janeiro a Dezembro de 2013
Tributao e impactos previdencirios sobre o
provedor do servio: no h previso de garantias
da manuteno de direitos previdencirios
adquiridos pelo provedor do servio como o
caso de produtores rurais da agricultura familiar;
Transferncias no monetrias: a definio de
PSA contempla a transferncia de recursos
financeiros ou "outra forma de remunerao". No
entanto, no h uma definio clara das
modalidades e critrios de repasse dos benefcios
para as transferncias no monetrias.
Recomendaes
As recomendaes apresentadas a seguir
esto estruturadas em quatro temas que foram o foco de
trabalho da Iniciativa PNPSA: (I) governana, (II)
desenho e modalidades, (III) acesso a benefcios e
salvaguardas socioambientais e (IV) financiamento.
Governana
Principais funes de governana a serem exercidas num sistema de PSA
Assegurar mecanismos para o alinhamento com
as polticas e legislaes vigentes;
Garantir a coerncia com programas nacionais,
e s t a d u a i s , r e g i o n a i s e m u n i c i p a i s d e
recuperao, conservao da biodiversidade, e
combate ao desmatamento;
Garantir a coerncia entre iniciativas pblicas e
privadas federais, estaduais e municipais
especficas ao tema;
Garantir alocao de recursos (humano e
financeiro) e transparncia nas transaes de
todos os processos associados;
Garantir a adequada representao dos usurios
e provedores na tomada de deciso referente ao
sistema;
O papel do setor privado
Entidades do setor privado beneficiadas pelos
servios ambientais e/ou ecossistmicos providos
devem ser estimuladas a assumir um papel de (I) co-
financiadoras junto ao Poder Pblico nos esquemas
pblicos; (II) de financiadoras ao adequar-se s normas
e legislaes nos mercados formais ou; (III) indutoras
nos mercados voluntrios formulando ou financiando os
esquemas onde houver negociao direta entre atores
privados, sem a regulamentao pelo Poder Pblico;
(IV) sensibilizadoras do valor e dos limites do capital
natural, atravs de polticas dirigidas a todos os seus
stakeholders.
O papel das organizaes no governamentais
As ONGs vm assumindo diversos e
importantes papeis no desenvolvimento e preparao
de iniciativas PSA, conforme seu foco de atuao. A
continuao destas aes pode ser assegurada atravs
de formas de distribuio de recursos pblicos (via
editais de Fundos e/ou Convnios) que tambm
beneficie este setor. Entre as aes promovidas pelas
ONGs que beneficiam o desenvolvimento de esquemas
PSA no pas, esto: mobilizao e articulao dos
atores; administrao, execuo e financiamento de
aes complementares ao PSA, fornecimento de
19
EC EC Boletim da Sociedade Brasileira de Economia Ecolgica
servios ecossistmicos e ambientais (caso possuam
ativos ambientais), participao em comits gestores
dos programas, elaborao e fornecimento de
ferramentas e metodologias que fundamentem,
p a d r o n i z e m e o t i m i z e m a s a t i v i d a d e s d e
desenvolvimento, execuo e monitoramento dos
esquemas de PSA.
Desenho e modalidades de PSA
Critrios de priorizao de reas para o Programa Nacional de PSA
Em linhas gerais, recomenda-se que o
Programa Nacional estabelea prioridades de acordo
com o grau de presso antrpica, alto nvel de fluxo de
servio ecossistmico, proteo, manejo e estado de
conservao das reas. Algumas das reas a serem
priorizadas so:
reas prioritrias para a conservao da natureza
(oficialmente reconhecidos pelo MMA ou
governos estaduais);
Entorno e interior de Unidades de Conservao
(UCs) de proteo integral e de uso sustentvel -
pblicas ou privadas - e terras indgenas;
reas que possibilitem a formao de corredores
de biodiversidade entre UCs ou grandes
remanescentes de vegetao nativa relevantes
em seu contexto regional;
reas de recarga hdrica, mananciais de
abastecimento pblico e reas com maior
densidade de rios e nascentes;
reas com maior presena de reas ngremes;
reas urbanas verdes ou com elevado potencial
de prestao de servios ambientais, como
controle de enchentes, drenagem de gua,
permeabilidade do solo, e controle trmico.
Critrios de elegibilidade de propriedades para participao de uma iniciativa PSA
Os pr-requisitos devem filtrar e organizar a
demanda, porm sem inviabilizar a participao da
maioria e, consequentemente, a implantao de uma
iniciativa PSA. Segue alguns exemplos:
Possuir rea natural preservada ou com potencial
de ser restaurada;
Estar total ou parcialmente inserida na rea
geogrfica de execuo do projeto;
Atender legislao ambiental vigente.
Lembrando que mecanismo de incentivo como o
PSA pode ser um vetor da promoo da
adequao ambiental em complemento ao
comando e controle;
Um fator importante na contratao dos
proprietrios de terra a definio da lista documental
que ser exigida pelo executor. Em diversas regies do
pas a situao fundiria precria, resultando numa
def icincia de documentao por parte dos
proprietrios. Dessa maneira, o aconselhvel que a
documentao que habilita o interessado deva ser
estabelecida pelo arranjo institucional local (com base
em requisitos padro definidos no nvel nacional), de
acordo com os objetivos especficos do projeto e as
20
EC ECBoletim N 32/33 Janeiro a Dezembro de 2013
leis/normas que orientam as atividades do executor ou
financiador. A identificao correta do proprietrio
essencial para determinar os direitos e deveres num
Contrato de Pagamento por Servios Ambientais. O
Cadastro Ambiental Rural pode auxiliar no engajamento
de interessados quando o mesmo j estiver implantado
no Estado ou municpio em questo.
Financiamento
O financiamento proveniente de um Programa
Nacional de PSA deve principalmente garantir as
condies para a organizao e estruturao de
iniciativas, auxiliando a cobrir os custos de transao,
em detrimento de ser uma fonte direta de recursos para
pagamentos por servios ambientais. Idealmente, a
fonte direta do PSA deve advir do prprio arranjo local.
Possveis fontes/instrumentos complementares para o financiamento de PSA em escala nacional
O Fundo (Federal) determinado no PL-792 tem
como objetivo financiar aes do Programa federal. A
recomendao que Fundo seja nacional e que
tambm possa ser acessado pelos estados, municpios,
ONGs e entidades privadas, via editais de Fundos e/ou
Convnios.
Adicionalmente, o Programa e, o FNPSA devem
evitar sobreposies e complementar aes produtivas
e/ou de conservao f inanciadas por outros
instrumentos econmicos ambientais existentes, tais
como:
Fundos como o Fundo de Defesa de Direitos
D i f u s o s ( F D D ) , F u n d o N a c i o n a l d e
Desenvolvimento Florestal (FNDF) e o Fundo
Dema;
Compensaes financeiras e royalties pagos pelo
setor hidroeltrico e o setor da minerao.
Taxas de reposio florestal (cobrada quando a
madeira nativa explorada); de Controle e
Fiscalizao do IBAMA (TCFA); sobre resduos
slidos ou poluio;
ICMS Ecolgico
Formas de repasse dos recursos do PSA
em escala nacional
Os recursos devem ser transferidos, aps a
aprovao das iniciativas, em duas modalidades:
(I) diretamente: aos beneficirios e/ou s instituies
locais executoras definidas na apresentao das
propostas atendendo a chamadas estabelecidas pela
entidade executora do Programa Nacional;
(II) indiretamente: com o repasse s entidades
responsveis nos estados e/ou municpios (ex.
prefeituras, secretarias do ambiente), que por sua vez,
repassam aos beneficirios e/ou instituies locais;
Os pagamentos devem ser diferenciados,
segundo as variaes nos custos de proviso (incluindo
os custos de oportunidade) e o tipo de servio ambiental
prestado. Deve ser assegurado aos prestadores de
servios ambientais o direito de participar em mais de
um t ipo de iniciat iva (PSA-hdrico, carbono,
biodiversidade, etc.) caso seja devidamente
comprovado as diferenas nos servios prestados. Os
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EC EC Boletim da Sociedade Brasileira de Economia Ecolgica
projetos devem poder utilizar recursos de diversas
fontes pbl icas e privadas disponveis, sem
sobreposies de servios prestados sociedade.
Acesso a benefcios e salvaguardas socioambientais
Os benefcios advindos dos servios
ambientais devem ser acessados de forma justa,
transparente e equitativa por aqueles que detm o
direito de uso da terra e/ou dos recursos naturais e que
promovem as atividades de conservao, uso
sustentvel e recuperao florestal de acordo com o
Artigo 15 da Conveno sobre Diversidade Biolgica
(CDB) e com o Protocolo de Nagoya. Sobretudo, o
instrumento deve garantir que os recursos (monetrios
ou no) cheguem integralmente aos provedores do
servio.
Salvaguardas a serem consideradas para assegurar o adequado acesso aos benefcios
Deve ser garantida a transparncia de
informaes sobre as iniciativas PSA, incluindo no
mnimo, aquelas re lacionadas aos aspectos
metodolgicos, localizao e tamanho da rea,
definio e participao dos atores envolvidos e
afetados, s atividades a serem executadas, ao tempo
de durao da iniciativa e os mecanismos de resoluo
de conflitos. Estas informaes devem fazer parte do
registro das iniciativas de PSA, disponveis numa
plataforma de cadastro acessvel a toda a sociedade e
potenciais financiadores, buscando evitar sobreposio
de financiamentos na mesma rea para os mesmos
servios ambientais/ecossistmicos providos.
Principalmente, para iniciativas PSA que envolvam a
populaes tradicionais e pequenos agricultores
familiares:
Devem ser garant idas as condies de
participao em todas as etapas da iniciativa PSA
e nos processos de tomada de deciso, inclusive
quanto definio, negociao e distribuio dos
benefcios.
Os processos de tomada de deciso devem
garan t i r de fo rma e fe t i va o d i re i t o ao
consentimento l ivre, prvio e informado,
considerando as representaes locais e o
respeito forma tradicional de escolha de seus
representantes;
Apoiar o engajamento das comunidades
localizadas em reas das iniciativas e no entorno;
Promover a identificao de sua vocao para os
servios ambientais;
As populaes localizadas na rea de influncia
das iniciativas tambm devem ser informadas
sobre as aes e potenciais benefcios e impactos
relacionados ao PSA;
Promover a adequao das potencialidades da
comunidade com as demandas do PSA;
Em terras pblicas e reas protegidas,
principalmente, em reas que envolvam povos
indgenas, agricultores familiares e comunidades
tradicionais, ou em iniciativas PSA que utilizem recursos
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EC ECBoletim N 32/33 Janeiro a Dezembro de 2013
pblicos, deve ser garantida tambm a transparncia
de informaes relacionadas captao, aplicao e
distribuio dos benefcios, e prestao de contas
peridica.
O que vem depois?
Passada a primeira fase de formulao das
recomendaes para operacionalizao da PNPSA o
prximo passo para dar o devido seguimento
participao da sociedade civil no processo de
elaborao e operacionalizao da poltica ser a
articulao com outros processos e setores, buscando
maior convergncia nas aes destinadas a influenciar
positivamente a Poltica Nacional de PSA. Entre as
aes previstas para a nova fase espera-se: (I)
identificar principais demandas comuns aos diferentes
setores (sociedade civil, setor produtivo, academia,
comunidades locais); (II) realizar reunies de anlise da
situao com atores chave no Executivo e Legislativo; e
(III) revisar o contedo do PL atual com base nas
recomendaes aqui propostas e dos demais setores .
5.Em um processo concomitante, o CEBDS formulou o documento:
"Pagamento por Servios Ambientais: Recomendaes para o marco
R e g u l a t r i o B r a s i l e i r o " ( p a r a s a b e r m a i s c o n s u l t a r :
ht tp: / /cebds.org.br /publ icacoes/pagamento-por-serv icos-
ambientais/#.VD1KHmddXwY)
23
5
EC EC Boletim da Sociedade Brasileira de Economia Ecolgica
Introduo
O Cdigo Florestal Brasileiro (CF), criado em
1965, estabeleceu que todas propriedades privadas
devem manter uma "reserva legal" em vegetao natural
com base em uma proporo fixa da rea da
propriedade, diferenciada por bioma. Os proprietrios
de terras muitas vezes ignoraram a lei, o que tornou sua
aplicao e exigncia muito cara e difcil por exigir
restaurao em reas j convertidas para a agricultura.
As recentes alteraes do CF (Lei No. 12.651/2012)
trouxeram a oportunidade para os proprietrios de
terras que no cumprem os requisitos da reserva legal
de serem compensados por outros que tem rea de
vegetao natural em excesso ou planejam restaurar
reas acima do exigido pelos requisitos legais mnimos.
A lgica econmica por trs do instrumento
deriva da existncia de custos de oportunidade
diferentes para reas com diferentes aptides
produtivas. A opo por negociaes privadas, por
meio de um ativo denominado pela nova legislao de
Cotas de Reserva Ambiental (CRA), provocou
considervel entusiasmo como um meio para alcanar
uma maior adequao ambiental das propriedades
rurais. No entanto, tambm existe controvrsia a
Cotas de Reserva Ambiental (CRA) na Nova Legislao
Florestal Brasileira: Uma Avaliao Ex Ante
Peter H. May , Paula Bernasconi , Sven Wunder e Ruben Lubowski
respeito da potencial eficcia ambiental e eficincia
econmica e das preocupaes sociais que podem
advir, dependendo como venha a ser implementado. O
presente estudo traz as principais concluses de uma
avaliao do potencial do mecanismo CRA para
complementar outros instrumentos como um meio para
alcanar um maior cumprimento da legislao florestal.
Para isso, foram analisadas a experincia internacional
com instrumentos econmicos semelhantes, bem como
estudos focados no caso brasileiro que simularam os
resultados potenciais do instrumento. Entrevistas com
alguns dos principais atores envolvidos com a questo
complementam a reviso da literatura.
Histrico do CRA e outros direitos
negociveis
Com base em nossa reviso de experincias
com o instrumento, denominado de "direitos de
desenvolvimento negociveis" (Tradable Development
Rights - TDR) nos Estados Unidos e em pases em
desenvolvimento como a ndia e China, fica claro que a
fora desses mercados ambientais depende em grande
Os autores agradecem a colaborao na reviso de literatura internacional
feita por Pasha Feinberg e pelos comentrios de Jan Brner e Frederik Noack
em verses preliminares desse documento. Esse artigo est baseado no
relatrio "Environmental Reserve Quotas in Brazil's New Forest Legislation: An
Ex Ante Appraisal", que parte de um projeto que recebeu apoio financeiro do
CIFOR, EDF, e da Unio Europeia, em um acordo de cooperao tcnica com o 24
1 2 3 4
Ministrio do Meio Ambiente (MMA) do Brasil. 1. Professor do CPDA/UFRRJ e Presidente da ECOECO
2. Gestora ambiental e Mestre em Desenvolvimento Econmico (Ambiental)
3. Economista Principal, Centro Internacional de Pesquisa Florestal (CIFOR)
4. Economista Ambiental, Environmental Defense Fund (EDF)
EC ECBoletim N 32/33 Janeiro a Dezembro de 2013
medida do escopo dos direitos negociveis e da
existncia de demanda suficiente para intensificao do
uso da terra . Se o mercado local para o comrcio for
morno, ou confinado a uma rea excessivamente
restrita, os preos talvez precisem ser estimulados
atravs da criao de "bancos" ou da compra
complementar de direitos de desenvolvimento por parte
do poder pblico ou entidades conservacionistas, com
posterior liberao para o mercado quando a demanda
se materializar. Outra forma para aumentar o valor das
terras oferecidas em troca consiste em estabelecer um
limiar para o crescimento.
Em geral, o fator mais importante a existncia
de restr ies em ambas as reas de "envio"
(conservao) e "recebimento" (intensificao de uso)
dos direitos, que tornam a comercializao necessria
para alcanar os objetivos dos proprietrios.
Experincias em TDR sugerem que um escopo de
negociao excessivamente amplo pode minar em
muito os efeitos ambientais desta transao, bem como
reduzir o valor recebido pelas propriedades das reas
de envio, devido ao excesso de oferta. No caso da CRA
no Brasil, muitos dos estudos analisados consideram
como linha de base a eficcia na implementao das
restries da legislao florestal com respeito s reas
protegidas. No entanto, como tal cumprimento foi raro no
passado e, pelo relaxamento das exigncias em
comparao com o Cdigo Florestal, dificilmente ser
cumprido em todos os casos no futuro, apesar da opo
da CRA.
Efetividade ecolgica A maioria dos estudos sobre o potencial do
CRA no Brasil concorda com a experincia internacional
de que a eficcia ecolgica e a viabilidade econmica
do mecanismo esto fortemente associadas ao escopo
do mercado. Os estudos que comparam diferentes
cenrios concluem que quanto maior o escopo, maiores
as possibilidades do mercado. Alm disso, os custos
para os compradores sero mais baixos, e o valor total
do mercado pode ser maior. Por outro lado, como
Sparovek (2012) adverte, um escopo muito amplo para o
mercado de CRA ir resultar em grande perda de
funes ecossistmicas.
Como o Brasil um pas imenso e a rea de
seus biomas tambm imensa, um escopo de mercado
no bioma inteiro pode resultar em concentrao de
conservao em reas onde h baixo risco de
desmatamento devido baixa aptido para a agricultura
ou distncia do mercado, enquanto intensifica reas j
bastante degradadas onde h necessidade de restaurar
os ecossistemas para assegurar a proviso de servios
ambientais. Alm disso, existem muitas tipologias e
ecossistemas diferentes dentro do mesmo bioma que
podem acabar sendo sub-representadas num escopo
mais amplo. A perspectiva de mercados segmentados
que abordem melhor tanto os custos de oportunidade
quanto os critrios ambientais devem ser contempladas
dentro das regulamentaes e definies de
prioridades dos Estados, conforme definido pelas
normas emitidas em maio de 2014 (Decreto 8.235/2014).
2. Em outros pases, o TDR tipicamente utilizado para preservar reas de alto
valor ambiental, em troca da permisso para incrementos alm do permitido
pelo zoneamento local na densidade de ocupao de reas vizinhas (veja
SANTOS, et al. (2011), para uma anlise comparativa).
25
2
EC EC Boletim da Sociedade Brasileira de Economia Ecolgica
Alm disso, estudos mostram que alguns
biomas tero perspectivas de mercado potencialmente
baixas, porque ou h falta de oferta de zonas com
excedentes (como na Mata Atlntica), ou h um excesso
substancial da oferta (caso da Caatinga). O ltimo caso
de especial preocupao, pois um excesso de oferta
de CRA pode resultar em preos muito baixos para
essas reas de floresta no mercado, resultando em
ameaa de desmatamento das reas que no
encontrarem demanda.
Isto implica que, em geral, h um trade-off entre um
escopo mais amplo, com menores custos de
oportunidade, e um escopo mais restrito e com uma
menor perda ecolgica para reas prioritrias para a
conservao.
Outro ponto importante levantado pelos
estudos a diferenciao entre o excedente (CRA) que
pode ser objeto de desmatamento e o que no pode .
Por definio, estes tm diferentes custos de
oportunidade. Em um mercado com excesso de oferta,
essa diferena significa que parte do excedente que
pode ser legalmente desmatada tende a ser convertido.
Neste caso, o mercado de CRA ir desempenhar um
papel de compensar alguns proprietrios de terra que,
incentivados pelo preo, desistiro de desmatar sua
floresta excedente, mas no vai evitar todos os novos
desmatamentos.
O impacto potencial do instrumento em termos
de eficcia para a conservao foi diludo com o decreto
de 05 de maio de 2014, que ampliou o conceito de "rea
prioritria" fora de um determinado estado que poderia
ser utilizada para compensao. Isto resultou num
3. Pela nova legislao, excedentes que podem ser desmatados so
diferenciados devido ao tamanho da propriedade e a presena ou no de
zoneamento ecolgico-econmico no estado em questo.
aumento adicional na oferta potencial que, somado com
a reduo drstica da demanda (causada pelas anistias
da legislao de 2012), podem reduzir a eficcia
ecolgica da CRA. Isso aumenta a probabilidade de que
a CRA tender apenas a ser emitida em reas muito
marginais com custos de oportunidade muito baixos e,
portanto, baixo risco de desmatamento.
Seguindo o mesmo argumento, se o mercado
fosse dominado pela CRA oriunda de Unidades de
Conservao (Ucs), como simulado por Bioflica /
ICONE (2013), isso tambm apresentaria baixa
adicionalidade, pois essas reas j esto legalmente
protegidas e terminariam sendo usadas para substituir
as reas que potencialmente poderiam ser restauradas,
pois teriam baixo custo de oportunidade. Para evitar
estes resultados, os estados devem ser estimulados a
elaborar seus Programas de Regularizao Ambiental
(PRA), com uma seleo de reas prioritrias que
poderia justificar que eles no aceitaro CRA emitidas
fora do Estado ou em UCs. Isto, na nossa opinio, ser
importante para garantir que os excedentes florestais no
interior do estado sejam valorizados e para reduzir o
risco deles serem desmatados, ao mesmo tempo que
no desestimule completamente restaurao.
Eficincia Econmica
Quando se discute a eficincia do instrumento,
os estudos e entrevistas apontam que a implementao
de um mercado para a CRA pode contribuir adicionando
valor monetrio vegetao nativa conservada em
propriedades privadas, alm de permitir que
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3
EC ECBoletim N 32/33 Janeiro a Dezembro de 2013
possibilidade de mudar o status da rea posteriormente,
se o valor do CRA j no for de interesse financeiro ou
para refletir mudanas nos custos de oportunidade da
produo. Embora tais servides no foram muito
usadas no CF anterior, devido insuficiente presso
pelo cumprimento da reserva legal, esta opo pode ser
prefervel nos termos da legislao vigente.
Aspectos distribucionais e de equidade
social
Poucos estudos abordaram os aspectos
distributivos e de equidade social do mercado de CRA.
Os custos de transao podem excluir boa parte das
propriedades de menor porte do mercado. Embora a lei
exija especificamente que o poder pblico deva prestar
assistncia tcnica aos pequenos agricultores no
registro no CAR e na emisso de CRA, ainda h muito a
ser feito para garantir que essas propriedades sero
capazes de participar no mercado e receber uma
compensao financeira para as suas reas de
vegetao natural. Isso porque a maioria dos pequenos
proprietrios no possuem os ttulos de propriedade da
terra, portanto no poderiam emitir CRA pelas
exigncias da legislao. Uma possibilidade prevista
para apoiar a sua participao estimular agentes a
trabalharem como "agregadores" prestando assistncia
tcnica e promovendo escala.
Dois pontos mencionados por Chomitz (2004)
tm uma influncia sobre esses aspectos sociais: 1) Um
mercado restrito a propriedades maiores tende a ter
menores custos de t ransao porque esses
proprietrios tm maior facilidade em lidar com a
4. Entrevistados: Helena Carrascosa (SMA-SP) e Raul do Valle (ISA)
propriedades em dficit no tenham que restaurar na
prpria propriedade. Porm, nenhuma das simulaes
calcula os custos de transao envolvidos. A maioria
reconhece que a literatura diz que tais custos devem ser
muito elevados e, por vezes proibitivos, mas este
aspecto ainda exige mais pesquisas empricas,
especialmente porque os estudos no abordam
recomendaes para a sua reduo. A nica hiptese
discutida (mas no testado) a de que quanto maior o
escopo geogrfico do mercado, maiores os custos de
transao envolvidos. Isso devido dificuldade de
monitoramento e fiscalizao do funcionamento do
sistema quando os compradores e vendedores esto
longe um do outro, por exemplo, em dois estados
diferentes. Mesmo no mesmo estado, os custos
associados com o monitoramento do cumprimento com
a legislao sero onerosos; ainda mais em situaes
longnquas.
A maioria dos resultados dos modelos
analisados indicam que o valor de CRA ser insuficiente
para cobrir os custos de oportunidade da produo
agrcola, embora possa compensar se for usada a
opo de regenerao natural em pastagens marginais,
com baixa produtividade. Assim, a venda de CRA de
reas de oferta pode vir a atuar mais como prmio de
consolao para aqueles que preservaram mais do que
o exigido por lei. Alguns entrevistados (Carrascosa,
Valle ) mencionaram a durao dos contratos como uma
varivel chave para atrair interesse dos potenciais
vendedores. O interesse em emisso da CRA seria
maior em contratos temporrios do que em servides
permanentes, devido perspectiva de um fluxo regular
de pagamentos de alugueis, e tambm pela
27
4
EC EC Boletim da Sociedade Brasileira de Economia Ecolgica
burocracia desse mercado e seu reduzido nmero
representa um substancialmente menor esforo
administrativo para as autoridades pblicas. 2) A
restrio a grandes propriedades tambm poderia ser
mais eficaz para a conservao, porque essas
propriedades concentram a maior parte da rea de
excedentes (especialmente fragmentos maiores). A
presso da cadeia de suprimentos para o agronegcio
cumprir com exigncias ambientais pode agir como
mais um fator motivador no lado da demanda.
A nova legislao mudou as regras para
clculo do excedente nas pequenas propriedades (at
4 mdulos fiscais) para abordar de alguma forma as
implicaes distributivas dos requisitos de reserva
legal, dando mais vantagens para elas. Alguns estudos
mostram que os pequenos agricultores poderiam em
consequncia ter uma forte participao na oferta de
CRA (e nenhuma participao na demanda, por
definio). No entanto, essa perspectiva ainda no foi
testada na prtica em amplo escopo (mas veja o artigo
neste nmero sobre o potencial da CRA em Cotriguau-
MT).
Discusso final
O que os estudos e entrevistas mostram que,
apesar das grandes expectativas que esto sendo
colocados na CRA, o seu potencial tem sido
severamente prejudicado pela anistia, reduo de
riscos e permisso para o mercado interestadual no
contexto da nova legislao florestal. A CRA no de
forma alguma uma panaceia que vai resolver todos os
problemas de conservao de florestas em terras
privadas no Brasil, e para ser eficaz deve ser utilizada
em combinao com outros instrumentos, e no
substitu-los. Na verdade, outros instrumentos que
compensem os proprietrios de terras a adotarem
me lho res p r t i cas e p ro te jam as f l o res tas
remanescentes, como pagamentos por servios
ambientais ou crdito subsidiado, podem ser mais
eficazes do que a CRA. Acima de tudo, a sua eficcia
depender do efetivo acompanhamento e fiscalizao
das restries de uso da terra na prpria legislao
florestal e dos esforos contnuos para motivar a
restaurao de reas degradadas.
Em resumo, a reviso da literatura sugere que
as seguintes pr-condies devem ser consideradas
para o funcionamento do mercado de CRA: (I) situao
fundiria consolidada; (II) reas alocadas para proteo
sujeitas fiscalizao; (III) instituies fortes de
regulao que fiscalizem e garantam o cumprimento da
le i em ambas as propr iedades ofer tantes e
demandantes de CRA e (IV) custos de transao
razoveis. Para garantir a adicionalidade (isto , maior
benefcio ambiental do que se espera do "business as
usual") tanto as reas de oferta como as de demanda
devem ser consideradas ameaadas, seja com presso
de fiscalizao para cumprimento da lei, seja com
presso para desmatamento e consequente perda de
valores ambientais. Desses pr-requisitos, fica claro que
sem uma forte fiscalizao do cumprimento da
legislao florestal, improvvel que a negociao
prospere.
Por fim, um aspecto muitas vezes citado se o
sistema de transaes e usos do solo realisticamente
possa ser monitorado e fiscalizado. O mercado de CRA,
como qualquer esquema de TDR, requer um sistema de
regist ro robusto e tambm um processo de
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EC ECBoletim N 32/33 Janeiro a Dezembro de 2013
monitoramento e acompanhamento muito bom como
requisito mnimo para seu funcionamento. Este
particularmente importante no caso de existir diferentes
estados e diferentes sistemas de cadastro para serem
integrados. A importncia da fiscalizao para
cumprimento da reserva legal tambm crucial: sem
presso do governo, bancos e compradores na cadeia
produtiva aos proprietrios a cumprir com as exigncias
mnimas da lei, no haver qualquer demanda, portanto,
no existir mercado.
Consideraes para aprofundamento de pesquisas sobre o tema
Nossa reviso das potenciais dificuldades e
oportunidades associadas implementao do
mercado de CRA no Brasil est longe de esgotar as
questes estimuladas neste debate. Para fornecer uma
avaliao mais completa, uma srie de questes surge
como merecedora de pesquisas mais aprofundadas,
enumerada a seguir. Em parte, essas questes podem
ser abordadas com base nas simulaes j realizadas
por outros autores, mas algumas podem exigir
si