Post on 03-Feb-2018
AS DIFERENÇAS NAS NARRATIVAS MIDIÁTICAS NA COBERTURA DA TRAGÉDIA EM MARIANA1
Marco Túlio Pena Câmara2
RESUMO
O rompimento da barragem da empresa Samarco (Vale/BHP), em 05/11/2015, foi o maior desastre ambiental do país, causando a destruição de Bento Rodrigues e do Rio Doce. Este artigo busca investigar a diferença entre a cobertura midiática dos editoriais de quatro produções jornalísticas impressas mineiras: Estado de Minas, O Tempo, Lampião e a Revista Curinga (produtos laboratoriais da Universidade Federal de Ouro Preto). A metodologia é baseada na análise do discurso, tomando como base a noção de enquadramento e construção de notícias, presentes em Charaudeau (2015) e Porto (2004); e o gênero editorial com posicionamento institucional, trabalhado em Alves Filho (2006), Furtado (2009) e Valões e Lima (2010). É possível notar a diferença de cobertura entre os jornais, não só pela proximidade física do fato, mas também pela linha editorial de conduzir a narrativa, firmando-se como porta-vozes das histórias envolvidas na tragédia.
PALAVRAS-CHAVE: Editorial; Discurso midiático; Bento Rodrigues;
Enquadramento.
DIFFERENCES IN THE MEDIA NARRATIVES IN THE COVERAGE OF THE
TRAGEDY IN MARIANA
ABSTRACT
Samarco (Vale/BHP) dam break, on 11/05/2015, was the worst disaster in the country, causing the destruction of Bento Rodrigues and of Rio Doce. This article pursuits to investigate the difference among the media coverage of the editorials of four printed journalistic productions: Estado de Minas, O Tempo, Lampião and Revista Curinga (lab production of Universidade Federal de Ouro Preto). The methodology is based on speech analysis, considering the ideia of framework and building of news, present in Charaudeau (2015) and Porto (2004); and the editorial gender with institutional positioning, worked in Alves Filho (2006), Furtado (2009) and Valões e Lima (2010). It is possible to notice the diference of coverage among the journals, not only because of the physical proximity of the fact, but also because of the editorial line
1 Trabalho apresentado no GT 2 Narrativas e textualidades midiáticas.2 Jornalista formado pela Universidade Federal de Viçosa. Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagens – Centro Federal de Ensino Tecnológico de Minas Gerais (CEFET-MG); marcotuliocamara@gmail.com
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
of leading the narrative, firming as spokesperson of the histories involved in the tragedy.
KEYWORDS: Editorial; media speech; Bento Rodrigues; Framework.
INTRODUÇÃO
O rompimento da barragem de Fundão da empresa Samarco (Vale/BHP), em
05/11/2015, causou a destruição de Bento Rodrigues, subdistrito pertencente à cidade de
Mariana, e é considerado, pela sua extensão e danos causados, o maior desastre
ambiental do Brasil, matando animais, rios, vegetação e, principalmente, histórias. A
lama de rejeitos da barragem rapidamente chegou ao Rio Doce e seguiu o curso até
chegar ao mar, no litoral do Espírito Santo. No trajeto, atingiu toda a fauna e flora
ligadas ao rio, em um verdadeiro cenário de destruição, com o elevado número de
peixes mortos que eram visíveis no leito do rio, além de prejudicar a população
ribeirinha que tirava seu sustento do rio Doce e até comprometer o abastecimento de
água de cidades que dependem diretamente do Rio, como a cidade de Governador
Valadares, a maior do leste do Estado. Os impactos dessa tragédia são sentidos até hoje,
um ano depois. São histórias que foram soterradas, vidas que foram perdidas,
comunidade que não foi refeita, esperança que ainda persiste latente.
Dada à importância do registro de tamanha tragédia, jornais locais, estaduais e
nacionais voltaram sua atenção, pautas e equipes à Mariana. Helicópteros de
reportagens, equipes fotográficas e repórteres enviados especiais chegavam à cidade a
todo o momento na procura da cobertura completa do maior desastre ambiental do
Brasil. Narrar um fato novo, com causas ainda desconhecidas e com abrangência que
supera os limites territoriais estaduais, foi um desafio. Dos iniciantes na profissão aos
mais experientes, relatar a tragédia de Mariana foi um marco na história e vida
profissional de cada um que esteve envolvido. Cobertura jornalística intensa,
registrando o caminho destruidor que a lama percorreu e histórias que foram apagadas
por ela. Diferentes veículos com diferentes posicionamentos focavam nas consequências
da tragédia, seguindo cada um a sua linha editorial.
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
Conforme relatam Barbosa e Carvalho (2016, p. 2), “uma das tarefas do
jornalismo diante de um acontecimento como o de Mariana é tentar construir a narrativa
(ou as narrativas) desse evento traumático, experenciado e testemunhado pelas pessoas
atingidas por ele”. Nesse sentido, Charaudeau (2015) postula a importância do relato
testemunhal, do discurso de depoimento, descrição e “designação identificadora” na
construção da notícia a fim de gerar efeito de credibilidade (e veracidade) na
reportagem. No entanto, é importante ressaltar o papel do jornalista e do veículo ao qual
o profissional trabalha para a construção dessa realidade:“A posição do jornalista é a de testemunha esclarecida, o que aumenta sua responsabilidade em relatar fielmente o acontecimento e, ao mesmo tempo, o compromete, pois a narrativa que constrói não pode prescindir da visada de captação. A instância midiática está, pois, colocada diante de um acontecimento exterior a si mesma, o qual deve ser considerado segundo suas potencialidades de atualidade, de diegese, de causalidade e de dramatização, acontecimento que deve ser transformado em narrativa midiática através de escolhas efetuadas a partir de uma série de roteiros possíveis”. (CHARAUDEAU, 2015, p. 157)
Dessa forma, o presente artigo busca investigar a diferença entre a cobertura de
quatro jornais mineiros, baseado nos editoriais de suas edições especiais: Estado de
Minas, O Tempo, Lampião e a Revista Curinga, sendo estes dois últimos, produtos
laboratoriais do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).
Para isso, pretende-se analisar o enquadramento dado em cada editorial, por cada
veículo, a partir das fontes utilizadas, estrutura e construção da narrativa. Busca-se,
ainda, refletir sobre as palavras designadas à descrição do fato, como posicionamento e
construção do ponto de vista. O objetivo é identificar semelhanças e, principalmente,
diferenças, para verificar se houve disparidades na cobertura entre os quatro veículos,
considerados, aqui, na dicotomia entre a mídia hegemônica e contra-hegemônica3.
A análise toma como base duas grandes esferas: a noção de enquadramento e
construção de notícias e da relação do gênero editorial com o posicionamento
institucional, o que o público pode esperar de tal produto. Dessa forma, pretende-se
analisar as narrativas utilizadas em cada veículo, as representações demonstradas, as
vozes apresentadas (e silenciadas) e como essas estratégias se relacionam com o
3 Aqui, trataremos os jornais-laboratórios como parte de uma mídia contra-hegemônica, já que possui maior liberdade editorial e se diferencia da grande mídia em outros aspectos reconhecidos pelos próprios orientadores, respeitando as limitações de veículos produzidos por estudantes de jornalismo instalados em uma Universidade pública.
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
posicionamento ideológico de cada um. Em comum, os editoriais utilizam o relato
testemunhal a fim de legitimar seu discurso, “como sinais de marcação de realidade”
(BARBOSA; CARVALHO. 2016, p. 11). No entanto, o Estado de Minas e O Tempo
destacam a cobertura midiática que acompanhou o trajeto percorrido pela lama e as
histórias da tragédia, enquanto O Lampião e a Curinga se posicionam como jornalismo
local, aproximando-se e demarcando-se como parte da história e dos relatos.
EDITORIAL COMO GÊNERO OPINATIVO
Tradicionalmente comum no jornal impresso, o Editorial se insere no gênero
Opinativo, pois exprime a opinião do veículo ao qual se insere, não apenas de
determinados repórteres. É o pensamento oficial do jornal, inserido em uma perspectiva
institucional, em que, ainda que não seja assinado, é redigido, em sua maioria, pela
direção ou editor-chefe. Alves Filho (2006) defende a institucionalização do editorial:“fala-se em nome de uma instituição ou empresa, a qual assume a responsabilidade pelo tratamento do objeto de sentido e pelas posições axiológicas assumidas, eximindo o redator do texto das responsabilidades jurídicas e enunciativas em relação ao conteúdo e posições assumidas em cada texto empírico; ou seja, o autor jurídico é a própria empresa jornalística”. (ALVES FILHO, 2006, p. 85)
Apesar de ter um pequeno alcance efetivo de leitor, cerca de 5% (CAMPOS,
2004), é o espaço onde o veículo se posiciona acerca dos temas atuais e apresenta o que
pode ser encontrado naquela edição, posicionando-se, de maneira mais explícita, em
relação às notícias trabalhadas. Dessa forma, é no editorial onde a empresa se define e
demarca sua linha política e opinativa, a fim de convencer o leitor a partilhar dos
mesmos ideais, considerados como verdades absolutas.“Como a palavra não é passada diretamente ao leitor, o que se busca é que ele aceite a orientação argumentativa apresentada e, consequentemente, alinhe-se à posição enunciativa defendida pelo jornal – nesse sentido, a interação é tensa. Em outras palavras, a autoria no editorial confere autoridade à empresa jornalística para que ela assuma uma posição e a defenda como uma verdade”. (ALVES FILHO, 2006, p. 87).
Apesar de ter um objetivo definido, seguindo o princípio de tipologia
heterogênea (MARCUSCHI, 2002), o editorial pode ganhar novos formatos de acordo
com o suporte em que está veiculado, público ao qual se direciona, dentre outras
variáveis que podem influenciar na produção do texto.
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
Com base na definição de Beltrão (1980), Valões e Lima (2010) apresentam
algumas características do gênero. Para nossa análise, consideraremos que os referidos
editoriais estão classificados:
1) Quanto à morfologia: Artigo de fundo, o que abre a página de opinião, sendo reconhecido pela sua tipografia e a manifestação explícita do posicionamento do jornal.
2) Quanto à topicalidade: de Consequência, já que repercutem os efeitos da tragédia na vida das pessoas e na rotina da cidade
3) Quanto ao conteúdo: Informativo, ao passo que exploram aspectos que não foram trabalhados com tanto afinco nas notícias, além de apresentarem o trabalho feito
4) Quanto ao estilo: Emocional, pois envolve o leitor na cobertura da tragédia, utilizando de estratégias patêmicas para o convite à leitura do produto, colocando o próprio jornal nessa posição subjetiva envolto de sentimentos causados pelo ofício.
5) Quanto à natureza: Circunstancial, já que estão inseridos no contexto da tragédia retratada em nível nacional, inscrita em forte opinião social, transmitindo o posicionamento editorial.
Em uma visão semiolinguística, o editorial está inscrito no Contrato de
Comunicação, caracterizando-se como gênero situacional (CHARAUDEAU, 2015):
inclui a identidade dos parceiros inscritos (no caso, o próprio jornal); a finalidade
daquele ato de comunicação (exposição da opinião e convencimento a partir dela); o
propósito como sendo o macrotema (a cobertura da tragédia); e o dispositivo no qual
o gênero está inserido (jornal impresso). Dessa maneira, chegamos ao seguinte
esquema ilustrativo (EMEDIATO, 2003), que servirá como base para nossa análise:
DOMÍNIO DE PRÁTICA SOCIAL
Midiatização
SITUAÇÃO GLOBAL DE COMUNICAÇÃO(determinações sociais)
Mídias de informação
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
SITUAÇÃO ESPECÍFICA DE COMUNICAÇÃO
Determinações sociais Determinações discursivas
Características semiolinguísticas
Jornalismo impresso
VARIANTES TEXTUAIS
Características semiolinguísticas
Jornal popularJornal satíricoJornal políticoJornal de referência
APRESENTAÇÃO DO CORPUS
Como dito anteriormente, a cobertura da tragédia de Mariana foi intensa e
ganhou destaque em cadernos especiais nos quatro veículos analisados: O Tempo,
Estado de Minas, Lampião e Curinga. Para este artigo, selecionamos os editoriais de
cada edição especial: “Agonia de um rio”, número 6.923 do jornal O Tempo, de
29/11/2015. “Vozes de Mariana”, número 26.959 do jornal Estado de Minas, de
05/12/2015; “Do fim ao recomeço”, edição 21 do jornal Lampião, de janeiro de 2016;
“Edição Especial”, edição 16 da revista Curinga, de março de 2016;
Especialmente nos jornais O Tempo e Estado de Minas, considerou-se como
editorial a nota de abertura da edição especial, na capa de cada uma, como apresentação
do conteúdo que se propõe a apresentar. Já nos produtos laboratoriais da UFOP,
Lampião e Curinga, o editorial se encontra nas páginas dois e três, respectivamente.
O especial “Um adeus ao Rio Doce”, do jornal O Tempo, apresenta o título “O
Rio da minha aldeia” (Figura 1) , fazendo referência a uma poesia de Fernando Pessoa,
com imagens de peixes mortos no leito do rio. O texto apresenta lead tradicional, com
dados e atualização numérica, apresentando a tragédia. O jornal demarca o
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
deslocamento da reportagem para a elaboração do caderno e a narrativa testemunhal que
se propôs a fazer.
Figura 1 Editorial do Jornal O Tempo: "O rio da minha aldeia"
Já o especial “Vozes de Mariana”, do jornal Estado de Minas (Figura 2),
apresenta, na capa, rostos das vítimas da tragédia, com o subtítulo “A dor em primeira
pessoa”, exemplificado em algumas falas reproduzidas entre aspas, marcando o discurso
relatado4. O texto de apresentação do jornal traz uma epígrafe do prêmio Nobel de
Literatura, comparando a tragédia de Mariana com o acidente nuclear de Chernobyl.
Apesar de apresentar o protagonismo das vítimas, o texto exalta o papel dos repórteres
na produção do material, apresentando-os logo no início da nota, para, só depois,
nomearem os personagens retratados, reconhecendo que eles “não podem ser vítimas
também do silêncio”.
4 Ver CHARAUDEAU, 2015, p. 161IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Gerais
https://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
Figura 2 Editorial do Jornal Estado de Minas: "Vozes de Mariana"
O jornal-laboratório Lampião apresenta três artigos do gênero opinativo:
Editorial, Crônica e Opinião. O editorial, objeto de análise deste artigo, leva o título
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
“Caos e Esperança” (Figura 3), trazendo a indagação acerca da responsabilidade da
tragédia. O texto, ainda, reforça a necessidade de que o fato não pode ser esquecido e,
como jornal-laboratório do curso de Comunicação Social, relaciona o papel da
Universidade com o papel acadêmico de levar informação completa ao leitor, com
abordagem diferenciada e regionalizada.
Figura 3 Editorial do Jornal Lampião: "Caos e esperança"
Por fim, a revista Curinga já se demarca como jornal local, como parte dos
relatos apresentados. O editorial (Figura 4) retrata o acontecimento como marca do
processo de identidade e de subjetividade da publicação e da população, trazendo
termos e relatos relacionados à memória, história, identidade a partir de narrativas de
vida, concedendo a “voz do invisível”, em oposição à grande mídia. Assim como o
Lampião, a revista também levanta uma indagação: “Qual o preço que se paga?”.
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
Figura 4 Editorial da Revista Curinga
ENQUADRAMENTO E A CONSTRUÇÃO DOS PONTOS DE VISTA NOS
EDITORIAIS
Classificar o editorial como gênero opinativo o qual indica o caminho escolhido
pelo veículo na abordagem de tal fato é fundamental para este trabalho. Também é
preciso destacar que a imparcialidade midiática, tão disseminada pelo senso comum, é
um mito. Considerar a mídia apenas como “fonte de informação”, onde ela é passada de
forma objetiva, é ignorar o papel do sujeito na instância da produção, que carrega IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Gerais
https://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
valores e opiniões que perpassam na produção daquele conteúdo, agregando pontos de
vista e subjetividade na informação, ainda que seja um relato sobre um fato,
acontecimento, como foi a tragédia relatada. “Partindo do acontecimento, o jornalista interpreta e analisa em função de sua própria experiência, de sua própria racionalidade, de sua própria cultura, tudo isso combinado com as técnicas próprias a seu ofício (…) A instância midiática institui-se num ‘meganarrador’ compósito, incluindo aí a fonte de informação, o jornalista que redige a notícia e a redação que a insere numa determinada encenação”. (CHARAUDEAU, 2015, p. 156 e 157)
No campo da Comunicação, os enquadramentos determinam a produção de
notícias, que definem e constroem a realidade a partir de determinada visão. Assim, as
notícias “são um recurso social cuja construção limita um entendimento analítico da
vida contemporânea” (TUCHMAN, 1978, p. 215 apud PORTO, 2004, p. 79). Nesse
contexto, o enquadramento, entendido com uma “ideia central organizadora”, é um
modo de organizar o discurso através de práticas específicas, construindo uma
determinada interpretação dos fatos.
É nesse sentido que Charaudaeau (2015) afirma que a notícia opera com um real
construído, a partir do filtro de um ponto de vista. Ou seja, não é o retrato puro e bruto
do acontecido, mas sim um recorte a partir da visão e interpretação do fato.
Especialmente o editorial se caracteriza como “acontecimento comentado”,
reconhecendo seu engajamento na função política do jornal, já que tal gênero “se exerce
sobre um propósito que concerne exclusivamente ao domínio político e social”
(CHARAUDEAU, 2015, p. 235).
O ponto de vista pode ser expresso de diversas formas, desde a escolha de uma
foto representativa ao posicionamento mais declarado, pois “referir-se a um objeto é
apontar para um enunciador e para a posição em que seu ponto de vista ocupa no
discurso” (CORTEZ, 2013, p. 299). Assim, coloca a perspectiva de si e do outro no
discurso, por meio da orientação argumentativa em formas nominais, verbos e a própria
percepção na formação de sentido. A autora afirma que através de um mecanismo
textual-discursivo, “o locutor apreende e apresenta os objetos de discurso para fazer
valer seu ponto de vista em meio ao ponto de vista de outros enunciadores” (p. 294).
Portanto, é fundamental sabermos quem está sendo representado e quais as
fontes usadas para a realização dessa representação. Para Charaudeau (2015) a escolha
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
das fontes utilizadas é parte da orientação do ponto de vista e determinante no
enquadramento dado. Quando se ignora sua identidade ou é denominada de forma vaga,
indica a “distância com relação ao valor de verdade da informação” (p. 149),
influenciando diretamente na credibilidade, colocando-a em risco.
Para Emediato (2013), o sentido de um enunciado, então, passa a ser os
encadeamentos discursivos que ele evoca, não a informação que ele traz. Ou seja, a
produção de sentido é provocada a partir dos efeitos esperados a partir dessas escolhas e
dos enquadramentos utilizados, incitando o leitor a seguir o ponto de vista defendido
pelo veículo, de forma implícita no corpo da matéria, se identificando com o público. “Os verbos de atitude podem representar uma opinião do sujeito enunciador/informante sobre o dizer de um ator social, (como) exercício de interpretação por parte do jornalista. (...) Indica ao leitor em qual perspectiva ele deve compreender esse dizer, além de provocar o acontecimento ao suscitar reações dos atores sociais ao discurso relatado, abrindo uma perspectiva de debate” (EMEDIATO, 2013, p. 83 e 84)
Como vimos, essa gestão de identidade e identificação com o público pode ser
feita por verbos, adjetivos e qualificações, como observamos no editorial da Revista
Curinga, onde assinalamos: “Olhamos a situação como quem vê todos os dias pessoas
ligadas ao rompimento da barragem, parentes, amigos, conhecidos. Somos parte disso
também” (Figura 5).
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
Figura 5 Trecho do Editorial da Revista Curinga
Como podemos observar na imagem acima, o editorial da Revista Curinga faz
questão de se demarcar como jornalismo local, que vivencia e convive com a tragédia e
as consequências dela, além de também se diferenciar na cobertura dos outros veículos,
indo ao encontro da classificação da Revista como parte da mídia contra-hegemônica.
Outro tipo de enquadramento bastante utilizado pelos produtos laboratoriais em
análise é o enquadramento pelo questionamento (Figura 6), que incita o receptor a
problematizar a partir de uma visada incitativa (EMEDIATO, 2013). Ele se dá quando
se faz uma pergunta que incita a reflexão, o pensamento sobre determinada questão. É o
que se observa no jornal Lampião, por exemplo: “’E agora?’ é o que nos perguntávamos
e ainda repetimos. Bento já não existe. Como sobreviver apesar disso? Esta edição
convida você a se perguntar: Quem se responsabiliza? Quem cuida de nós?”. Tal
enquadramento também está presente na Revista Curinga: “Qual o preço que se paga
pela mineração? E qual o custo ambiental da tragédia?”.
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
Figura 6 Editoriais da Curinga e do Lampião: Enquadramento pelo questionamento
Como vimos, o editorial é o que diferencia determinado veículo de outro,
mesmo que possam apresentar semelhanças, pois a enunciação decorre de um enunciado
inédito (ALVES FILHO, 2006). Tal característica é fundamental para nossa análise, já
que apresenta de um lado, dois jornais comerciais de grande circulação, com
posicionamentos aparentemente similares e, do outro, dois produtos laboratoriais
elaborados por estudantes do mesmo curso da mesma Universidade, que, apesar de
grandes semelhanças na linha editorial, apresentam abordagens diferentes em cada
edição.
O texto de apresentação da edição especial dO Tempo possui caráter mais
informativo (Figura 7), com o lead de reportagem factual, apresentando o ocorrido,
localizando-o no estado, distanciando-se fisicamente do local, e narrando
temporalmente a tragédia. Além disso, classifica o fato como “acidente”, atribuindo
naturalidade ao desastre.
Figura 7 Editorial do Jornal O Tempo: lead tradicional. Editorial informativo
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
Logo em seguida, o jornal destaca o papel testemunhal na cobertura da tragédia:
“A reportagem de O Tempo acompanhou de perto esse rastro de morte provocado pelo
maior desastre ambiental do Brasil e um dos maiores do planeta, levando-se em conta o
volume de material derramado na natureza”. Observa-se também, a partir desse trecho
(Figura 8), a angulação mais voltada aos estragos ambientais da tragédia,
dimensionando o tamanho dela, mas também tenta resgatar a perspectiva pessoal do
desastre, mas em segundo plano. “Este caderno especial dimensiona o tamanho do dano
causado ao meio ambiente até aqui (quase um mês após o desastre), questiona as
responsabilidades dos agentes envolvidos e, principalmente, mostra a dor de quem vive
do agora agonizante rio Doce”.
Figura 8 Editorial de O Tempo: informacional, distante da tragédia
Seguindo a mesma linha, o Estado de Minas se apresenta como jornal que
testemunhou a dor das pessoas atingidas e traz, agora, esses relatos, enaltecendo o
trabalho de sua equipe jornalística: “Durante duas semanas, os jornalistas do EM
mergulharam nas histórias de sobreviventes para apresentá-las em textos e vídeos”.
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
Figura 9 Editorial do Estado de Minas: ressalta o trabalho da equipe em primeiro lugar
É importante observar que o jornal destaca o trabalho feito pela sua equipe na
cobertura da tragédia. Apesar de carregar o subtítulo de “A dor em primeira pessoa”, e
afirmar dar mais valor às histórias dos moradores envolvidos diretamente no desastre, o
Jornal apresenta, nas suas primeiras linhas, os nomes dos repórteres, e não das vítimas,
que somente são apresentadas no fim do texto.
Outro ponto importante em comum do jornal Estado de Minas com o jornal O
Tempo é o discurso relatado em destaque. Em ambos (Figura 10), apresentam falas de
pessoas que não foram atingidas pelo rompimento da barragem. O primeiro apresenta
um trecho de uma obra premiada no Nobel de Literatura, sobre o acidente nuclear de
Chernobyl, fazendo uma comparação com a tragédia de Mariana. Já O Tempo, destaca,
no alto da página, a fala de uma repórter acerca da cobertura do ocorrido, onde atesta
não conhecer, anteriormente, o curso do leito do rio.
Figura 10 Destaques do Estado de Minas e O Tempo não trazem relatos de vítimas
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
Os excertos destacados acima demonstram o não protagonismo, na cobertura
desses dois jornais, das vítimas do desastre, ainda que os referidos veículos tenham
declarado que suas edições especiais seriam diferentes por abordarem, prioritariamente,
os relatos de quem mais sofreu com a tragédia relatada. Assim, realizam o
silenciamento das vozes que afirmaram que seriam ouvidas, cedendo maior espaço e
destaque a outras fontes terceiras à tragédia.
No entanto, enquanto produtos laboratoriais do curso de Jornalismo da UFOP, a
Curinga e o Lampião demonstram abordar a tragédia sob outro olhar, como observado
no editorial da Revista (Figura 5): “Era impossível deixar de relatar as histórias das
vítimas da tragédia. Isso não poderia ser esquecido. Resolvemos fazer uma abordagem
diferente dos outros veículos. (...) buscamos dar voz à todas as pessoas que tiveram
algum envolvimento da situação”. E no Lampião (Figura 11): “Nos dias que sucederam
o acontecido, estudantes se comprometeram e ajudaram reforçando o ideal de
universidade pública como espaço coletivo de aprendizagem e retornos. Este
LAMPIÃO é mais um efeito disso. Não somos instituição. Somos gente, somos alunos e
buscamos, por meio deste jornal, deixar nossa contribuição a esta cidade que nos recebe
de braços abertos a cada semestre, dividindo conosco seu tempo e sua eternidade”. Nos
dois excertos, assim como outros observados anteriormente, podemos verificar a
demarcação de localidade destas publicações, considerando-se como participantes da
rotina da cidade, alterada pela tragédia.
Figura 11 Editorial do Lampião: identificação com as vítimas
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
Dessa forma, observamos maior aproximação com o público de atingidos pelo
rompimento da barragem, num processo de identificação e pertencimento, já que estão inseridos
na mesma cidade e dividem as mesmas dúvidas e incertezas acerca do ocorrido. De modo a
sintetizar e explicitar melhor a análise, chegamos ao quadro a seguir. Ele se divide em quatro
categorias de enquadramento específico dos editoriais, elencados pelo autor, presentes nos
quatro veículos selecionados. A cada categoria, apresentamos as palavras-chave em que ela se
demarca, extraída, na íntegra, dos editoriais em questão. A partir desses trechos, inseridos em
determinadas categorias, fazemos a análise, interpretando como cada veículo se posiciona a
partir dessas observações.
Categoria Veículo Palavras-chave Análise
Identificação
Lampião Cidade que nos recebe; dividindo conosco
Identifica-se como inseridos na mesma cidade em que ocorreu a tragédia
CuringaNossa casa; vê todos os dias; Somos parte disso
também
Insere-se na cidade, como parte dos atingidos pela tragédia.
Estado de Minas
o EM escalou os repórteres; Os jornalistas
mergulharam nas histórias
O trabalho feito pelo Jornal é exaltado, destacando os nomes dos repórteres
envolvidos. Ao afirmar que "mergulharam nas histórias", coloca-se como externo à realidade
que busca retratar, ainda que tente aproximação.
O Tempo
acompanhou de perto; repórteres
testemunhando; mostra a dor
Pode-se observar o distanciamento do Jornal em relação às vítimas e cidades atingidas, ao
informar que acompanha, relata, testemunha o que houve, sempre na visão da equipe
responsável pela cobertura, como observador externo, não como parte da tragédia.
Abordagem
Lampião
por parte dos sobreviventes; estragos
incalculáveis; atingidos à mercê; tragédia que não
pode ser esquecida
O jornal denomina o fato como "tragédia", colocando em primeiro plano as perdas dos
habitantes da cidade de Mariana, retratando as vítimas do desastre. Trata, também, da
importância de se registrar o ocorrido por tal abordagem, ao firmar que não pode ser
esquecido.Curinga Histórias das vítimas da
tragédia; Isto não poderia ser esquecido;
Abordagem diferente; tema delicado e
importante; memória de todos os atingidos.
A revista já informa, no primeiro parágrafo, quem são os retratados pela edição: as vítimas. Também já se posiciona como mídia contra-
hegemônica, ao diferenciar sua abordagem dos veículos tradicionais. Também trata da
memória, ao afirmar que tal fato não pode ser esquecido.
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
Estado de Minas
Primeira pessoa; Quem fala são brasileiros anônimos, vítimas do descaso criminoso; Vítimas também do silêncio; tragédia; gente; apresentar histórias; ganhou traumas;
O Jornal busca dar uma abordagem mais pessoal e personalizada, ao evidenciar as
pessoas vítimas como foco da edição. Denomina o fato como "tragédia" e "descaso criminoso", relativiza a voz com o silêncio
dado a essas vítimas. Apesar disso, apresenta, primeiramente, os nomes dos repórteres
escalados para tal cobertura para, só ao final, apresentar as vítimas relatadas.
O Tempo
Acidente; dimensiona o tamanho do dano causado
ao meio ambiente; lava fria; mar de lama; maior
desastre ambiental
Classifica o fato como "acidente" e refere como "tragédia" apenas quando se trata em
relação ao meio ambiente. Utiliza palavras que dão denotação natural ao ocorrido (como mar e lava), evidenciando o maior enfoque ambiental na tragédia, em detrimento ao humano/social.
Questionamento
LampiãoE agora? Quem se
responsabiliza? Quem cuida de nós?
Instiga o leitor a fazer as mesmas perguntas e procurar suas possíveis respostas na edição que
se segue. Questiona responsáveis e se coloca como parte dos atingidos.
CuringaQuem eram, são e serão os moradores? Qual o
preço que se paga?
Dá enfoque nas identidades dos moradores e problematiza a questão econômica da
mineração em detrimento dos estragos que ela pode causar.
Estado de Minas x O jornal não apresenta questionamentos nem
incentiva o leitor a fazê-lo.
O TempoQuestiona as
responsabilidades dos agentes envolvidos
O questionamento do jornal não é explícito, assim como a quem se dirige tal problema.
Dessa forma, não deixa claro a questão principal, tampouco instiga a reflexão e análise
que poderiam ser incentivadas pela edição.
Vozes
Lampião x
Não traz nenhum discurso relatado, mas informa a abordagem e direcionamento da
edição, que é voltada às pessoas e à cidade ao qual se insere.
Curinga x
Não traz nenhum discurso relatado, mas informa a abordagem e direcionamento da
edição, que é voltada às pessoas e à cidade ao qual se insere.
Estado de Minas Svetrlana Alexievic
Tem como título "Vozes de Mariana", apresenta, na capa, fotos e relatos de vítimas, mas, no texto, apresenta-se trecho do livro de
escritora bielo-russa.
O Tempo Bárbara Ferreira
Apresenta, em destaque, o relato de uma repórter do jornal e, ao final do texto, trechos
de uma poesia de Fernando Pessoa, silenciando, portanto, as vozes das vítimas às
quais se propõe a relatar.
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
Como demonstrado acima, os quatro veículos apresentam características
próprias e especificidades, mas, ainda assim, podem ser separados em dois grupos: de
um lado, Estado de Minas e O Tempo, do outro, Lampião e Curinga. Essa divisão
corrobora nossa classificação enquanto mídia hegemônica e a contra-hegemônica, em
relação à diferença de abordagem na cobertura do mesmo fato. O jornal Lampião e a
Revista Curinga se identificam mais com as vítimas do rompimento da barragem,
voltando suas pautas e atenções principalmente a eles, seja por causa da proximidade
(ambos os veículos são sediados na mesma cidade da tragédia relatada, em Mariana) ou
pela linha editorial. Enquanto isso, Estado de Minas e O Tempo, apesar de estarem no
mesmo estado e, levando em consideração a extensão territorial de Minas Gerais,
próximos às barragens, aborda de forma mais “distanciada” das vítimas, dando enfoque
ambiental, como observado majoritariamente na cobertura do jornal O Tempo, ou
colocando o aspecto pessoal em segundo plano, ainda que este seja o tema principal da
edição, como notado no Estado de Minas. Assim, a abordagem também se diferencia,
exemplificado pelas escolhas lexicais de como classificar o fato e indicação de como se
dá a narrativa daquela edição que segue o editorial analisado. Dessa forma, os produtos
laboratoriais da UFOP se posicionam de maneira mais incisiva e questionadora,
propondo indagações e reflexões, tendo essa característica facilitada por serem mais
independentes editorialmente, com mais liberdade de posicionamento e, até mesmo,
comercial. Mesmo assim, apesar de não apresentar discursos relatados em seus textos, o
Lampião e a Curinga dão mais espaço e voz às vítimas do rompimento da barragem, ao
passo que o Estado de Minas e O Tempo, mesmo que indiquem protagonismo das
vítimas, não o fazem nos seus trechos de destaque, evidenciando falas de pessoas
externas ao acontecimento.
Feita a análise mais detalhada de cada editorial, retomamos ao esquema
apresentado no início deste artigo, sobre a classificação de editorial (EMEDIATO,
2003). Baseando em Furtado (2009), seguindo as postulações de Charaudeau (2015) na
Análise do Discurso, sintetizamos a análise do gênero no esquema a seguir:
O gênero editorial nos jornais O Tempo, Estado de Minas, Lampião e Curinga
Domínio da prática socialIX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Gerais
https://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
Natureza do discurso – discurso midiático
Situação Global de Comunicação
Informação – discurso de informação
Situação Específica de Comunicação
Jornalismo Impresso
Parceiros inscritos na relação midiática: jornalista relata e opina, enquanto o leitor
absorve a informação e opta por recusar ou aceitar o produto oferecido. Determinado
por quatro exigências: exigência da visibilidade (organização espacial), de legibilidade
(exposição clara), de inteligibilidade (aplica-se ao comentário) e da dramatização
(estratégia de captação).
Variantes Textuais
Jornais de referência – informação (jornal comercial e laboratorial)
Argumentam aquilo que acreditam/defendem, seguindo uma linha de raciocínio ao qual
o veículo se insere na linha editorial previamente estabelecida, regidos pelo contrato de
comunicação. Apresenta o que pode ser encontrado nas matérias e demarca-se como
participante testemunhal.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tendo em vista a importância do editorial na determinação da abordagem e
enquadramento que serão dadas as reportagens subsequentes, percebeu-se uma profunda
ligação entre o primeiro texto de cada edição em relação às reportagens que se seguiam.
Analisar o editorial é tentar perceber a opinião daquele veículo acerca do tema tratado.
Mais que isso, é direcionar o olhar do leitor ao que o jornal se propôs a fazer, como
forma de identificação com o público, a fim de conquistar sua confiança e partilhar da
mesma visão.
Como são veículos distintos, inscritos em diferentes condições de produção e
finalidade, observou-se maior distinção entre esses dois grupos: de um lado, os jornais
de maior circulação estadual e, do outro, os produtos laboratoriais do curso da UFOP.
Tais diferenças são marcantes tanto na própria produção, quanto na visão e abordagem
de cada veículo. Percebeu-se maior envolvimento com as pessoas de Mariana que foram
atingidas e suas histórias nos produtos laboratoriais, enquanto nos outros jornais a
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
dimensão da tragédia, pessoal e ambiental, ganha prioridade, com o papel do jornal
como veículo de informação e porta-voz ganhando grande destaque. Tal divisão pode
ser classificada na dicotomia entre mídia hegemônica (jornais comerciais) e contra-
hegemônica (produtos laboratoriais), tendo em vista a diferença de abordagem sobre o
mesmo fato relatado.
Dessa forma, notou-se a diferença de cobertura entre os jornais, não só pela
proximidade física do fato, mas também pela linha editorial de conduzir a narrativa,
pelas palavras, termos e enquadramentos utilizados, firmando-se como porta-vozes das
histórias envolvidas na tragédia e da dimensão da catástrofe.
REFERÊNCIAS
ALVES FILHO, F. A autoria institucional em editoriais de jornais. Alfa, São Paulo, 50
(1): 77-89, 2006.
BARBOSA, K. B; CARVALHO, A. L. Narrativas do trauma no jornalismo local:
Bento Rodrigues. In. Anais do XXV Encontro Anual da Compós, Lugar, 2016.
Disponível em:
http://www.compos.org.br/biblioteca/narrativasdotraumanojornalismolocal_autoria_338
0.pdf [acesso em 20/09/2016]
CAMPOS, /P. C. "Artigo, coluna, editorial". In:
http://ftp-acd.puc-campinas.edu.br/pub/professores/clc/adauto/Impresso/Opini
%C3%A3o%20-%20Pedro%20Celso%20Campos.doc. [acesso em 28/09/2016].
CHARAUDEAU, Patrick. Discurso das mídias. São Paulo: Contexto, 2015
CORTEZ, Suzana. A representação de pontos de vista em reportagens de revista
feminina. In: Emediato, W. (Org.) A construção da opinião na mídia. Belo Horizonte:
NAD, 2013, p. 293 – 316
CURINGA. 16a edição, 88p. Mariana: Universidade Federal de Ouro Preto, Março,
2016.
EMEDIATO, Wander. A construção da opinião na mídia: argumentação e
dimensão argumentativa. In: Emediato, W. (Org.) A construção da opinião na mídia.
Belo Horizonte: NAD, 2013, p. 69 - 103
_______. Os gêneros discursivos como tipos situacionais. In MARI, Hugo et al.
Análise do discurso em perspectivas. Belo Horizonte; Núcleo de Análises do Discurso, IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Gerais
https://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com
Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos, Faculdade de Letras da UFMG,
2003.
ESTADO DE MINAS. Vozes de Mariana. 26.959a edição, 12p. Belo Horizonte,
Dezembro, 2015
FURTADO, Maria Aparecida Silva. O Editorial Jornalístico numa perspective
Semiolinguística. In: VI Congresso Internacional da ABRALIN XIX Instituto de
Linguística, 2009, João Pessoa. VI Congresso Internacional da Abralin, Anais, João
Pessoa: Editora Contexto, 2009, v. 01
LAMPIÃO. 21a edição, 12 p. Mariana: Universidade Federal de Ouro Preto,
2011- .Bimensal. Janeiro, 2016.
MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONÍSIO,
Ângela et al. Gêneros textuais e ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2002.
O TEMPO. Agonia de um rio. 6.923ª edição, 20p. Belo Horizonte, Novembro, 2015
PORTO, Mauro P. Enquadramento da mídia e política. In: Albino, Antonio; Rubim,
Cabelas, A. (Orgs.) Comunicação e política: conceitos e abordagens. São Paulo: Unesp,
2004, p. 74 - 104
VALÕES, Andrezza L. L. ; LIMA, R. R. . O gênero jornalístico-editorial no ensino
de Língua Portuguesa em Educação de Jovens e Adultos: uma proposta teórico-
metodológica. In: V EPEAL, 2010, Maceió. V EPEAL - Pesquisa em Educação:
desenvolvimento, ética e responsabilidade social, 2010. v. 1. p. 1-12.
IX Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Geraishttps://ecomig2016.wordpress.com/ | ecomig2016@gmail.com