Post on 19-Jun-2015
Capítulo 1
Introdução à Tecnologia de Fundição
Fundição é um processo de fabricação onde um metal ou liga metálica, no estado
líquido, é vazado em um molde com formato e medidas correspondentes aos da peça a
ser produzida. A peça produzida por fundição pode ter as formas e dimensões
definitivas ou não. Em muitos casos após a fundição, a peça é usinada para serem feitos
ajustes dimensionais ou mesmo conformada mecanicamente (por exemplo, ser forjada),
para que as formas e dimensões finais sejam obtidas.
Na história de humanidade, a fundição de peças e materiais metálicos pode
quase ser considerada uma tecnologia pré-histórica, mesmo sabendo-se que os primeiros
registros arqueológicos surgiram razoavelmente tarde. Não se sabe exatamente quando
foram obtidas as primeiras peças metálicas fundidas, mas os registros indicam que isso
ocorreu no período compreendido entre 5000 e 3000 a.C., ou seja, no período
imediatamente anterior à Idade do Bronze. As análises químicas dos objetos
encontrados revelaram que foram produzidos a partir de cobre nativo. Desde então e
progressivamente, a fundição passou a estar cada vez mais presente na história da
evolução da humanidade, passando pelo aparecimento do ferro fundido na China em
600 a.C. e seu surgimento na Europa no século XV, embora sua utilização como
material estrutural só tenha ocorrido de forma extensiva no século XVIII na Inglaterra.
A Figura 1.1 ilustra o processo de vazamento de metal no estado líquido em um
molde.
Figura 1.1. Processo de fundição. Vazamento de metal líquido em molde.
As vantagens do processo de fundição em relação a outros processo de
fabricação são:
- Capacidade de produção, de modo econômico, de peças complexas ou com
cavidades internas, como pode ser observado na Figura 1.2 ou;
- Capacidade de produção, também de modo econômico, de peças muito
grandes;
No entanto, o processo de fundição apresenta algumas desvantagens. Os aços
fundidos, por exemplo, podem apresentar elevadas tensões residuais, microporosidade,
zonamento e variações de tamanho de grão. Tais fatores resultam em menor resistência
e ductilidade, quando comparados aos aços obtidos por outros processos de fabricação
como conformação a quente.
Figura 1.2. Peças produzidas por fundição.
O processo de fundição envolve: 1. Fusão do metal ou liga. 2. Vazamento em
um molde. 3. Solidificação da peça ( cujo estudo será abordado mais detalhadamente no
capítulo seguinte). 4. Remoção do metal ou liga solidificado do molde.
Algumas considerações importantes devem ser feitas com respeito ao
escoamento do metal líquido na cavidade do molde, o qual é influenciado pelos
seguintes fatores, que dependem do processo de fundição, que será estudado
posteriormente:
Temperatura de vazamento
Um metal apresenta uma temperatura de fusão bem definida, isto é, ele inicia e
termina o processo de solidificação em uma temperatura bem determinada. Já as ligas
apresentam uma temperatura onde se inicia o processo de solidificação e uma
temperatura onde termina esse processo. Isso é ilustrado na Figura 1.3 para o sistema
cobre-níquel. Dentro da faixa de temperaturas em que ocorre a solidificação para uma
liga existe sempre uma mistura de sólido e líquido. A temperatura de vazamento dever
ser estar sempre acima da temperatura onde existem 100% de líquido
(superaquecimento), conforme mostra a Figura 1.4 para o sistema alumínio-silício. O
vazamento, no caso de ligas, dentro de uma faixa de temperaturas onde se tem sólido e
líquido prejudica o preenchimento completo do molde.
Figura 1.3. Curvas de resfriamento ideais para o sistema Cu-Ni.
Figura 1.4. Curvas de resfriamento experimentais para ligas Al-Si (Goulart, 2007).
Variáveis Térmicas de Solidificação
As variáveis térmicas de solidificação (Velocidade e Gradiente de solidificação e
Taxa de resfriamento) têm efeito no desenvolvimento da estrutura das peças fundidas
(estruturas planar, celular ou dendrítica), conforme será visto mais detalhadamente no
capítulo posterior. Dependendo dos valores dessas variáveis haverá a formação de uma
ou outra estrutura da peça.
Fluidez
A capacidade de o metal líquido preencher as cavidades do molde é chamada de
fluidez. A fluidez depende de características do metal e de parâmetros utilizados na
fundição. No que se refere ao metal, a fluidez depende da viscosidade, tensão
superficial, inclusões e padrão de solidificação da liga. No que se refere aos parâmetros
de fundição, a fluidez depende do projeto do molde, material do molde e de seu
acabamento superficial, grau de superaquecimento, taxa de vazamento e transferência
de calor. A Figura 1.5 ilustra um dispositivo utilizado para teste de fluidez.
Figura 1.5. Modelo em espiral para ensaio de fluidez. A fluidez é medida pela distância
que o metal percorre antes de se solidificar.
Existência de Turbulência
A Figura 1.6 ilustra o sistema por onde o metal líquido flui durante o processo
de fundição.
Figura 1.6. Funil de vazamento (pouring cup), massalote ou alimentador (riser), canal
de alimentação (runner), canal de descida (sprue), canal de entrada (gate) , fundido
(casting).
O escoamento de metais e ligas líquidos superaquecidos é semelhante entre si e
semelhante ao da água. É importante que o sistema de canais seja projetado de forma a
reduzir a turbulência. Isso pode ser quantificado pelo número de Reynolds ( Re=v.d/ ν ,
onde v é a velocidade do fluxo, d é o diâmetro hidráulico do canal e ν é a viscosidade
cinemática do líquido, que é dada pela viscosidade dinâmica dividida pela densidade do
líquido. O valor de d é dado por 4 x área da seção transversal do canal/ perímetro da
seção transversal). Para Re até aproximadamente 2000 o fluxo é laminar. Para valores
de Re entre 2000 e 20000 o fluxo apresenta uma mistura entre laminar e turbulento e
acima de 20000, o fluxo é severamente turbulento. Para a maioria dos casos reais o
fluxo se aproxima do turbulento. Isso permite que ocorram mais reações do metal
líquido com formação de gases, o que não é bom, pois pode haver formação de bolhas.
Essas bolhas de gás podem ficar presas e constituírem defeitos nas peças fundidas.
Contração da Solidificação
A maioria dos metais comercialmente utilizados apresenta contração durante o
processo de solidificação. Isso deve ser levado em conta na fabricação do molde, o que
será discutido posteriormente. Para compensar essa contração existe no projeto do
molde a adição de um recipiente para o metal líquido chamado de massalote. Esse
massalote é a última parte a se solidificar e concentra a contração de solidificação. O
massalote é retirado da peça após a solidificação e desmoldagem, sendo sucateado. A
Figura 1.7 ilustra o fenômeno de contração. A Tabela 1.1 apresenta algumas variações
de volume durante a solidificação.
Figura 1.7. Ilustração esquemática do fenômeno de contração durante a solidificação.
Tabela 1.1. Variação de volume durante a solidificação. A maioria dos materiais
metálicos apresenta redução de volume (-), mas alguns apresentam expansão (+).
Transferência de Calor no Molde
Fatores como fluidez e taxa de resfriamento dependem da temperatura e portanto
também da transferência de calor do molde. A Figura 1.8 ilustra a diferença de
temperatura na interface da parede do molde durante a solidificação.
Figura 1.8. Representação do sistema Temperatura-Distância no
processo de solidificação (Garcia, 2007).
Características do lingote (ou molde)