Post on 06-Nov-2015
description
De repente um professor japons faz uma estranha proposta
ao governo dos EUA: entregar uma bomba atmica para
experimentar os efeitos de uma certa Drgea Anti-A
1968/Agosto Lou Carrigan Publicado No Brasil Pela Editora Monterrey
Ilustrao De Capa: Bencio JVS - 400611 400725
MEMRIA
No primeiro volume desta novela, vimos Brigitte
Baby Montfort, a espi da CIA, vivendo uma aventura sensacional e indita de espionagem atmica.
Quem deseja uma bomba-A norte-americana, aps ter
possivelmente obtido outra da Rssia e outras, qui, dos
demais pases possuidores dessa arma terrvel?
De que plano diablico trata-se aqui e qual o seu
misterioso idealizador?
Iniciando suas investigaes em Miami, na Flrida,
onde entra em contato com o japons Masao Yoshimura,
que veio aos EUA pedir uma bomba, Baby , demonstrando sua mais do que nunca magistral eficincia, comea por
eliminar trs agentes da MVD sovitica, que Investigavam
Yoshimura, para logo aps, agora em Los Angeles, na
Califrnia, penetrar furtivamente num estdio
cinematogrfico onde est em processo de filmagem uma
produo intitulada A Caminho da Lua. Ali consegue vencer numa luta de jud um agressor faixa preta... Mas, subitamente, as luzes de muitas lanternas revelam aos
inimigos a presena de um intruso nos estdios da Jap-
American Pictures.
PARTE II
CAPTULO PRIMEIRO Tudo como num filme
Captura do chins
No h perdo para os traidores
O velho japons da barbicha deu outra ordem e os
demais nipnicos precipitaram-se para o homem que, perto
dos foguetes espaciais e estendido na areia como se quisesse
enterrar-se nela, tinha sido descoberto pelos fachos das
lanternas.
Brigitte apertou-se mais ainda contra a palmeira,
agachada ao mximo, felizmente ainda invisvel nas
sombras do bosque prximo praia. Por um instante, teve a
insensata idia de ajudar aquele homem, que no era outro
seno o do sinal no queixo, ao qual ela tinha seguido
enquanto ele, por sua vez, seguia Masao Yoshimura.
Foi uma idia que durou pouqussimo, j que sua mente
de espi, como sempre, soube adaptar-se imediatamente s
circunstncias. O certo era que o do sinal devia ter visto a
luta entre ela e o faixa preta e no tinha feito o menor gesto para auxili-la. Muito lgico, alis. E por isso, sem
rancor, atendendo apenas prpria convenincia e da
CIA, a agente Baby permaneceu imvel, enquanto meia dzia de japoneses lanaram-se contra o homem do sinal no
queixo.
Este ps-se de p ao compreender que tinha sido
descoberto. E como! Estava banhado de luz, piscando,
ofuscado pelo resplendor das lanternas.
Sacou um revlver, mas logo se convenceu de que no ia
conseguir nada com ele. No devia absolutamente estar
enxergando, ofuscado como se encontrava... E optou pelo
que lhe pareceu o mais conveniente naquelas circunstncias.
Deu meia volta e comeou a correr para a praia.
Ouviu-se outra ordem, sempre em japons, do velho da
barbicha. Os seis japoneses correram atrs do homem do
sinal. No se gritava, no se fazia escndalo. Era a tentativa
de fuga de um agente secreto surpreendido, o qual
compreendia que todas as suas possibilidades de conservar
a vida estavam na velocidade com que pudesse correr.
Sempre enfocado pelas luzes, Brigitte viu-o chegar
praia. Era evidente que tencionava lanar-se ao mar,
submergir, tentar evadir-se nadando, para onde quer que
fosse.
Estava a ponto de consegui-lo quando um fulgor cruzou
por entre os fachos das lanternas. O homem lanou um grito
e curvou-se para trs, levando as mos s costas. Mas
voltou-se quase imediatamente, apontando o revlver que
empunhava com a mo direita.
Ento, Brigitte viu outro fulgor no meio das luzes. O
homem largou o revlver e crispou as mos no cabo da faca
que sobressaia em seu peito...
O homem do sinal no queixo tornou a girar, mostrando a
faca que se tinha cravado pouco antes em suas costas. Um
novo giro, j com gua pelos joelhos, e viu-se a que tinha
no peito. Sbito, caiu, mergulhando na espuma de uma
diminuta onda que chegava mansamente praia privativa
dos estdios da Jap-american Pictures. Dois japoneses
meteram-se na gua, seguraram-no cada um por um brao e
arrastaram-no para a praia, na qual esperavam Masao
Yoshimura e o velho da barbicha. Masao dizia qualquer
coisa, mas o da barbicha movia negativamente a cabea,
sorrindo com amabilidade, como se perdoando as tolices de
uma criana.
Os dois japoneses chegaram arrastando o desacordado
Minoro, que deixaram aos ps do velho. Este no lhe fez o
menor caso. Tinha estendido uma das mos e nela recebeu o
que os outros retiraram do cadver do homem do sinal no
queixo.
Por entre as palavras japonesas, quatro francesas,
chegaram aos ouvidos de Brigitte: Melchior Bondieu,
Deuxime Bureau.
O revlver de Johnny surgiu novamente em sua mo, mas a cabea de Brigitte apareceu na janela do carro.
Tudo vai bem, Johnny. Afastemo-nos daqui. Ser melhor que voc me siga.
O txi passou junto do imponente carro negro de
Johnny. Baby ia ao volante e, no assento traseiro, ele viu fugazmente um homem, estendido numa posio no l
muito cmoda.
J longe da Jap-american Pictures, Brigitte estacionou o
txi diante de um bar e passou ao carro em que ia Johnny. Acendeu dois cigarros, colocou um nos lbios de seu
companheiro e comentou:
s vezes, at mesmo para convencer uma pessoa de que lhe estamos salvando a vida precisamos aplicar-lhe
alguns golpes.
Que se passou com o chofer? Nada. Mas se teria passado se ficasse mala tempo
esperando Melchior Bondieu. Acho que lhe salvei a vida...
Nosso querido Johnny II disse alguma coisa? No.
Ainda no teve tempo, claro... Voltemos ao motel, Johnny. Perdemos Yoshimura, de modo que s o poderemos reencontrar voltando ao motel, parece-me. Ou se
Johnny II conseguir saber de tudo a respeito da Jap-american Pictures ou algo relacionado com o tal Noburo
Tanaka.
Que aconteceu l dentro? Esto a caminho da Lua. Como? Explicarei depois... riu Brigitte. Enquanto isto,
voltemos ao motel. Ocorre-me que enquanto esperamos
Masao Yoshimura, talvez o nosso chins esteja fazendo o
mesmo. o lgico, no?
Parece, O motel a nica pista que resta ao filho do Ex-Celeste Imprio. Naturalmente, ele nos ver...
Oh, sim! Mas quando j for demasiado tarde. * * *
A pistola apareceu de repente, como se se materializasse
no ar, junto da janela. O homem que estava ao volante,
fumando, olhou-a atnito, aps um ligeiro estremecimento.
O rosto maravilhoso da jovem que tinha travado contato
com Masao Yoshimura em Miami apareceu atrs da pistola,
sorridente, amvel. Mas o homem no cometeu nenhum
engano.
No banco de trs, o chins tinha levado a mo direita
axila esquerda, mas um revlver apareceu na outra janela,
quase tocando a orelha do outro homem, do que estava
sentado junto ao do volante.
As mos quietas, china disse o tipo que o empunhava.
Aposto qualquer coisa como ele tem um nome, Johnny: no seja descorts.
Como queira... Johnny moveu o revlver. Podem fazer a honorvel gentileza de apear?
Somos de boa paz assegurou Brigitte. E estou convencida de que ser de vantagem para todos uma
conversa amistosa senhor... senhor Chang? Saiam do carro,
com as mos colocadas na nuca desde agora.
Os trs homens obedeceram. Os que estavam no assento
dianteiro eram brancos, norte-americanos, com toda a
certeza. A sombra das rvores, ao lado do parding do motel, de onde se viam as cabanas 10 e 12, os trs ficaram
com as mios na nuca, enquanto Johnny lhes tirava as armas.
Pronto disse. A conferncia ter lugar na cabana 10 decidiu
Baby. Creio que no lhes custar muito encontr-la. Caminhem. E se lhes interessa saber, direi que no me
importar nada elimin-los.
Chegaram cabana 10. Brigitte abriu a porta, entrou e
acendeu a luz, adiantando-se at o centro do living.
J, Johnny. Primeiro entraram o chins e os dois americanos.
Depois, Johnny, sempre os cobrindo com o seu revlver e levando os trs outros pendurados pela ala do gatilho no
dedo index de sua mo esquerda. Fechou a porta, colocou
na vertical as barras das venezianas e indicou o sof aos trs
homens.
Ali. Sentaram-se os trs, em silncio. Os dois americanos
tinham uma expresso logicamente torva, mas o chins
permanecia impassvel. Brigitte olhou-o durante alguns
segundos, atentamente, com um sorriso enganador nos
lbios.
Suponho que no se chama Chang alvitrou. No. Como se chama? No creio que isso tenha importncia. Nenhuma, certamente. Mas se vamos conversar,
preferia cham-lo por seu verdadeiro nome.
Que classe de conversa lhe interessa? Bem, parece-me uma tolice perguntar-lhe se pertence
ao Servio Secreto chins.
O oriental olhou-a fixamente, sem responder, Brigitte
esperou uns segundos. Por fim, suspirando, sentou-se numa
das pequenas poltronas e cruzou as magnficas pernas... que
no impressionaram ningum, dadas as circunstncias.
Senhor. Chang, at o momento, que eu saiba, morreram quatro homens. Trs deles eram russos, da MVD,
e at o momento s conhecemos o nome de um: Piotr
Stalinov. O outro era francs, do Deuxime Bureau,
naturalmente, e chamava-se Melchior Bondieu. O senhor,
sem dvida, conhecia a ambos... Esteve em Miami,
vigiando Masao Yoshimura?
Sim. No o vi. Felicito-o. Bem... Os homens que
mencionei por seus nomes eram da espessa barba vermelha
e o esbelto e moreno que tinha um sinal no queixo...
Lembra-se deles?
Sim. Estou convencida de que ambos tinham a pretenso
de conseguir, por intermdio de Masao Yoshimura e fosse
como fosse, a devoluo de uma bomba atmica. Que sabe
a este respeito?
Nada. Assim no nos entenderemos. E asseguro-lhe que
minha pacincia no durar muito, apesar de que minha
inteno provisoriamente amistosa. Diga-me: roubaram
uma bomba atmica chinesa, senhor Chang?
O oriental tornou a olh-la com aquela rigidez
inexpressiva durante uns segundos. Por fim, perguntou:
Para quem trabalha? CIA. Tudo isto do roubo de uma bomba atmica coisa da
CIA?
No. Como posso ter certeza do que diz? Porque o digo sorriu Brigitte. E voc quem ? Uma espi. Mas como tenho a inteno de permitir-
lhe continuar vivendo, desculpe se no lhe digo qual o nome
que utilizo para meus trabalhos. No lhe interessa.
Ento, tampouco lhe interessa o meu. Oh, sim! Quanto mais que tenho uma pistola e voc
no... Compreende?
Baby sorriu e o chins captou perfeitamente a frieza daquele sorriso.
Po Mao Ting sussurrou. Muito bem. E eles? perguntou ela, indicando os
outros dois.
Lewis Wilson e Comei Tully. Americanos, claro. Claro.
E esto trabalhando para o Servio Secreto chins? Exato. Brigitte olhou para os dois homens, o rosto to
inexpressivo como poderia estar o do mais chins de todos
os chineses.
Voc poder talvez ir embora, Po Mao Ting. Mas temo que seus... empregados no merecem o mesmo
respeito, de modo que ficaro. Sempre disponho de tempo
para mostrar aos traidores como feio trabalhar contra sua
ptria. No est de acordo?
Sem dvida. Comeamos a nos entendei. Portanto, continuemos
com uma conversa mais substancial. Voc trabalha para a
espionagem chinesa e est seguindo Masao Yoshimura...
Devido ao roubo de uma bomba atmica?
Masao Yoshimura no roubou nada da China. Bem. Digamos, ento, que a China entregou a
Yoshimura uma bomba, a fim de que...
No foi Yoshimura. No? A quem? A outro. Entendo... Yoshimura foi localizado posteriormente,
talvez no momento em que saiu do Japo, ou sua chegada
aos Estados Unidos... mais exatamente, a Los Angeles.
No?
Sim. Por que suspeitaram dele? Vigiamos um homem, tambm japons, que esteve
presente quando da entrega da bomba. Esse japons foi a
Tquio ver Masao Yoshimura e desapareceu. Ento,
vigiamos Yoshimura. Quando ele chegou aos Estados
Unidos, perdemos sua pista. Passamos a vigiar o aeroporto e
o vimos partir para Miami. Um de meus... empregados,
como diz, conseguiu tomar o mesmo avio. Depois,
chamou-nos a Miami.
Entendo. E agora esto na expectativa. Diga-me que...
Ns explicaremos melhor.
CAPTULO SEGUNDO Execues em srie
Demonstrao de jud
Dois chamados sem resposta
A voz soou na porta, uma frao de segundo aps ser
esta aberta rapidamente. Brigitte voltou-se para l com
natural sobressalto e surpresa.
Johnny fez algo mais... isto , quis saber. Quis atirar contra os trs japoneses que tinham aparecido to
Inesperadamente na cabana. O que vinha na frente se
adiantou.
Plop. Plop.
O agente da CIA lanou um gemido e soltou seu
revlver ao receber o balao no ombro direito; um balao
que o obrigou a girar violentamente para trs. O segundo
alcanou-o precisamente quando iniciara o giro e a bala
cravou-se em suas costas, derrubando-o de bruos. Os trs
revlveres resvalaram pelo cho, para os ps de Brigitte,
que tinha empalidecido bruscamente e parecia petrificada,
olhando para seu companheiro.
Johnny no se moveu. Po Mao Ting e os dois americanos, tampouco. Nem se moveram os trs japoneses.
Um deles tinha fechado a porta e apressara-se em colocar-se
ao lado do que disparara, tal como o outro. E os trs ficaram
atentos a Baby, que desviou seus olhos azuis de Johnny para contemplar os intrusos nipnicos.
Os trs usavam calas e camisas de malha pretas, e
sapatilhas da mesma cor. Os dos lados eram de estatura
comum, isto , um tanto baixos. Mas o do centro, o que
atirara, media mais de um metro e oitenta, tinha olhos
menores que os dos outros dois e a cabea completamente
raspada. Seus olhos oblquos fixaram-se malignamente nas
pernas de Baby e um sorriso cortante apareceu em seus finos lbios.
Deixe cair a pistola, miss Montfort. Brigitte obedeceu, sem deixar de fixar os malignos olhos
do japons. Era uma tensa troca de olhares em que cada um
se esforava por ocultar seus pensamentos.
Aps deixar cair a pistola, Baby desviou seus olhos do japons para olhar Johnny. Ps-se de p.
Torne a sentar-se ordenou o japons. Brigitte no lhe fez o menor caso. Aproximou-se de
Johnny, ajoelhou-se junto a ele e pousou a mo em seu pescoo. Um vivido claro de alegria brilhou em suas
pupilas azuis, que um segundo antes pareciam congeladas.
Olhou o japons.
H uma caixa de primeiros socorros no banheiro. Gostaria...
Deixe estar. No faa nada. Vai esvair-se em sangue... E dai? Tanto faz morrer de um modo ou de outro.
Fez sinal aos dois homens que o acompanhavam, sem
olh-los. E ambos apertaram o gatilho de suas armas
silenciosas.
O primeiro a morrer foi Po Mao Ting, que recebeu os
dois balaos no corao. Tinha iniciado um movimento para
incorporar-se, para tentar o salto que o colocaria fora da
trajetria dos projteis. Mas os dois impactos empurraram-
no novamente contra as costas do sof, sacudindo duas
vezes a cabea, bruscamente, uma a cada balao. Ficou
sentado, simplesmente, com a cabea cada sobre o peito, os
olhos abertos, como se olhassem para a mancha de sangue
que crescia em seu peito.
Lewis Wilson e Comei Tully tinham conseguido pr-se
de p mim salto nervoso. E Wilson foi lanado para trs,
por cima das costas do sof, impelido pela bala que o
atingiu em cheio na testa. Tully Conseguiu dar meio passo.
Apenas. Recebeu o balao no estmago, caiu de joelhos e
depois de bruos, com fora.
Depois, um dos japoneses aproximou-se dele e disparou
o tiro de misericrdia. Fez o mesmo com Po Mao Ting e
com Lewis Wilson, apesar de nenhum deles precisar de
mais chumbo para empreender sua viagem ao Alm.
E por fim, ficou olhando para Brigitte, que, ainda
ajoelhada, o belo rosto inexpressivo, tinha-se interposto
entre ele e o malferido Johnny. O japons moveu o revlver, indicando claramente que se afastasse, mas
Brigitte nem sequer pestanejou. E, muito menos, obedeceu
silenciosa ordem.
O gigante da cabea raspada disse qualquer coisa em sua
lngua e o rematador tornou a colocar-se a seu lado, em
silncio. O gigante deu unia volta pela cabana. A ltima
coisa que fez foi apanhar a bagagem de Brigitte, que deixou
a um lado da porta. Depois viu a maleta vermelha, apanhou-
a, abriu-a e nela guardou os revlveres de Johnny, Po Mao Ting, dos americanos e finalmente, aps um olhar de
curiosidade, a pequena pistola de Baby. Ento, olhou para esta e disse:
Temos que ir. J deve ter visto que no queremos mat-lo... no momento.
No irei sem atender meu companheiro. O da cabea raspada indicou o japons que dera o tiro de
misericrdia nos americanos e no chins.
Semba podia t-lo atendido devidamente. Como voc no quis isso, ele que morra sozinho.
Brigitte esteve tentada a desafiar novamente a ira dos
nipnicos indo ao banheiro buscar a caixa de primeiros
socorros, mas compreendeu que seria absurdo; se no
queriam que Johnny vivesse, teriam apenas que acabar de mat-lo, pois que ela no o poderia evitar. E no queria
provocar isso. Era melhor deixar Johnny moribundo, com a esperana de que Johnny II aparecesse por ali a tempo de tentar alguma coisa por ele.
Ps-se de p, lentamente.
Foi Masao quem os enviou? Masao Yoshimura? sorriu o da cabea raspada.
No, no... Mas voc esteve na Jap-american e lutou com
Minoru. Sabamos que Yoshimura tinha com ele uma moa
e j estvamos fazendo planos a respeito dela... quer dizer, a
respeito de voc. Deve saber que matamos um homem na
praia dos estdios.
Eu vi.
Ah... Voc tem bons nervos, Brigitte. o seu nome verdadeiro?
Verificaremos isso, naturalmente. E seu nome, na hiptese de possuir um? Direi o mesmo que o chins: no lhe interessa. Sempre me interessa saber como se chama um
homem que mais tarde ou mais cedo matarei.
Discutiremos isso em outro lugar sorriu o japons. Mas no ter oportunidade de matar-me, jamais.
Tentarei. Voc poder fazer o que quiser, esconder-se nos confins do mundo... mas de nada lhe valer.
As sobrancelhas do japons se arquearam..
Isso parece um desafio formal. Que voc tem medo de aceitar. Mmmm... J lhe disse que jamais ter oportunidade
de tentar nada contra mim. Quanto aos meus companheiros,
chamam-se Semba e Toshiro.
Seus companheiros no me interessam. Foi voc quem atirou em Johnny.
O japons olhou para o espio, que continuava
sangrando. Depois, muito sorridente, para Brigitte, cujos
olhos azuis pareciam querer hipnotiz-lo.
Meu nome Katsumi. E estava dizendo que voc no uma mulher comum. Nem foi casual seu encontro com
Yoshimura, claro. Quando matamos aquele homem na
praia, pensvamos que fora ele quem lutara com Mizioru.
Mas este recuperou os sentidos pouco depois e admitiu,
para sua vergonha, que tinha sido uma mulher que o
vencera. Na escurido, no a pde ver muito bem, mas
bastaram alguns detalhes para convencer-nos de que a
mulher em questo s podia ser a tal Brigitte Montfort, que
chegara a Los Angeles com Yoshimura. De modo que
viemos busc-la. Um pouco surpresos, verdade.
Esperamos que nos explique o que faz perto de Yoshimura,
qual o seu objetivo e para quem trabalha... Muitas coisas,
Oh, e... Bem, isto j pura curiosidade pessoal: venceu
realmente sozinha, sem armas, a Monoru Orita?
Sozinha. Assombroso. Como pde conseguir isso? Lutando, simplesmente. Mmmm... Conhece O jud, ento? Entre outras coisas. Que coisas? Vrias. Bem. Voc parece muito confiante em si mesma.
Gostaria de saber se pensa que pode vencer-me, tal como
venceu Monoru.
No tenho nenhuma dvida a este respeito. Voc ver quando chegar a ocasio.
Quando chegar a ocasio? E por que no agora? sorriu o nipnico.
Boa pergunta: por que no agora? sorriu tambm Baby.
Katsumi olhou-a atento, sempre com um sorriso entre
divertido e expectante, cheio de curiosidade, de
perplexidade. Guardou a pistola no bolso, aproximou-se de
Brigitte e fez uma inclinao de cabea, mostrando o crnio
redondo.
Podemos comear disse. Adiantou as mos, lentamente. E, claro est, o que
menos esperava era a rapidssima, fulminante reao da
linda jovem que estava diante dele. No houve estudo
prvio, nem fintas, nem regras, nem consideraes. Brigitte
agarrou velozmente com suas munhecas as poderosas
manoplas do nipnico, tentou atingir-lhe o queixo com a
cabea e, quando o surpreendido adversrio estirou os
braos para mant-la afastada, recebeu um tremendo
pontap no baixo ventre que o fez encolher-se bruscamente
e cair de joelhos, as feies alteradas.
O segundo pontap de Brigitte acertou-lhe em cheio a
boca, partindo-lhe os lbios, obrigando-o a oscilar para trs
e cair sobre as prprias pernas dobradas. Mas
indubitavelmente, Katsumi era muito duro. Ps-se
rapidamente de p, ao mesmo tempo em que Semba e
Toshiro agarravam Baby pelos braos, imobilizando-a. Katsumi olhou-a com uma expresso perplexa, piscando.
Passou a mo pela boca, olhou o sangue no dorso da
mesma, tornou a olhar para Baby. Assombroso na verdade murmurou. Tanto que,
em minha opinio, nosso encontro merece um cenrio
adequado e um momento mais oportuno. Assim, por
enquanto, vamos resolver nosso caso de outro modo.
O japons lanou-lhe subitamente um golpe sobre o seio
esquerdo. Brigitte fez-se lvida. Semba e Toshiro soltaram-
na ento, e Katsumi tornou a golpe-la, agora no ventre,
friamente utilizando o canto da mo. Ela caiu de joelhos
diante do nipnico, que a ergueu com um brao e golpeou-a
com o outro, agora sobre o seio direito; depois nas costas,
novamente no ventre, e quando ela ia cair outra vez de
joelhos, um novo golpe, no rosto, manteve-a de p, o nariz
escorrendo sangue. Permaneceu de p trs ou quatro
segundos, depois pareceu dobrar-se sobre si mesma at o
cho.
Foi um prazer lutar com voc ciciou o japons. Sempre se aprende alguma coisa.
Estendida de lado no cho, Brigitte ergueu a cabea,
lanando um olhar ao nipnico, que a contemplava
sorridente. Sentia o sangue escorrer de seu nariz,
manchando-lhe a boca e o queixo, pingando em seus
doloridos seios. Katsumi notou aquele olhar sereno,
impvido, e tornou a arregaar os lbios num amplo sorriso.
Devo admitir que voc tem uma resistncia notvel, querida. Um homem muito forte estaria ainda sem sentidos
com os golpes que lhe apliquei.
Brigitte no respondeu. Continuou olhando para
Katsumi, o qual teve a desagradvel sensao de que
aqueles formosos olhos azuis congelavam seu nimo,
enchendo-lhe a alma de um frio mortal.
Bem... Vamos embora. Como levamos suas maletas, poder trocar de roupa... se chegar a ser necessrio.
Acrescentou qualquer coisa em japons, e Semba e
Toshiro puseram-se a revistar o trs mortos e Johnny, tirando-lhes tudo quanto levavam nos bolsos. Toshiro
estava olhando com curiosidade a carteira de cigarros que
tirara de Johnny, justamente quando dela brotou um suave zumbido. Chamou Katsumi, que se apressou a apoderar-se
da surpreendente carteira, da qual, cada trs segundos,
brotava um zumbido apenas audvel.
O japons careca aproximou-se de Brigitte e agachou-se
junto a ela.
Parece que esto chamando seu companheiro, meu bem. O que significa que vocs dois no esto trabalhando
sozinhos. Chegaram com algum mais, contam com mais
gente... Muito bem: responda ao chamado e diga a quem
seja que a espere na milha 12 do caminho de Malibu.
Vamos.
Brigitte olhou fixamente para Katsumi, com um leve
sorriso nos lbios ensangentados.
No quer responder? Posso obrig-la agora mesmo. O sorriso de Baby acentuou-se. Os lbios baixaram
um pouco, com uma expresso desdenhosa que fez o
nipnico de cabea raspada compreender a verdade.
to valente assim? perguntou ele. Est bem, falaremos disso mais tarde. Vamos, agora. Levaremos o
rdio. Ver como se decide a responder de um momento
para outro... Mmmm?
Toshiro se tinha aproximado com a maleta vermelha
aberta. De seu interior brotavam agora zumbidos idntico
aos da carteira de cigarros de Johnny, que havia silenciado.
Agora chamam precisamente voc. No vai responder? Muito bem: responder do lugar para onde
vamos lev-la, quando tornarem a chamar.
Baby Montfort continuava sorrindo. E Katsumi compreendeu: no haveria mais chamados. Tocava a vez a
ela e a Johnny. Quem chamara estaria esperando, no tornaria a chamar.
Brigitte ainda sorria, quando Katsumi falou:
Levem-na para o carro. E vendem-lhe os olhos. Vamos!
CAPTULO TERCEIRO Junto ao tanque das carpas
Um vingativo fantasma do passado
Adversrio atmico
Percebeu que saam da cidade, que viajavam por uma
estrada e no teve a menor dvida de que, a despeito de
pretenderem mat-la, faziam uma volta a fim de desorient-
la, prevenindo qualquer atividade posterior de sua parte.
Finalmente, ouviu ranger o saibro sob os pneus do carro.
J no ouvia o zumbido de outros carros cruzando o seu,
nem o continuo crepitar da estrada. Quando o carro se
deteve, fez-se o silncio mais absoluto. O carro moveu-se.
J no sentiu a seu lado a presena de Katsumi. Ouviu seus
passos, afastando-se.
S isso... e o vago rumor do mar. Estava certa de que
ouvia o mar, no muito distante.
Katsumi tardou apenas cinco minutos em voltar.
Saia do carro. Esto sua espera, mas antes precisa tornar-se mais apresentvel.
Saiu do veiculo, seguraram-na por um brao e
conduziram-na, ainda com os olhos vendados. Notou que
entravam numa casa, num recinto fechado. Cheiro de
diversas flores, numa mistura suave, agradvel.
Por fim tiraram-lhe a venda. Piscou quando a luz deu em
seus olhos e s aps alguns segundos pde olhar com
normalidade ao seu redor. Estava num quarto de banho,
grande, com piso de mrmore negro, paredes cor-de-rosa,
banheira azul com plantas na borda rente parede. Um
colorido ofuscante. Tudo novo, caro, esplendente.
Quando se voltou, viu Katsumi atrs dela, apoiando um
ombro contra a porta, olhando-a com interesse. A seus ps
estavam as maletas de Brigitte, e tambm a vermelha.
Lave-se bem, penteie-se e troque de vestido disse o japons. A pessoa que vai ver detesta sangue... em pequenas quantidades. Que vestido prefere?
Um de noite, naturalmente. O azul. Os sapatos pretos, abertos... Vocs e seus amigos roubaram minhas jias?
Ainda no sorriu Katsumi. Ento, o colar de prolas. Brincos, anis...? Nunca uso brincos nem anis... a menos que seja
necessrio.
O enorme japons assentiu com a cabea. Inclinou-se,
abriu as maletas e revolveu-as, procura do que tinha sido
pedido e que fora posto ali por ele mesmo, de modo no
muito ordenado. Quando ergueu a cabea, o olhar de
Brigitte estava fixo no revlver que ele trazia cintura,
agora por cima da camisa de malha, de modo que podia
empunh-lo rapidamente.
Esquea isso: no ter oportunidade. Vamos, prepare-se.
No vai sair? Quero tomar um chuveiro. Katsumi sorriu, evidentemente satisfeito. No se deu o
trabalho de responder, e Brigitte compreendeu, encolhendo
os ombros.
Pouco depois, estava debaixo do chuveiro, sempre
vigiada pelo olhar atento de Katsumi. Terminou seu banho,
enxugou-se, depois se vestiu. Por fim, olhou, contrastando
seu olhar irnico com o olhar torvo do japons.
Sei no que est pensando, Katsumi sussurrou. uma lstima que eu tenha de morrer... No mesmo?
Se j est pronta, vamos disse ele, roucamente. Tem pressa? Vamos. Talvez seu chefe pudesse esperar mais alguns
minutos... Sou de opinio que s vezes convm uma...
aliana com o inimigo. No pensa do mesmo modo,
Katsumi?
Um truque muito feminino crisparam-se as mandbulas do nipnico. Mas intil desta vez. Volte-se... Ainda previno-a que Semba e Toshiro esto esperando a
fora.
Voc bobo murmurou docemente Baby. Volte-se. Muito bem. No sou eu quem perde... Voltou-se. Katsumi tomou a vendar-lhe os olhos. A
advertncia a respeito de Toshiro e Semba tinha base: se ela
tentasse algo, ainda que vencesse Katsumi, no poderia
escapar do quarto de banho.
Vamos. Abriu a porta. Ouviu umas palavras sussurradas em
japons e deteve-se. Mas empurraram na pelas costas.
Caminhou novamente pelo interior de uma casa. Depois, ao
sair desta, sentiu novamente o perfume de multas espcies
de flores. Devia ser um esplndido jardim.
J no teve que, caminhar muito. Novamente ouviu falar
em japons depois, passos que se afastavam.
E sbito, a voz:
Tire a venda, por favor. Na verdade, j no era necessria desde que chegou aqui, pois no sair... com vida
de minha humilde casa.
Brigitte tirou a venda. Estava, efetivamente, num
formoso jardim, com palmeiras ans, flores, um diminuto
tanque com ltus aquticos. A luz da lua dava a tudo um
tom prateado, romntico.
Sentado na borda do tanque, sobre uma esteira de palha,
estava o velho japons da barbicha branca, o que tinha visto
antes na Jap-american Pictures com Masao Yoshimura.
Trajava um quimono preto, ou vermelho escuro. Tinha a
mo esquerda no regao, com a palma para cima; com a
direita, apenas com as longas unhas, apanhava algo que
havia na esquerda e atirava gua do tanque, onde
imediatamente se formavam crculos concntricos.
So carpas. No quer sentar-se, miss Montfort? Baby sentou-se na outra esteira, com as pernas
cruzadas, tal como o velho japons, que parecia no se
importar com ela.
Carpas douradas... insistiu ele. Supe-se que procedem da China, mas o certo que estas me chegaram
diretamente do Japo. Claro que, sendo do Japo, so
melhores... Tudo melhor no Japo.
Menos a bomba atmica. O velho japons voltou vivamente a cabea para ela.
Olhou-a durante uns segundos, por fim assentiu com a
cabea.
Acho-a muito bela e inteligente elogiou com legitima sinceridade.
Nesse caso, merecia ser japonesa... No lhe parece?
Oh, no... Sua beleza de outro tipo. Ao dizer que formosa, considerei o ponto de vista dos homens de sua
raa, no de minha. Na realidade, para mim, sua beleza
um tanto inspida.
Oh. Talvez seja demasiado alta. Seus ps parecem-me
muito grandes, e tambm as mos. Tem os quadris
excessivamente largos e os seios volumosos...
Em suma riu Brigitte: pareo-lhe um mostrengo.
No, no... J lhe disse que o ponto de vista de um japons.
O seu, somente... No posso ver Masao? O senhor Yoshimura no est aqui. Uma mentira inocente: vi os dois juntos. Vi tambm
outras coisas, e penso que ambos vieram para c na lancha
tripulada por Monoru Orita.
Sim, sim, verdade. Mas Yoshimura j se foi. Tem algo que fazer em San Francisco. No creio que demore
muito a chegar l. Mas falemos a seu respeito, miss
Montfort. Disse Katsumi que esse parece ser o seu
verdadeiro nome, mas tenho minhas dvidas. Tambm
tenho dvidas quanto a suas intenes ao relacionar-se com
Yoshimura. Claro que ele me contou como as coisas
aconteceram, mas como demasiado ingnuo... No acha?
No sei. O senhor o conhece melhor do que eu, suponho.
No muito bem. Pelo menos no que se refere sua maneira de ser. Sei que um grande mdico, muito
bondoso, srio, honesto... E um grande idealista. Quer dizer,
o homem necessrio... O quinto homem de que necessitei
para isto.
E os outros quatro homens? Todos japoneses, todos idealistas, honestos... Onde esto? De viagem... Matou-os? Os americanos so demasiado rudes, O branco
branco, o preto preto. Rogo-lhe que procure ser delicada
durante nossa conversa.
Conte com isso. Mandou-os empreender a grande viagem, da qual no h retrno. Est bem assim?
O japons da barbicha olhou-a amavelmente.
Diga-me quem , na realidade, miss Montfort. No creio que isso tenha importncia, senhor... Noburo Tanaka. Por que no tem importncia? Brigitte sorriu friamente. J suspeitara, claro, que
estava em presena de Noburo Tanaka. Mas, se tivesse
desejado demonstrar quanto era esperta, Tanaka teria
compreendido que, assim como ela sabia seu nome, outras
pessoas tambm poderiam sab-lo. Em cujo caso era bem
possvel que levantasse vo, dificultando assim o trabalho
da CIA para localiz-lo.
Porque vou empreender uma longa viagem, mergulhada num profundo sono do qual despertarei quando
soarem as trombetas.
Noburo Tanaka assentiu com a cabea. Depois, antes de
tornar a prestar ateno a Brigitte, esteve alimentando suas
carpas, pensativo. Sbito, disse:
Masao Yoshimura um homem... dbil. Devia ter mais firmeza de carter, no deixar-se vencei por seu
encanto. Mas no lhe resistiu e contou-lhe algumas coisas.
Qual a sua opinio sobre a Drgea Anti-A? Sou uma moa americana comum, senhor Tanaka. A
mim me parece uma blague.
Ficaria surpresa se lhe dissesse que os governantes de alguns pases no a julgaram assim?
No me surpreenderia. Sei que pelo menos a China, a Rssia e a Frana o acreditaram. A Inglaterra no?
Repito que a julgo muito inteligente. A Inglaterra tambm, com efeito... Sabia que o MI.5 possui alguns
agentes excelentes? At o momento, tm sido os mais
espertos.
Por qu? Porque souberam chegar a mim. Bem, no
exatamente a mim, mas at um ponto muito perigoso do
caminho que traz minha humilde casa. Certamente lhe
agrada meu ryokan?
No o vi muito bem. Mas parece-me uma morada muito extica e agradvel.
Tudo em estilo japons, naturalmente. Exceto algumas pequenas concesses ao conforto americano.
Quanto ao resto, dado o isolamento deste lugar, vivo como
num pequeno pedao do Japo.
Perto de Malibu? Mais ou menos perto sorriu Tanaka. Trabalha
para a CIA, est claro.
Minha boa educao me probe discutir com o senhor.
Tanaka acariciou a barbicha.
Os americanos tornaram-se muito desconfiados. Recordo-me que h alguns anos possuam um servio
secreto, naturalmente, mas muito ineficaz. Uma prova disso
foi o que aconteceu em Pearl Harbour.
Isso foi h muito tempo. Agora, suponho que os espies meus compatriotas aprenderam a desconfiar de todo
o mundo ao seu redor.
E noto que est olhando demasiado ao nosso redor... Asseguro-lhe que no poder escapar.
Brigitte deixou de olhar ao seu redor para fitar Tanaka,
sorrindo friamente.
Mas talvez possa matar o senhor. Noburo Tanata lanou ao tanque o resto do alimento
para as carpas que tinha na mo. Depois, ergueu as duas e
examinou detidamente suas unhas, longas de quase urna
polegada.
Duvido, miss Montfort. Sou muito mais perigoso do que pareo. J ter notado, certamente, que tenho uma idade
avanada.
Oitenta? Noventa e dois. Impossvel! Por que haveria de mentir-lhe? verdade que tenho
noventa e dois anos. Uma idade, como dizia, muito
avanada, mas... perigosa.
Tambm o senhor, como Katsumi, quer lutar jud comigo?
Poderia faz-lo, sem dvida. Mas prefiro reservar minhas energias... De qualquer modo, o tigre velho sempre
tem seus recursos. Por que entrou em contato com Masao
Yoshimura?
Simpatia. Alis, foi ele quem...
Por favor! Yoshimura muito ingnuo, mas eu no. No quer admitir que pertence CIA? No me quer dizer
qual exatamente sua misso junto a Yoshimura? natural
que os Estados Unidos o mantenham sob vigilncia, tal
como outros pases mantiveram sob vigilncia meus
enviados anteriores. Mas, por seu intermdio, a CIA chegou
mais longe.
Chegou ao senhor, exatamente. Essas foram as ordens que recebeu? Alm da sua
pessoa, somente o homem chamado Johnny e o outro que tentou comunicar-se com ambos pelo rdio esto minha
procura? Ou j notificaram a CIA a respeito da Jap-
american Pictures e outros detalhes?
Katsumi no me deu tempo para nada, o senhor bem sabe.
Quisera ter certeza disso... Pode ter, por infelicidade minha. E antes de morrer,
senhor Tanaka, gostaria de fazer-lhe uma s pergunta: que
est tramando com essas bombas atmica?
Yoshimura no lhe disse? Insiste nessa tolice da Drgea Anti-A? Tolice? Claro que sim. Alm disso, para a prova, lhe bastada
uma bomba, e creio que j tem trs ou quatro. Para que
tantas? Que est tramando?
Uma comemorao. Comemorao? A comemorao de um aniversrio. Que aniversrio?
Falou numa pergunta, miss Montfort, j a fez. Eu lhe faria umas quantas mais. Penso, porm, que se recusar a
respond-las, pelo que deixaremos para amanh.
Devo retirar-me? Por favor. Agrada-me estar s, meditar... O grande
dia do aniversrio est prximo. Falta apenas que os
Estados Unidos dem sua contribuio para a festa, e estar
tudo pronto.
O senhor se engana acreditando que os Estados Unidos vo-lhe entregar uma bomba atmica.
Talvez no a entreguem. Mas talvez sim. Masao Yoshimura logo chegar a San Francisco. L, como j deve
saber, ele se por em contato com o Departamento de
Guerra em Washington. Esta vez no concordar com
prazos de espera: se os Estados Unidos querem a Drgea Anti-A, devero entregar a bomba amanh ao anoitecer.
O senhor est louco... riu nervosamente Brigitte. Jamais lhe entregaro uma bomba atmica. E mais ainda: lhe tiraro as que possui, Tanaka.
Bem... Quer dizer: as que encontrem, no? Coisa que me parece pouco provvel. No, miss Montfort, no!
Ningum poder impedir a comemorao do aniversrio
atmico.
Como pensa fazer essa... comemorao? Sabe que dia hoje? Claro... Trs de agosto de mil novecentos e sessenta e
sete, no?
Exato. Suponhamos que consiga viver trs dias mais... Qual seria a data?
Seis de agosto. E...?
No compreendo... Que aconteceu no dia seis de agosto, vinte e dois
anos atrs? No aconteceu algo que abalou o mundo?
BabY, aps um segundo de concentrao, empalideceu bruscamente. To bruscamente e com tanta
intensidade, que seu rosto perdeu toda a cor, ficando como
uma mancha lvida, azul-prateada, sob a luz do luar. Seus
olhos dilataram-se, sua boca abriu-se numa expresso de
angstia, suas mos cruzaram-se no peito, como se ela
acabasse de receber a mais cruel das feridas. Sentiu um
zumbido nas tmporas, quase um desmaio...
No... gemeu. No, meu Deus! No! NO! Noburo Tanaka moveu uma de suas mos enrugadas, cor
de pergaminho velho.
A entrevista terminou. Ser conduzida ao seu aposento.
No! No pode ser... O senhor um criminoso! Mais que os Estados Unidos? Mas... est louco... Agora tenho certeza de que est
louco!
No estou louco, nem sou um criminoso. Acontece apenas que, para mim, a guerra no terminou.
H vinte e dois anos que terminou! O Japo um pas livre e prspero, tem amigos... comeando pelos Estados
Unidos! H noventa milhes de japoneses que esqueceram a
guerra, alguns nem sequer a conheceram...!
Eu a conheci. E meus filhos. E meus netos. E os filhos de meus netos... Uns, do Pacfico. Outros, em
Hiroshima. Sabe por que ainda estou vivo, miss Montfort?
Porque quando aquilo aconteceu, achava-me casualmente
longe de Hiroshima. Mas toda a minha famlia estava l,
exceto alguns de meus netos, que lutavam contra vocs, os
americanos. De toda a minha famlia, ningum ficou vivo...
Ningum! H vinte e dois anos que estou ao...
Tanaka, eu lhe suplico... Faa comigo o que quiser. Aceito morrer... Oua, Tanaka sou uma agente da CIA,
conhecida profissionalmente pelo nome de Baby. Por esse nome, sou conhecida em todos os meios de espionagem do
mundo. Tenho amigos em toda parte. Amigos espies de
todas as nacionalidades: alemes, srios, ingleses, egpcios,
chineses, russos, franceses, judeus... Na CIA minha voz
ouvida com muita ateno. Tenho amigos em Washington.
O prprio Presidente j me distinguiu em algumas
ocasies... Tenho fora, Tanaka: a um chamado meu,
milhares de agentes da CIA e uma centena de vrias
nacionalidades se poriam em movimento. Tenho amigos no
FBI, no Governo, na polcia... Esquea esse projeto, Noburo
Tanaka, e eu conseguirei que todos os meus amigos lhe
dem apoio. Tudo ser perdoado. Juro-lhe que o
conseguirei. O senhor j tem noventa e dois anos, resta-lhe
pouco tempo de vida... Passe esses poucos anos aqui, nesta
maravilhosa casa japonesa, com suas carpas, suas flores, seu
mar azul que lhe recorda o do Japo. Apanhe sol junto s
suas cerejeiras, passeie por seus jardins... Desista desse
plano e eu lhe garanto o completo esquecimento de tudo
quanto fez at agora.
No. Matei trs espies russos, o senhor matou pelo menos
um francs. Lamento agora ter eliminado Piotr Stalinov e
seus companheiros. Se tivesse sabido o que estavam
buscando, se tivesse conhecimento do trabalho que
realizavam, estaria agora lutando junto com eles. E sei que
apesar de t-los eliminado, se impedir isso que est
projetando, ningum me guardar rancor. Nem o senhor.
Esquea tudo... e todos esqueceremos. Devolva as bombas
atmicas.
No. Peo-lhe por Deus! Qual deus? Deus... No h nenhum deus. Noburo Tanaka no cr em
nada. V, j lhe disse que a entrevista terminou. E no me
agradea por conserv-la viva: morrer como outros muitos
milhes de americanos. Retire-se. Katsumi a conduzir ao
seu aposento.
Brigitte, ainda plida, olhou fixamente para Noburo
Tanaka. A idia veio-lhe de chofre. Sabia, que Katsumi e
talvez outros japoneses a vigiavam de perto, apesar de no
ver ningum. Mas isso no importava. Naquele momento,
como em outras ocasies, morrer no tinha a menor
importncia, de acordo com seus pontos de vista, graas aos
quais tinha-se transformado na mais eficiente espi do
mundo: manter o mximo possvel de ordem neste planeta
cheio de sol e de pessoas que desejavam apenas viver em
paz. Por essas pessoas, a agente Baby tinha arriscado a vida dezenas de vezes. Ela no era nada, no era ningum...
Mas em sua pequenez, em sua insignificncia, dedicava
todo seu esforo, toda sua vida, a esse empenho. Sua
contribuio poderia, ser pequena ou grande, mas
importante.
Receber uns quantos balaos para evitar aquilo, no
tinha importncia. Se no a matassem instantaneamente,
sabia-se capaz de quebrar o pescoo de Noburo Tanaka. Em
menos de trs segundos, podia quebrar aquele pescoo seco
e enrugado... E ento, nada aconteceria, certamente.
Apenas sua morte.
Lanou-se de sbito contra Tanaka, as mos estendidas
para seu pescoo. Era s comprimir o polegar contra
determinada vrtebra...
Mas Noburo Tanaka no tinha mentido. E bem certo
que a idade no significa nada para um judoca. Com
surpreendente agilidade, afastou-se, rodando, de modo que
Baby falhou em sua primeira tentativa de agarrar-lhe o pescoo. Ao mesmo tempo, a mo direita do velho golpeava
com extrema delicadeza o brao de Brigitte, justamente
acima do cotovelo. Isto no s a desviou como ela sentiu
uma dor imensa no brao, a ponto de no poder mov-lo.
Tanaka incorporava-se agilmente. Ela, porm, foi ainda
mais gil, muito mais veloz. Prescindindo do jud, lanou a
mo esquerda ao rosto do japons, o qual o que menos
esperava de uma mulher que tinha vencido Minoru e feito
Katsumi passar mal numa demonstrao tcnica de jud era
uma bofetada daquela violncia. Uma bofetada simples,
sem estilo nem tcnica, mas terrvel, que o atirou para trs,
flutuando no ar em seu folgado quimono.
Ainda no tinha parado de rolar pelo cho e j Baby estava em suas costas, tentando rodear-lhe o pescoo com o
brao esquerdo, j que o direito quase no podia mover.
Tanaka conseguiu escapar chave antes que ela a
completasse, derrubou-a para um lado e novamente ps-se
em p.
Outra bofetada o derrubou, com a cara voltada para
cima. E Brigitte montou sobre ele, rasgando completamente
de cima abaixo seu modelo Courreges, ao abrir as pernas
para coloc-las de ambos os lados do esguio torso do
nipnico.
E ento, sua mo esquerda cravou-se no seco pescoo
apergaminhado.
Vai morrer... criminoso... Um violentssimo golpe num lado da cabea arrancou-a
de cima do velho japons, fazendo-a rolar at a borda do
tanque das carpas. Semba e Toshiro apareceram junto dela e
puseram-na de p, sujeitando-a com fora irresistvel pelos
braos. Katsumi surgiu sua frente e golpeou-a primeiro no
estmago, depois nos ombros, com o canto da mo.
Baby ficou pendente das mos dos japoneses, paralisada pela dor, inerte, a cabea cheia de zumbidos.
Katsumi agarrou-a pelos cabelos, levantando-lhe
brutalmente a cabea.
Noburo Tanaka estava diante dela, ainda agitado, os
olhos oblquos apertados numa expresso de clera infinita.
No... No vai morrer, miss Montfort arquejou. No assim, de um modo vulgar. Tal como o outro espio
que conseguiu chegar a mim, merece ser morta de forma
sensacional, juntamente com uns quantos milhes de
americanos. Como compreendeu muito bem, no dia seis de
agosto completam-se vinte e dois anos da grande hecatombe
de Hiroshima. Dentro de trs dias, vinte e dois anos aps,
vou bombardear, no uma, porm cinco cidades americanas.
J tenho quatro bombas atmicas. Quando receber a quinta,
no esperarei mais. Tenho tudo preparado: um submarino,
cinco avies, pessoal com a necessria qualificao,
material, tcnicos atmicos... Vinte e dois anos lutando por
isto, miss Montfort. Ficaria estarrecida se soubesse como foi
duro o meu caminho, quanto tive que lutar para aumentar
meus recursos. Foi-me preciso, inclusive, associar-me a
norte-americanos! A Jap-american Pictures uma prova
disso. Mas no teve importncia. Fui conseguindo o que
queria medida que ganhava o dinheiro. E agora tudo est
pronto, tudo est preparado: dentro de trs dias, cinco
bombas atmicas sero lanadas simultaneamente em cinco
cidades americanas. Direi-lhe quais so: Washington,
Miami, Chicago, Los Angeles e Nova Iorque. Vinte e dois
milhes de americanos vo morrer. Um milho por ano de
espera... Claro que sabia que ningum ia acreditar na
Drgea Anti-A Mas sempre permaneceria a dvida. Essa dvida sutil, que os obrigaria a pensar na possibilidade de
que fosse certo. E se fosse? Neste caso, todos os paises
atmicos gostariam de dispor dessa drgea. Sua inteligncia
lhes diria que era mentira, que no podia ser, mas... e se
fosse verdade, ainda que s em parte, como uma derivao
de outra descoberta relacionada com o tomo? E assim,
aceitaram minhas condies de entrega, foram mistificados.
E hoje tenho quatro bombas atmicas. Amanh noite, terei
cinco. E no dia seis de agosto celebraremos o aniversrio
atmico. Levem-na.
Katsumi puxou-a pelos cabelos, mas Tanaka parecia ter
ainda algo a dizer. Colocou suas mos ante os olhos de
Brigitte.
Veja estas unhas. Esto impregnadas de um veneno fulminante, mortal em poucos segundos. Atua em contato
com o sangue, de modo que me bastaria t-la arranhado
para que j estivesse morta. Mas quero que morra como
morreram todos os meus em Hiroshima. O veneno est
reservado para mim, caso o meu projeto falhasse... Nunca
me apanharo vivo, garanto-lhe. Mas no falharei, est
claro. Tive vinte e dois anos para elaborar meus planos. No
posso falhar!
CAPTULO QUARTO Recurso ao Morse
Contratao de honra
Entrega de bomba atmica norte-americana
Katsumi tinha tornado a golpe-la, deixando-a sem
sentidos. Quando reabriu os olhos, encontrou-se num quarto
de paredes midas, feitas de tijolos sem revestimento. No
teto, a um canto, uma pequena lmpada vermelha, que
apenas produzia alguma luminosidade. Era tudo.
Tambm o cho estava mido. Cheirava a mar. A sal...
Ps-se de p, lentamente, sentindo dores em todo o
corpo. Havia algo que a conservava alerta. Sabia que devia
fazer alguma coisa, mas no lograva coordenar as idias...
Sbito, percebeu que estava ouvindo umas pancadas na
parede, na da direita. E no eram batidas fortuitas, sem
significado. Era morse.
Deixou-se cair no cho, junto daquela parede, prestando
ateno s pequenas batidas, de modo que foi captando a
mensagem:
... at, ai? Responda se est bem. Brigitte bateu com os ns dos dedos na parede,
respondendo tambm em morse:
Estou bem. Diga-me quem voc. Primeiro diga voc estabeleceram as pancadas. Sou uma espi. Pois eu sou um espio. Estimo. Diga sua nacionalidade. Primeiro voc.
Eu perguntei primeiro. Certo. Sou ingls. Suponho que est aqui por causa das bombas
atmicas e a Drgea Anti-A. No confio em voc. Se na verdade um espio ingls, ter ouvido meu
nome: Baby, da CIA. Esta boa... Amo-a, Brigitte Montfort. John... Voc John Pearson, vulgo Fantasma, do
MI5. Meu querido Fantasma... Outra vez juntos, querida. Estou sorrindo. Eu tambm. E mando-lhe um beijo atravs da parede. Reserve-o para quando sairmos daqui. De acordo. Diga se foi voc quem mandou a taa de
champanha, no avio.
No. Espero que tenha sido Perignon 55, de qualquer modo.
Foi. E bem gelada. Suponho que esteja trabalhando sozinho, John.
Mataram meus companheiros. A mim, um... Tive que deix-lo moribundo. Diga-me
o que souber do assunto das bombas.
Nada. Fui apanhado quando cheguei aos estdios da Jap-american. Diga voc o que sabe.
Um japons chamado Noburo Tanaka j tem quatro bombas atmicas, entregues pela Rssia, Frana, Inglaterra
e China. Est esperando a dos Estados Unidos. Quando a
tiver, diz que lanar as cinco: Los Angeles, Miami,
Chicago, Nova Iorque e Washington. Simultaneamente.
Voc est brincando, amada espi. No.
Temos que sair daqui. Veja se tem alguma possibilidade.
Brigitte levantou-se e examinou as paredes, a porta.
Voltou para o ponto de comunicao.
No. Mas temos que fazer alguma coisa. Esperaremos. Tenho um amigo que no deve estar
longe daqui.
Diga-me se um bom espio. Melhor que voc. Antiptica. Diga-me se era voc quem se escondia atrs de uma
palmeira-an, no terrao do Sandpiper Motel. No. Voc est precisando de uns culos. Acontece que aquele homem era melhor que ns
dois. Mas um amigo e tudo ir bem. Alm disso, meus
companheiros da CIA j tm o nome de Noburo Tanaka e o
da Jap-american Pictures.
timo. Espero que nos tirem logo daqui. Certo. Agora vou dormir, John. Estou cansada,
surrada e h duas noites que quase no durmo. At logo.
At logo, amor. Sonhe comigo. Prefiro v-lo, do outro lado de uma taa de
champanha, num balnerio da moda.
Boa idia. Ficamos combinados para dentro de uma semana no McVays, em Flamingo, Flrida, USA. Certo?
Certo. Se acontecer novidade, chame. No se esquea: sonhe comigo. Brigitte sorriu, estendeu-se ali mesmo, junto parede, e
fechou os olhos. Um minuta depois, dormia profundamente.
* * *
Abriu os olhos e voltou a cabea para a luzinha
vermelha. Piscou, recordando imediatamente qual era sua
situao. Sentou-se, encostando as costas parede. Levou a
mo atrs e deu uma,s batidas, utilizando novamente o
morse:
John. Ol. Acabo de acordar. Diga-me quanto tempo dormi. Incrvel para uma espi em situao crtica: cinco
horas, calculo.
timo. Estou muito melhor. Espero novidades. Nenhuma, querida. Tudo normal, dentro do possvel.
Estou com fome.
Eu tambm. Sero umas oito horas da manh. Dentro de doze horas, os Estados Unidos devem entregar uma
bomba atmica a Tanaka.
Isso demonstra que os americanos so to bobos como os ingleses. Menos mal. Se estou bem lembrado, voc
disse que seus companheiros da CIA sabiam o nome de
Tanaka, o da Jap-american, etc. Pergunto-me que esto
esperando para vir salv-la, meu amor.
No sei. Mas tenho uma ligeira idia. longo de explicar, mas diria que, com efeito, os Estados Unidos vo
entregar sua bomba atmica.
Lstima. Poderia salvar-se Nova Iorque: a cidade que mais me agrada.
A mim, Miami. Sempre faz sol. Menos quando acontece um desses tufes espetaculares.
J vi um. Espetacular, sem dvida. Tentei fazer um orifcio na parede, mas impossvel. Muito dura. E cheira a
umidade, a sai, a mar. Isto um poro, Brigitte.
Bem me parecia. E suponho que voc tampouco tenha janela ou algo parecido.
Nada. Uma luzinha vermelha, apenas. Gentileza do senhor Tanaka. Quando o encontrar, quebro-lhe o pescoo.
Cuidado com suas unhas. Esto envenenadas. Esse sujeito louco. Estive pensando no tal
bombardeio e acho que no poder faz-lo.
Acho que sim. Dispe de tudo: homens, material, avies, tcnicos... E as bombas.
Estou com inveja de voc, que no tem barba. A minha comea a incomodar-me que um inferno.
Coce-se. E se lhe ocorrer alguma idia, comunique-me.
Estou h trs dias querendo ter uma. E nada. Humor britnico. Revistemos novamente nossas
celas.
Dedicou-se a, isto, com efeito. Mas uma investigao
mais detida que a de cinco horas antes no a ajudou em
nada. Para escapar dali, s um desses seres de fico
cientfica que se filtram pelas paredes.
E nem sequer tinha um cigarro. Sentou-se no cho
mido e disps-se a esperar.
* * *
Segundo seus clculos, tinham-se passado dez ou doze
horas quando ouviu rudo do outro lado da porta. Ps-se de
p, deslizando imediatamente para um lado da mesma.
Qualquer coisa que tentasse podia dar resultado. Ficou
imvel, com as mos rgidas, prontas para o ataque.
Miss Montfort ouviu a voz de Katsumi sei que est atrs da porta. Por favor, coloque-se no centro do
quarto, ou tornaremos a fechar.
Fora se acendeu uma lanterna e Brigitte compreendeu
que, se no se colocasse no centro do circulo de luz, a porta
tornaria a fechar-se. Bem... Pelo menos naquela ocasio no
podia queixar-se da qualidade de seus inimigos, que
pareciam prever tudo.
Afastou-se da porta e colocou-se no centro do crculo de
luz. E Katsumi tornou a falar:
Saia. Saiu daquela espcie de cela. Encontrou-se no que
parecia uma adega. Havia tonis, caixotes com garrafas,
uma mesa com copos de cores formas distintas.
Semba, Toshiro e Katsumi estavam l, cada um com um
revlver na mo. Uma bala era, sem dvida, uma morte
muito mais suave que a produzida pela exploso de uma
bomba atmica. Mas Baby era de opinio que enquanto havia vida, era obrigatrio conservar a esperana. E uma
coisa era morrer matando Noburo Tanaka, outra era morrer
tentando fugir, sem possibilidade.
Havia um lano de degraus de pedra. Subiram-no e
encontraram-se numa garagem. Katsumi baixou o alapo e
apontou para o exterior.
Tanaka est sua espera. Voc sua convidada de honra, por ser americana.
Uma honra muito perigosa, no verdade? Katsumi encolheu os ombros.
Ningum lhe pediu que nascesse nos Estados Unidos.
Excelente argumento. Se eu no tivesse nascido nos Estados Unidos, perdoariam minha vida?
Todo o seu mal est em pensar como uma cidad americana. Alm disso, uma agente da CIA para ns uma
inimiga.
Bom... Posso tambm ser uma boa amiga, Katsumi. Eu no sou Yoshimura. Vamos. No me venda os olhos? So olhos de cega. Logo esquecero o que viram.
Ande. Vai assistir ao espetculo.
Brigitte voltou-se. Era quase noite. Sentia-se cansada,
deprimida, mas tinha que continuar, tinha que se esforar
por conservar-se alerta, disposta a aproveitar a menor
ocasio para tentar deter o japons que queria comemorar o
aniversrio atmico... sua maneira.
Com efeito, a casa de Noburo Tanaka parecia um ryokan
japons, quer dizer, uma dessas casas de madeira, com
janelas de papel pintado, esteiras de palha, assoalho
cintilante. Era como um desenho japons de um artista dos
velhos tempos. Ocorreu-lhe a Idia de que, se olhasse para o
norte, veria a Inconfundvel silhueta do Fujiyama, com suas
neves perptuas.
Mas s via Katsumi, sempre perto dela, sempre
vigilante. Ao entrarem na casa, ele indicou seus ps.
Tire os sapatos. Brigitte lanou-os para um lado, utilizando o simples
processo de sacudir graciosamente os ps. Katsumi
apontou-lhe o interior. Atravessaram aposentos decorados
segundo o mais clssico estilo japons, com flores,
mesinhas baixas, cortinas de bambu. As portas eram largas,
de correr, com painis de papel. Pelas janelas via-se o
jardim, cheio de rvores em miniatura e no um, mas vrios
tanques em cujas guas flutuavam ltus e lrios... e nos
quais, sem dvida, nadavam carpas japonesas.
Subiu e desceu escadas. Era uma casa de forma
irregular, sem simetria aparente. Em dado momento, passou
por um enorme living, atravs de cuja vasta janela viu o mar, azul e avermelhado ao final do crepsculo.
Aquela tinha sido a pea mais elevada. Encontrou-se
depois em outra, que parecia de nvel mais baixo com
relao ao mar. Katsumi fez um sinal a Semba e Toshiro, os
quais afastaram um tatami e levantaram um retngulo do assoalho de madeira.
Desa. Havia uma escada de madeira, de amplos degraus.
Baby desceu por eles. O ltimo a segui-la foi Toshiro, que fechou o alapo sobre sua cabea. Havia um corredor.
Via-se uma luz ao fundo e Katsumi fez um sinal naquela
direo.
Segundos depois, ela se detinha entrada daquela pea
subterrnea. No tinha porta: simplesmente uma entrada.
Dentro, sentado comodamente numa poltrona vermelha e
branca, em cujo espaldar via-se a bandeira japonesa, estava
Noburo Tanaka, que apenas voltou a cabea, olhou-a e
sorriu amavelmente, como se no recordasse o mau bocado
que ela o fizera passar na noite anterior.
Entre, por favor. E sente-se. Sente fome, ou sede? Ambas as coisas. Mas temo que seja muito exigente,
Tanaka.
No compreendo... Comeria ostras galegas e tomaria champanha francs.
Pode oferecer-me isso?
Temo que no. Assim sendo, no se incomode. Sentou-se na poltrona que o ancio lhe indicava. Ele
considerou-a com uma centelha de interesse em seus
oblquos olhos negros.
Devo entender que prefere passar fome e sede a aceitar o que eu lhe possa oferecer?
Se eu no fosse uma moa educada, Tanaka cuspiria agora mesmo. Pode guardar seus alimentos e bebidas.
Noburo Tanaka olhou suas unhas envenenadas,
carinhosamente.
Se tem esperana de morrer de inanio antes que eu lance as cinco bombas atmicas, miss Montfort, quero
desengan-la definitivamente. Sei que uma pessoa
saudvel: resistir perfeitamente alguns dias sem comer
nem beber. No obstante, renovo meu convite: Deseja
alguma coisa?
Sim, claro. Bem! O qu? Crave uma dessas unhas num olho, Tanaka. No posso satisfaz-la... Ainda no. Aceitaria um
cigarro, pelo menos?
Brigitte quase adiantou a mo para a carteira que Tanaka
lhe estendia. Mas deixou-a imvel sobre seu regao. No
respondeu, mas tampouco era necessrio.
Sua personalidade chega a ser irritante, de to integra e firme, miss Montfort. De qualquer modo, no a admiro
muito: para quem vai morrer to logo, privar-se de um
cigarro e um pouco de comida no grande coisa. Gosta de
televiso?
Os filmes de espionagem e os desenhos animados. Tambm as modas de Cana Vanchetti. Sou uma admiradora
de seu estilo.
A sesso de televiso que lhe ofereo no trata de nada disso, mas de um... jogo de astcia. Sendo uma agente
secreta, vai apreciar o programa, suponho. Ligue, Katsumi.
Diante das poltronas ocupadas por Tanaka e Baby havia um bonito mvel, com quatro telas de televiso, nada
menos. Katsumi apertou um boto e vinte segundos depois,
em cores, aparecia uma estupenda vista do mar; ao fundo,
algumas gaivotas. Tanaka indicou-as.
Aproximam-se da costa. Devem ter-se cansado de seguir algum barco, onde sabem que sempre existem seres
humanos que jogam alimento ao mar. Gosta de gaivotas?
Muitssimo. Pois j temos um pouco em comum. Para mim no h
nada mais belo que um pssaro.
Os abutres inclusive? So mais feios, certamente. Mas um adgio japons
diz que o homem pode fechar os olhos sempre que queira...
Compreende?
Querer dizer que quando algo no nos agrada devemos desviar a vista.
Algo assim. Acha que est certo? No. Quando algo no agrada, o melhor destru-lo. Perfeito. o que penso dos Estados Unidos. o que penso do senhor. Compreendo. E tolero, porque sempre compreendo as
pessoas cuja atitude razovel e lgica. perfeitamente
lgico e razovel que me odeie. Do mesmo modo que
perfeitamente lgico e razovel que eu odeie os Estados
Unidos. No aceita sequer uma xcara de ch?
No. S me agrada o usque. o que sempre pede um americano quando entra num bar.
Tambm pedem coca-cola. Os americanos so um povo desigual, no esto de acordo uns com os outros. s
vezes, claro, isso cria uma srie de confuses e discusses
que podem lev-los catstrofe. Como por exemplo, agora.
Veja: estou-lhe oferecendo um programa em primeira mo.
E garanto-lhe que somente ns, com exclusividade, estamos
desfrutando do mesmo. Com toda a beleza da cor do mar,
dos ltimos fulgores do crepsculo e os primeiros lampejos
da lua. No quer olhar? Tive a delicadeza de cham-la como
minha convidada de honra... No recuse isto, ao menos.
Brigitte olhou para o mvel onde se viam as quatro telas
de televiso.
Numa delas aparecia, em primeiro plano, uma barcaa
de desembarque do Corpo de Fuzileiros Navais. E nesta
barcaa, com capacidade para sessenta homens, s havia
meia dzia. Ocupando-a quase toda, um objeto longo, que
quase sobressaia por ambos os extremos da embarcao,
proa e popa; estava coberto por uma lona na qual
destacava-se a estria americana e liam-se as palavras
United States of Amrica. O objeto longo e cilndrico devia
medir no menos de dez metros e sua forma era
inconfundvel para um agente secreto que participava duas
vezes por ano das sesses de treinamento e atualizao da
Academia Central da CIA.
A segunda tela mostrava o mesmo lancho de
desembarque, mas a maior distncia.
A terceira enquadrava um velho pesqueiro de nome
americano, Black Fish, e a barcaa do Corpo de Fuzileiros. Na quarta via-se todo o mar que circundava
ambas as embarcaes. Era evidente que a cmara efetuava
um movimento de rotao contnua, vigiando as guas onde
ia ter lugar o encontro entre o lancho de desembarque e o
velho navio pesqueiro.
Tanaka olhou de relance para Brigitte.
Veja que a cmara nmero quatro est vigiando essas guas, miss Montfort. Nas quatro ocasies anteriores
seguiu-se o mesmo sistema.
Isso nos preserva de uma surpresa por parte dos
generosos doadores da bomba. Oh, claro que todas estas
imagens esto sendo tomadas por quatro cmaras de
televiso instaladas num submarino. Circuito fechado,
lgico. E, obviamente, o submarino est equipado com
radar e sonar. J lhe disse que todo o projeto me custou
muitos milhes de dlares. Mas ganhei-os com a Jap-
american Pictures... Observe um detalhe interessante: o
submarino... Oh, mas no pode v-lo, claro...
Brigitte olhou para Tanaka e passou a lngua pelos
lbios.
Os EStados Unidos esto... entregando a bomba atmica?
Assim parece assentiu amavelmente Tanaka. Disse-lhe ontem que seu pas aprendeu muito nos ltimos
vinte anos, mas temo que no o suficiente. Ou talvez seja
essa dvida, essa ccega produzida pela pergunta-chave: e
se for um fato verdadeiro a Drgea Anti-A? O certo que, neste momento, os Estados Unidos esto dispostos a
entregar sua bomba atmica, nas condies exigidas: um
lancho de desembarque, com o menor nmero possvel de
homens, e a bomba nesse lancho. E, segundo as cmaras
de televiso, o radar e o sonar, esto fazendo jogo limpo:
no h nenhum navio nas vizinhanas do lugar de entrega.
Seu submarino levar a bomba, Tanaka? Certamente. Ah, como lhe dizia a respeito do
submarino... um barco que os Estados Unidos venderam
como sucata, h uns oito anos. Foi comprado e, para todos
os efeitos legais, desmontado. Entretanto, a o tem: pintado,
remoado, com as mquinas em perfeitas condies,
equipado com uma emissora de televiso. E vrios detalhes
mais, muito interessantes. Para qualquer possvel espectador
de tudo isto, o submarino seria um dos pertencentes frota
dos Estados Unidos. Suas letras, sua sigla de identificao,
o uniforme dos homens que logo vo aparecer na coberta...
Tudo.
Utilizou o mesmo truque com os outros pases? Bem... Digamos que quando a China, a Inglaterra, a
Rssia e a Frana compareceram ao local da entrega,
nenhum suspeitou o perigo... at ser demasiado tarde.
Mmmm... A China foi muito desconfiada. Compreende-se,
sabendo que seu poderio atmico o menos importante.
Mas, precisamente por isso, tinha grande interesse em
conseguir a Drgea Anti-A. Em seu primeiro envio, cometeu a tolice de mobilizar nada menos que meia dzia
de submarinos atrs do transporte que levava a bomba.
Tudo o que ocorreu foi que nosso submarino recolheu os
tripulantes do junco utilizado naquela ocasio e ps-se em
fuga. Trs dias mais tarde, a China recebia uma ltima
oferta: jogo limpo ou nada feito... Tivemos a bomba.
Como? Que aconteceu?
O mesmo que com os demais pases. S que nenhum deles, tal como eu esperava, teve coragem para confessar ao
mundo seu erro, seu fracasso... Assim, foram caindo a
China, a Rssia, a Frana e a Inglaterra. E tudo no maior
silncio. Nenhum desses pases vai admitir publicamente
que algum lhe roubou uma bomba atmica, enganando-o.
Compreendo... Onde est sendo realizada a entrega, agora?
Em certo lugar do Pacfico sorriu sarcasticamente Tanaka. Apenas um ponto no imenso mar...
Perto ou longe daqui? No mar. Parece que Masao Yoshimura recebeu resposta
favorvel de Washington, com plena aceitao de suas
condies.
Por assombroso que parea, foi o que aconteceu. No tem mais que olhar para convencer-se.
No me parece assombroso sorriu Brigitte. Noburo Tanaka olhou-a durante uns segundos. Depois,
voltou sua ateno para as telas de televiso.
Seu sorriso encerra esperana murmurou. Que classe de esperana, miss Montfort?
Masao Yoshimura ser seguido e cercado. Ser obrigado a trazer aqui, a esta casa, algumas dezenas de
agentes da CIA e de outros servios norte-americanos de
contra-espionagem. No poder lanar essas bombas,
Tanaka.
Logo se desenganar. Quanto a Masao Yoshimura... Preste ateno a isto.
Brigitte voltou rapidamente a cabea para as telas de
televiso. O pesqueiro Black Fish estava j muito perto
do lancho de desembarque. Do pesqueiro estava-se
afastando um pequeno bote, no qual viam-se apenas quatro
homens, todos eles japoneses. Por um instante, Baby teve a impresso de que estava vendo um filme em tecnicolor
sobre operaes americanas em guas do Pacifico vinte e
tantos anos antes. S que naquela ocasio tudo era real, no
uma criao de Hollywood.
Os quatro japoneses remavam para o lancho, tranqilos.
Uma das cmaras do submarino fez uma aproximao e, por
um instante, os quatro rostos nipnicos ficaram em primeiro
plano, grandes, facilmente identificveis. Katsumi disse
alguma coisa, e Semba e Toshiro riram mansamente.
Tanaka limitou-se a sorrir. E Brigitte, que no tinha
entendido as palavras japonesas, ficou olhando com ateno
a qudrupla imagem da entrega da bomba atmica norte-
americana.
O bote aproximava-se lentamente do lancho; neste,
viam-se seis marines, um deles j grisalho, com insgnias de
comandante. Havia tambm um tenente, um sargento, um
cabo e dois marines de primeira. Uma das cmaras
apanhava-os de muito perto e seus rostos tensos, seus olhos
fixos num ponto distante, naturalmente no submarino que
tinham visto emergir. Estavam algo perplexos e assustados.
O tenente dizia alguma coisa, apontando para o submarino,
O comandante assestou um binculo. Via-se perfeitamente
na tela seu sorriso de alivio.
Agora, o comandante est pensando que o submarino americano explicou Katsumi, desnecessariamente rindo.
Semba disse algo em japons e todos riram, inclusive
Tanaka, que lanou um olhar de relance a Brigitte. Um
olhar divertido, maligno, que revelava sua satisfao em
assistir ao espetculo para o qual ela era convidada de
honra, por ser americana.
Esperemos que os americanos sejam mais espertos que os outros e no pretendam opor-se ultima hora,
quando descobrirem que esse submarino no realmente
deles, miss Montfort augurou Tanaka. Observe que o comandante tem um binculo. Olhar com mais ateno
para o submarino, ver uniformes americanos, mas logo se
dar conta de que os homens que os vestem no so
americanos. Os traos caractersticos de nossa raa so uma
das desvantagens que temos para determinadas operaes.
Mmmm... Temo que esteja percebendo agora.
Efetivamente, o comandante do lancho americano
estava enfocando com o binculo o submarino e, muito
excitado, dizia alguma Coisa, apontando para as cmaras,
isto , para, o submarino. O tenente quase lhe arrebatou o
binculo e olhou por sua vez. Depois, baixou o binculo
lentamente. Viu-se seu rosto alterado, perplexo.
J se deram conta! riu agudamente, Tanaka. No podia ser de outro modo, est claro. Mas no importa.
Quer dizer... no importa segundo o que esses homens
decidam fazer.
Brigitte olhava para as telas como hipnotizada. Por um
momento, teve esperanas de que os seis marines
oferecessem combate, inclusive perdessem a vida, contanto
que aquela bomba fosse afundada ali mesmo, naquele
momento, a fim de que s pudesse ser recuperada por
grandes meios, dos que s dispunha a Marinha dos Estados
Unidos.
Mas no.
O pequeno bote que fora lanado do pesqueiro chegou
junto ao lancho, e, ante a passividade dos marines, os
japoneses subiram a bordo, armados.
No os mataro explicou Noburo Tanaka. Sempre que possvel, recolhemos a bomba de um
modo pacifico, a fim de dar a impresso, at o ltimo
momento, de que nossas intenes so boas. Se os
americanos no fizerem nada, salvaro suas vidas... por
enquanto. Tudo depende do lugar para onde forem levados
depois disto. Seria engraado que morressem sob a exploso
da bomba que eles mesmos entregaram!
Brigitte passou a lngua pelos lbios, tensa, angustiada.
Mas os marines comportaram-se sensatamente; sempre
obedecendo s ordens dos japoneses, saltaram para o bote
em que estes tinham chegado e comearam a remar,
afastando-se. Enquanto isto, o pesqueiro Black Fish estava virando, disposto a afastar-se tambm.
E o submarino, a julgar pela paulatina amplificao de
todas as imagens, aproximava-se do lancho, que por sua
vez era conduzido ao seu encontro pelos japoneses que
tinham chegado no bote.
Numa tela apareceu agora o costado do submarino, e
fixou-se l. Menos de um minuto mais tarde, o lancho
aparecia junto do submarino, por aquele lado. Uns quantos
japoneses com uniformes da U.S. Navy estavam-se
pendurando ao costado do submarino, presos por cordas
passadas por baixo de seus braos, e levando rolos de cabo
muito fino. No costado do submarino haviam sido
colocados grandes ganchos, aos quais, pelos japoneses que
agora ocupavam o lancho e os que pendiam pelo costado
do submarino, foi atada a enorme bomba, que ficou a
descoberto ao ser retirada a lona.
A operao demorou quase dez minutos e, durante todo
este tempo, a cmara permaneceu fixa, enfocando-a,
levando a imagem at o ryokan de Noburo Tanaka,
enquanto as demais iam mostrando o mar que circundava o
submarino, e o cu, vigiando a possvel chegada de barcos
ou avies norte-americanos.
Do bote em que tinham partido os seis marines j no se
tornaram a ocupar de um modo especifico. Vez por outra,
ao percorrer a objetiva aquela parte do mar, via-se o bote
sobre as guas e as diminutas figuras dos marines, remando
energicamente.
Terminada a fixao da imponente bomba atmica ao
costado do submarino, todos os japoneses passaram a este e
o lancho americano de desembarque foi afundado, com um
s canhonao disparado de uma centena de metros, com o
submarino j em marcha.
Finalmente, este desapareceu sob as guas.
J no houve mais imagens sobre as quatro telas.
Tanaka fez um sinal e Katsumi apanhou-as. Tudo ficou
em silncio, at o velho japons voltou-se para Baby, comentando:
Foi uma entrega perfeita, digna dos Estados Unidos. No est de acordo, miss Montfort?
Brigitte olhou-o. Depois, o revlver que Katsumi tinha
na cintura. Passou a lngua pelos lbios e permaneceu
calada, plida como um cadver.
Quanto a Yoshimura... gostaria de v-lo?. Est aqui? exclamou ela.
Sem duvida. Esperando para saber se seu trabalho foi coroado de xito.
Posso... poderia v-lo? Noburo Tanaka levantou-se, sorrindo enigmaticamente.
Claro que sim. Acompanho-a. Assim poderei comunicar-lhe que tudo terminou da melhor forma possvel.
Observaremos sua reao quando lhe dissermos que j teve
lugar a entrega da bomba norte-americana. Siga-me, por
favor.
CAPTULO QUINTO Hara-kiri
Antecipao de uma catstrofe
ltima luta
Detiveram-se diante de um aposento cuja porta era de
madeira fina, com desenhos
que pareciam de laca. Katsumi abriu-a e Tanaka cedeu o
passo a Brigitte, com um sorriso ironicamente corts em seu
enrugado rosto amarelento, os midos olhos brilhando entre
as mil rugas que os circundavam, fazendo soar suavemente
suas longas unhas envenenadas, que pareciam as garras de
uma ave de rapina.
Baby entrou sem preocupao alguma. O que no conseguiriam fazer-lhe aqueles homens, ainda que se
opusesse? Se queriam que entrasse, entraria de qualquer
forma.
Ficou como cravada no cho to logo deu dois passos.
Masao Yoshimura l estava, sentado sobre um tatami, com as pernas cruzadas, as costas para uma larga janela
aberta. Era uma pea lisa, vazia, com assoalho de madeira
brilhante. Yoshimura ergueu os olhos, olhou-a com
indiferena e depois olhou para Tanaka, expectante.
Atrs dela, ouviu a voz de Noburo Tanaka:
Conseguimos. Temos a bomba. Masao Yoshimura fez uma ligeira inclinao de cabea.
Depois, olhou de relance para Brigitte.
Posso despedir-me dela? Pode. Tem cinco minutos. A porta fechou-se s costas de Brigitte, que se
aproximou de Yoshimura, olhando-o fixamente, sem saber
o que pensar.
No quer sentar-se? ofereceu o japons. Vai dar-me uma explicao? perguntou ela. Sim. Baby aproximou-se da janela e olhou para o exterior,
passeando no jardim, viu trs japoneses, em pontos
distintos, olhando para o mar e para a casa,
alternativamente.
No poder escapar pela janela advertiu Yoshimura. Nem por nenhum outro lugar. Sente-se, Brigitte, quero despedir-me de voc.
Olhou-o fixamente. Por fim, sentou-se diante dele, sobre
o mesmo tatami. Despedir-se? murmurou. Vou partir para muito longe... Para o Japo? Muito mais longe... sorriu Yoshimura. At onde podem chegar os mortos. No entendo... Vo mat-lo? Agora, ao v-lo,
pareceu-me que voc o culpado direto de tudo isto, o que
planejou tudo...
Pensou isso de mim? perguntou tristemente Yoshimura.
No certo? No... Eu, como outros quatro japoneses de idias
nobres, fui apenas utilizado por Noburo Tanaka. Diga-me:
verdade que trabalha para a CIA?
verdade. Ento, voc me esteve enganando... enquanto eu fui
sincero durante todo o tempo.
Eu tambm fui sincera com voc em certos momentos, Masao. Tinha que obter todas as informaes
que pudesse, recorrendo a qualquer meio. Mas entre tudo
isso, houve uma boa parte de sinceridade em mim.
O que me consola... Porque creio em voc, Brigitte. certo o que disse de seus olhos. Agora esto frios, duros...
Mas talvez possam tornar a encher-se daquela luz que eu
vi...
No viverei para isso. Sinto Yoshimura inclinou a cabea. Sinto por
voc, por mim, por quase trinta milhes de americanos. E
sinto pelo Japo e todos os japoneses. Quero... quero que
saiba que no somos como Noburo Tanaka. O Japo no
guarda rancor, nem deseja a morte no mundo, nem faria
jamais o que quer fazer Tanaka...
Sei o que devo pensar a respeito do Japo. E sei que isto no obra de seu pas. a obra de um criminoso que
nem sequer tem a desculpa de estar louco. uma vingana
atroz, Masao. Uma vingana pessoal, com uma espera de
vinte e dois anos. O fato de Noburo Tanaka ser japons no
significa nada para mim. O mesmo poderia hav-lo tentado
outro homem, de outra nacionalidade. O mesmo, se as
coisas tivessem acontecido ao contrrio, poderia estar sendo
tentado por um americano, que estaria agora planejando
lanar bombas atmicas sobre o Japo. Mas isso, Masao, j
est fora de nosso domnio. Fale-me, se que tem algo me
dizer.
Somente pedir-lhe perdo e despedir-me. Voc perdoou-me uma vez sorriu docemente
Baby , de modo que s me cabe retribuir. Quanto despedida, suponho que dever ser mutua.
Eu partirei antes... Dentro de poucos minutos. E partirei com a alegria de ter podido v-la mais uma vez.
Quando voc sair daqui, Brigitte, praticarei o hara-kiri.
Brigitte olhou estupefata para Masao Yoshimura.
No... murmurou. No! Sei o que est pensando. Acha que sou um brbaro,
recorrendo a antigos mtodos de castigo... de autopunio.
Talvez seja certo, mas espero que o compreenda. Tanaka
me explicou o que fizeram comigo, como com os outros
quatro. Nas cinco ocasies, procuraram homens respeitados
no Japo, homens cujo interesse pelo bem do prximo era
conhecido. A todos enganaram, dizendo-lhes que tinham a
Drgea Anti-A, que precisavam do auxlio atmico dos Estados Unidos, ou do pas em questo, para a ltima prova,
mas que as coisas deviam ser feitas discretamente, a salvo
de toda publicidade, da espionagem, de ambies pessoais.
Era uma distino escolher-nos. E os cinco aceitamos. No
sei quem foram os outros quatro, mas sei que, como eu a
noite passada, chegaram ao ponto final, ao contato com
enviados do pas de onde se esperava conseguir a bomba
atmica. Depois disso, foram retirados pelos homens de
Tanaka e assassinados. Era o que queriam fazer comigo
tambm, hoje, para cortar o caminho dos americanos at
minha pessoa, tal como antes cortaram o caminho dos
russos, chineses, franceses e ingleses, at os outros quatro
meus conterrneos de boa-f.
E no o mataram porque voc reclamou o direito de matar-se a si mesmo?
Sim. Pelo menos isso devo agradecer a Tanaka. Masao... Por favor, Masao! Estamos em mil
novecentos e sessenta e sete, O Japo e os japoneses
mudaram muito em tudo, voc o sabe melhor que eu. No
pode fazer Isso a esta altura!
Compreendo voc, Brigitte. E tem razo. Mas creio que mereo morrer assim. Sei que um retrocesso em tudo
quanto at agora conheci e vivi. um recuo no tempo e na
cultura. Mas tenho a necessidade ntima de faz-lo. Mais
ainda: o desejo. Quero castigar-me a mim mesmo pela ajuda
que prestei a esse horrvel plano de Noburo Tanaka.
Compreende?
Sim, mas no estou de acordo com voc, Masao. Ainda podemos ter um golpe de sorte, escapar daqui,
viver... No quero engan-lo agora: no viveria com voc
em Tquio. No porque lhe tenha mentido em nossos
momentos importantes, mas porque eu no posso amar a um
s homem: amo a todos os homens, todas as crianas, todas
as mulheres... H uma vida nossa frente. No renuncie a
ela.
Masao Yoshimura sorriu com suavidade.
Sempre soube que seu corao demasiado grande, Brigitte. Compreendo-a, admiro-a, amo-a por isso... Agora,
quero despedir-me de voc com o desejo de que consiga
escapar. E se o conseguir, tome cuidado com seu corao
porque, de to grande, poder acarretar-lhe muito
sofrimento.
Voc me aconselha, se consigo escapar, a deixar de ser uma boa menina? sorriu ela.
Ser a nica maneira de voc viver muitos anos. E agora, adeus, Brigitte Montfort, vulgo Baby.
Era evidente que Yoshimura dava por terminada a
ltima entrevista. Mas Brigitte no se moveu.
Masao, possvel que logo nos tirem daqui. Quero fazer-lhe uma proposta.
Qual? Escute... Continue com seu projeto. Pea a arma
branca, simulando que vai praticar o hara-kiri, ou que o
pratica... Faa como preferir para ganhar tempo, mas
permanea vivo. E quanto eu puder...
A porta do aposento se abriu. Brigitte intensamente para
Yoshimura, que sorriu ela e inclinou a cabea.
Pondo-se de p, Baby voltou-se. Noburo Tanaka estava no limiar. Atrs dele, Semba, tendo nas mos uma
grande almofada sobre a qual via-se um sabre. A um Sinal
do velho japons, ela saiu, dirigindo um ltimo olhar a
Yoshimura. Semba cruzou com ela. Deixou a almofada
sobre o tatami, diante de Masao Yoshimura, saindo em seguida.
A porta foi fechada e Brigitte novamente conduzida ao
recinto onde estava o aparelho com quatro telas de
televiso. Tanaka sentou-se e olhou-a friamente.
No lhe parece que Masao Yoshimura digno de admirao e respeito? Isso no faria nenhum americano.
Claro que no, Tanaka. Um americano lutaria at a ltima gota de sangue em seu intento de continuar vivendo.
Mas, conforme sabe, os americanos so uma raa inferior,
sem grandeza espiritual.
Percebo muito bem o sentido irnico de Suas palavras, miss Montfort. Mas no vamos discutir isso.
Trouxe-a novamente aqui porque tenho algo importante a
dizer-lhe.
Vai cravar-me uma unha? Vou antecipar um pouco a data do aniversrio
atmico.
O espanto levou toda a ironia de Baby, que uma vez mais empalideceu ante os projetos de Noburo Tanaka.
Por qu? perguntou simplesmente. Vou dizer-lhe. Explicarei qual foi a jogada dos
Estados Unidos neste assunto da bomba atmica. Claro que
agiram tal como eu esperava e suspeitava... Sabe quando
suspeitei?
Quando e o que suspeitou? No estou compreendendo nada.
Estou certo de que, no fundo, sabe as coisas to bem como eu, mas explicarei de qualquer modo. Dizia que, tal
como esperava, os Estados Unidos realizaram uma jogada
especial: a carga atmica da bomba que entregaram h um
quarto de hora ou pouco mais falsa.
Falsa? Um engenhoso mecanismo completamente intil.
Mas j lhe disse que disponho de tcnicos atmicos, que
estavam esperando a bomba no submarino. A utilizao de
certos aparelhos conexionados bomba por alguns homens-
rs revelou que esse artefato jamais produzir uma exploso
atmica.
Bravo! exclamou Brigitte.
Magnfico sorriu Tanaka, enchendo ainda mais seu rosto de finssimas rugas. Na verdade, magnfico, miss Montfort, j que era isso exatamente o que estvamos
esperando.
Como? simples. Sei muito bem que atualmente a Jap-
american Pictures e esta casa esto vigiadas pela CIA e sei
j quantos outros servios de contra-espionagem. lgico,
naturalmente.
Se o tivessem localizado, j teriam... Deixe-me prosseguir. Olhe, eu compreendo muito
bem que a CIA, por exemplo, no pode ser um organismo
que deixe de funcionar s por lhe matarem um agente e
raptarem outro. No, no... Sei muito bem que estou sendo
atentamente vigiado. Sei que dispunha de um rdio, que
seus companheiros tambm, que Masao Yoshimura j lhe
dera meu nome... Depois, outro detalhe: se a CIA estivesse
jogando limpo, teriam retido Yoshimura, como tentaram a
Rssia, Inglaterra, Frana e China com os quatro outros
enviados, pelo que foi-nos necessrio mat-los. No entanto;
coisa surpreendente, Masao Yoshimura conseguiu burlar a
vigilncia da CIA, do G-2, possivelmente do FBI, do
Servio de Contra-Espionagem do Departamento de
Guerra.. No lhe parece absurdo?
De fato. Portanto, h que se render evidncia; tanto nesta
casa como na Jap-american, Noburo Tanaka e seus homens
esto severamente vigiados. Devo admitir que seus
compatriotas est