Post on 29-Sep-2015
description
1
A LITERATURA MARGINAL (PERIFRICA) NO CONTEXTO CONTEMPORNEO
FRANCIELE QUEIROZ DA SILVA1 LUCIENE ALMEIDA DE AZEVEDO (ORIENTADORA) 2 RESUMO: Identificando a Literatura Marginal (perifrica) como um gnero presente e perturbador na literatura contempornea, interessa-nos como fonte de investigao o boom das produes literrias escritas por jovens autores, moradores de periferia e os reflexos provocados por essas publicaes nos estudos literrios. O pressuposto que as obras contemporneas sob a denominao "marginal" contrariam o cnone literrio e questionam os limites da definio da literatura. O objetivo principal do presente texto estar em problematizar fatores que rondam este 'movimento', tais como a prpria nomenclatura "marginal", a questo da violncia como um elemento de forte incidncia nas narrativas marginais perifricas contemporneas e o embate que h algum tempo est em curso entre duas vertentes distintas que disputam lugar na teorizao sobre o literrio: Estudos Culturais e a prpria Teoria Literria. PALAVRAS-CHAVES: literatura, contemporaneidade, marginal, cnone, estudos culturais RSUM: En prouvant la Littrature Marginale (priphrique) comme un genre prsent et perturbateur dans la littrature contemporaine, ce que nous intresse comme source de recherche c'est le boom des productions littraires ralises par des jeunes auteurs, des habitants la banlieue et des rflexes causs dans les tudes littraires. La prsupposition est que les oeuvres contemporaines sous la dnomination "marginal" contrarient le canon littraire et interrogent les limites de la dfinition de la littrature. Le bus principal de cette production sera discuter des facteurs qui accompagnent ce "mouvement", ainsi que la nomenclature "marginale" elle-mme, la question de la violence comme un lment de forte incidence dans les rcits marginaux priphriques contemporains et l'affrontement qu'il y a depuis quelque temps en cours entre deux sources distinctes qui disputent place dans la thorisation sur le littraire: tudes Culturelles et la Thorie Littraire elle-mme. MOTS- CL : littrature; contemporanit, marginal, canon, tudes culturelles.
1 Instituto de Letras e Lingstica/Universidade Federal de Uberlndia; Endereo: Avenida Joo Naves de vila, 2121, Uberlndia, CEP. 38400-902. E-mail: franciele_queiroz@yahoo.com.br. 2 Instituto de Letras e Lingstica/ Universidade Federal de Uberlndia. Endereo: Avenida Joo Naves de vila, 2121, Uberlndia, CEP. 38400-902. E-mail: lucieneazevedo@ig.com.br.
2
I- INTRODUO
ENFRENTANDO O PRESENTE:
UMA PERSPECTIVA MARGINAL O presente texto abordar
questes que rondam uma das diversas
facetas da cena literria atual, pois
acreditamos que necessrio destacar
do panorama mltiplo da
contemporaneidade, a vertente sobre a
qual nos debruaremos. Tendo em vista
a "pluralidade de nomes e
caractersticas" (AZEVEDO, 2004, p.6)
na literatura contempornea, que s faz
crescer mais a cada dia motivada pelas
mudanas sociais e pela facilidade da
publicao na Internet, o projeto
promoveu um recorte sobre o vasto
nmero de publicaes e props
empreender uma pesquisa direcionada a
um determinado grupo de escritores que
se autodenominam "marginais".
Segundo o estudioso Stuart Hall,
"O sujeito assume identidades diferentes
em diferentes momentos, identidades
que no so unificadas ao redor do "eu"
coerente." (1997, p.13). Entendendo que
a emergncia do sujeito e sua
importncia, cada vez maior a partir do
Romantismo, est estritamente
relacionada a isso que chamamos
modernamente literatura, acreditamos
que a literatura contempornea os
autores que se lanam hoje como autores
de literatura exige uma conscincia
crtica a fim de estimular a reflexo
sobre as mudanas que o surgimento de
outras vozes e novos sujeitos impem
como desafio ao pesquisador dessa rea.
Nosso pressuposto de pesquisa
considera que a Literatura Marginal
(perifrica) um gnero perturbador na
literatura contempornea. Acreditamos
que essa pressuposio se justifique,
principalmente, por estas produes
colocarem em xeque as noes de valor,
de cnone, questionando o que seja o
"literrio" hoje. Dessa forma tentamos
perceber algumas estratgias textuais e
extratextuais que justificassem tal
pressuposto. Nossas perguntas iniciais
procuraram entender a nomenclatura
deste 'movimento' que vem se
fortalecendo na contemporaneidade: O
que ser "marginal"? Marginal a qu?
H diferena entre o marginal dos anos
70 e o marginal contemporneo? Quais
so as caractersticas deste "marginal"?
Em seguida, investigamos o
lugar reservado Literatura Marginal no
embate entre Estudos Culturais e Teoria
Literria alm de problematizar sua
insero numa tradio literria
especfica. E, depois disto, buscamos
refletir sobre a extrema violncia como
uma caracterstica dos textos ficcionais
da Literatura Marginal Contempornea.
3
Acreditamos que importante
confrontar-se com o presente na
tentativa de traar panoramas, a fim de
buscar conhecer essa nova literatura
para propor hipteses, arriscando-se s
produes 'marginais' na literatura.
Alm disso, a relevncia desta pesquisa
est em promover um estudo
contemplando um ngulo da literatura
muitas vezes no observado, no
inserida nos padres cannicos e ainda
muito questionada no que diz respeito
sua "qualidade" literria.
A escolha do referido tema deu-
se pelo interesse investigativo em
acreditar que a teoria " aquela que
aceita se questionar a si prpria e
colocar em causa o seu prprio discurso"
(COMPAGNON apud SOUZA, 2002,
p.282). Sendo assim, esta pesquisa se
props a investigar caractersticas que
nos apontem se a obra considerada
'marginal' deve ser encarada sob novos
parmetros.
II - MATERIAL E MTODOS O CAMINHO... Nossa investigao est
fundamentada na pesquisa de material
bibliogrfico sobre o tema e na
submisso desse material aos
procedimentos comparativos e
descritivos. A primeira etapa diz
respeito ao mapeamento de escritores,
crticos, pesquisadores ligados
literatura contempornea, j que um dos
interesses da proposta de pesquisa
colocar o pesquisador em confronto com
o que j se produziu e registrou a
respeito da literatura marginal.
O procedimento comparativo se
justifica porque buscamos traar um
histrico de incidncia do termo
'marginal' na literatura brasileira a fim
de identificarmos convergncias e/ou
divergncias em relao ao momento
contemporneo. J o aspecto descritivo
diz respeito ao fato de que tentamos
investir na descrio de caractersticas,
propriedades ou relaes existentes entre
os diferentes textos-alvo da pesquisa.
O surgimento de diversos
escritores no mercado editorial veio em
conseqncia da expanso do espao
virtual graas popularizao dos
computadores e do acesso Internet. O
poder de divulgao e circulao de um
escritor nos dias atuais
indescritivelmente facilitado em relao
h alguns anos atrs quando ainda no
se falava no ciberespao ou em blogs. E
o aparecimento desses suportes fez com
que mais ferramentas fossem
incorporadas a esta pesquisa. Sendo
assim, alm de nos dedicarmos aos
livros, tericos e ficcionais, nos
ativemos tambm observao dos
4
blogs, pginas na web dos escritores
bem como a entrevistas concedidas
pelos estes e por crticos a sites e blogs
na Internet.
Para a pesquisa, nos baseamos
em autores que discutiram ou discutem
questes que tiveram relevncia para o
seu desenvolvimento. O livro de Carlos
Alberto Messeder Retrato de poca:
Poesia Marginal3 nos anos 70 foi uma
referncia fundamental para obtermos
informaes sobre a poesia marginal dos
anos 70, sua representatividade para a
sociedade da poca, para a
caracterizao de um movimento que
acreditamos contrapor-se cena literria
atual. Nesse sentido, tambm foram de
fundamental importncia os textos de
Helosa Buarque de Hollada em suas
antologias 26 Poetas de Hoje (1975) e
Esses Poetas Uma Antologia dos Anos
90 (1998).
Buscamos conhecer movimentos
que pudessem sugerir alguma ligao
com a Literatura Marginal
Contempornea, especificamente em
relao ao engajamento, como o Grupo 3A aproximao da nomenclatura 'marginal' foi o primeiro impulso para que nos interessssemos pelo movimento dos anos 70 Poesia Marginal . No entanto, a partir dessa relao semntica observamos e estabelecemos convergncias e divergncias entre o movimento dos anos 70 e a produo contempornea Literatura Marginal que contriburam para melhor entender e caracterizar o panorama atual, sobretudo no que se refere incidncia do termo marginal na prosa, sendo este um dos interesses do projeto.
Violo de Rua. Alm disso, para
entendermos um pouco mais sobre o que
significa o adjetivo marginal, lemos a
obra O que poesia Marginal do poeta e
crtico Glauco Mattoso. Atentamos
tambm para publicaes recentes
relacionadas ao tema, como as
dissertaes de rica Peanha intitulada
"Literatura Marginal": os escritores da
periferia entram em cena (2006) e de
Ana Cristina Tanns denominada Em
busca do discurso potico de Aristide
Klafke: Marginalia e contracultura
(2007).
As leituras de obras ficcionais se
basearam nos autores Ferrz (Reginaldo
Ferreira da Silva) e Sacolinha (Ademiro
Alves). Alm disso, contamos com o
livro Literatura Marginal: Talentos da
escrita perifrica, bem com os textos
publicados na revista Caros Amigos atos
I, II e III, ambos organizados pelo
escritor Ferrz, em que constam diversos
nomes da Literatura Marginal.
Para entendermos melhor os
desdobramentos referentes vertente
terica dos Estudos Culturais e seus
embates com a Teoria da Literatura nos
baseamos no texto da professora Maria
Eneida de Souza, "Teoria em Crise" e na
obra de referncia que julgamos ser o
livro de Terry Eagleton: Depois da
Teoria: um olhar sobre os estudos
Culturais e o ps-modernismo, bem
5
como na leitura atenta dos captulos do
livro Dez Lies sobre os Estudos
Culturais de Maria Elisa Cevasco.
Analisamos o que constatamos
ser uma das caractersticas marcantes da
produo dos ditos 'marginais': a
violncia. Embora essa marca tambm
seja encontrada nos textos de escritores
dos anos 70, como ocorre com Rubem
Fonseca, por exemplo, gostaramos de
efetuar uma comparao de estilos
"marginais" anos 70 e anos 90/00 e
discutir, por meio dos textos literrios de
Rubem Fonseca, "O cobrador", e do
escritor Ferrz, "Abismo atrai abismo", a
questo da violncia na produo
literria contempornea.
III - RESULTADO E DISCUSSO O "MARGINAL" ONTEM E HOJE De acordo com o dicionrio
Houaiss o termo "Marginal" pode ter
entre outras significaes: 1. relativo
margem 2. Que vive margem do meio
social em que deveria estar integrado,
desconsiderando os costumes, valores,
leis e normas predominantes nesse meio;
delinqente, vagabundo; mendigo 3.
Situado no extremo, no limite, na
periferia 4. Diz-se de pessoa que vive
entre duas culturas em conflito 5.
Indivduo marginal; delinqente, fora-
da-lei. Como podemos observar muitas
das definies que escolhemos e
expusemos dizem respeito posio do
individuo que vai contra a cultura
vigente.
A denominao "Marginal" no
um termo novo para designar um
movimento ou um aspecto da literatura
de uma determinada poca. Nos anos 70,
o termo "marginal" foi designado para
caracterizar um movimento denominado
"Poesia Marginal". O conhecido rtulo,
"Poesia Marginal", despontou com
maior fora na cidade do Rio de Janeiro.
Tratava-se de um grupo de poetas quase
todos pertencentes s classes mdia e
mdia alta, como afirma PEREIRA
(1981, p.36): "[...] so,
fundamentalmente, representantes das
camadas mdias; alguns de camadas
mdias altas com slido backgroud
familiar tanto em termos financeiros
quanto intelectuais [...]". O rtulo
'marginal' dizia respeito reproduo de
suas obras (quase sempre poemas) de
forma 'artesanal'. A tambm conhecida
"gerao mimegrafo" valia-se desse
mecanismo para fazer circular as poesias
produzidas.
As caractersticas principais
dessa produo eram o tom irnico, a
escolha pelo uso de uma linguagem
coloquial, drogas e sexo como temticas
principais e a tematizao do cotidiano
carioca predominantemente de classe
6
mdia. Segundo Carlos Alberto
Messeder Pereira essa produo estaria
prxima a "algo que talvez pudesse ser
definido como 'politizao do
cotidiano'[...]." (1981, p.32)
A "marginalidade" desse grupo
de escritores tambm conhecidos como
gerao mimegrafo diz respeito, ento,
como pudemos observar, sua relao
com o mercado editorial, j que as obras
eram confeccionadas pelos prprios
poetas que tambm eram os grandes
distribuidores do seu produto: venda de
mo em mo, propaganda boca a boca,
mantendo um contato presencial com
seu potencial leitor em teatros, shows,
cinemas e bares. O poeta dos anos 70 j
no mais o mesmo preso a 'torres de
marfim', diferente de todo aquele
distanciamento proposto, daquela
atemporalidade pretendida em diferentes
pocas literrias, este 'poeta marginal'
entra em contato direto com seu pblico
leitor, comeando a (des)construir uma
noo de escritor.
O termo "marginal", de acordo
com Helosa Buarque de Hollanda,
merece ento ressalvas, pois a avaliao
de seu valor literrio dirigida por
fatores extralingsticos, principalmente
de produo:
"A classificao marginal adotada por anlises e assim mesmo com certo teor e hesitao. Fala-se mais freqentemente 'ditos
marginais', 'chamados marginais' evitando-se uma postura afirmativa do termo. Geralmente ele vem justificado pela condio alternativa, margem da produo e veiculao do mercado, mas no se afirma a partir dos textos propriamente ditos, isto , de seus aspectos propriamente literrios" (HOLLANDA, 1981 p.98-99).
Uma das intenes primordiais
dos poetas observados no perodo era de
transformar os padres de qualidade da
poca. Distanciando-se propositalmente
das obras "intelectualizadas" ou
"populistas", declarando assim, sua
posio underground em relao ao
sistema.
A atitude 'gauche' dos poetas, diz
respeito no apenas alternativa ao
mercado editorial, mas tambm
inquietao quanto aos padres morais
da famlia burguesa. Essa postura tem
semelhanas como o movimento hippie,
surgido nos anos 60, que marcou uma
atitude contra cultural. Originado, nos
EUA esse grupo estava em desacordo
com os valores tradicionais
estabelecidos pela cultura norte
americana. Os hippies tm como
caracterstica a transgresso de valores
pr-moldados pela sociedade, utilizam
cabelos e barbas compridos como forma
de infringir as 'normas'. VIOLO DE RUA E
ENGAJAMENTO
7
Durante as dcadas de 60 e 70, o
Brasil vivia um contexto scio-poltico
de autoritarismo e de censura cujo alvo
principal era as artes: msica, cinema,
literatura, enfim, quaisquer
manifestaes culturais que
contrariassem, naquele momento, os
ideais polticos impostos pelo regime de
exceo. A Literatura foi um campo de
resistncia. Embora no pretendamos
afirmar o determinismo do regime
poltico sobre aspectos culturais da
dcada, no podemos negar que fortes
influncias desse perodo conturbado
marcam a produo dos escritores.
Vrios movimentos literrios
aliaram a literatura postura engajada,
participativa, de luta contra a represso e
o autoritarismo, como o "Violo de
Rua".
O Grupo "Violo de Rua"
(patrocinado pela UNE) reunia nomes
como os de Ferreira Gullar, Paulo
Mendes Campos, Affonso Romano de
Sant'anna, Moacyr Felix, Vincius de
Moraes, Jos Carlos Capinam, entre
outros, e tinha como intuito maior
promover a literatura como canal de
reivindicaes, lutas e utopias. A
temtica das produes concentrava-se
na descrio da pobreza, da
desigualdade e da explorao do povo
tanto no campo quanto na cidade.
Talvez, ento, valha pena
pensarmos numa proximidade muito
maior do movimento da literatura
marginal contempornea com os poetas
do grupo "Violo de Rua" do que
propriamente com a poesia marginal da
dcada de 70.
Na literatura contempornea o
termo "marginal" continua sendo
utilizado para demarcar um grupo de
escritores. No entanto, agora no
escrevem apenas poesia, mas participam
de uma conjuntura cultural mais ampla,
que envolve a prosa, a msica (por meio
dos rapps e Mc's) e produes
cinematogrficas.
Outra significao da palavra
"marginal" proposta pelo poeta e
ensasta Glauco Mattoso em seu livro O
que Poesia Marginal. De acordo com
o autor, o termo marginal foi
emprestado das cincias sociais e traz
como significado "o indivduo que vive
entre duas culturas em conflito, ou que,
tendo-se libertado de uma cultura, no
se integrou de todo em outra, ficando
margem das duas". (MATTOSO, 1981,
p.7)
Se considerarmos a sugesto de
Mattoso, o conceito de marginalidade no
contemporneo, por ser mais abrangente
e inclusivo, pode abarcar inmeros
sujeitos: homossexuais (pela escolha
sexual) indgenas (pela diferena
8
cultural), negros (pela raa). Enfim,
identidades que no correspondem a
uma cultura dominante. Nesse sentido, a
noo de contracultura diz respeito
margem, periferia.
Portanto, nos dias atuais a
ambivalncia do termo ainda prevalece.
Assim como pode se referir
juridicamente a delinqente, fora-da-lei,
infrator e perigoso, estando ligado ao
mundo do crime, tambm remete
concepo sociolgica, ou seja,
indivduos que de alguma forma so
vitimados pela excluso social, 'pobres'
ou membros de minorias tnicas e
raciais, margem da sociedade.
Na dcada de 90, o termo
"marginal" assume outra roupagem para
o cenrio contemporneo. Os marginais
dessa dcada podem ser caracterizados
por seu perfil sociolgico, ou seja,
moradores ou ex-moradores das
periferias urbanas brasileiras. E mesmo
presidirios, que no crcere utilizam-se
da literatura como libertao,
repassando suas experincias a leitores
por meio de suas obras literrias como
o caso do ex-presidirio Josemir Jos
Fernandes Prado, conhecido como
Jocenir, em sua obra, Dirio de um
detento.
So, em sua maioria, autores da
cidade de So Paulo que comearam a
despontar no cenrio editorial a partir da
publicao do livro Cidade de Deus no
ano de 1998. O sucesso do livro, que foi
roteirizado no ano de 2002, fez eclodir
na sociedade brasileira um envolvimento
com uma realidade que andava ausente
da literatura. O cotidiano da favela
torna-se mais prximo e explcito para
todos, estranhamento que rendeu uma
boa repercusso tanto para a bilheteria
do filme de Fernando Meirelles, quanto
para a obra de Lins.
A revista Caros Amigos tambm
abriu espao para divulgao de uma
produo que no encontrava
repercusso no meio editorial at ento.
A srie Literatura Marginal em trs
atos: Ato I (2001), Ato II(2002) e Ato
III(2004) trouxe cena vrios autores
desconhecidos. A seleo dos textos
para publicao era feita pelo escritor
Ferrz que contribua com a revista
desde o ano de 2000.
Os temas destas obras permeiam,
sobretudo, o cotidiano dos moradores da
favela, e suas adversidades na sociedade
brasileira como: violncia, sexo, drogas,
estupros e assaltos. A linguagem
utilizada nas obras tambm uma
caracterstica marcante dessa vertente da
produo literria contempornea. Os
'ditos marginais' se utilizam de uma
linguagem em sua maioria aproximada
da oralidade, saindo dos padres
9
convencionais de escrita e no
utilizando a chamada linguagem 'culta':
" E a truta! Firmeza? S, eu t na boa, choque, e voc? Na moral, t l trampando com o Matcherros na firminha dele. Ah! T ligado, o Amaral me contou que ele t indo pela rdi l com o esquema. , o bagulho virou bem, se p nis vamo contrat at o Panetone, isso , se o bagulho dele com o futebol num vir. Firmeza, o esquema esse; afinal, como diz o crente, "Se Deus por nis, quem ser contra nis". Choque, a parada sempre foi nesse naipe, e a parada cada vez vai ser pior, as correrias esto ficando mais forte e a parada vai ficar mais louca, firma!"(FERRZ, 2005, p.145)
Os escritores da "literatura
marginal" contempornea possuem
caractersticas prprias como levantar
questes gerais importantes para a
comunidade da qual fazem parte. Neste
sentido nos questionamos: ser que
poderamos arriscar uma aproximao
com o contexto comentado por
Benjamin em seu texto sobre o narrador
segundo a anlise das obras do escritor
russo Leskov no qual o terico alemo
identificava, a partir da afirmao do
romance como gnero, uma
incapacidade de compartilhar
experincias?
"O romancista segrega-se. A origem do romance o individuo isolado, que no pode mais falar exemplarmente sobre suas preocupaes mais importantes e que no recebe conselhos e que no
sabe d-los." (BENJAMIN, 1987, p.201.)
Diferentemente do que Benjamin
afirma a literatura marginal
contempornea objetiva oferecer um
espao em que "a voz da comunidade"
aparea, e no s a do autor, produtor da
obra. Os autores procuram se basear em
uma idia coletiva sobre o que narram,
ou seja, o espao social da periferia.
Algumas vezes nota-se o intuito
de "provocar" a capacidade crtica do
pblico por meio de textos com fundo
denunciador e moralizante. Como no
conto + 1 AKIM do escritor Rato, que
se encontra na obra Capo Pecado de
Ferrz:
"No me deixo levar, a Rede Globo at, mas no vai me enganar. No to a fim de ver a merda da Sandy e o bosta do jnior o dia inteiro na tv cantando suas msicas sem contedo e ganhando dinheiro com a misria do meu povo." (RATO, 2000, p.42)
Nos anos 70, segundo Ana
Cristina Tanns Alves (dissertao de
mestrado "Em busca do discurso potico
Aristides Klafke: Marginalia e
Contracultura") prevaleciam os sentidos
de deboche, de riso, do efeito cmico
em si, provenientes das experincias
dirias, aliadas atitude de desbunde do
poeta.
Na "Literatura Marginal" dos
anos 90/00 assim como no movimento
10
"Poesia Marginal" dos anos 70 h uma
opo de abordagem 'literria' por
elementos do cotidiano. Porm, o
tratamento dado a esse tema o
cotidiano na contemporaneidade
completamente diverso da postura de
'deboche' dos anos 70, considerando-se a
seriedade e o compromisso social
investidos pelos autores em suas obras.
No que diz respeito utilizao
da linguagem, podemos notar que o
"marginal" dos anos 70, utilizava a
linguagem coloquial. A literatura
marginal de nossos dias exacerba ao
mximo esse recurso, e ainda acrescenta
um estilo prprio de falar, na tentativa
de reproduzir uma maneira de falar da
cultura perifrica como: "m", "truta",
"pode cr", "t ligado", entre outros.
Apesar de todas as diferenas,
contextuais e de produo, a "Poesia
Marginal" tambm pretendia
desestabilizar o cnone, a tradio
literria brasileira. Os marginais dos
anos 90 no apenas citam os grandes
nomes da literatura, como os apontam
como inspirao para suas produes
literrias. Notamos essa busca pelo
clssico como uma caracterstica deste
'novo marginal', e comprovamos tanto
por entrevistas concedidas a sites da
Internet como na prpria produo
literria.
"Eu li, li muito. Quando escrevi Capo pecado, tive mais trampo, menos tempo. Comprei vrios livros, outros me foram trazidos por amigos. Li Dostoievski, Tchekov, Gorki, Flaubert, Pessoa. Eu gosto muito da literatura beatnik, tambm." (FERRZ, em entrevista ao site Portal Literal, originalmente publicada em 2003)
Nesta entrevista o autor Ferrz
explicita a sua preparao e as suas
inspiraes criativas para escrever seu
segundo Romance, a obra Manual
Prtico de dio, lanada no ano de
2003. Evidenciamos tambm essa
caracterstica nos textos literrios destes
autores como o caso do escritor
Sacolinha que em muitos de seus contos,
faz referncia a filsofos e autores
consagrados da literatura: "Nessa poca eu lia Karl Marx, Aristteles, Descartes, Kant, Rousseau, Maquiavel, Plato e Vygotsky. Eu no tinha com quem conversar [...] e quando encontrava algum do meu nvel intelectual, esse dizia que eu falava demais. (Sacolinha, 2006 p.31) Eu estava dando uma risada do comentrio de um crtico de literatura sobre a literatura de Edgar Allan Poe [...]" (SACOLINHA, 2006, p.17)
Conclumos, assim, que houve
uma verdadeira "metamorfose" de
valores atribudos ao termo "marginal".
O marginal contemporneo o morador
da favela que de alguma forma se sente
menosprezado pela sociedade da qual
faz parte e tenta por meio das artes como
11
a literatura demonstrar o valor cultural
que possui. ESTUDOS CULTURAIS E TEORIA
DA LITERATURA
Podemos dizer que a denominada
"Literatura Marginal ou Perifrica"
torna-se para ns um bom expoente para
a averiguao do embate, h algum
tempo recorrente, entre Estudos
Culturais e a prpria Teoria da
Literatura.
Estes autores reivindicam seu
espao no mercado editorial e agem para
que isso acontea. A comunidade
tambm um dos alvos desse
contemporneo "marginal" agora com o
intuito de promover outros autores da
prpria comunidade.
Na maioria dos casos, os autores
contemporneos como Ferrz,
Sacolinha, Srgio Vaz e outros, lutam
por uma comunidade mais justa,
promovem aes e divulgam em seus
blogs, projetos, festas literrias, saraus,
bibliotecas comunitrias, recitais, onde
todos possam ter acesso s obras
literrias. Configura-se uma noo de
autor 'colaborativo', engajado e
participativo na comunidade, prximo
ao leitor e que tenta ao mximo elevar as
caractersticas prprias da cultura
perifrica.
Esses autores sofrem crticas
pelo forte apelo ao real intrnseco a suas
obras literrias. Essa talvez seja a marca
que mais sustente as dvidas a respeito
da condio literria da produo 'dita
marginal'. Porm a discusso sobre o
que literatura atravessa sculos e se
mantm na contemporaneidade.
A indefinio do termo literatura
tema do captulo introdutrio de Terry
Eagleton em seu livro Teoria da
literatura: Uma Introduo. Desde os
textos de Plato e Aristteles a discusso
se arrasta, porm ao longo de sculos
muitos foram os parmetros criados para
sustentar alguma especificidade desse
objeto de estudo: a bela escrita (belles
lettres) da retrica, a escrita imaginativa
romntica, o estranhamento formalista.
Variando conforme as pocas e os
olhares de seu pblico em relao ao
objeto literrio.
Sendo assim, quais os critrios
que definem a literatura 'dita marginal'
como literatura? Quais os traos
literrios contidos nessa literatura? Ou
ser que devemos reformular estes
parmetros de leitura para as obras
contemporneas?
A Professora Eneida Maria de
Sousa dedicou-se em um de seus textos,
"A teoria em Crise", a tratar de uma
possvel turbulncia sofrida pela "teoria
pura" e de seus reflexos na literatura.
12
Segundo a estudiosa Eneida "a crise por
que passa a disciplina causada pelas
transformaes culturais e polticas das
ltimas dcadas" (SOUZA, 2002, p.68),
sendo assim, a tranqilidade de uma
rea tida como consolidada abalada
por mudanas sociais. H ento a
necessidade de um campo que aceite
outras perspectivas, que no considere
apenas a aplicao e compreenso de
termos como "belo potico", "qualidade
esttica", "literariedade" e etc.
A produo literria deve ser
encarada agora com outros olhares, no
mais valorizando apenas o
"esteticamente concebido" e os "critrios
de literariedade". Deve-se considerar
uma capacidade antes no aludida que
a de "suscitar questes de ordem terica
ou de problematizar temas de interesse
atual, sem se restringir a um pblico
especfico" (SOUZA, 2002, p.68).
De acordo com a pesquisadora o
conceito moderno da Teoria Literria
objetivou apenas a produo cientfica
do objeto de estudo e acabou por no
considerar fatores psicolgicos,
histricos e biogrficos do literrio,
prendendo-se apenas ao nvel da
literariedade como valor.
Sendo assim, observamos o
surgimento de uma corrente de estudos,
na dcada de 50 que se interessa pelo
vis de teoria social crtica, sendo
denominada de Estudos Culturais. Esta
vertente estaria pautada na tentativa de
incluso do que um estudo
multidisciplinar, que investe nos saberes
produzidos pelas cincias humanas se
encontra margem da noo de cultura
vigente. Provocando assim, uma
desestabilidade na ordem pr-
estabelecida pelo poder dominante
(cultura dominante).
Os Estudos Culturais campo que
contemporaneamente tambm "teoriza"
sobre o objeto literrio passa a ser
responsvel ento, pela desconstruo
da noo de cultura vigente,
reivindicando assim, espao para a
valorizao do que anteriormente no
foi/ entendido como produo cultural.
O que provoca uma ampliao da noo
do objeto de estudo da Teoria da
Literatura, com a insero de obras antes
no encaradas como literrias,
provocando uma desestabilizao da
noo de 'cnone literrio'.
Um sentido imprescindvel para
a corrente dos Estudos Culturais
defendida por Raymond Williams, um
dos pioneiros na rea, era a de transpor a
noo de 'cultura exclusiva' para uma
'cultura comum'. De acordo com a
estudiosa Maria Elisa Cevasco em sua
obra Dez Lies sobre os Estudos
Culturais, a importncia do
13
materialismo cultural do ponto de vista
de Raymond Williams est em:
"[...] demonstrar que a oposio costumeira entre literatura e realidade, cultura e sociedade mascara profunda interconexo: no se pode analisar uma sem a outra, e nem mesmo sem conceber uma literatura sem a realidade que ela produz e reproduz, ou, pela mesma via, uma sociedade sem a cultura que define seu modo de vida."(CEVASCO, p.150, 2003)
Apesar de possuir propsitos
interessantes, a teoria proposta pelos
estudos culturais muito criticada no
meio acadmico, j que alguns dos
intelectuais da academia afirmam que os
Estudos Culturais "estariam ameaando
os estudos literrios, corrompendo o
objeto de anlise e distorcendo a teoria
da literatura." (SOUZA, 2002, p.68)
Temos ento, duas vertentes
distintas, com preocupaes tambm
dspares. Interessa-nos pensar que a
Teoria da Literatura de alguma forma se
'modifica' com a tenso estabelecida
pela emergncia dos Estudos Culturais,
que acreditam ter tambm a
competncia de teorizar sobre o objeto
literrio.
Eneida Maria de Sousa reclama
em seu texto uma mudana evidente no
papel do intelectual. Para a estudiosa
no cabe mais ao acadmico o
"comodismo" de expor suas opinies
apenas em salas de aula.
Contemporaneamente outros meios
requisitam o trabalho intelectual, indo
alm das anlises de defesas de teses e
de publicaes em revistas
especializadas. Muitas vezes este crtico,
estudioso, pesquisador e/ou professor
convidado a demonstrar suas opinies
pelos meios de comunicao em massa.
O que pode ter favorecido essa
postura de dilogo, de abertura e de
troca foi o embate terico existente entre
as duas correntes j expostas, ou seja,
Teoria Literria e Estudos Culturais.
A crise poderia estar ento no
surgimento de uma concepo
culturalista que tambm tem como
intuito o "teorizar" as produes
literrias, tarefa antes exclusiva da
Teoria Literria, provocando assim,
diretamente uma turbulncia em um
campo "consolidado", que, no entanto,
permeado por questes imprecisas como
"definio de literrio", "cnone",
"valor", "esttica" e etc.
Temos como grandes expoentes
da corrente dos estudos culturais: os
estudiosos Stuart Hall, Terry Eagleton,
Jonathan Culler e no Brasil vemos
enveredar para essa postura alguns
crticos como Silviano Santiago, Maria
Elisa Cevaso e a prpria Eneida Maria
de Souza.
Nesta conjuntura de 'teorias'
como pensar a Literatura Marginal
14
(perifrica)? Nossa proposta que a
literatura denominada "marginal"
distancia-se radicalmente do "belo
potico" e das ditas palavras bonitas.
Fato este observado no 'estilo literrio'
prprio de escritores marginais
perifricos em que a aproximao com o
real ntida e no se cogita uma
definio do literrio como escrever
difcil e 'bonito'.
A chamada Literatura Perifrica
demonstra um interesse vido pelo real.
Essa tendncia est presente nas obras
dos escritores contemporneos, porm
ela poderia ser avaliada na literatura
marginal (perifrica) como mais do que
uma relao indissocivel entre o real e
o imaginativo, mas como um meio pelo
qual esses escritores contestam sua
realidade. Neste caso seria vlido avaliar
a literatura marginal (perifrica) como
uma postura de resistncia. Para Bosi a
resistncia " um conceito originalmente
tico, e no esttico" e quando h esse
hibridismo de intenes entre "os
conceitos prprios da arte e da tica e da
poltica" surgem s expresses como
poesia de resistncia e narrativa de
resistncia.
Neste sentido entra a grande
questo o que seria este esttico? A
literariedade o que realmente legitima
um texto literrio como produo
cultural? Nossos julgamentos no esto
sempre pautados por valores?
AFINAL, O QUE A TAL
LITERARIEDADE?
Literariedade segundo o
dicionrio literrio4 quer dizer a
possibilidade de "constatar uma
propriedade, presente nas obras
literrias, que as caracterizaria como
pertencentes literatura. Para denominar
esta propriedade, criaram o termo
literaturnost, que foi traduzido para a
lngua portuguesa como literariedade."
(JOBIM, E-Dicionrio de Termos
Literrios) No entanto, a existncia
desta possibilidade questionvel, pois
que propriedade seria esta? E como esta
propriedade estaria presente em todos os
textos ditos literrios, j que a literatura
fruto de uma cultura, varivel,
portanto, historicamente?
Mrcia Abreu discute essa
questo em sua obra Cultura Letrada,
afirmando que a "literariedade no est
apenas no texto os mais radicais diro:
no est nunca no texto e sim na
maneira com que ele lido." (ABREU,
2006, p.29) Neste sentido dialogamos
com uma concepo extremamente
abstrata que ser entendida a partir de 4 Disponvel em: , acesso em: 15 de jan. de 2009.
15
olhares diferentes e segundo valores
tambm distintos.
"Dois textos podem fazer um uso
semelhante da linguagem, podem contar
histrias parecidas e, mesmo assim, um
pode ser considerado literrio e o outro
no. Entra em cena a difcil questo do
valor, que tem pouco a ver com os
textos e muito a ver com posies
polticas e sociais." (ABREU, 2006,
p.39) o que sugere Mrcia Abreu.
Observarmos, neste sentido, que
o valor est ligado a questes sociais,
fatores que se transformam
cotidianamente. A autora instiga ainda
mais a discusso afirmando que uma
obra s ser declarada literria quando
referendada por "instncias de
legitimao." Estas instncias seriam
representadas pelas "universidades, os
suplementos culturais dos grandes
jornais, as revistas especializadas, os
livros didticos, as histrias literrias
etc." (ABREU, 2006, p.40)
Neste momento que
percebemos que no basta apenas a
criao pela criao e que realmente
existem interesses, vises polticas e
ideolgicas que determinam toda uma
tradio. Por isso somos levados a
concordar mais uma vez com a posio
de Mrcia Abreu, pois o consenso em
torno da Grande Literatura ser sempre
difcil, j que parece baseado no cultivo
de uma instncia evanescente, o
chamado "gosto literrio". Basta citar as
eternas listas de leituras imperdveis
para constatarmos que alterando-se o
jri, modificam-se tambm os eleitos.
Os motivos para referendar uma
obra como sendo ou no literria,
possuidora ou no da dita literariedade
podem ser os mais arbitrrios.
Suscitando assim, indagaes
interessantes para uma investigao
como esta: o que esse estranho objeto
denominado literatura? O que
caracteriza a qualidade de uma obra
literria? Se consideramos que parte da
crtica rejeita a produo da literatura
marginal alegando o carter meramente
documental das obras, mero reflexo e/ou
registro da violncia cotidiana das
periferias, caracterizando tais produes
como mera denncia e, portanto,
negando-lhes "qualidade literria", a
questo fundamental parece ser a
seguinte: as obras apelando s questes
da realidade mais brutal conseguem
extrapolar o mero registro,
transformando esse real em um processo
de constituio para as narrativas?
Se considerarmos os
apontamentos de Terry Eagleton, em sua
obra Depois da teoria, a respeito de
fico no temos problemas em admitir
que os textos produzidos pelos escritores
perifricos, assim como Ferrz, so
16
produes ficcionais. Nossa afirmao
se embasa nas colocaes do autor:
"[...] a fico incapaz de contar a verdade. Se uma autora parte para nos garantir que o que est afirmando agora realmente verdade que, literalmente, de fato aconteceu tomaramos isso como uma declarao ficcional. Romancistas e contistas so como o menino que brincava de gritar por socorro: esto condenados a ser perpetuamente desacreditados. Voc poderia pr a declarao numa nota de rodap e assin-la com suas iniciais e a data, mas isso no o faria passar da fico para o fato. O subttulo "Um romance" suficiente para garantir isso. "(Eagleton, 2005, p.130)
Sendo assim, as obras as quais
nos referimos e que so o corpus de
nossa anlise, no podem deixar de ser
caracterizadas como ficcionais, mesmo
que muitas das vezes sejam vistas como
mero reflexo do real. Pois a partir do
que nos expe Eagleton o leitor no ver
a obra como simples descrio do
cotidiano destes autores mesmo que
assim seja o leitor dessa obra passa a
ter uma funo de extrapolar o narrado,
transformando esse cotidiano em um
processo de constituio para as
narrativas.
talo Moriconi em seu texto
"Circuitos Contemporneos do
Literrio" colabora para pensarmos a
questo da literatura e afirma em seu
texto que "Enquanto fenmeno
histrico, "literatura" define-se
nuclearmente como arte verbal escrita,
da narrativa ficcional ou da lrica, posta
a circular no mercado na forma-suporte
do livro." (MORICONI)
No entanto, vale ressaltar que
Moriconi expe nesse texto trs
circuitos, que para o autor, se
caracterizam como fundamentais para
entender o literrio contemporneo o
circuito miditico, o circuito crtico e o
circuito da vida literria alm de um
quarto circuito que o ensasta se diz
obrigado a mencionar- o circuito
alternativo que de acordo com o autor,
compreende o que nesta abordagem nos
interessa "[...] o campo dos relatos
prisionais, dos relatos brutos da periferia
urbana brasileira (o novo serto) e
demais escritas e assinaturas de no
profissionais. "(MORICONI).
De acordo com o pesquisador
"nesse circuito [se refere ao alternativo],
j no lidamos com literatura, se
consideramos que o conceito de
literatura implica a circulao num
mercado de livro e a condio
profissional de produo deste livro, do
lado do autor ou autora, atores principais
do sistema." (MORICONI)
Entretanto, apostamos que no
bem assim que ocorre com a literatura
marginal (perifrica) contempornea j
que essa literatura pelo que entendemos
eclodiu de forma inesperada e conseguiu
17
espao no mercado de livros. O escritor
Ferrz exemplo do que afirmamos j
que possui quatro livros lanados pela
editora Objetiva e j foi traduzido em
outras lnguas para vendas fora do pas
pela editora El Alefh (Espanha) e pela
editora Palavra (Portugal) construindo
assim a nosso ver um sistema com
condies profissionais de produo, o
que nos leva a questionar os limites do
circuito alternativo referendado por
Moriconi e encarar essas produes
ficcionais como literrias.
No entanto, em vista das
dimenses desta discusso no achamos
pertinente encerr-la com nenhum
veredicto, acreditamos que ainda h
vrios pontos a serem discutidos, mas
tambm que o enfrentamento com estas
polmicas se faz necessrio para que se
forjem suposies que resultem em
embates tericos acerca destas questes.
Para Ferrz, organizador da
antologia Literatura Marginal o
enfrentamento aberto dos textos
publicados com as classes dominantes
encaradas como instncias de
legitimao , indicia a vontade de
assumir uma voz prpria, evitando-se
atravessadores:
"A capoeira no vem mais, agora reagimos com a palavra, por que pouca coisa mudou, principalmente para ns. No somos movimento, no somos novos, no somos nada, nem pobres
porque pobre, segundo o poeta da rua, quem no tem as coisas. Cala a boca, negro e pobre aqui no tem vez! Cala a boca! Cala a boca uma porra, agora a gente fala, agora a gente canta, e na moral agora a gente escreve. Quem inventou o barato no separou entre literatura boa /feita com caneta de ouro e literatura ruim/escrita com carvo, a regra s uma, mostrar as caras. No somos o retrato, pelo contrrio, mudamos o foco e tiramos ns mesmos a nossa foto. "(FERRZ, p.9, 2005)
O prprio autor questiona a
suposta separao entre literatura
boa/ruim; relacionando assim com a
predominncia de classes (rico
simbolizado pelo ouro/ pobre
simbolizado pelo carvo); este pequeno
excerto retirado do texto denominado
"Terrorismo Literrio" tem a inteno
maior de colocar em xeque a existncia
de uma produo muitas vezes
desconsiderada ou deixada margem,
mas que por meio dos textos literrios,
ou seja, da produo cultural quer ser
"ouvida".
De certa forma, essa vontade de
adquirir um "espao de direito" faz com
que surja o interesse de diversos
pesquisadores e leitores. Alm de um
espao relevante no campo da crtica
cultural e literria, que no poupa
esforos para tentar analisar esse
movimento atual.
18
OLHARES SOBRE A VIOLNCIA
Nota-se nas narrativas
contemporneas um grande apelo s
questes cotidianas. Gostaramos de
privilegiar a violncia como temtica
importante no contexto da literatura
marginal dos anos 90, claro que no
podemos generalizar as produes e
seus temas, no entanto, a violncia um
elemento muito recorrente nas prosas
dos 'ditos marginais' contemporneos.
Neste sentido apreciamos a
violncia como elemento temtico das
narrativas de dois autores: Rubem
Fonseca (anos 70) e de Ferrz (anos
90/00). Tentando observar de que forma
essa violncia apresentada aos leitores,
selecionamos dois contos e buscamos
observar a "maneira" como os autores
apresentaram essa violncia ao leitor.
Quando falamos em violncia,
somos remetidos facilmente a mais
notria das violncias, ou seja, a fsica,
mas no podemos deixar de enfatizar a
existncia de outras formas de violncia
tais como violncia de gnero, familiar,
domstica, moral, psicolgica e sexual.
Quando dizemos "Literatura
Marginal" inegavelmente poderiam
surgir no mnimo duas abordagens
interpretativas. A primeira, a qual o
trabalho tenta abordar enfaticamente, a
produo literria produzida pelos
chamados marginais" ou excludos
sociais, moradores de favela, e que
produzem textos literrios. Aqui,
tomaremos como exemplo o escritor
Ferrz.
Outro tipo de "literatura
marginal" poderia ser representado pelo
autor Rubem Fonseca, seria uma
literatura sobre marginais, no
produzida por eles e nem para eles e que
reavivaria o velho dilema do narrador de
A Hora da Estrela de Clarice Lispector
que representa o intelectual consciente
das mazelas de seu pas e que sofre
porque nunca ser lido por aqueles de
quem sua literatura fala. Embora Rubem
Fonseca nunca tenha pretendido
escrever uma literatura engajada,
inegvel que em muitos de seus contos
proliferam os marginais excludos da
sociedade.
J Ferrz representa escritores
que esto na periferia e fala de fatos
sobre os quais mostra conhecimento
pela convivncia diria com a violncia.
Enquanto Rubem Fonseca fala a partir
de um olhar externo. Importante
analisarmos que so vivncias,
experincias e olhares totalmente
distintos, e que discorreram em suas
narrativas sobre uma mesma vertente, a
da violncia. Portanto discutiremos a
questo da violncia nas narrativas
contemporneas, analisando tambm a
19
busca da representao do outro, da
alteridade.
"O COBRADOR" E "ABISMO
ATRAI ABISMO"
O cobrador" faz parte de uma
coletnea de contos lanados em 1979,
pelo escritor Rubem Fonseca. O conto
retrata os pensamentos e os atos
violentos de um narrador-personagem
que tem o intuito constante de cobrar da
sociedade. como se o "outro" lhe
devesse quase tudo de que necessita para
viver. E promove essa cobrana por uma
srie de assassinatos, estupros e pela
violncia fsica.
O narrador representa uma classe
distinta de boa parte das demais
personagens do conto, e evidenciamos
este tipo de postura por alguns
comentrios emitidos pelo narrador-
personagem, como nos fragmentos: "Na
praia somos todos iguais, ns os fodidos
e eles." (FONSECA, 1979, p.175) ou em
um poema de autoria do narrador-
personagem recitado para uma mulher
mais velha com a qual teve um breve
envolvimento "Os ricos gostam de
dormir tarde/ apenas porque sabem que
a corja/ tem que dormir cedo para
trabalhar de manh/ Essa mais uma
chance que eles/ tm de ser diferentes:/"
(FONSECA, 1979, p. 169).
A voz narrativa firma-se como
uma voz excluda da sociedade. O tema
central do conto a busca pela "justia"
entre classes. Desse modo, a matria
com que Rubem Fonseca trabalha, est
na sociedade e nas ruas, buscando por
meios no convencionais e
"politicamente incorretos" a igualdade
entre as classes.
O ttulo bem ilustrado pela fala
incisiva do narrador: "Eu no pago mais
nada, cansei de pagar!, gritei para ele,
agora eu s cobro!" (FONSECA, 1979,
p.166). O narrador-personagem que no
nomeado em momento nenhum do
conto, assim como a maioria de suas
vtimas, "o cobrador" e est disposto a
mostrar sociedade por meio da
violncia, que merece seu espao, e que
merece tudo que a classe qual no
pertence sempre teve acesso.
O que fortalece esse aspecto de
cobrana so as vrias necessidades que
ele afirma ter, o que pode ser observado
neste excerto: "Esto me devendo
comida, buceta, cobertor, sapato, casa,
automvel, relgio, dentes, esto me
devendo." (FONSECA, 1979, p.166)
Em certos momentos a sua raiva toma
propores maiores, e isso acontece
quando a personagem assiste a
programas televisivos nos quais a
classe-mdia a personagem dominante.
20
O conto um misto de violncia
fsica, violncia sexual, crtica social e
anti-herosmo, tudo isso com uma
exacerbao de detalhes. Pode-se dizer
que a narrativa consegue promover uma
seqncia de flashes. A composio da
narrativa minuciosamente descritiva,
em alguns momentos conseguimos
facilmente imaginar a cena, pela
sensibilidade de composio que o
escritor demonstra ter.
"Curva a cabea, mandei. Ele curvou. Levantei alto o faco, segura nas duas mos, vi as estrelas no cu, a noite imensa, o firmamento infinito e desci o faco, estrela de ao, com toda a minha fora, bem no meio do pescoo dele. A cabea no caiu e ele tentou levantar-se, se debatendo como se fosse uma galinha tonta nas mos de uma cozinheira incompetente. Dei-lhe outro golpe e mais outro e outro e a cabea no rolava. Ele tinha desmaiado ou morrido com a porra da cabea presa no pescoo. Botei o corpo sobre o pra-lama do carro. O pescoo ficou numa boa posio. Concentrei-me como um atleta que vai dar um salto mortal. Dessa vez, enquanto o faco fazia seu curto percurso mutilante zunindo fendendo o ar, eu sabia que ia conseguir o que queria. Brock! a cabea saiu rolando pela areia. Ergui alto o alfanje e recitei: Salve o Cobrador!"(FONSECA, 1979, p. 173)
A narrativa uma seqncia de
fatos violentos. Em seus momentos de
"cobrana", o personagem acaba por
destruir o consultrio de um dentista,
chutar a lata de um cego que pede
esmolas na rua e atirar em um homem
que andava em sua Mercedes. Alm
disso, mata um muambeiro a tiros,
depois atira em um casal de jovens,
estando a mulher grvida, e estupra
outra de classe nobre.
Apenas em casos excepcionais, o
"cobrador" no mata suas vtimas e
nessas ocasies considera-se um
indivduo "justo". A respeito de um caso
fortuito com uma mulher mais velha,
afirma: "Essa fodida no me deve nada,
pensei, mora com sacrifcio num quarto
e sala, os olhos dela j esto
empapuados de beber porcarias e ler a
vida das gr-finas na revista Vogue."
(FONSECA, 1979, p.170).
No sabemos nada da vida deste
narrador, apenas sua busca
incondicional por 'justia'. No
reconhecemos na personagem um
indivduo que aceita a ordem social
estabelecida. Rubem Fonseca nos
interessa ao trazer j nos anos 70 uma
postura inquietante.
O que na contemporaneidade,
para autores como Ferrz tratar da
questo da violncia?
Em 1934, Walter Benjamin
promoveu uma conferncia que resultou
em um texto denominado "O autor como
produtor" em que a tenso central de sua
anlise baseou-se justamente na dialtica
entre 'tendncia politicamente correta' e
'qualidade literria'.
21
O contexto em que Benjamin
escreve era marcado por uma forte
presso do partido comunista pelo
alinhamento poltico dos intelectuais e
artistas, exigindo-lhes um engajamento
comprometido com as diretrizes
partidrias. A "tendncia" politicamente
correta significava o apadrinhamento
dos mais pobres e necessitados pelos
intelectuais do partido. Dessa forma, a
qualidade literria era uma caracterstica
secundria em relao tendncia
poltica da esquerda revolucionria.
Segundo as diretrizes partidrias, a obra
literria seria considerada de
"qualidade" se o artista se
comprometesse com as causas e anseios
da classe operria. S assim, a
'qualidade' da obra de arte estaria
assegurada. Para Benjamin qualidade e
tendncia no so caractersticas
opostas. Na condio de produtor, o
autor deveria zelar pela produo de sua
obra, preocupando-se com sua escrita,
com a experimentao formal,
comprometendo-se com a pesquisa da
inovao esttica e nessa condio de
autor-produtor assumiria uma tendncia
poltica progressista.
Como Rubem Fonseca e Ferrz
lidam com a questo da violncia na
encruzilhada entre 'tendncia poltica' e
'qualidade literria'? A grande questo
que nos interessou a partir da leitura do
texto de Benjamin "O autor como
produtor" foi pensar como a literatura
marginal (perifrica) contempornea
lida com as duas faces de uma mesma
moeda, segundo o pensador alemo.
O autor procura explicitar que
estes aspectos qualidade literria e
tendncia politicamente correta no
precisam competir: "Pretendo mostrar-
vos que a tendncia de uma obra
literria s pode ser correta do ponto de
vista poltico quando for tambm correta
do ponto de vista literrio. Isso significa
que a tendncia politicamente correta
inclui uma tendncia literria"
(BENJAMIN, 1987, p.121),
acrescentando que a "tendncia literria"
de que trata o que determina a
"qualidade da obra".
Parece-nos que Benjamin
defende a existncia de um labor
necessrio para a produo da obra
literria, uma necessria transformao
do material "real" em ficcional. A
questo que gostaramos de colocar em
debate est intrinsecamente relacionada
a vrias discusses que permeiam o
texto de Benjamin e incisivamente
relacionada s inmeras crticas
lanadas s produes da dita literatura
marginal (perifrica). Ser que estes
jovens autores "marginais" conseguem
promover esse processo de transposio
do real ao ficcional? As obras destes
22
jovens autores possuem "qualidade
literria", entendendo-a aqui como
aquela operao de transformao do
material de que tratam (a realidade? A
violncia?)?
As obras analisadas parecem de
certa forma ir contra o pressuposto de
Benjamin literalizao das condies
de vida se dermos ouvidos s fortes
crticas lanadas s produes literrias
marginais contemporneas pelo
explcito apelo que fazem ao real. No
entanto, como definir se estas produes
apenas refletem as caractersticas de
uma comunidade e/ou de um grupo
social? At que ponto essas narrativas
so apenas "informativas? Ou se
podemos consider-las literrias? Ser
que existem critrios que conseguem
estabelecer estes limites to nebulosos?
Ou ser que para os escritores
contemporneos "marginais" a dualidade
exposta por Benjamin no faz nenhum
sentido j que consideram que seguir a
tendncia poltica, repudiar o sistema j
o 'motivo', a causa que faz valer a pena
escrever, justificando, portanto a
insero no sistema literrio?
Uma citao de Ferrz contida
no texto Terrorismo Literrio diz muito
do comportamento adotado pelos
escritores "marginais" em relao ao
mercado: "Somos o contra sua opinio,
no viveremos ou morreremos se no
tivermos o selo da aceitao, na verdade
tudo vai continuar, muitos querendo ou
no." (FERRZ, 2005 , p. 9).
Nessa breve citao podemos
observar que a postura de Ferrz de
uma possvel ruptura com os moldes
aceitos pela sociedade, ou como escritor
diz pelo "sistema". E fica claro que no
se importar com o julgamento que
recair sobre sua atitude, j que tudo vai
continuar da mesma forma tendo ou no,
a aprovao geral do sistema. Se
aproximando tambm, do personagem
principal de "O Cobrador", conto de
Rubem Fonseca, que no quer saber
quais leis regem a ordem social, quer o
que 'dele', esteja com quem estiver.
Joo Cezar de Castro Rocha em
seu ensaio "Dialtica da marginalidade
caracterizao da cultura brasileira
contempornea" 5 insere o imaginrio
literrio da marginalidade no dilogo
com a malandragem valendo-se do
famoso ensaio de Antnio Candido,
"Dialtica da Malandragem". Castro
Rocha identifica, no contexto
contemporneo, uma transfigurao do
conceito de malandragem, observando
as mudanas de valores da sociedade.
5Disponvel em: < http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2004/03/275292.shtml>, acesso em: 30 de mar. de 2008.
23
De acordo com a anlise de
Candido, incorporamos facilmente ao
imaginrio social a figura do malandro
como tipo idealizado. O 'malandro'
caracterizado como um smbolo de
inteligncia e provocador de uma
afetividade popular, aspecto sobre o qual
reflete Castro Rocha: "Passamos
dcadas idealizando o malandro. Mas
no existe nenhuma possibilidade de
idealizao da figura do marginal"
(ROCHA). De acordo com a proposta de
Castro Rocha, a figura do "malandro"
nunca elaborada como sendo m, pois
este sempre aparece caracterizado de
forma simptica e um tanto rebelde. J
a representao simblica do marginal
no raro aponta para as franjas da
sociedade, quando no para o indivduo
criminoso capaz de ameaar a
sociedade.
Segundo as reflexes de Castro
Rocha, o malandro passa, na literatura
contempornea a marginal. No h mais
espao para a dialtica, pois a 'inocncia'
e esperteza do malandro, capazes de
garantir-lhe um lugar com jeitinho na
sociedade que insiste em negar-lhe um
lugar de direito no fazem mais parte da
postura ativa do marginal, que quer
assumir um papel que sempre lhe foi
negado, como explicita Ferrz: "No
somos o retrato, pelo contrrio,
mudamos o foco e tiramos ns mesmos
a nossa foto." (FERRZ, 2005, p. 9). O
que parece estar em pauta para os
escritores marginais que esse outro
pertencente classe mdia e mdia alta,
que nunca deu importncia para a sua
existncia como excludo social, leia e
considere sua voz perturbadora na
sociedade contempornea.
Voltando anlise das obras
literrias, podemos afirmar que em
Rubem Fonseca, a violncia est
presente tanto nos atos do narrador,
assim como em certos momentos na
linguagem utilizada. Rubem Fonseca
trabalha com o misto de popular e
erudito, aterrorizante e lrico e o cmico
e trgico.
Os dilemas enfrentados pelo
narrador ficam ntidos quando
observamos atitudes totalmente
contrrias aos atos violentos que comete
como podemos observar no seguinte
trecho: "Conversamos na rua. Voc est fugindo de mim? ela pergunta. Mais ou menos digo. Vou com ela pro sobrado. Dona Clotilde, estou com uma moa aqui, posso levar pro quarto? Meu filho, a casa sua, faa o que quiser, s quero ver a moa."(FONSECA, 1979 , p. 179)
Ora o narrador demonstra ter
uma autoconfiana exacerbada,
chegando s vezes a se mostrar
prepotente "Onde eu passo o asfalto
derrete." (FONSECA, 1979, p.173) ,
ora totalmente frgil. A ambigidade se
24
mostra mais presente se analisarmos a
personagem. Ela capaz de provocar em
seus leitores uma 'classificao' um tanto
contraditria, como se carregasse em
si a capacidade de se mostrar heri/anti-
heri. Para os excludos sociais um
verdadeiro smbolo de herosmo, j que
busca uma igualdade entre classes.
Entretanto, os meios de que se utiliza, o
colocam na condio de anti-heri pela
extrema brutalidade com a qual
promove suas cobranas no decorrer da
narrativa.
Em certos momentos toda esta
crueldade parece doentia, at mesmo
para o personagem: "A rua est cheia de
gente. Digo, dentro da minha cabea, e
s vezes para fora, est todo mundo me
devendo!" (FONSECA, 1979, p.166).
Outro acontecimento que tem
bastante relevncia no conto o
aparecimento de Ana. Uma moa rica,
dona de uma beleza singular, o que faria
a moa uma perfeita "vtima" do
cobrador. Porm isso no ocorre. Desde
o incio o narrador-personagem parece
ter se encantado com ela. Ana
representante da classe alta, mas no
alvo da violncia do "cobrador". O que
Ana teria de diferente? Uma
caracterstica incomum de Ana em
relao s outras personagens do conto
que ela no teme "o cobrador".
Aps conhecer Ana e ouvir dela
a confisso de que no tinha medo dele,
o cobrador muda seus planos e modifica
seu modo de 'cobrar'. Esta personagem
de suma importncia no conto, tendo em
vista que Ana ensina ao cobrador outras
formas de efetuar sua vingana.
Como podemos observar na
anlise comparativa dos contos, a
temtica aborda a mesma, talvez a
brutalidade e a intensidade de tal
violncia seja at maior na obra de
Rubem Fonseca em comparao a
produo de Ferrz. No entanto, vale
ressaltar que o modo com que essa
violncia exposta ao leitor
substancialmente diferente, alm de sua
posio como sujeito-autor no sistema
literrio brasileiro tambm constar de
origens distintas. Prova disto pode ser a
escolha das vozes atribudas aos
personagens pelos escritores em
questo.
O foco narrativo do conto de
Rubem Fonseca o de um narrador-
personagem. Pode ser uma estratgia do
autor em consolidar um pacto e uma
aproximao com o leitor. Como se
fosse necessrio tornar explcita a
participao e a vivncia dos fatos
expostos no decorrer da narrativa.
Aparentemente, o intuito de uma
possvel 'comprovao' da vivncia do
narrador-personagem o que poderia
25
gerar uma maior credibilidade ao
narrador executor de todas aquelas
agresses brutais. Como vemos no
trecho: "Dei um tiro no joelho dele.
Devia ter matado aquele filho da puta"
(FONSECA, 1979, p.166).
J a obra contempornea do
escritor Ferrz, intitulada Manual
Prtico do dio, escrita em terceira
pessoa do singular por um narrador
observador, ou seja, o narrador no se
inclui na narrativa, apenas tem o papel
de 'contar' o que presenciou para seus
leitores. Se observarmos o foco do
captulo aqui destacado, observaremos
que o autor ao escolher o narrador em
terceira pessoa parece no estar
preocupado em 'convencer' o leitor do
que conta. Como vemos no trecho a
seguir: "Armandinho mirava a pistola na
cabea de rika e no deixava de achar
muito engraado ver a dona daquele
apartamento extremamente luxuoso,
com aquela cara, ele notava que assim
ela no parecia to alta..." (FERRZ,
2003, p. 191).
Esse paralelo foi realizado para
refletirmos sobre o posicionamento dos
autores diante de suas narrativas. Ser
que pelo fato de Ferrz ser do gueto e
falar de acontecimentos que
possivelmente fazem parte de seu
cotidiano, faz com que sua narrativa
funcione como uma espcie de
testemunho cuja posio de observao
garante o pacto com o leitor? Em
contrapartida a utilizao de um
narrador-personagem na obra de Rubem
Fonseca um artifcio de aproximao
representao do marginal?
E interessante pensar na sucesso
de "conflitos" importantes para a
discusso no mbito dos estudos
literrios que o boom da literatura
marginal provoca.
"Tratando de espaos no valorizados socialmente, como a periferia dos grandes centros urbanos, ou os enclaves murados em seu interior, como as prises, os textos citados como alguns outros vem conseguindo uma visibilidade na mdia, xito perante parte importante da crtica e reconhecimento dentro do campo literrio e cultural, provocando debates sobre sua legitimidade, enquanto expresso de um sujeito social at ento sem voz, ou mesmo sobre a possibilidade de uma nova vertente temtica e estilstica, correspondente matria que traduzem." (Pellegrini, 2008, p. 41)
Seria interessante considerarmos
a citao de Tnia Pelegrini para
refletirmos sobre essa "nova vertente
temtica e estilstica". A violncia e o
engajamento social, contidos na maioria
das obras marginais contemporneas so
caractersticas de uma vertente
temtica.
O romance Manual Prtico do
dio de Ferrz conta a histria de um
grupo que planeja um assalto a um
26
banco. O captulo "Abismo atrai
abismo" foi escolhido para comparaes
com a obra de Rubem Fonseca e inicia-
se relatando a extorso de um delegado
a um dos integrantes da quadrilha do
roubo. O autor promove neste primeiro
momento uma crtica polcia, pela
corrupo. O delegado chega a dizer a
Rgis, que o que lhe interessava, ou seja,
o dinheiro, tambm era interesse de
todos ali. E que o melhor a fazer era
ouvir e concordar.
Durante a narrativa de Ferrz h
uma constante mudana no foco de
observao. Avaliamos tal postura
tambm como artifcio de construo
narrativa, em que para delimitar
diferentes ngulos o escritor opta por
marc-los graficamente por meio de
espaos em branco no decorrer de toda a
obra.
Aps uma dessas mudanas de
foco narrativo, narrado um assalto a
um apartamento de luxo. Violncia
direta a uma famlia de classe mdia
alta. Como observamos na citao:
"Celso estranhou quando Alfredo que estava indo com a cadeira na sua frente soltou um grito e desmaiou. Ao chegar entrada da sala, rapidamente Celso passou pela cadeira de roda e tomou outro susto quando viu a cena, Armandinho havia desferido vrios golpes com o cabo da pistola no rosto de rika e ela estava com o rosto todos ensangentado e cada no cho." (FERRZ, 2003, p.194)
Esse trecho resultado da revolta
de Armandinho, um dos assaltantes,
com a administradora de empresas que
est sendo vtima do assalto, pois ela
supe que o assalto tenha sido uma
"fita" que a empregada passou. Ou seja,
que tenha sido a empregada que
forneceu os dados para que o assalto se
consumasse. A revolta de Armandinho
estava em defender a funcionria de
rika.
Poderamos falar da alteridade
nas obras literrias marginais
contemporneas, em que uma nica voz,
tem o intuito de representar toda uma
comunidade, dar voz a uma comunidade
antes negligenciada. o que pode
simbolizar parte deste assalto, em que
observamos a defesa de uma classe
excluda. Nestes momentos de violncia
e crueldade, as classes se igualam: "
Agora fudeu, dona, todo mundo igual,
naum tem patro, num tem empregada, e
se vacil, vai ta tudo cheio de sangue em
menos de segundos, o primeiro a morrer,
se tentar algo, o pivete a." (FERRZ,
2003, p. 192).
Ferrz, morador da favela,
empresta sua voz comunidade
excluda, j Rubem Fonseca um
elemento estranho a essa excluso, e
tenta, a fim de garantir a confiabilidade
27
de sua representao, promover um
pacto com seus leitores.
A questo da violncia est
inegavelmente presente na estrutura
narrativa dos dois textos brevemente
analisados. E como se a violncia
estruturasse o 'fazer' literrio de Ferrz e
de Rubem Fonseca. Entretanto,
interessante pensarmos em que nvel
essa estrutura narrativa fortalecida ou
enfraquecida com a utilizao
indiscriminada da violncia.
Atravs da breve anlise que
empreendemos na tentativa de realar as
diferenas e semelhanas entre os dois
textos literrios destacados, podemos
concluir que relevante o modo como
os escritores lidam com a representao
da marginalidade. Rubem Fonseca fala
em primeira pessoa, tenta avivar uma
situao marginalizada, tenta falar de
uma esfera a qual no pertence, de um
outro que no definitivamente seu
'mano', seu irmo, e para isso cria uma
"persona", na tentativa de criar seu
'efeito de real'. A posio de Ferrz
totalmente diversa: o autor reivindica o
conhecimento da causa, ele prprio,
autor marginal, convive com os
marginais e o resultado ficcional disso
a exposio dos fatos pelo narrador
como testemunha, como observador da
violncia real. Respaldando por sua
condio margem, o pacto de
verossimilhana pode ser perfeitamente
reforado por um narrador em terceira
pessoa, meninos, eu vi.
IV CONCLUSO
LITERATURA DO INCMODO Retomando nossas discusses
acerca do tema podemos detectar com
clareza que nossa premissa maior se
confirma. Apostamos, pelos inmeros
impasses explorados ao longo de nosso
texto, que a literatura marginal
(perifrica) um 'movimento' presente e
perturbador na cena literria
contempornea.
Talvez a maior evidncia disso
seja o fato de que a maior polmica
provocada pelo surgimento de tais textos
gire em torno da pergunta sobre se a
produo chamada de literatura marginal
se caracteriza como "literria". No
entanto, entendemos que a confirmao
ou a refutao a este questionamento
pode no ser algo to simples de
delimitar. Richard Freadman e Seumas
Miller na obra Re-pensando a Teoria
afirmam que:
"[...] preciso deixar claro que embora exista, em nvel conceitual, uma distino a ser traada [...] as fronteiras entre o literrio e o no-literrio no so ntidas. A maioria dos textos possui uma dimenso literria e uma no-literria, e na prtica muito difcil caracterizar cada texto como
28
(predominantemente) literrio ou no-literrio, ou isolar todos os elementos literrios dos no-literrios dentro de qualquer texto especfico." (FREADMAN e MILLER 1994, p.254)
Neste sentido, observamos que
um mesmo texto tem a possibilidade do
"hbrido", da mistura, de elementos
considerados literrios ou no. Ento,
talvez por isso possamos afirmar que o
surgimento da literatura marginal cause
tanto rebulio no mbito da teoria
literria: por apostar no hibridismo, no
deslizamento, no alargamento das
fronteiras do que h pouco tempo era
certamente apontado como literatura.
Observar a transio da "figura
marginal" no contexto literrio brasileiro
e promover paralelos entre estes
perodos analisados (70 e 90) foi de
suma importncia para confirmar a
premissa do 'incmodo' que essa
literatura provoca. Muitas diferenas
foram detectadas, tanto nos meios de
produo, quanto na sociedade e nos
prprios produtores desta literatura
"marginalizada". Como j explicitamos,
a inteno do "Marginal"
contemporneo tematizar seu cotidiano
violento, colocar em questo a cultura
perifrica e acima de tudo inscrever na
histria um grupo antes silenciado,
dando-lhe voz prpria.
importante notar que um
grande nmero de escritores envolvidos
com a produo ficcional atual so
autores nascidos na periferia que
enfrentam adversidades, e que
despontam em um momento mpar, fase
de deslocamentos, de transio, de
reestruturao de valores, forando a ns
que pertencemos ao campo literrio, a
re-pensar a crtica e a teoria.
Estes autores encontram na
literatura uma forma de "incluso" e
tomam este espao como seu. Parecem
pressupor que esta 'incluso' pode ser
apenas simblica por isso reforam de
maneira quase "impositiva" seus ideais.
Como podemos observar no seguinte
excerto:
"[...] o ideal mudar a fita, quebrar o ciclo da mentira dos "direitos iguais", da farsa do "todos so livres", a gente sabe que no assim [...] Sabe duma coisa, o mais louco que no precisamos de sua legitimao, porque no batemos na porta para algum abrir, ns arrombamos a porta e entramos." (FERRZ, 2005, p.10)
No entanto, estar disposto e/ou
saber lidar com estas "novas posturas"
tambm no uma tarefa to simples.
Re-definir conceitos, padres de
qualidade e valores contemporneos
necessrio, principalmente para a crtica.
Afinal, como bem colocou Eagleton
"Nesse mundo, o que centro pode
deixar de s-lo da noite para o dia: nada
nem ningum permanentemente
29
indispensvel". (EAGLETON, 2005,
p.36).
neste sentido que
acreditamos a teoria "envolve relaes
complexas de tipo sistemtico entre
inmeros fatores; e no facilmente
confirmada ou refutada" (CULLER,
1999, p.12) como nos prope Culler em
seu texto "O que teoria?". Sendo
assim, nesse perodo de transio e
efervescncia em que nos encontramos
que a teoria justifica sua tarefa de
problematizar seu objeto de anlise
evitando estabiliz-lo como algo
atemporal.
V- AGRADECIMENTOS
Profa. Dra. Luciene Almeida
de Azevedo meu franco reconhecimento
pela maneira com que me apoiou nesta
investigao: uma orientao criteriosa,
sria, crtica e acima de tudo sincera, da
qual s me fez ter vontade de dar
continuidade prtica investigativa e a
minha vida acadmica; Agradeo
tambm por ter sido a precursora nos
estudos em Literatura Contempornea
da Universidade Federal de Uberlndia;
Ao Prof. Dr. Antnio Marcos
Pereira da Universidade Federal da
Bahia que a convite da Professora
Azevedo gentilmente exps suas crticas
e sugestes ao plano de trabalho;
Ao programa de Apoio
Iniciao Cientfica (PIAIC-UFU) pela
concesso do registro do projeto, por
meio do nmero H-017/2008, ao
Instituto de Letras e Lingstica e suas
dependncias;
Ao Grupo de Estudos em
Literatura Contempornea da
Universidade Federal de Uberlndia que
possibilitou vrias discusses e
indagaes que foram proveitosas ao
trabalho;
E aos colegas graduandos e
estudiosos de Literatura Contempornea
Carla rica Oliveira Ferreira, Fernanda
de Paula Vasconcelos, Jordnia A. da S.
Oliveira e Tiago Henrique Cardoso por
acompanharem o projeto, pelas
apresentaes conjuntas, pelas
discusses realizadas alm da presena
sempre efetiva.
VIREFERNCIAS
BIBLIOGRAFICAS ABREU, MRCIA. Cultura Letrada: literatura e leitura. So Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 2006. ALVES, Ana Cristina Tanns. Em busca do discurso potico de Aristide Klafke: Marginalia e contracultura. 118p. 2007. Dissertao de Mestrado. AZEVEDO, L. Estratgias para enfrentar o presente: a performance, o segredo e a memria (literatura contempornea no Brasil e na Argentina- dos anos 90 aos dias de
30
hoje) Tese de doutorado em Letras: Literatura Comparada: R.J.: UERJ, 2004. Indita. BENJAMIN, Walter. (1987) "O narrador" e "O autor como produtor". In: Magia, tcnica, arte e poltica. Ensaios sobre literatura, e histria da cultura. Obras escolhidas v. 1. So Paulo, Brasiliense. BOSI, Alfredo. "A escrita e os excludos". In: Literatura e resistncia. So Paulo, Companhia das Letras, 2002. BROCA, Brito. A Vida literria no Brasil. Editora: Jos Olympio, 1960. CANDIDO, Antnio. Dialtica da Malandragem. Disponvel em: acesso em: 02 de abr. de 2008. CAMPOS. Geir et al. Violo de Rua; Cadernos do povo brasileiro. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 1962. V. 1 e 2. COMPAGNON, Antonie. O demnio da teoria, Belo Horizonte, Editora: UFMG, 1999. COSTA LIMA, LUIZ. Histria, Fico, Literatura. SP, Cia das Letras, 2006. CULLER, J. Teoria literria: uma introduo. Traduo Sandra Vasconcelos. Beca Produes Culturais Ltda, So Paulo, 1999. DALCASTAGN, Regina. "A personagem do romance brasileiro contemporneo: 1990-2004". In: Estudos de Literatura Brasileira Contempornea, n26. Braslia, julho-dezembro de 2005, p.13-71.
Dicionrio Eletrnico Houaiss da Lngua Portuguesa. Verso 1.0-Dezembro 2001. Copyright 2001. Instituto Antnio Houaiss. Produzido e distribudo pela editora Objetiva. Ltda. EAGLETON, Terry. Depois da teoria: um olhar sobre os Estudos Culturais e o ps-modernismo/ traduo de Maria Lucia OliveiraRio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2005. ______. Teoria da Literatura. Uma Introduo. SP, Martins fontes. S/A FERRZ _______. Capo Pecado. Rio de janeiro, Editora objetiva, 2005. _______. Manual Prtico do dio. Rio de Janeiro, Editora Objetiva, 2003. _______. Literatura Marginal: talentos da escrita perifrica/Ferrz (organizador). Rio de Janeiro: Agir, 2005. ______. Ningum inocente em So Paulo. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2006. ______. Ferrz. Disponvel em: < http://www.ferrez.blogspot.com/>. Acesso em: 2008 FONSECA, Rubem. "O cobrador". In: O Cobrador. Rio de Janeiro, Editora Nova Fronteira, 1979. FREADMAN, Richard. Re-pensando a teoria. Uma crtica da Teoria Literria Contempornea. Richard Freadman e Seumas Miller; Traduo de Aguinaldo Jos Gonalves, lvaro Hattnher. So Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1994. HALL, Stuart. A identidade Cultural na ps-modernidade; traduo: Tomaz Tadeu da Silva, Guaracira Lopes Louro, Rio de Janeiro: DP&A Editora, 1997.
31
HOLLANDA, Helosa Buarque de. Esses Poetas uma antologia dos anos 90, (organizao), Aeroplano Editora, RJ, 1998. ______. 26 Poetas Hoje, (organizao, da 2 edio) RJ, Aeroplano Editora, RJ, 1998 JOBIM, Jos Lus. "Literariedade", E-Dicionrio de Termos Literrios, coord. de Carlos Ceia, ISBN: 989-20-0088-9. Disponvel em: , acesso em: 15 de jan. de 2009. LINS, Paulo. Cidade de Deus. So Paulo, Companhia das Letras, 1997. MATTOSO, Glauco. O que poesia marginal? 2a ed. Coleo Primeiros Passos. So Paulo, 1981. MORICONI, talo. Circuitos Contemporneos do Literrio. Disponvel em: acesso em: 07 de out. de 2008. NASCIMENTO, rica Peanha do. "Literatura Marginal": os escritores da periferia entram em cena. 2006. 197p. Dissertao de Mestrado. PELLEGRINI, Tnia. "No fio da navalha: literatura e violncia no Brasil de hoje". In: Ver e imaginar o outro: alteridade, desigualdade, violncia na literatura brasileira contempornea, Regina Dalcastagn (Org.) Editora Horizonte, 2008. PEREIRA, C. A. Messeder. Retrato de poca: poesia marginal nos anos 70. Rio de Janeiro, MEC/ Funarte, 1981.
PORTAL LITERAL. Do Capo para o mundo. Disponvel em: acesso em: 31 de dez. de 2008 ROCHA, Joo Cezar de Castro. Dialtica da marginalidade - caracterizao da cultura brasileira contempornea. cmi Centro de mdia independente. Disponvel em: http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2004/03/275292.shtml acesso em: 30 de mar. de 2008. SACOLINHA, 85 letras e um disparo. So Paulo: Editora Ilustra 2006. ______. Escritor Sacolinha. Disponvel em:< http://www.sacolagraduado.blogspot.com/> acesso em: 2008. SOUZA, Eneida Maria de. "A teoria em Crise" In: Crtica Cult. Belo Horizonte, Editora UFMG, 2002.